Fenrir Brasileira

Autor(a): Marcus Antônio S. S. Gomes

Revisão: Heaven


Volume 6

Capítulo 66: Preparação

Sobre o céu mórbido de Lemur estrondos luminosos explodiram naquelas nuvens cinzentas, deixando o clima ainda mais assustador. Os lampejos incandescentes foram os únicos que iluminaram aquele dia escuro.

Os trovões ressoavam como se a ira dos deuses estivesse para cair sobre aquele solo.

BRUM!

Um poderoso raio caia partindo em dois uma árvore centenária como se fosse um graveto qualquer. O fogo tomou conta da madeira que em poucos instantes queimava se tornando carvão.

Aquele clima desolador estava sendo assistido por duas pessoas que se ocultavam em meio a floresta de Lemur. O primeiro deles era um ancião de idade avançada, suas vestes de seda fina branca eram atípicas do país das Feras, porém havia nele um traço marcante, em sua cabeça haviam um par de chifres negros.

Aquele ancião assistia a madeira se tornar cinzas com um olhar sombrio, na íris de seus olhos o brilho do fogo consumindo a madeira era refletido.

Uma voz feminina quebra o momento de reflexão do ancião:

— Ora! Que raro vê-lo tão pensativo Tabask!

O velho demônio inclina sua cabeça na direção da voz, ele viu uma bela mulher trajando roupas negras reveladoras, embora suas vestes mostrassem o quanto a mulher de cabelos negros era bela o velho sorriu e fez um comentário impertinente.

— Hunf! A forma como se veste é vulgar como sempre… Glinda.

A bruxa do Sul agiu com desdenho ao comentário fora de hora do velho, mas a grande bruxa conhecia bem esse homem.

— Mudar de assunto não vai adiantar — disse Glinda dando as mãos com calma. — Agora me diga o que o incomoda velho amigo.

Tabask voltou a encarar a chama que agora havia enfraquecido. Glinda por sua vez aproximou-se do ancião e o acompanhou contemplando a pequena chama se apagar.

— O que foi Tabask? Existe algo que queira dizer?

O velho mostrou um sorriso amargo e respondeu:

— Sou apenas um vassalo. Minha opinião, pensamentos e vontades são irrelevantes diante das minhas obrigações.

Glinda fechou seus olhos por um instante, após suspirar fundo deu sua opinião:

— Até quando vai arcar com os delírios de Azfir? Sei bem que não concorda nem um pouco com seus métodos repulsivos.

O velho tomou uma postura mais relaxada, após um breve momento de reflexão, o ancião move seus lábios:

— Como disse antes, sou apenas um vassalo, meu tempo passou. Sou um velho moribundo que não serve para nada além de passar seu conhecimento adiante, afinal uma relíquia do passado não pode intervir com a decisão das novas gerações.

Glinda cruzou seus braços perplexa e indagou:

— Tabask, pare Azfir, o caminho que ele está tomando não tem volta.

Tabask baixou seus olhos com tristeza.

— Minha amiga, a loucura da tribo branca já tomou Azfir por completo. Não é como se ele estivesse rumando por um caminho sem volta, o príncipe já está condenado a vagar por esse caminho até o fim de sua vida.

Glinda botou sua mão sobre o ombro cansado de Tabask.

— Então, não é seu dever pará-lo?

Tabask mostrou uma face triste, mas um sorriso forçado disfarçava seus conflitos interiores.

— Obrigado por suas palavras velha amiga, contudo meu dever não é parar o jovem mestre e sim permanecer ao seu lado até o amargo fim.

Glinda retrocedeu sua mão, depois de contemplar a expressão de Tabask ela entendeu que nada o faria mudar de ideia.

A bruxa do Sul conhecia Tabask a muito tempo, tanto tempo que o ancião demônio era apenas um jovem garoto.

Cheia de nostalgia e tristeza, as únicas palavras que a bruxa achou para confortá-lo foram simplórias e curtas.

— Dê o seu melhor, velho amigo!

— Ufufufufu! Deixe comigo, até meu último suspiro farei o melhor que puder.

A fraca chama que os dois contemplavam se apagou.

 


 

A duas horas de distância de Harp:

— Tsk! Que droga, não posso acreditar no quanto custou para meus bolsos deslocar esses bárbaros acéfalos — um bestial do clã dos lobos azuis indaga suas lamentações furiosamente. — Que droga! Aquela felina infernal está me custando muito caro….

Ranpa saboreava um vinho caro em sua taça de cristal, tudo a sua volta era luxuosa e cara, mesmo assim, isso não foi o suficiente para tirar o sabor amargo de sua boca.

O vendedor de escravos teve um breve vislumbre de Ferus em sua mente. Isso o fez furioso ao ponto de ranger seus dentes com ódio.

— Tudo por causa daquele cachorro preto maldito!

Irado, Ranpa se levantou e lançou violentamente a taça de vinho na parede, os cacos espalham-se por todos os cantos.

Ranpa coloca a mão sobre seu rosto desolado e se lembra da promessa que fez a Tabask Azura.

— Droga! Amanhã é o terceiro dia, se não cumprir meu acordo a cabeça rolará desse pescoço — Ranpa reclama enquanto passa a mão em volta de seu pescoço. — Aquele lobo maldito…

Repentinamente a porta se abre chamando a atenção de Ranpa, a pessoa que passou pela porta foi o seu mais leal servo, Besker.

— Tsk! Espero que seja importante para ousar me interromper assim.

Besker sorriu e respondeu após um arco graciosos:

— De modo algum ousaria interrompê-lo sem um motivo importante.

Ranpa suspirou fundo e sentou-se em seu “trono”.

— Nesse caso seja breve.

