Volume 1 – Arco 1

Capítulo 9: Rei dos Minotauros

Na densa e sombria Floresta do Norte, o ar era pesado, carregado por uma aura sinistra e amedrontadora. Sangue cobria o chão em poças escuras, e o silêncio era cortado apenas pelos sons de respiração ofegante e o distante ruído de metal colidindo.

Uma jovem mulher, trajando vestes de feiticeira com um chapéu pontiagudo, estava apoiada em seu cajado mágico. Seus olhos estavam arregalados em puro desespero, estampado em seu rosto pálido. Nissa não conseguia afastar a visão das duas figuras caídas no chão diante dela.

Uma delas era outra mulher, uma guerreira com um chicote caído ao lado, envolta em uma grande poça de sangue que escorria de um ferimento profundo em seu abdômen. Ao lado dela, um homem imponente, de músculos definidos, estava estirado no chão. Seu braço, decepado, jazia a centímetros de distância, ainda preso a um grande escudo destruído.

"Como chegamos a isso?" — pensou Nissa, atordoada, seu coração batendo acelerado em seu peito enquanto observava a devastação ao redor. O medo a paralisava, incapaz de entender como tudo havia desmoronado tão rapidamente.

De repente, um rugido bestial reverberou pela floresta, sacudindo-a de seu estado de choque. O som foi seguido por um estrondo — o metal colidindo violentamente contra metal. Virando-se instintivamente, Nissa viu um jovem que reconhecia bem. Cid estava de pé, sua espada erguida, bloqueando um ataque feroz que teria atingido Nissa diretamente.

— Eu não vou deixar que te machuquem, Nissa!!! — gritou Cid, com toda a coragem que conseguiu reunir, sua voz determinada, mas também tremendo sob o peso da responsabilidade que sentia.

No entanto, por mais corajoso que fosse, Cid já estava exaurido. O fluxo constante de mana o desgastava, e sua mão dominante, que segurava a espada, vacilava levemente sob a pressão esmagadora do inimigo. Suas pernas tremiam enquanto lutava para não ceder.

Diante deles, três minotauros observavam a batalha. Dois mantinham-se afastados, mas o terceiro, aquele que avançava com imensa força, era o verdadeiro terror. Ele era gigantesco, muito maior que seus subordinados, e cada golpe que desferia era tão pesado que o chão ao seu redor rachava sob o impacto.

— Você acha que pode me vencer? — rugiu Thorak, com uma voz profunda que ecoava pela floresta. — Eu sou Thorak, Rei dos Minotauros! — declarou, erguendo seus dois cutelos gigantescos.

Cid cerrou os dentes, seu corpo inteiro tremendo de esforço. Ele segurou sua espada com ambas as mãos, mal conseguindo manter a defesa enquanto os golpes de Thorak o esmagavam. O chão sob eles começou a ceder, formando uma cratera em torno da batalha, enquanto ambos travavam um impasse de pura força e determinação.

— Eu não me importo com quem você é! — gritou Cid, sua voz ressoando com a intensidade de sua determinação. — Se você ameaça a vida de quem eu amo, não sairá impune!

O solo estalava e se desintegrava sob o impacto da batalha, e uma densa nuvem de poeira se ergueu no ar, obscurecendo a visão de Nissa. O desespero tomou conta dela enquanto a poeira subia, e ela tentou enxergar através do caos.

— Cid!!! — gritou Nissa, a voz quebrada pela angústia e pelo medo de perdê-lo.

De repente, a figura de Cid emergiu da nuvem de poeira. Ele foi arremessado para trás, caindo pesadamente ao lado de Nissa, sua espada cravada no solo para parar o impacto. Seu corpo estava exausto, os músculos ardendo de dor, e um fio de sangue escorria por sua testa.

— Droga... esse Etéreo é muito mais forte do que eu imaginava. — murmurou Cid, com a respiração ofegante.

À medida que a poeira se dissipava, Thorak reaparecia, intacto. O enorme minotauro caminhava à frente, sem um arranhão sequer, seus olhos selvagens brilhando de satisfação. Não havia sinal de cansaço em seu corpo massivo, pelo contrário, ele parecia mais forte e revigorado, como se cada momento da batalha apenas aumentasse sua energia.

— Venham, guerreiros! — gritou Thorak, sua voz cheia de desprezo. — Ainda não estou satisfeito com nossa batalha!

