Guerreiro das Almas Brasileira

Autor(a): Lucas Henrique


Volume 1

Capítulo 27: Bernard e Monique

Entre os diversos corpos caídos no chão, alguns ainda soltavam espasmos de dor. Eram os últimos manifestos de quem havia sofrido um golpe mortal, sem chance de recuperação.

Monique agitou a adaga para limpar o sangue e a guardou na bainha da cintura. Sua gigantesca espada estava apoiada no ombro. Virando-se para confrontar Bernard, a misteriosa mulher continuava inexpressiva, com um rosto apático. Talvez até entediada com aqueles adversários.

— Pensei que iria atrás do garoto — disse Bernard, mantendo seu sorriso. — Ele tem bem mais valor para você do que...

Antes que pudesse finalizar sua frase, viu a mulher avançar novamente. Um segundo ataque tão rápido quanto o primeiro. Igualmente letal, mirando em sua garganta.

O mestre lutador conseguiu rebater com sua própria sombra. Dois guerreiros da mesma Natureza em um confronto invisível e silencioso. A colisão das sombras era muda e apenas a força do impacto era sentida.

Antes que pudesse revidar o ataque de Monique, Bernard a viu já de pé na outra ponta do distrito, ajudando Vivienne a se levantar.

— Vá para a saída Leste com os civis.

A voz dela era tão fria e direta quanto seus movimentos.

— Eu ainda posso lutar — respondeu Vivienne dando um tapa na mão da mulher. A garota se apoiava em seu grande escudo retangular para firmar-se de pé.

— Então chegamos a esse ponto, garota? — Bernard ficou parado olhando para as duas. — Nunca imaginei você querendo lutar ao lado da Monique para nada.

— Aliada de ocasião, não confunda! — A garota gritou raivosamente enquanto se preparava para voltar ao combate.

Vivienne cravou seu grande escudo no chão. Rapidamente, as sombras dela se manifestaram, criando uma barreira em toda a extensão do distrito onde eles estavam lutando. Era um grande cubo protegendo toda a área externa do combate do trio.

A luz da lua mal conseguia penetrar a proteção, mas mesmo com a mínima iluminação, nada iria para-los.

Bernard viu Monique avançar outra vez. Os movimentos dela eram um pouco mais fáceis de antecipar quando não havia o fator surpresa. Ainda assim, o mestre lutador não conseguia evitar alguns pequenos cortes quando a lâmina da espada o acertava.

Monique avançava como uma caçadora. Ela buscava a chance de acabar com a luta em um único movimento.

Avançando com a adaga, ela saltou para frente. Bernard deu um pulo para trás, fazendo ela fincar sua pequena lâmina no chão. No mesmo instante, ela usou a adaga como ponto de apoio e girou para frente com sua espada rente ao chão.

Bernard focou toda a sua energia nos pés para que eles não fossem cortados pela lâmina, mas ainda recebeu a pancada. Caindo de costas, ele rapidamente apoiou as duas mão no chão e se equilibrou para dar uma cambalhota para trás e voltar a ficar de pé.

Antes que pudesse contra-atacar, viu o escudo circular de Vivienne vir voando como um frisbee. Ele rebatia nas paredes criadas com o escudo maior e se aproximava na direção do pescoço do mestre.

Esperando até o último segundo, Bernard levou a mão para frente, segurando o escudo. Depois disso, girou e o arremessou de volta com força na direção da garota.

Tudo o que conseguia fazer era recuar, pois logo veio outro ataque.

Monique concentrava ainda mais escuridão na sua grande espada e a balançava para arremessar toda a energia em Bernard. A barreira de Vivienne acabou sendo conveniente para ele se apoiar e desviar de cada golpe.

As ondas de escuridão vindas da espada eram tão poderosas que cortavam o chão e as paredes como se o vilarejo fosse feito de argila. Sequer havia poeira da destruição, somente sinais de cortes por todo o distrito.

Bernard estava arrepiado de emoção. Finalmente liberto de seu papel de fingir ser amigável, podia aproveitar as lutas de verdade. Lutas para matar.

Enquanto Monique mantinha-se séria e concentrada, e Vivienne ainda estava em um misto de emoção e tristeza, ele sorria.

Por um momento, a misteriosa espadachim parou e observou o local discretamente. Seu olhar parecia não se importar em ficar focado no adversário.

— Sua barreira está me atrapalhando — disse enquanto voltava a apoiar a espada no ombro. — Desfaça.

— Você não me dá ordens! — A defensora continuava gritando. — Ele vai fugir!

— Fugir? — Bernard ria compulsivamente. — Eu nunca fiquei tão empolgado em estar nesse maldito lugar.

— V-você. — Vivienne gaguejava em um esforço enorme de segurar-se para não chorar. — Eu aprendi tudo com você para cuidar de Prospéria e agora isso não vale nada?!

Bernard decidiu não responder. Somente encarava sua discípula com desinteresse naquela discussão. Não era hora de conversar.

— Vamos equilibrar o jogo.

Em poucos instantes, ele concentrou um nível tão poderoso de energia de sombra quanto o da espada de Monique. Bastou um único pisão para fazer toda a estrutura picotada do distrito estremecer e desmoronar.

Ainda com o pé apoiado firmemente no chão, Bernard se abaixou para dar um salto em direção à garota de escudo.

Vivienne estava evitando se movimentar e, mesmo sem os ferimentos, não desviaria de um golpe como aquele.

