Hant! Os Piores Brasileira

Autor(a): Pedro Suzuki


Volume 1 – Arco 1

Capítulo 35: Recalculando rota

Abrindo meus olhos, vi uma nuvem de partículas brilhantes, que se dissipavam lentamente, vindos do enorme cristal, já quase escavado por completo.

Os responsáveis por isso não poderiam ser outros: aventureiros que não valorizam a própria vida, tentando escavar com todas as suas forças um homem misterioso, sem nem tentarem investigar o motivo dele estar naquele estado.

Isso ativou meu sensor de perigo natural, em sua capacidade máxima.

Risco biológico de uma doença ancestral, chefão toupeira disfarçado, ser super forte aliado das forças do mal, selado graças aos sacrifícios de milhões, em uma era onde o conhecimento mágico era muito superior, mas foi perdido atualmente; espírito vingativo pela morte de seus companheiros, que vai se confundir e partir para cima de nós. 

São infinitas as possibilidades de isso dar extremamente errado, para uma recompensa que parece inexistente.

Essa deveria ser a regra número 1 ao entrar em qualquer masmorra: não toque no que não precisa ser tocado.

“Mas o que esperar de sujeitos que tentaram lutar contra esse colosso, mesmo após verificarem sua grandeza real?”, de qualquer forma, já era tarde demais.

A respiração quase imperceptível, mas estável, do monge congelado, sofreu uma alteração brusca com o fim do descongelamento.

Como alguém que mergulhou por muito tempo, ele respirou desesperadamente, de boca aberta, porém, ainda na mesma posição de lótus e de olhos fechados.

Estabilizando sua respiração, ele esticou seus braços, desentrelaçou suas pernas, ficou de pé e só então abriu seus olhos.

Todos estavam apreensivos, prontos para uma possível batalha.

Colocando a mão em sua garganta, ele tossiu e fez diversos movimentos com a boca, até se acostumar e recuperar a fala.

Tomando um gole de água, tossiu novamente e anunciou em um ritmo constante, quase robótico:

— Eu sou o que derrama lágrimas por aqueles que não tiveram tempo para lamentar, o olho que vê o sofrimento oculto, o que jejua para que haja aqueles que se fartem. Sou o humilde monge do monte Iman-haman-yuman-Ibei, o iluminado Bara-Iman-Naja, conhecido externamente pelas conquistas na terrível guerra contra o avanço do culto demoníaco. Se me permitem perguntar, quem são vocês e quais suas intenções, dentro de um lugar tão sagrado?

Com o fim de sua apresentação, ele emitiu um olhar mortal, acompanhado de uma técnica que criou uma espada fantasma, formada por mana, para cada pessoa consciente nessa sala.

Eu senti imediatamente que caso me movesse, morreria na hora. E olhando a reação dos outros, sem mover minha cabeça, parecia que sentiram o mesmo, inclusive os grão-mestres.

“Estamos diante de alguém ridiculamente forte”, por isso, demorou até que o primeiro voluntário a conversar com o monge surgisse.

Nesse grande tempo de espera, ele não tentou nos apressar, nem acrescentou nenhuma palavra.

— Me chamo Rafun. Não possuo um sobrenome real, então apenas me apresentarei com meu nome. Viemos sem intenção de lutar e não tínhamos o conhecimento de que esse era um espaço sagrado. Peço que perdoe nossa ignorância.

Olhando seus arredores, com uma expressão que demonstrou confusão por uma janela de pequenos milésimos de segundo, mas retornando a face ameaçadora de antes, continuou:

— Quantos anos se passaram?

— Se passaram, desde quando?

— Desde a era do imperador...

— O tempo em que mensurávamos a passagem do tempo em eras de acordo com os imperadores, já passou faz um tempo. Na medida atual, estamos no ano 1340, depois da queda do meteoro.

— Se passaram 1340 anos desde aquele incidente!?

— Não me diga que é daquela época...

Hah, sou velho, mas nem tanto. Pelas minhas contas, se passaram duzentos anos desde que iniciei meu treinamento em reclusão, duzentos e dez, desde que cheguei a esse mundo pela torre e duzentos e quarenta, desde que nasci. — Passando seus dedos no chão, perguntou: — Por acaso, esse lugar não é mais um templo?

— Atualmente, estamos no casco de um colosso.

As espadas se dissiparam e caímos de joelhos, aliviados por sobrevivermos.

Seus idiotas! Por que fizeram isso? — disse, apenas movendo meus lábios, para um dos aventureiros.