Nissa, observando a cena, sentiu seu coração se afundar ainda mais. O poder esmagador de Thorak parecia intransponível, e ela mal podia acreditar no que via. Cid, que sempre foi o pilar de força e coragem, estava ali, derrotado, tentando desesperadamente se levantar.

— O que vamos fazer? Esse cara é impossível... como vamos lidar com ele? — murmurou Cid, com a respiração pesada e os músculos exaustos, lutando para se manter de pé. Suas pernas tremiam, mas ele não podia ceder agora. Não quando a vida de Nissa e a sua estavam em jogo.

Ao seu lado, Nissa apertava o cabo de seu cajado mágico com força, a pressão da situação pesando sobre seus ombros. Suas mãos começaram a brilhar à medida que uma grande quantidade de mana fluía de seu corpo para o cajado. Seus olhos se fecharam enquanto ela tentava alcançar uma concentração plena, buscando a calma necessária para canalizar sua energia.

Na escuridão de sua mente, as memórias das batalhas anteriores invadiram sua consciência. Ela viu Julie, a sentinela que manejava o chicote com precisão e velocidade, tentando sem sucesso acertar Thorak. Por mais rápidos e ferozes que fossem os ataques, nenhum deles havia sequer arranhado o Rei dos Minotauros. Thorak, com um único golpe brutal de seu cutelo, a derrubou sem piedade, deixando-a sangrando no chão.

Depois, veio Heng. Furioso, ele avançou com sua espada curta e escudo. Seus golpes pareciam mais certeiros, e por um breve momento, Nissa pensou que ele poderia ferir Thorak. Mas não, o mesmo padrão cruel se repetiu. Nenhuma lâmina conseguia penetrar a pele espessa de Thorak, e Heng pagou o preço. Com um golpe devastador, o minotauro cortou seu braço, junto com o escudo, como se fossem papel.

"Mesmo com todos os ataques desesperados dos meus companheiros, nenhum deles conseguiu nem arranhar esse monstro. Mas e se...", Nissa refletia, sua mente girando em busca de uma solução.

Subitamente, uma ideia se formou. Seus olhos se abriram, e uma nova determinação brilhou em seu rosto.

— Já sei! Cid, vou usar minha magia de acerto garantido nesse minotauro! — declarou Nissa, sua voz agora firme, cortando o silêncio com uma confiança renovada.

— Você quer dizer que vai usar aquilo? — perguntou Cid, surpreso, seus olhos arregalados. Ele sabia o poder devastador que aquela magia tinha, mas também sabia o risco que ela trazia.

Thorak, observando de perto, não conseguiu conter seu sorriso arrogante ao perceber que os dois estavam tramando algo. O minotauro arrastava suas duas espadas pelo chão, o som de metal contra pedra ecoando pela floresta enquanto ele avançava com passos pesados em direção a eles. Seus olhos brilhavam de confiança, como se estivesse apenas brincando com suas presas.

— O que é isso? Estão tramando algum plano para me derrotar? — zombou Thorak, sua voz carregada de desprezo. — Já aviso, nada que vocês façam vai adiantar! Vocês são insignificantes.

Seu riso cruel ecoou pelo ar, cada palavra carregada de um desprezo profundo por seus adversários. Para Thorak, essa batalha já estava decidida.

— É o que você pensa! — gritou Cid, sua voz cortando o riso de Thorak. Ele se colocou em posição de combate, os olhos fixos no minotauro enquanto seu corpo todo tremia, não de medo, mas de pura adrenalina. Ele estava prestes a disparar, mas sabia que seria uma batalha dura.

Nissa, ao seu lado, estava igualmente determinada, mas sua raiva era mais pessoal.

— Isso mesmo! Vamos mostrar para você o que acontece quando Etéreos mexem com os sentinelas... — disse Nissa, sua voz ganhando força enquanto seus olhos queimavam de vingança. — E, em específico, quando mexem com a minha irmã!

O ar ao redor dela começou a crepitar com a energia mágica que se acumulava, formando um círculo de luz em torno de seus pés. Cid sentiu o calor da magia e sabia que ela estava prestes a fazer algo grandioso.

Thorak, no entanto, avançava implacável, sem medo, sem hesitação. A confiança absoluta em sua força fazia seus passos ecoarem com um poder ameaçador. O Rei dos Minotauros acreditava piamente que nada poderia derrotá-lo.

