Pt. 2 – Arco 3
Capítulo 33: A Ameaça do Bat-Maconha (2)
Quarto N. 264, Casa do Sol Nascente - 10:45 da noite, quinze de Julho.
Leonard se levantou. Havia caído no sono.
Ao olhar para cima, encontrou um buraco no teto, com o exato tamanho da sua cabeça. "Caralho, acho que dei uma cabeçada na parede e desmaiei. Nunca mais tento descobrir o quão alto consigo pular", pensou.
Olhou em volta, notando que nem Einstein e nem Elin estavam no cômodo. "Será que já acordaram e saíram, ou nem voltaram para cá?"
Embora curioso, deu de ombros e foi até o banheiro, onde tomou uma ducha. Era a primeira vez desde… alguns dias? Ele sorriu ao se lembrar do bom sentimento de ficar limpo. Após o gracioso processo, escovou os dentes e saiu do quarto, pronto para mais um dia de ̶f̶a̶r̶r̶a̶ investigação.
Já trajado de Benjamin Arrola, usando o terno estilo e o chapéu de abas, caminhou sapateando pelo corredor.
Isso até passar por um grupo de policiais que, seja lá por qual motivo, estavam dentro do hotel. Saiu andando bem na moral. “Acho que não vou ser vítima de bala perdida dentro de um hotel, né? Só preciso manter a calma e seguir em frente”.
Um dos policiais sacou a pistola e disparou contra ele.
— Vai tomar no cu! — Leonard se esquivou por pouco, o raspão do tiro ficou em seu terno. — Qual foi? Sou negão e tudo mais, mas também sou rico. Isso não deveria equilibrar as coisas?
— Você está preso por terrorismo, Leonard Mystery. — Um dos três policiais afirmou, com a arma apontada contra sua cara.
— Leonard Mystery? É Benjamin Arrola.
— Hm… Perdão, não sou viado.
— Esse é meu nome, cacete! — gritou, derrubando a arma que estava apontada na sua cara com um soco-surpresa. Já aquele policial precisou de dois para ser derrubado.
Quando os outros dois tiras estavam prontos para disparar, o detetive agarrou o policial que havia acabado de atacar para usá-lo como escudo. Os homens desistiram de atirar, e correram em sua direção.
— Xaplau! — Leonard arremessou o escudo-humano contra um dos tiras e atingiu um chute no rosto do outro. Em menos de dez segundos de luta, todos os três já estavam nocauteados e largados no chão.
Por fim, saiu correndo em disparada pelo corredor, se perguntando como havia sido descoberto. Descobriu a resposta quando, ao descer as escadas e atravessar outro corredor, encontrou o disfarce de Einstein largado na frente do restaurante.
"Merda, o Einstein deve ter tirado o disfarce na frente de geral". O restaurante desértico e a mesa destruída logo à frente denunciavam o fato de que alguma coisa nada legal tinha ocorrido naquele ambiente.
"Aposto que todo mundo reconheceu ele e aí chamaram a polícia! Deve ter demorado bem pouco para que descobrissem o quarto onde ele estava dormindo e a aparência de seus colegas. Tive sorte de ter acordado rápido. Senão, abriria os olhos já dentro de uma cela! Ou ao lado do Elvis Presley, do jeito que esses policiais atiraram em mim antes de tentarem me prender.”
Ele tirou o terno e voltou a correr, sabendo bem o que precisava fazer. Voltou rapidamente para seu quarto.
Cassino, Casa do Sol Nascente - 11:04 da noite, 15 de Julho.
Elin ganhou mais uma partida.
Descobriu naquele dia ser uma verdadeira jogadora de jogos de azar; havia vencido inúmeras partidas e seu dinheiro quintuplicou. Tudo bem que ela poderia criar quanto dinheiro quisesse através de seus poderes… mas ainda assim, a emoção era extasiante.
— UHUL! — riu maleficamente das caras chorosas dos seus inimigos engravatados gordinhos que trabalhavam com coisas como bancos ou bolsa de valores.
Sequer notou os policiais adentrando o recinto.