Des-cul-pa. — respondeu ele.

— Casco de um colosso? Qual colosso?

— Um monstro tartaruga, sobre o domínio dos Fortuna.

— Fortuna?

— Tenho quase certeza de que existiam no seu tempo... A família ducal que governa essa região.

— Aparentemente, minha memória ainda está embaçada pela passagem do tempo. Se me permitem propor, poderia acompanhá-los? Ao menos, até encontrar o paradeiro de minha organização ou um lugar para ficar?

— Ficaríamos agraciados em ter a presença de um transcendente.

— Está decidido então. Sem demora, partiremos agora!

— Antes disso — disse Rafun, virando seu olhar para a parede, com o fim das negociações perigosas. — Poderia vestir algo antes de iniciarmos nossa caminhada?

Ele olhou para o Rafun, olhou para baixo e percebeu que estava completamente nu. Deu uma risada, arrancou um pedaço de um cristal mágico e formou um manto, que usou para cobrir seu corpo.

— Por que não avisou antes?

— Perdão, deveria ter mencionado no início da conversa.

Corajosamente ou idiotamente, um dos aventureiros se levantou e foi falar com o monge, com uma animação vibrante:

— Aqui era mesmo um templo?

Ao invés de palavras, o monge decidiu responder na prática.

Levantando seu braço e juntando seus dedos, ele bateu no chão, criando um estrondo que levantou toda poeira e lixo para o alto, sem nem balançar as pessoas inconscientes.

— Que controle ridículo...

Então foi revelado um chão de madeira, completamente destoante com o resto do lugar, provando que falava a verdade.

— Como será que acabou aqui?

— O destino é realmente imprevisível. É mesmo um milagre que as condições perfeitas tenham surgido tanto nesse, como no meu universo, permitindo com que a mais primitiva das formas de vida crescesse e se tornasse o que é o humano atual. Ainda mais, coincidindo perfeitamente para que os eventos se alinhassem e possibilitassem o nosso encontro atual. Só é uma prova mais profunda que os fios do destino não julgam lugar, tempo ou energia.

— O que? Eu queria dizer, sobre como o templo parou aqui, dentro do colosso... Será que ele teve danos internos em todo esse tempo congelado? É bom darem uma checada aqui!

— Sobre meu corpo, mente e alma, estou completamente saudável... Estou mesmo? Analisando a ligação invisível, o equilíbrio entre minhas duas energias, a aparência é de que está levemente desbalanceado, porém, pelas técnicas que aplico, percebi que, na verdade, esse era o real balanceamento ideal, visto que meu gasto é mais excedente de um lado, que no outro. Realmente, tenho que me cuidar e treinar para que isso não ocorra em excesso, caso contrário, é possível que uma grande tragédia ocorra... Um dia.

— É sério, acho que ele teve uma concussão interna ou um derrame...

No meio dessa conversa maluca, o artefato de comunicação com o Barão brilhou.

Atendendo, a voz irritada do Barão pode ser escutada por toda sala:

— O cristal foi entregue e o tempo planejado já passou, mas por que vocês ainda estão aí dentro?! O colosso começou a andar de volta para a reserva!

— Começou mesmo? — Em cada pequeno movimento do colosso, éramos jogados de um lado para outro, mas agora que o Barão afirmou que ele começou a caminhar, não sentimos nenhuma mudança. — O interior continua estável, que estranho...

— Coloquei uma magia espacial nessa sala pouco depois que acordei e senti algumas armadilhas direcionadas a esse lugar, pelo bem dos feridos. Mesmo assim, perdão por não ter consultado vocês.

— Armadilhas?

— Agora que ele falou, onde que vocês amarraram a toupeira que vocês capturaram? — perguntei, para os aventureiros.

— Deixei com ele...

— Tive que sair por um tempo e deixei com o outro...

— Comigo!? Eu nem toquei nesse bicho.

— Verdade, será que deixei com...

— Não acredito que perderam a toupeira de vocês! — gritou Rafun.

Procuramos por toda sala e não encontramos.

— Provavelmente na hora em que vocês se distraíram com a escavação do monge, deixaram a toupeira fugir! Como ainda se chamam de mestres e grão-mestres!? — acusou, um dos cavaleiros de menor ranque.

— Agora que o erro já foi feito, não adianta de nada ficar discutindo. Esqueçam capturar aquele animal, alguém ao menos sabe como vamos sair daqui?

— Por que não trouxemos o cartógrafo?

— E se sairmos quebrando as paredes?

