Volume 1 – Arco 1
Capítulo 24: Jogo das frutas
— Vamos esperar aqui mais um pouco — disse Selena.
Depois de ligar diversas cordas com objetos metálicos para servirem de aviso caso alguém tente entrar sem ser notado, subimos para o segundo andar e esperamos.
— Por que bananas especificamente? — perguntou Khajilamiv.
— Talvez por emitirem radiação, eles estejam tentando criar uma bomba? — Pela lógica comum seria impossível, mas talvez com um artefato de fundir ou compactar as coisas o efeito radioativo seja amplificado?
— O que?
Isso só seria possível se o conhecimento de como fazer uma bomba atômica chegou nesse mundo, se tal artefato ou magia realmente existisse, e eles tivessem posse dele. Mas não teria outros usos mais úteis para um poder desses?
— Será que eles precisam de tudo isso para alimentarem um exército de gorilas mutantes? — sugeriu Selena.
— E de onde que eles tirariam tantos?
— Eles podem ter sequestrado um cientista que saiba como clonar animais.
— Isso faz mais sentido que deveria...
— Mas a pergunta real é para que eles os usariam! — complementou Selena.
O barulho metálico dos talheres ressoando como um sino de vento interrompeu nossas teorias. Pegamos nossas armas e descemos cautelosamente, espiando de canto para ver quem havia entrado.
— Quem está aí? — gritou um dos cavaleiros.
— Os bananomaníacos buahahahaha!
— Agora não é hora para isso Selena.
— Deixa de ser sem graça.
— Khajilamiv? — Assim que o Barão viu os dois, ele correu e os abraçou firmemente. — Onde é que vocês estavam?
— Saímos para tomar um ar... — disse Khajilamiv, virando o rosto para o lado, evitando contato visual.
— Vocês estavam procurando a gente? — perguntei.
O Barão se levantou e sinalizou para o seguirmos.
Saímos da pousada, entramos na carruagem e no caminho ele explicou o que aconteceu:
— No fim acabou sendo até bom que vocês não estavam. Enquanto estávamos fora, esperamos por horas, mas ninguém apareceu. Quando tivemos certeza de que era uma mensagem falsa, voltamos e encontramos a dona da pousada desesperada e os três cavaleiros da escolta a beira da morte.
— Estamos indo para um hospital ver eles então?
— Acabamos de voltar de lá e os cavaleiros vão ficar bem.
— Para onde estamos indo então?
— Quando eles vieram para a pousada tentando sequestrar o meu filho, a única forma que eles teriam como sair ganhando nessa situação e não encontraram nada, os sequestradores roubaram alguns itens valiosos e entre eles estava a banana espiã.
— Como você sabia disso?
— Os cavaleiros contaram, depois de acordar, que vocês estavam enchendo uma banana de equipamentos de espionagem. Felizmente os sequestradores estavam com pressa demais para checar debaixo das camas e lá estava o painel indicando exatamente para onde eles estavam indo.
— Já tentamos fazer isso, mas quando chegamos não tinha ninguém — disse Khajilamiv.
— Mas o lugar que está apontando é diferente de onde fomos, será que não é a base deles dessa vez? — disse Selena.
— Ainda acho que é uma armadilha.
— Eu sei disso, mas independente do que eles tentem, com toda nossa força total aqui e os artefatos de emergência que estamos carregando, é impossível perder. E essa pode ser nossa última chance antes deles sumirem de vez.
...
— O sequestro falhou.
— Eles eram mais fortes que o esperado, ou não caíram na distração?
— O alvo não estava na pousada.
— Então fomos nós os enganados...
— Me perdoe pela incompetência.
— Esqueça isso, o Barão já voltou para a cidade?
— Sim, junto de todos os cavaleiros.
— Envie o sinal para eles agora.
— Entendido.
O líder sorriu e se virou para trás, onde estava uma montanha de exatamente 98.326 bananas, que finalmente atingiriam o marco de cem mil depois desse último roubo.