Para surpresa do mestre lutador, Monique copiou sua habilidade e conseguiu chegar a tempo de colocar a espada no caminho como um escudo improvisado para proteger as duas. No entanto, foi uma oportunidade perfeita para que ele atacasse com tudo o que tinha.

Seu soco conflitou com a lâmina da espada e ressoou como uma explosão. As duas guerreiras voaram para trás, caindo uma em cima da outra. Além do forte golpe ter desnorteado a jovem de escudo, acabou desfazendo parte da energia sombria que cobria a espada.

— Já que não posso sair daqui, por que não vamos mais para baixo?

Bernard juntou os punhos fechados e esmurrou o chão próximo deles, criando uma cratera enorme. Com as mãos praticamente fincadas no chão, concentrou mais energia sombria em si para jogar todos os escombros para o alto.

Seus músculos já estavam enrijecidos, suas veias pulsando. Ainda assim, era um trabalho fácil quando sua habilidade da Natureza tomava conta.

Vivienne levantou seu pequeno escudo para o alto e criou uma barreira para proteger as duas da chuva de pedras criada por Bernard. Ao voltar sua atenção para ele, viu o mestre lutador correndo para atravessar aquela pequena proteção e a atingir em cheio.

Era um golpe para tirá-la totalmente do combate, mas Monique interviu. Por baixo da grande energia de sombra estava escondida uma comprida e fina espada curva.

Bernard desviou-se facilmente do corte da espada e redirecionou seu golpe em Monique, que foi atingida em cheio no estômago. Ela voou para longe, mas ainda caiu de pé.

Aproveitando a abertura, Vivienne fez seu escudo absorver a pequena proteção que tinha criado, e usou toda aquela força para atingir Bernard.

Apesar do duro golpe, que o mestre sabia que poderia até mesmo quebrar o corpo de um guerreiro de elite, nada aconteceu. Ambos ficaram parados no mesmo lugar, se encarando.

Dava para ver o medo nos olhos da garota, a dúvida sobre o que aconteceria em seguida.

— Vou dizer outra vez — sussurrou Bernard. — Você é mais forte do que isso.

Segurando o escudo e o braço da garota, ele virou para trás e a arremessou para o alto. Vivienne colidiu com o teto de sua própria barreira de proteção, caindo bruscamente no chão em seguida.

O mestre lutador olhou em volta. Seus olhos se fixaram especificamente no grande escudo, ainda fincado no chão e emanando as sombras da barreira.

Significava que Vivienne sequer havia desmaiado com a queda. Ela se recusava a perder e permitir que Bernard saísse daquele local. Naquele momento, um outro sorriso surgiu em seu rosto.

— Suponho que em algum momento a insistência dela não vai ser mais tolerada. — Monique voltava a sua postura de combate. A espada já estava em seu estado normal novamente.

— É, não adianta tentar esconder de você que houve um motivo para tudo isso. Não vamos ficar aqui e tomar Prospéria para o Oeste. Porém, meu plano para escapar ainda está de pé.

Ambos se encaravam sem nenhum movimento brusco. Havia respeito dos dois lados, apesar de tudo. Bernard tinha consciência de que Monique era a única guerreira com a qual ele não poderia se distrair.

Passos leves acompanhavam o encontro de seus olhares, como uma dança que estava prestes a recomeçar.

— Talvez essa seja uma boa oportunidade para me responder uma dúvida — disse Bernard.

— O que quer saber?

O olhar do mestre lutador era profundo e compenetrado.

— Qual é o Demônio Interno que faz parte da alma da guerreira mais poderosa do Leste? Já passou da hora de me contar.

Monique voltou a apoiar sua espada sobre o ombro.

— Demônios Internos são só ferramentas para manifestação da Natureza das sombras. O que eu faço com o poder que tenho é mais importante do que saber a origem dele.

Bernard não conseguia esconder sua expressão de deboche. Até mesmo olhando para alguém que nunca expressava emoções, ele sabia quando estava atingindo um ponto sensível.

Deixando a conversa de lado, mais uma vez os punhos e a espada estavam em conflito. 

Apesar da desvantagem numérica, ele não estava tão abatido. Certamente era uma sensação mista de estranheza e ânimo ao ver que seu corpo estava recebendo vários ferimentos. No fim, isso mostrava que ainda existia algum desafio.

Vivienne ainda estava caída atrás dele, tentando se levantar. Monique preparava-se para arremessar outra onda cortante de sombras em sua direção. A batalha poderia durar mais algum tempo, porém, havia chegado a hora de encerrar o primeiro ato.

— Bernard!

Um urro raivoso percorreu todo o distrito.

Ao ouvir aquela voz enfurecida e confusa, o mestre lutador passou a se conter. Olhando para o fundo do distrito, onde estava o escudo de Vivienne, viu a figura que estava esperando encontrar.

Oliver havia chegado.

O garoto caminhava devagar e com dificuldade, mal se mantendo de pé. Apesar do corpo com grandes lesões, sua energia espiritual se esbaldava. Era uma luz esverdeada e forte, emanando de todo o corpo dele, especialmente dos olhos.

Acima do garoto, havia vários corpos de invasores flutuando. Entre eles estava Roger, com sua lança partida em pedaços.

— C-como? — Vivienne, ainda caída, olhava assustada para o jovem mago. — Como ele conseguiu passar pela barreira?

 

***

 

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