— Essa eu aprendi com a família Dramus! — bradou Cid, suas pernas se posicionando firmemente no chão, uma à frente da outra, preparando-se para o ataque final. — Tríplice Corte do Dragão!

Num piscar de olhos, Cid se lançou em um pulso de velocidade, encurtando a distância entre ele e Thorak em um instante. Sua espada brilhou com o influxo de mana, movendo-se com precisão letal enquanto ele desferia o primeiro golpe. A lâmina cortou o ar em direção ao rei dos minotauros, mas Thorak, sem sequer recuar, ergueu seus cutelos com um ar de desprezo.

— Suas técnicas são fracas. — zombou Thorak, seus olhos sem sequer registrar preocupação.

— Quero ver você dizer isso depois de ser atingido! — rugiu Cid, a adrenalina correndo em suas veias.

Sua espada desceu de baixo para cima, em um arco feroz que visava cortar o braço ou o torso do minotauro. Mas Thorak, com a facilidade de quem já enfrentara centenas de batalhas, balançou seu cutelo, bloqueando o ataque com um estrondo metálico que fez o chão ao redor vibrar.

Sem hesitar, Cid girou em um movimento fluido, desferindo um corte horizontal com uma precisão e velocidade espantosas, mirando diretamente no pescoço do monstro. O golpe seria letal... se Thorak não tivesse se esquivado com uma leveza surpreendente para alguém de seu tamanho. O aço passou inofensivo pelo espaço onde, por um momento, estivera a cabeça do minotauro.

— Droga! — pensou Cid, seu coração batendo mais rápido. Mas ele não podia parar agora.

Concentrando todo o mana restante na espada, ele preparou o golpe final — o terceiro e mais poderoso dos três cortes. Com um grito feroz, Cid levantou a espada e desceu com toda a sua força e intenção assassina. O golpe vinha na vertical, com força suficiente para partir uma montanha em duas, e a lâmina reluziu com energia mágica enquanto visava a cabeça de Thorak.

Por um momento, o ar pareceu se eletrizar, e o ataque parecia imparável. Mas, antes que a espada pudesse atingir seu alvo, Thorak ergueu suas espadas e, com um bloqueio preciso, conteve o golpe. O impacto ecoou por toda a floresta, levantando poeira e pedras, mas o monstro não vacilou.

— Como eu disse... — Thorak abriu um sorriso arrogante, seus olhos frios fixos nos de Cid. — Nada vai funcionar.

O olhar de Cid, antes determinado, começou a vacilar. Ele havia colocado tudo naquele ataque, cada gota de energia e vontade. No entanto, Thorak permanecia ali, firme e inabalável, como se os golpes de Cid não fossem mais que um leve incômodo. A sensação de impotência tomou conta do espadachim, seu coração se apertando com o crescente desespero.

Ele respirava com dificuldade, sua mente girando enquanto sentia o peso da situação se abater sobre seus ombros. 

"Será que... não há nada que eu possa fazer contra esse monstro?", pensou Cid, lutando contra a crescente onda de desesperança. Mas ele não podia ceder. Não agora.

Thorak riu, uma risada baixa e ameaçadora que parecia zombar do esforço inútil de Cid. Ele balançou a cabeça, incrédulo.

— Você não é nada para mim. Apenas mais um inseto que ousa desafiar a ordem natural.

Cid respirou fundo, cerrando os punhos ao redor da empunhadura de sua espada. 

"Pelo menos consegui tempo para ela...", pensou ele, buscando algum conforto na ideia de que seu esforço permitiu a Nissa preparar sua magia. 

Cid, com sua alta mobilidade, saltou para trás, saindo rapidamente da linha de frente com Thorak. Ele sabia que precisava dar espaço para Nissa agir. Thorak, por sua vez, percebeu a mudança e virou seu olhar para Nissa, que estava pronta, com o cajado mágico firmemente apontado em sua direção.

Faíscas elétricas começaram a emergir do chão, subindo pelas pernas de Nissa, passando por seu torso, braços e finalmente concentrando-se no cajado. Um grande círculo mágico se materializou à frente dela, sua energia pulsando com poder crescente. No centro do círculo, uma pequena bola de eletricidade se formava, aumentando de tamanho e potência a cada segundo.

— Descarga Relâmpago!!! — gritou Nissa, sua voz carregada de desespero e esperança.