— Mande metade para atrasar o Barão e metade para escoltar a última carga.
...
— Por que a carruagem parou? — perguntou o Barão.
— Tem um homem na frente do caminho, parece ser só um bêbado caído.
O cocheiro desceu para puxar ele para a calçada, mas quando se aproximou do homem caído, ele começou a brilhar, então explodiu.
— Que barulho foi esse? — Aqueles dentro da carruagem reforçada permaneceram ilesos, mas os cavaleiros de fora foram jogados para longe.
— Não saiam da carruagem! — gritou Rafun, que tomou o lugar do cocheiro, amarrou a montaria dele, o tigre branco, na carruagem e começou a dirigir desgovernadamente pela rua.
Os bananáticos surgiam de todos os cantos, mas todos eram dilacerados pelos executores e cavaleiros antes que tocassem na carruagem.
— Droga, vamos ter que descer — disse Rafun.
—O que houve?
— Tem uma barricada bloqueando a rua.
— Leve os três com você para longe, vou ficar — disse o Barão.
— Mas também podemos lutar! — disse Selena.
— Isso não é discutível.
— Como quiser. — O Rafun agarrou a nós três e saltou para cima do tigre. — Se segurem firme.
Então ele desamarrou a corda e deu duas batidas nas costas do Fum, que como de costume, avançou em sua velocidade máxima adiante, pulando por metros acima da barricada.
— Se abaixem! — Algumas flechas voaram por cima de nós, mas passaram em branco.
— Vou devolver o favor! — A Selena soltou duas bombas no chão e a barricada foi destruída, lançando detritos de madeira em chamas para todos os lados.
A montaria deu uma freada brusca, quase nos derrubando e mudou de direção, correndo por cima das casas.
— Tem ao menos cem deles lá... Vou deixar vocês na pousada e vou voltar para ajudar eles.
— Vai deixar a gente sozinho sabendo que eles querem sequestrar o Khajilamiv?
— Sabem quanto que custou aquela barreira? Ela deve proteger vocês melhor que eu.
— A gente destruiu a barreira para fugir da pousada.
— Vocês o que!?
Passamos para ainda mais longe da pousada e chegamos no fim da cidade.
— Vamos esperar daqui então — disse Rafun, ainda inquieto com o resultado do confronto dentro da cidade.
— Eles vão ficar bem — disse Selena. — São cavaleiros treinados contra ladrões de rua, por que está tão ansioso?
— Aquela marca esquisita na testa deles... Tenho um mau pressentimento.
— No pior dos casos tem aquele artefato caríssimo de fuga usado pelos magos aventureiros.
— O artefato é individual, só salvaria o Barão.
— Lírio? Como o gato chegou aqui? — perguntei.
— Ele sempre arruma um jeito de encontrar a gente, já disse antes.
— O que ele está segurando na boca? — perguntou Selena.
— Uma... Banana?
— Será que ele é um membro infiltrado do culto da banana? — disse Selena em um tom irônico.
O gato soltou a banana no chão e empurrou com a pata na direção da floresta.
— Hm?
Então o chão começou a tremer e um gorila de quatro metros veio em nossa direção.
O Rafun e eu, nos preparamos para lutar, o Khajilamiv deu alguns passos para trás e a Selena deu uma longa gargalhada.
— Por que a cara dele é de um gato!? Hahahahahaha!
“Era esse um dos monstros híbridos criados em laboratório que os fujões mencionaram antes?”
Corpo e mãos de um gorila gigante, cabeça, patas traseiras e cauda de gato. Esse monstro era ao mesmo tempo fascinante e meio desconfortável de se olhar.
— Que amigo diferente que você fez Lírio... — disse Khajilamiv.
A quimera pegou a banana, farejou e comeu, passou pela gente, nos ignorando e andou em direção a cidade, em um passo constante e calmo, mas ainda bastante estrondoso.
O Lírio começou a seguir ele, parou e se sentou, olhou para trás e deu um miado, como se estivesse nos esperando.