— Se a parede fosse sólida, até seria possível. Mas apesar de bem estruturado, se nos movermos irresponsavelmente, é capaz de tudo desmoronar e soterrar a gente aqui.

— Vamos pensando em soluções no caminho, ficar parado aqui é a pior opção!

— Esperem um pouco — disse o monge.

Com um estalo, seu corpo entrou em combustão, assustando a todos. Mas vendo que ele estava completamente bem, observamos seu alongamento incomum criar uma fuligem preta com um cheiro terrível e restaurar seu movimento completamente.

Mais perguntas dos grão-mestres resultaram em mais respostas longas, mas vazias, do monge.

Então saímos da sala e sentimos o balançar de cada passo do colosso nos desequilibrar.

Usamos muitos métodos para tentar encontrar a saída: tentando nos guiar a partir do vento, pela memória, com pontos marcados por tinta e até pelo cheiro, todos sem sucesso.

Continuamos caminhando em círculos, até que tomamos coragem para perguntar:

— Bara-Iman-Naja...

— Podem me chamar de Barinaja.

— Barinaja, você teria alguma técnica útil para nos tirar dessa situação complicada?

— Complicada aos olhos de quem? O tempo percorre de maneira linear e fluida, apesar de já me ter encontrado com outros que provavam até essa verdade como falsa. A natureza da magia é essa, não é mesmo? Deixe me lembrar... Creio que há uma, sim.

— Poderia usá-la?

— Não poderia, não.

— Por que?

— Me esqueci.

— Por favor, se esforce para se lembrar.

— Me lembrei.

— Está brincando com a gente?

— Se foi isso que dei a entender, peço perdão, o conhecimento na minha mente flui de uma maneira não ortodoxa, apesar de pertencer aos ortodoxos, sem dúvida.

— Vai usar a técnica?

— Vou sim.

Coçando sua cabeça careca, ele fez um círculo com a mão e assoprou, criando uma rajada de vento que tomou a forma de um corvo, que foi e voltou contando o caminho da saída para o monge.

O monge seguiu o corvo que voou em alta velocidade e tentamos acompanhar o monge, da maneira que conseguíamos.

Os grão-mestres seguiram sem problemas, mas todo resto ficou para trás.

Eventualmente ele retornou para nos guiar e com ajuda dele, saímos da caverna.

Pulando do colosso em movimento, com uma técnica de caminhada no ar do monge, fomos abraçados pela nostálgica sensação de grama nos pés.

O lugar onde caímos, no entanto, não era tão hospitalar.

Cheio de cruzes e esculturas de pedra, marcados por escritas, chegamos a um assustador cemitério inóspito.

Um ambiente não tão assustador, quando visitado de dia, mas ainda desconfortável.

Caminhando e procurando pelo Barão, logo descobrimos que também não era inóspito.

Após cinco minutos de caminhada, nos encontramos com um velho homem de costas encurvadas, cuidando das ervas daninhas.

Perguntando onde estávamos e usando da memória do Rafun para nos localizarmos, percebemos que, de alguma forma, estávamos a uma hora de distância do lugar que iniciamos essa missão.

Vendo que não nos reuniríamos tão rapidamente, alguns deitaram no chão e outros resmungaram.

Usando seu artefato para criar um pombo correio, Rafun escreveu e enviou uma carta explicando a situação e pedindo para se encontrar com o Barão na cidade do Rio Cieno. Ponto de encontro no meio do caminho, que levaria menos tempo que ir diretamente a ele.

Ao propor nossa partida imediata, o Rafun foi impedido por um voto majoritário, que decidiu o contrário.

O simpático coveiro ofereceu sua casa para descansarmos e aceitamos sua oferta. Ele parecia bastante alegre em ver pessoas novas.

Pensei em suspeitar dele, mas meu coração não permitiu.

Nos hospedando na casa do coveiro, ele nos ensinou como construir um artefato de proteção, capaz de criar uma barreira para nos protegermos da maldição, esculpindo um padrão predeterminado em um bom cristal de mana ou prisma.

Então o coveiro e o monge passaram um bom tempo trocando conversas fúteis, sem alcançar nada.

Sobre o clima, sobre a beleza da grama que rodeava os túmulos, indigna de ser cortada, sobre a grandeza do céu de hoje. Tudo isso no tempo em que os grão-mestres e aventureiros montaram redes e cabanas, para descansarem antes de partirem.

— Houve alguma tragédia, ou algo do tipo? — perguntei, pelo desproporcional número de túmulos em comparação aos moradores.

