Guerreiro das Almas Brasileira

Autor(a): Lucas Henrique


Volume 1

Capítulo 28: Aliado ou inimigo?

Com o coração disparado, Oliver sentia como se estivesse a ponto de explodir.

Sua visão estava embaçada pela estranha escuridão que rondava o local. Ele forçava seus pés a andarem para frente, mas não conseguia avançar muito.

Por um momento, sua energia espiritual falhou, fazendo com que ele derrubasse os corpos de todos os inimigos que tinha derrotado e trazido consigo até ali. O garoto caiu de joelhos e buscou respirar fundo.

— Um tempo atrás, você estava tomando uma surra no seu primeiro dia. — Era a voz de Bernard. — Agora, atravessou um bloqueio da Vivienne com muita tranquilidade e carregando um monte de gente com você. Se não me engano, a gente completaria três meses de treinamento na semana que vem, então, promessa cumprida.

— Cala... essa boca! — O jovem mago apoiava as mãos nos joelhos e olhava para o chão, ainda se recuperando.

Ele não queria acreditar que tinha sido enganado por quem ele mais confiava. No meio de pessoas que pareciam só querer o seu mal, saber que ele iria olhar para o Bernard e estaria diante de mais um inimigo era confuso. A mistura de fúria e tristeza deixava sua mente turva.

No fundo de seus pensamentos, os espíritos da família de Oliver o chamavam. Porém, o garoto também não queria escutá-los. Ignorou tudo o que estava em seu caminho. Sequer sabia como chegou até o mestre lutador e nem reconhecia quem estava ali com ele. Só se importava em ter respostas.

— Você... — A voz de Oliver ainda falhava. — Você causou tudo isso. Você foi o responsável pela morte da minha família! Por todos os meus problemas!

— Será mesmo? — perguntou Bernard em tom jocoso, coçando a cabeça. — Porque toda essa história aí tem a profundidade de um abismo. Tantas camadas. Isso faz com que você não perceba o caminho e só pense no resultado final, que é cair no chão.

— Vai mesmo tentar justificar seus atos? — perguntou Vivienne.

— De forma alguma. Só quero deixar claro como tudo se encaixa nisso aqui. Ele disse que eu causei a tragédia, mas não é tão simples. Me considere como um carrasco. Eu só aplico a sentença, mas não determino ela. Não é não, Monique?

A mulher misteriosa estava lá. Ela mantinha-se quieta e com o olhar fixo em Bernard, mas de alguma forma parecia estar atenta a Oliver também.

— O ódio aos magos sempre existiu, garoto. A Noite dos Demônios prova isso.

— Você fez parecer que minha família perdeu o controle!

— Isso é o que você não enxergou, Oliver. Não fiz nada! Nada além de elevar a escuridão dentro da alma daquelas minhas primeiras cobaias. Agora, quem disse que os magos estavam abusando delas? Quem sugeriu que estavam roubando as almas? Quem os culpou por um desastre que eles tentaram evitar por centenas de anos?

A dor das palavras se apoiavam nos machucados do corpo e só serviam para aumentar mais o sofrimento do jovem mago naquele momento.

Oliver levantou o rosto para encarar Bernard, e viu a feição séria do mestre lutador.

— Exatamente, garoto. Prospéria fez isso. Sem honrarias, sem a busca pela verdade, sem nunca sequer ter dado apoio ao trabalho que sua família desempenhava. No dia seguinte, Prospéria só queria um alvo, alguém fácil de culpar por todos os problemas.

— Oliver, esquece isso — gritou Vivienne. — Muita coisa mudou nesse tempo!

— Será mesmo? O que foi toda essa busca pelo invasor? Sempre foi mais fácil atribuir a culpa a ele e a Leanor. Foi mais fácil expulsá-lo do que lidar com um aprendiz que teve o trauma de perder alguém em batalha. E você sabe disso, garota.

Vivienne arregalou os olhos diante daquelas palavras de Bernard. Parecia que ela tinha sido ferida profundamente. Mesmo ela, em sua fúria para tentar o impedir de falar, parecia, naquele momento, só querer ouvir.

Devagar, a garota se ajoelhou e apoiou suas mãos nas coxas. Era como se esperasse por uma sentença.

— Isso mesmo — disse Bernard, observando o comportamento de Vivienne. — Você entendeu, não é?

— Ainda não muda o que você fez. — Oliver voltava a caminhar para frente, tentando chegar até a garota de escudo.

— Não mesmo, e nem quero que mude. O Oeste queria sua família morta, porque seria um problema. Aqui no Leste, foi conveniente que eles morressem. A cada geração que passa, é mais fácil jogar os que não prestam para o outro lado da muralha. Dessa forma, eles nunca precisariam repensar o modo de vida confortável que existe hoje.