— É para gente seguir aquela coisa? — perguntou Rafun.
— Deve ser melhor que ficar parado aqui, fazendo nada — disse Selena, se levantando e seguindo os gatos.
— Da próxima vez você vai trazer um gato dragão? — E Khajilamiv pegou o Lírio e o colocou em seu ombro.
De tempos em tempos, o gato gorila parava, cheirava o chão, seguia ou mudava de direção. Andamos por volta de quinze minutos, até o gato gorila parar completamente.
— O que foi?
— Parece que esse é o lugar.
O gato gorila acenou para o Lírio e foi embora feliz com o pagamento de mais vinte bananas que não faço ideia de onde ele tirou.
— Tem dois cavaleiros vigiando a porta, será que tem mais lá dentro?
— Deixa eu ver. — O olho do Khajilamiv brilhou em dourado e ele confirmou: — Só tem três pessoas nessa casa.
— Eu lido com os dois então — disse Selena, que caminhou até a entrada da casa.
— Não lembro de você, quais os seus assuntos com o líder? — perguntou o cavaleiro da direita.
— Vim entregar essa carta para ele — respondeu Selena.
— Tudo bem, pode deixar que eu repasso para ele. — Quando o cavaleiro segurou a carta, suas mãos grudaram. — Mas que...
Ele balançou a mão para tentar tirar, mas não saia de jeito nenhum.
— Me perdoe, acho que caiu um pouco de cera no envelope...
— Mas cera gruda?
— Jogue um pouco dessa água, que deve ajudar a soltar.
— Obrigado.
A primeira gota de água caiu no envelope, a Selena saltou para trás e a carta explodiu, jogando a cola por toda parte, prendendo os dois cavaleiros ainda mais, cada vez que eles se mexiam, tentando se soltarem.
— Parece que a armadilha de rato funciona bem em humanos também. Podem vir!
Quando passamos por eles, os cavaleiros até estavam tentando gritar alguma coisa, mas suas bocas estavam coladas.
— Boa sorte para se livrarem disso...
Passado o enorme jardim negligenciado até os espinhos e ervas daninhas dominarem tudo, ao abrirmos a porta central, os três tamparam seus narizes, pelo forte cheiro de cigarro que surgiu.
O chão era coberto por um carpete velho com manchas vermelhas o suficiente para se pensar que era um padrão intencional. Havia animais empalhados e tapetes de pele por toda parte, no teto um candelabro cheio de teias de aranha e passando pelo corredor, nos deparamos com um enorme sofá amarelo, que diferente do resto, parecia novo.
Pela mobília, o tanto de papelada, a variedade nas decorações e o tanto de cadeiras nos quartos que nem tinham camas, estava claro que esse era o local de trabalho deles.
Enquanto checávamos todo primeiro andar, no corredor em direção a escada, nos encontramos com um grupo de pessoas descendo.
— Quem são vocês?
— Eu cuido deles — disse Rafun, colocando a mão em seu bolso e tirando uma bola vermelha. — Prestem atenção!
Ele fechou sua mão direita e quando reabriu havia mais quatro, que entregou para cada um dos cinco.
— Assoprem e abram suas mãos!
Enquanto performava o truque principal, ele fazia um globo de vidro levitar e se mover sozinho, o que distraiu eles o suficiente para concordarem com todas as instruções do Rafun.
— Que cara bom! — Quando eles abriram, uma rosa floresceu na palma de suas mãos. — O chefe contratou alguém do circo como recompensa por esse trabalho?
— Isso mesmo, mas por enquanto é só... — Ele abriu a boca e tirou um cartão com instruções até onde o conflito com os outros cultistas acontecia. — Sigam até esse lugar que ele preparou ainda mais coisas!
Eles aplaudiram e foram embora alegres.
— Quando forem para entrada e virem os dois grudados no chão, não vão suspeitar de nós? — perguntou Khajilamiv.