Porém, o homem atrás dela percebeu, e cutucou o seu ombro. Elin se virou e encontrou um negão de chapéu e bigode mexicano.
— Oi, Leo.
— Leo? No, no, soy El Hermano Carlos!
— Ah.
Foi agarrada por ele, que sussurrou em seu ouvido:
— Demorei pra cacete só para encontrá-la. Roubei essa roupa de um brechó aqui do lado. O Einstein foi descoberto e agora os policiais descobriram nossos disfarces e estão nos perseguindo.
— Por que deixou a informação mais importante para o final?!
— Explicar como arranjei essa roupa era muito importante. Aliás, eu saí do hotel pela sacada e voltei por lá. Escalar um prédio é osso.
— Por que continua me explicando os detalhes inúteis? Onde está o Einstein?
— Sei lá. Só encontrei o disfarce dele largado no restaurante, totalmente rasgado. Eles não emitiram um alerta de que os três terroristas mais procurados do país estão no hotel?
Elin se revirou, pensativa sobre o assunto. Demorou dez segundos para chegar a uma conclusão.
— Sim, sim. Falaram, mas pensei que eram outros terroristas.
— Porra, Elin! Era para você ser a inteligente do grupo!
— Só quando o roteiro convém, desculpa.
Os dois partiram até o corredor oposto à direção dos policiais. O suor escorrendo por seus rostos.
— O que acha que aconteceu com o Einstein? — questionou o investigador.
— Não sei — respondeu, preocupada. — Espero que meu irmão esteja bem…
— Do jeito que ele é, pode ter tirado a fantasia na frente de todos sem querer.
— É possível, mas… e se alguém tê-lo atacado?
— Aí fodeu. Quem poderia ser? Era impossível alguém ter nos encontrado e alcançado em menos de um dia.
— Quando falamos do meio humano, sim, mas desconhecemos os tipos de poderes que podem existir entre os cryptos. Se um dos nossos inimigos for capaz de se teleportar, as coisas podem complicar.
— Verdade. Esse rolê complica tudo… olha, temos que despistar aqueles tiras para voltarmos até a cena do crime.
— Cena do crime?
— O restaurante, onde encontrei o disfarce do Einstein.
— Vamos!
Restaurante, Casa do Sol Nascente - 00:05 da madrugada, 16 de Julho.
Depois de dar a volta no hotel, os dois conseguiram acessar o restaurante. O local estava vazio, pois os policiais já tinham parado de investigar o ambiente e se dispersado pelo hotel há tempos.
Eles passaram por cima da fita que isolava o restaurante e pararam na frente da fantasia rasgada de Einstein.
— Aconteceu uma luta aqui, definitivamente — afirmou Elin. — Isso está óbvio.
— Puts, é mesmo? Faz sentido.
— Com quem poderia ser?
— Aposto que foi com aquele cara, o dono desse hotel — deduziu o detetive, com toda a certeza do mundo. — Sabe, o mano do bigode que tinha feito um discurso no cassino.
— Por quê?
— É porque isso aqui é uma história de investigação, e é muito mais foda quando o culpado por tudo já foi apresentado. Aquele cara é todo carismático e tudo mais, tem o perfil de bandido. Isso sem contar o bigode.
— Do que você está falando…? Isso não é uma histórinha de entretenimento.
— E daí? Já teve o clichê da passagem secreta (três vezes), agentes secretos, super-poderes, monstros, magia… tipo, uns bagulhos que nem combinam. A lógica do que estamos vivendo é a mesma de uma história fictícia.
— Mas eu já tinha me esquecido daquele cara. Se ele revelar ser um vilão, vai ser uma surpresa bem sem graça.
— Ok, talvez seja a lógica de uma história não muito boa, mas é muito brisado e os clichês se aplicam.
— Sério? Esse é o seu método para investigar?
— É — respondeu, apontando para as pegadas atrás da fantasia. — Por exemplo, irei seguir essas pegadas até descobrir de onde ele veio.
— Mas isso é um processo comum em toda investigação.
— Cê reclama quando não sou convencional, reclama quando sou convencional… tem gente que recebe a mão e quer o braço!