Rapidamente, Monique sacou sua espada outra vez e atacou Bernard. Um pouco de sangue voou para o alto com o movimento do corte da espada, mas nada que fosse letal.

Por meio de socos e chutes ele revidava cada ataque da gigantesca lâmina e da pequena adaga.

O garoto se impressionava em ver como a espadachim exigia de Bernard movimentos tão rápidos para se salvar. O corpo do mestre flexionava sobre as pernas e se dobrava para trás como uma dança. As mãos sempre à frente garantiam todo o equilíbrio e proteção que ele precisava.

Corte atrás de corte, não acontecia nada além de um encontro de sombras.

Monique preparava mais um golpe. Ela segurou a espada com duas mãos, concentrou energia suficiente para transformar a espada em um bloco fino e super afiado em ambos os lados da lâmina.

Ao avançar outra vez, mantinha-se com os olhos firmes em Bernard. Ela levantou a espada, pronta para aplicar um único golpe de cima para baixo na tentativa de parti-lo ao meio, mas acabou se segurando.

Um obstáculo apareceu na sua frente.

A visão de Oliver chegou a ficar embaçada pelo esforço, mas ele havia conseguido criar um círculo de magia para proteger Bernard.

— Eu... ainda... não acabei... nossa conversa.

— Veja só como são as coisas. — Bernard fez um olhar de deboche para a espadachim.

Oliver, em seguida, puxou o círculo de magia na direção de Bernard como um disco, pegando-o de surpresa e cortando seu rosto.

— Não estou do seu lado.

O mestre lutador ficou brevemente surpreso, mas logo voltou a sorrir.

— Acho que nós dois odiamos Prospéria, garoto, então vou partir desse ponto em comum. Sabe tão bem quanto eu o que está acontecendo por baixo desse teatro de sociedade justa e feliz. Os poderosos e considerados melhores que o resto existem aqui há centenas de anos. A influência nas decisões para favorecer essas pessoas sempre acontece. Os nomes de família ainda pesam, mesmo com aquele maldito senhor Durant pagando de bonzinho.

— E o que você quer fazer? Para quê tudo isso?

— A minha vontade hoje em dia não importa. Além do mais, parece que sempre é assim: Ou caminhamos para o fim da existência, ou prolongamos o que claramente está dando errado.

O mestre lutador jogou um olhar sereno para ele.

— Qual caminho trilhar? Quem sabe você seja capaz de enxergar uma nova estrada. Do contrário, essa é só uma história que já foi escrita. E aí vira apenas uma questão de esperar pela morte. Sinceramente, essa foi a minha escolha. E acho que foi o que seu avô quis também.

— O quê? — O coração do garoto praticamente parou de bater.

— Você não era o único mago de que tinham conhecimento aqui, certo? Achou que iam esquecer de acusar o velho Albert?

Todas as palavras e reações foram tomadas do jovem mago, que ficou imobilizado pelo choque.

Oliver sentia como se seu corpo tivesse parado de funcionar. Não havia mais nada capaz de movê-lo. A tremedeira pelo esforço da caminhada, o suor do combate, a respiração pesada do cansaço, tudo havia sumido.

Naquele momento, não sentia nada além de sua alma. E ela estava em fúria.

No lugar da escuridão que cobria aquele local, logo veio a luz da lua. Na mesma velocidade em que ela surgiu, também acabou sumindo.

Outra luz tomou o lugar dela. Uma mais brilhante, poderosa e afundada em perturbação.

A luz espiritual.

Um círculo enorme de magia foi criado abaixo dos pés de Oliver. O clarão cresceu tanto que foi lançado para o alto, formando um pilar brilhante gigantesco no meio de Prospéria.

Cercado de uma energia poderosa, aquele círculo começou a fazer o chão tremer.

 

***

***

 

O corpo do garoto continuava lá dentro, parado. Porém, quando a luz começou a criar um vórtice, puxando tudo ao seu redor, houve uma reação.

Oliver gritava de agonia e, junto dele, outros gritos começavam a ressoar de dentro do pilar de luz.

Os escombros estavam pouco a pouco sendo engolidos e transformados em poeira. Todo o acúmulo estava criando um vórtice ainda mais poderoso.

Parecia que o pilar logo atingiria o céu, criando uma tempestade. O garoto não via mais nada ao seu redor que não fosse a luz. Também não sentia mais nada além de um vazio. No ponto mais íntimo de seus pensamentos, apenas queria que o mundo parasse.

Aquele seria o destino de todos.

 

***

 

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