— Qualquer coisa o Fum ganha um petisco extra, deixei ele vigiando os dois.
Olhamos para trás e escutamos alguns gritos, esperamos um pouco e ninguém veio, então seguimos o caminho.
— E é claro que tinha que ter uma grande escadaria para nos encontrarmos com o chefão.
A escada tinha espaço para cinco pessoas subirem ao mesmo tempo. Ela se dividia em dois caminhos que levavam ao mesmo lugar, olhando para cima, havia diversos quadros aleatórios, provavelmente roubados e no corrimão, a cada canto havia uma decoração como um vaso de cerâmica ou uma estátua de pedra do busto de algum nobre.
O chão estavam tão desgastados que era possível ver o caminho que as pessoas faziam e o papel de parede estava danificado com cortes e arranhões, que deviam ter sidos causados pelas caixas e carregamentos de bananas.
— Vamos indo? — disse Rafun. — Se eu fizer o sinal, apenas fujam sem olhar para trás.
— Ok.
A cada passo, o cheio de banana e mais um que não conseguia identificar se intensificava, tomando o protagonismo de todos os outros cheiros desagradáveis. E a ansiedade só aumentava com o desagradável barulho da madeira rangendo a cada passo, anunciando nossa chegada para quem quer que estivesse no andar de cima.
“Finalmente vamos descobrir para que ele estava coletando tantas bananas.”
Subindo o último degrau, eu vi o andar completamente cheio por bananas de todos os tipos e formatos e as caixas vazias usadas para carregá-las.
— Erramos por muito...
No fundo do enorme andar, estava o líder dessa gangue fissurada em bananas, falando sozinho com uma estátua dourada que tocava no teto: um anjo com um chifre do lado direito da cabeça, em formato de banana, a referência para as tatuagens dos outros malucos que se explodiram antes.
— Finalmente! — Ele se virou sorrindo, mas fez uma expressão confusa a nos ver. — Ué? Quem são vocês.
— Eu conto depois que assinar esse contrato — disse Khajilamiv.
— Cedo demais... Por que disse isso logo de cara? Ele nunca vai...
— Tem caneta?
— Uma gota do seu sangue deve servir.
“Agora que ele não assina mesmo.”
— Vocês estão ficando gananciosos demais. — Mesmo dizendo isso, ele mordeu seu dedão e selou sua digital no contrato.
— Ele confundiu a gente com entregadores de uma encomenda de bananas? — perguntou Selena.
— E vocês não são? — Ele coçou seus olhos vermelhos, que voltaram a cor marrom. — Parece que me apressei novamente... Mas tanto faz, já está concluído.
Ele segurou uma das bananas no chão, que desapareceu em pleno ar, então as caixas de madeira foram destruídas e reconstruídas na forma de uma gaiola, prendendo a nós quatro.
— Nunca vi alguém usar magia alimentada por bananas. — E Rafun cerrou seu punho e quebrou a gaiola.
— Um cavaleiro? Você não devia se vestir melhor quando está trabalhando? — E ele pegou outra banana do chão.
O Rafun partiu para cima dele, mas foi pego pelo pescoço no caminho e começou a sufocar em pleno ar, lentamente sendo levantado.
— Tem como a gente ganhar disso? — perguntei para o Khajilamiv.
— Felizmente ele assinou o contrato antes disso, então tem duas condições para termos sequer uma chance. — E ele cochichou. — Ou eu explico todas as regras em voz alta ou vou ter que levar um ataque para ser considerado uma quebra de contrato e as cláusulas serem ativadas forçadamente.
— Começa a falar as regras logo, antes que o Rafun morra!
Antes do Khajilamiv começar a explicar, a Selena, que havia sumido, reapareceu com um ataque furtivo, mas foi impedida com uma mão, então duas bananas desapareceram e uma espada se materializou na mão dele, que cortou o braço dela.
— Selena!
“Ele não precisa nem encostar nas bananas para usar sua habilidade?”
Mas o barulho do braço caindo no chão foi estranho, um som oco.