Sherlock Holmes e Watson da boca de fumo foram andando, seguindo as pegadas até chegar na origem.
— Algumas dessas pegadas são as “patas” do Einstein, definitivamente. Mas tem outras, essas enormes, que definitivamente são de algo bem menos humano. Acho que estamos lidando com uma mitofera.
As pegadas levaram os dois para o banheiro masculino. Ficaram impressionados ao encontrarem duas paredes esburacadas.
Uma das paredes estava conectada ao corredor e parecia ter sido quebrada pelo lado de fora com algo muito mais forte que uma marreta. O segundo buraco, o mais curioso, já parecia levar para algo muito mais profundo. Leonard e Elin trocaram olhares, sabendo o que precisavam fazer. Sem pensar duas vezes, ele saltou para dentro da fenda. A garota entrou logo em seguida.
Os dois desceram pelas brechas de escuridão, se impressionando cada vez mais ao perceberem a profundidade do buraco. Foram minutos gastos para que alcançassem o fundo daquilo. Quando encostou os pés sobre a superfície rochosa, Leonard suspirou, aliviado. Em seguida, ajudou sua colega a pousar em segurança.
A dupla continuou o percurso pela gruta escura e molhada, sem palavras. Isso até seus olhos encontrarem a cena.
No fim da gruta, avistaram Einstein. O feiticeiro se encontrava caído sobre o chão, agonizando de dor.
— O quê?! — Elin gritou, correndo até ele. — O que está acontecendo contigo?!
Ele respondia apenas com grunhidos estranhos. Era nítido que sentia um sofrimento imensurável, e a dor parecia se originar da sua mão esquerda, que segurava algo com uma firmeza doentia.
A artista tentou abrir a mão dele, mas permanecia fechada com toda a força que tinha, como um cachorro que agarrou um osso. Einstein tentou se encostar em sua irmã, mas em um surto, jogou-se para o lado oposto.
— Temos que dar no pé para tratá-lo — falou o investigador, se aproximando para agarrar seu amigo.
Foi recebido com um soco.
Diferente de todos os outros golpes físicos que o detetive alguma vez recebeu de Einstein, aquele foi capaz de fazê-lo sentir dor. Sangue espirrou de seu nariz.
Já o segundo soco, que recebeu logo em seguida, foi o suficiente para tirá-lo do chão e jogá-lo violentamente contra a parede.
— Einstein? — Leonard fraquejou, tentando se reerguer.
— Maconha… maconha… maconha… — começou o feiticeiro, enfurecidamente. — MACONHA!!!
— “Maconha”? Do que cê tá falando, maluco?!
— Ah, irmão, você entrou para o mundo das drogas…? — indagou, mais preocupada ainda.
Elin tentou acalmá-lo, mas fora obrigada a se afastar quando ele começou a se debater freneticamente.
Horrorizada com aqueles lampejos de loucura, conseguiu notar algo saindo de dentro do corpo de seu irmão.
Era um horrendo e esverdeado humanoide, com um afiado sorriso amarelo e um par de olhos ardendo em vermelho. O Bat-Maconha.
— Olha só o que ocorreu com essa pobre alma — falou um outro homem, surgindo na gruta pelo mesmo caminho tomado por eles. — Não foi de grande inteligência tentar usurpar o poder do Coração para si próprio.
Ao se virarem, encontraram a figura bem comportada do dono bigodudo do hotel: David Goe.
— Então foi tu! — gritou Leonard, se levantando. — Eu sabia!
Um pedaço de pedra saiu do chão e simplesmente voou para cima do detetive, o derrubando. Elin percebeu que, pelo olhar de David Goe, foi ele que de algum modo fez aquilo acontecer — mesmo que nem tivesse se movido.
O dono do hotel permaneceu calmo, ajeitando o próprio bigode. Tinha um olhar sereno e imutável.
— Deveriam ter pensado duas vezes antes de invadirem o meu domínio para roubar o Coração, pois tudo o que está dentro da Casa do Sol Nascente fica sob meu controle.