O feixe de luz rasgou o ar numa velocidade inimaginável, um ataque rápido e implacável, com potência para desintegrar qualquer coisa em seu caminho. O golpe pareceu instantâneo, impossível de se esquivar ou defender. Em um piscar de olhos, Thorak foi atingido, e um clarão cegante tomou conta do campo de batalha.

Nissa, com o coração disparado, observou o clarão. 

"Consegui?", pensou ela, desesperada por uma resposta, por algum sinal de que o monstro havia caído.

Segundos depois, o clarão começou a se dissipar, e o cenário se revelou. O chão estava queimado e coberto por faíscas elétricas. Árvores ao redor da área haviam sido completamente destruídas pelo ataque devastador. Mas, no centro de tudo, de pé e inabalável, estava Thorak.

— Que ataque interessante! Nunca usaram algo assim contra mim antes. — comentou Thorak, seu tom levemente admirado, mas ainda repleto de arrogância.

— Não... pode ser... — murmurou Cid, incrédulo, incapaz de acreditar no que via.

Nos olhos de Nissa, lágrimas começaram a se acumular. Ela sabia que havia acertado Thorak. Ela sentiu o impacto da magia. Mas ele estava ali, sem um arranhão. O medo começou a tomar conta dela, misturado com a tristeza e a impotência. 

"Se nem isso o detém... será esse o fim?"

— Eu sei que o acertei... mas... como ele ainda está de pé? — sussurrou Nissa, seu coração afundando em desespero.

Cid rapidamente correu para ficar ao lado de Nissa, sua espada erguida e pronta, mas o olhar em seu rosto era de pura preocupação. Ele avaliou o inimigo à sua frente, percebendo que Thorak não era apenas mais um minotauro qualquer.

— Esse monstro não é nível Zeta... ele está mais para Delta... ou até Gamma. — murmurou Cid, o medo em sua voz era palpável.

Os passos de Thorak eram brutais, cada movimento criando pequenas crateras no chão. Ele caminhava com confiança absoluta, o peito estufado, seus olhos fixos nos dois sentinelas, como se eles fossem nada mais do que obstáculos a serem destruídos.

— Querida... me desculpe. — murmurou Cid, sua voz carregada de arrependimento. — Eu queria ter encontrado sua irmã... eu sou fraco demais. Me perdoe.

Nissa olhou para ele, com o coração pesado, mas não de desapontamento, e sim de compreensão. Ela o amava, e ele tinha lutado com tudo o que podia. Ela sabia disso.

— Não se preocupe. Você fez o que pôde... e eu fiz o que pude. — respondeu Nissa, segurando firme seu cajado.

Os dois apertaram suas armas, seus olhares se encontrando por um breve momento. Entre eles, havia amor, uma conexão silenciosa que transcendia a situação desesperadora. Juntos, olharam para Thorak, suas mãos firmes, a coragem de enfrentar o inevitável crescendo em seus corações.

— Não pense que vamos recuar! — gritaram os dois em uníssono, suas vozes unidas em determinação. — Somos sentinelas, lutaremos até o fim!

Thorak sorriu, um sorriso largo e cruel, cheio de desprezo.

— Admiro a atitude de vocês... mas de nada adianta. Vocês são fracos. — zombou ele, enquanto continuava sua aproximação, cada passo mais ameaçador que o anterior.

Mas, de repente, o ar ao redor deles pareceu mudar. Antes que Thorak pudesse dar o próximo passo, uma figura pousou diante de Cid e Nissa. Seus cabelos grisalhos esvoaçavam levemente com o vento, e seus olhos roxos estavam fixos no minotauro, sem medo algum. Havia uma calma inabalável em seu rosto, mas também um sorriso satisfeito.

— Gostei do que ouvi. — disse ele, com um tom tranquilo, mas firme. — Realmente, Thesena tem grandes soldados. — ele olhou para Cid e Nissa, com um brilho de respeito em seus olhos. — Em respeito a vocês e por aqueles que se foram, eu assumirei daqui.

Thorak, por um breve instante, franziu a testa, surpreso com a nova presença. Mas o sorriso não desapareceu de seu rosto.

Aquele que surgira no campo de batalha era Dusk, e sua presença trouxe uma nova onda de esperança. Mesmo diante do poder imenso de Thorak, havia algo em Dusk, uma confiança, uma força silenciosa que parecia dizer que a batalha estava longe de acabar.



Comentários