— Era falso?
Ela sorriu e tirou o braço real de dentro do manto e socou a cara dele, que tropeçou e caiu em uma pilha de bananas, que estranhamente soltaram um pouco de um líquido vermelho.
— Cuidado!
Então a pilha inteira desapareceu e seu corpo começou a ser queimado por uma chama dourada, expondo seus músculos, órgãos e ossos, para então o processo se inverter e seu corpo começar a ser reconstruído, duas vezes maior.
— Joga alguma coisa enquanto ele está se transformado!
A Selena arremessou uma adaga na barriga dele, mas o corpo foi reconstruído por cima dela.
— Meros mortais, o mundo agora... — Quando a reconstrução do corpo foi concluída, ele nem conseguiu terminar o discurso e começou a agonizar em dor, com a mão na barriga, caído no chão. — O que vocês fizeram!?
Ele começou a consumir uma banana atrás da outra, mas não conseguia curar a dor por não saber com o que tinha sido atacado.
— Veneno? Bomba? Maldição!?
O Rafun foi solto e caiu no chão, ofegante. E gritando de dor, a lança foi arrancada da barriga do líder, que teve que usar mais cinco bananas para se regenerar por completo e anular sua dor.
— Será que é aquele ser da estátua interferindo na luta e realizando os pedidos dele? — sugeriu Selena.
— Terminei! — gritou Khajilamiv.
Assim que ele terminou de ditar todas as regras em voz alta, ele e o líder foram jogados para o teto como se a gravidade tivesse invertida apenas para os dois.
Olhei para o teto e vi que a superfície havia se tornado completamente plana, uma mesa de vidro e duas cadeiras de ponta cabeça haviam surgido e cem cartas viradas para baixo estavam espalhados nela.
O líder esticou sua mão para cima, tentando usar sua habilidade, mas falhou.
— Pode começar — disse Khajilamiv, com os olhos dourados.
Nesse jogo de memória, você tinha que escolher duas cartas de duas frutas aleatórias. Se elas não combinam, você devolve para o mesmo lugar de antes, se elas combinam...
— Hahaha. — E uma banana sumiu do meu lado. — Que sorte! Duas laranjas.
E uma laranja se materializou na mão dele.
— O que eu faço?
— Você roubou nessa rodada, não valeu — disse Khajilamiv.
A laranja na mão dele balançou, foi levantada e entregue ao Khajilamiv, que começou com casca e tudo.
— Um ponto para mim! Minha vez. — Khajilamiv levantou uma maça e um Pomelo, então devolveu para a mesa.
— Tem que comer a fruta... Entendi. — Ele confiantemente virou duas cartas, mas elas eram de uva e morango. — O que? Você mentiu para mim!?
— Meu pescoço está doendo... — disse Selena. — Por que eles não jogam aqui embaixo?
— Ele está brigando com o demônio da banana?
Fechei meus olhos e foquei minha atenção na audição, que graças ao meu tempo na solitária, havia melhorado consideravelmente só de ter ficado naquele círculo esquisito. Definitivamente havia dois seres invisíveis lutando.
O jogo seguiu e eu comecei a entender o que estava acontecendo, mas me surgiu uma dúvida: nesse lugar de alimentos escassos ou envenenados, como haviam tantas bananas? E de onde surgiam tantas frutas comestíveis, ainda por cima.
Se magia pudesse gerar comida com tanta facilidade, então a existência dessa crise é mantida pelos Fortuna? Mas por que eles distribuiriam comida gratuitamente?
Selena tinha uma resposta simples e direta para essas perguntas:
— Não são comestíveis.
Frutas, nesse ducado, tinham duas funções mais comuns que serem consumidas como alimento: a primeira, como ingrediente para perfume, a segunda, como presente decorativo, com uma função semelhante as flores.