— Apenas o curso natural das coisas. Os jovens partiram para capital em busca de empregos melhores que a nossa agricultura antiquada e totalmente prejudicada pela maldição, oferecendo apenas uma pequena porção do que um dia produziu. E os velhos que ficaram, eventualmente morreram. Tudo que restou foram algumas casas isoladas e esse cemitério. Mas o pior é que não houve nenhum evento significativo para que esse lugar seja lembrado, em toda história de sua existência.

Discordei dessa afirmação, enquanto degustava um fruto que ele ofereceu. Apenas produzido nesse lugar. Adocicado, levemente ácido e surpreendentemente agradável. 

— Lembrarei desse lugar. Isso te garanto. — Nesse meio de nada, que se escondia, uma das primeiras comidas agradáveis que comi nesse mundo. — Mais que todas as paisagens e todas as incríveis construções feitas pelos homens, uma pequena fruta azulada, foi o suficiente para ganhar um grande espaço no meu coração. Tenha certeza disso.

Ele agradeceu e quase se engasgou enquanto ria.

O ambiente barulhento se aquietou a medida em que os cavaleiros e aventureiros caíram no sono.

Uma conversa permanecia firme: o bate papo entre o coveiro e o monge.

Encontrando o fundo do recipiente de frutas que ele entregou, lavei e devolvi ao lugar original, em um armário velho.

Me alonguei, procurei algo para fazer naquela casa, mas decidi dar uma volta pela vila desértica.

Caminhando, refleti sobre minha batalha.

“Foi necessário interferir, não nego. Mas qual será o custo?" 

Diferente da primeira vez, a situação que se seguiu, me garantiu uma tranquilidade para aceitar como um acidente inconveniente e apenas isso. Só por hoje, decidi deixar de lado essa questão tão importante para mim.

Em um dos cruzamentos, acabei me deparando com Prilio, o cavaleiro dragão, sem seu dragão.

Ou melhor, Serpe, como especificou em uma conversa, que se alongou em uma lanchonete.

— Como conseguiu sua serpe? — perguntei.

— Sabe meu nome completo?

Acenei negativamente.

— Prilio Celeste de Eplila. Celeste, significando linhagem autorizada a criação e utilização de Serpes celestes e Eplila, especificando a cidade de onde o primeiro ancestral nasceu, para diferenciar entre as famílias com mesmo sobrenome.

Dragões são inteligentes, capazes de transformarem sua aparência e tamanho, detém uma enorme reserva de mana e são ferozes, mas serpes, bem mais fracas e semelhantes apenas na aparência, foram domesticadas faz um tempo, por diversas linhagens e uma delas, a minha família.

Por um contrato de linhagem que permite a ligação de sangue entre a fera e o humano, compartilhando a dor, sentimentos e até a vida e a morte. Instintivamente, eles se tornam dóceis com seu dono.

Aos treze anos, me foi contada toda história de nossa linhagem, bem além das cinco gerações de domadores de serpe e junto a isso, me foi entregue um ovo de serpe, sem cor.

Uma propriedade única dessa espécie, é que o ovo absorve a mana de onde é criado. Como minha família faz parte dos celestes, os ovos são colocados em um ninho no topo de um castelo onde o vento sopra mais forte.

Mas quando chegou na minha vez de cumprir essa tradição, me atrapalhei e derrubei o ovo, que caiu e rolou até o fundo de um lamaçal.

Até encontrá-lo, sua coloração já havia mudado para marrom e seu tipo já havia sido permanentemente definido como um dragão de terra.

Como uma serpe terrestre não faz parte da permissão de nossa família, tive que ser enviado para esse Ducado e treinado por uma família daqui, especializada nisso.

De início, fiquei devastado por ser obrigado a me separar de minha família, porém logo fui comprado pelo pagamento exorbitante dos Fortuna.

Nos raros reencontros com a minha família, descobri que ganhava até mais que alguns adultos. Não é surpresa que já não sou convidado faz um bom tempo, Hahaha!

— Aqui está o seu sanduiche e sua salada de frutas... — interrompeu o garçom, que também trabalhava como atendente e cozinheiro desse lugar.

— Obrigado.

— E a sua sopa de letrinhas.

— Que iguaria!

— Isso não é para crianças? — perguntei.

— Está vendo alguma criança nessa cidade? Obviamente é uma refeição que não tem limites de idade.

O sanduiche não tinha gosto, como esperado e a salada de frutas era menos doce que as frutas daquele velho coveiro.

Terminando de comer e pagar as contas, nos reunimos para recomeçar nosso retorno.

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