Comer frutas, pelo tamanho esforço requerido em comparação a pouca sustância, era um privilégio reservado apenas para os nobres ou comerciantes ricos, em raras ocasiões
É possível que algum produtor possa ter inventado uma magia que crie frutas artificiais, porém é difícil que um garoto de um pequeno baronato sem relação alguma, tenha conseguido adquiri-la.
Portanto, essas frutas não são o que parecem. Mas o que são, não sei.
— Dois mamões! — gritou Khajilamiv.
Vendo que sua primeira estratégia não iria funcionar, o líder pulou para tentar roubar a fruta do Khajilamiv, mas bateu de cara com uma barreira invisível entre a mesa e a cadeira.
— Dois pêssegos! — gritou o líder.
— Duas limas! Bleh...
No início o Khajilamiv havia tentado roubar usando sua inata familiar, mas aparentemente ela só funciona em pessoas.
“Ou ele fez isso por outro motivo?”
Uma banana desapareceu no chão e outra foi levada ao teto.
— Duas bananas! — Ele comeu a banana e testou se funcionaria.
Os pontos eram contabilizados em um placar de papel, que não se virou mesmo ele comendo a banana.
— Duas lichias! — gritou Khajilamiv.
— Duas melancias!? Tá de brincadeira!
— Se não quiser comer, pode passar para mim.
— Você não virou essas cartas de propósito?
— Quem sabe.
Enquanto ele comia a melancia, o Khajilamiv foi virando as cartas.
— Duas uvas! Dois abacates!
— Terminei! Minha vez!
O jogo seguiu e o líder voltou ao todo vapor, recuperando a vantagem com 39 frutas a 38. A esse ponto, os dois estavam completamente cheios, mas continuavam se forçando ao máximo.
— Droga! Não era ele. — E o líder virou duas cartas que não combinavam.
— Khajilamiv! Todas as cartas foram viradas! — gritou Rafun.
— Ele pode roubar assim? — perguntou o líder.
Então uma barreira de som se formou, impedindo o Rafun de dizer a sequência da vitória.
— Figo... Jamelão... Yuzu... Sapota... Droga. — Mas sua memória falhou e ele virou duas frutas diferentes.
— Hahaha, eu ganhei!
O líder começou virando confiantemente as primeiras frutas, mas parou no meio.
“Será que tudo isso era o plano dele desde o início?”, era o que a cara dele indicava. Ele estava duvidando que o Khajilamiv entregaria o jogo fácil assim.
Tudo estava dando certo demais para ser verdade. Consegui me identificar com esse sentimento irritante.
Ele começou a analisar os arredores, algumas bananas sumiram, então finalmente ele pegou a caixa que o jogo vinha e leu o manual de regras.
— Seu pirralho esperto... Achou que conseguiria me enganar fácil assim? — Ele apontou para a caixa e seguiu: — Ganha quem estiver com MENOS pares na mão.
Então ele errou as duplas de propósito e Khajilamiv riu.
— Esse é só um dos modos de jogar e no contrato estava claramente escrito que não era esse. Quem mandou assinar sem ler... Duas artérias das cavernas luminosas... Eu disse que existia! — E ele acertou todas as cartas que faltavam, ganhando o jogo. — Hm, é bem doce.
O jogo acabou, a mesa e as cadeiras desapareceram, as cartas começaram a cair e os dois também.
— Segura ele! — gritou Selena.
O Rafun amorteceu a queda com perfeição e o líder caiu de cara no chão.
— Qual era o prêmio de ganhar esse jogo?
— Ele... Não pode mais machucar a gente.
— Por que não escreveu uma condição melhor?
— Eu fiz isso propositalmente para aquele espírito aparecer por ter uma injustiça grande demais e salvar a gente em uma situação dessas.
O teto criado para o jogo se estilhaçou como vidro e junto dele, a sala voltou ao estado que estava antes da luta, exceto os ferimentos e as bananas usadas, que sumiram.
— Tinha uma cláusula de voltar no tempo também?
— Não tinha nada desse tipo.
— Era uma ilusão — disse Rafun. — Provavelmente aquele cara foi enganado para conseguir bananas para algum ser que se aproveitou dele.
— Ele era só um peão? — disse Khajilamiv. — Então isso nem vai contar como um feito relevante...
— Estamos vivos pelo menos, isso que importa.
O Rafun usou um sinalizador e pouco depois o Barão e os outros chegaram, completamente exaustos, cobertos de sangue, mas quase nenhum ferimento.
— Eu entrego para o responsável da região, podem ir descansar — disse o Barão.
— Você não vem também Lucca?
— Podem indo na frente, já vou.
— Quer falar algo comigo? — perguntou o líder.
Eu passei a cola da armadilha da Selena na boca dele, o amarrei e levei ele para uma nova carruagem — menos luxuosa e tecnológica que a anterior — onde o Barão estava esperando.
— Obrigado.
— Não foi nada.
— Alguma coisa sobre aquele homem está te incomodando?
— O que vão acontecer com as pessoas daqui?
— Uau, um herói de corpo e alma mesmo.
— Vários comerciantes dependiam deles e até os membros, nem todos eram combatentes. Claro que podemos prender todos, mas e quando a sentença acabar? Eles vão reconstruir o mesmo esquema e as pessoas vão se voltar novamente para o crime.
— Então o que? Quer que eu abra uma indústria aqui?
— Você consegue?
O Barão deu uma risada e concordou com a cabeça:
— Tenho um fundo de um investimento que acabei de sacar... Mas teria que discutir com o Visconde que cuida dessa cidade.
— Não estamos indo para lá agora?
— Verdade, a prisão daqui fica perto do escritório dele. Só não sei se está aberto a essa hora.
E fomos ao centro da cidade, passando por belas praças com fontes de água e pelas ruas mais bem cuidadas. Tudo sobre o charme da madrugada do silêncio absoluto e vazio. Agora com a calma de não ter que se preocupar com o que se espreitava na escuridão.
— Deu certo?
— Sim.
— Esse Visconde não vai para o Banquete?
— O Visconde já partiu, conversei com o secretário dele. — O Barão se espreguiçou e perguntou: — Quer tomar uma bebida?
Meu instinto sempre foi recusar, mas dessa vez me senti coagido a aceitar.
— Onde achar melhor — respondi.
...
— Me perdoe! Eu estava errado, me dê mais uma chance! — os gritos de agonia dele mal podiam ser ouvidos em meio a tamanho desespero.
Depois de ser arrastado da mansão, ele foi jogado em uma rua vazia, onde esperava uma carga com mais vinte pessoas de idades variadas.
Quando viu isso, ele tentou correr, mas foi derrubado e drogado por quatro homens usando toucas, óculos brilhantes e máscaras.
Acordando sendo levado por uma esteira que terminava em uma enorme caixa metálica, com duas hélices em seu fundo.
Todos que acordaram a tempo tentavam se arrastar para longe, pisando uns nos outros, se jogando por cima das paredes, caindo de uma altura fatal, usando a última força que lhes restavam em uma falsa esperança que era a falta de monitoramento.
Mas todos esses esforços só resultaram em mais alguns minutos de vida, uma vez que um novo carregamento foi jogado, empurrando todos da leva para serem cortados em pedaços grosseiros e irreconhecíveis de carne e ossos.
Ali suas vidas terminaram, mas o processo continua.
Depois de filtrado o sangue, a mistura de carne, ossos e órgãos passaram por um sistema industrial, onde tudo foi mergulhado por conservantes e perfumes, reformado e etiquetado depois do toque final que requeria as bananas.
A casca da banana, depois de um processo separado, fazia a mistura passar batida aos olhos despercebidos, mascarava a massa vermelha e suprimia totalmente seu cheiro. Mas quando descascada, inspecionada por um dos trabalhadores, ainda era uma coisa desagradável de se ver.
Depois da inspeção, elas foram jogadas para o fundo de uma caixa de madeira, junta com outras bananas reais por cima, para diversos destinos distantes.
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