Besker lança aos pés de Ranpa uma garota amarrada firmemente por cordas e com marcas de espancamento.

Ranpa contempla a garota de cabelos azuis, tão pequena que confundir ela com uma criança era quase inevitável. A garota do clã roedor olhava com olhos marejados para Ranpa, embora a pobre menina quisesse gritar a mordaça apertada a impedia de realizar tal façanha.

Sem entender, Ranpa exige esclarecimento:

— O que é “isso”?

— Hunf! Essa garota se chama Millin, não sei muito sobre ela, porém sei com certeza que ela e a felina tem uma relação amigável.

Ranpa arregalou seus olhos surpreso, um sorriso se desenhou em seu rosto ao perceber que a situação finalmente havia pendido a seu favor.

— AHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA! Muito bem Besker!

— Ahahaha! Embora tenha sujado minhas mãos, valeu a pena, pois poderemos usar essa rata como isca.

Ranpa sentiu um grande alívio, pois, a situação favorável garantiria a cabeça sobre seu pescoço e ainda por cima a tão sonhada riqueza que sempre desejou.

Besker sentiu-se aliviado ao notar que seu mestre havia retomado a confiança. Ranpa torna-se insuportável sobre pressão.

— Besker — chamou Ranpa em um tom imperativo.

— Sim, meu senhor.

— Fale com Badak que agiremos imediatamente.

— Certamente mestre, entretanto Bertis ainda não chegou.

— Eu não ligo para aquele urso maldito, o tempo não está ao nosso lado. Ordene Badak para que prepare o ataque a Harp o mais rápido possível.

Besker fez uma meia reverência e confirmou:

— Perfeitamente mestre.

Após sua confirmação, Besker deu as costas e saiu.

Ranpa olhou para Millin que estava impossibilitada de realizar qualquer movimento e exprimiu um sorriso malicioso.

— Hanf!

Millin lançou um olhar de desprezo para Ranpa que achou graça dessa atitude corajosa.

O lobo azul levanta-se de seu trono e se aproxima de Millin. Ranpa toca o rosto amordaçado de Millin e vira seu rosto de um lado para o outro como se estivesse a examinando.

— Nada mal, essa rata talvez valha alguma coisa — Ranpa soltou o rosto de Millin que ainda o encarava com ira em seus olhos. — Você é corajosa rata nojenta, para sua sorte você é uma boa mercadoria, caso contrário já teria arrancado seus olhos presunçosos.

Millin tentou se debater e gritar, mas as amarras e mordaças foram bem presas. Com os olhos marejados a pequena tenta gritar, mas seu som foi abafado e sem forças, Ranpa ria horrores dos esforços infrutíferos de Millin.

No lado de fora do esconderijo de Ranpa, Besker andava tranquilamente em meio a uma grande quantidade de bestiais bárbaros, o número somava a incrível quantidade de trezentos homens, todos ali eram membros da Predatory e sua grande maioria contava com bestiais de “sangue puro”.

Esses bestiais encaravam Besker com olhares maliciosos, mas Besker foi superior ignorando os bárbaros com sutileza.

Os clãs bestiais que considerados completamente puro: clã dos tigres (Clã Tigar), clã dos ursos, clã dos leões (Clã Chloe), Clã bisão, Clã das panteras (Clã Panther), o clã dos linces, clã dos rinocerontes dentre outros clãs que possuem sua contraparte animal como traço principal tomam conta desse lugar.

Os clãs dos lobos são considerados impuros por estes bestiais, pois sua contraparte humana é muito aparente.

Besker percebeu os olhares de desprezo para sua pessoa, contudo ele sorriu para essa situação atípica e pensou:

“ Então é dessa maneira que os escravos se sentem quando foco meu olhar para eles. Esses malditos me encaram como se eu fosse um pedaço de lixo. Ahahahahaha! Que irônico”

Besker continuou seu percurso até o centro da comoção, o pequeno povoado tomado por Ranpa tornou-se um local onde a pior ralé da Predatory se unia.

Um grande rinoceronte maior que qualquer outro desse clã bestial estava sentado sobre uma rocha. Uma poderosa armadura férrea protegia o corpo desse colosso.

Seu tamanho e postura imponente fizeram Besker engolir a própria saliva. Entre as pernas desse bestial descansava seu grande martelo de guerra, tão ridiculamente grande que parecia um conto fantasioso.

Besker sentiu arrepios ao imaginar seu corpo sendo atingido pelo martelo gigante e pensou:

“Não sobraria muita coisa de mim”

Besker já sabia como os demais ali o viam, mesmo assim juntou coragem e falou com grande bestial:

— Senhor Badak, o mestre Ranpa me mandou até aqui passar-lhe uma mensagem.

Badak olhou para Besker sem emitir nenhum som. Porém seu olhar cintilava com a cor rubra.

Besker limpou a garganta intimidado, mas continuou:

— Como ia dizendo, o senhor Ranpa ordenou adiantar o ataque sobre Harp e…

Badak bateu com violência o cabo de sua marreta no chão arrancando o silêncio de Besker que deu um passo para trás intimidado.

Pela primeira vez o grande bestial ergueu sua voz:

— “Ordenou”? Você me diverte cão azul. Seu mestre não é o meu mestre, não devo nada a aquele verme gananciosos do Ranpa.

Muitos bestiais leais a Badak se uniram a conversa lançando olhares intimidadores a Besker.

Um dos servos de Badak avisou:

— Cuidado com a língua sangue sujo! Não ache que está a par com o nosso líder.

Besker apertou seu punho frustrado, contudo assim como Ranpa, Besker é um articulador talentoso, recuar agora significaria um sinal de fraqueza, por isso e apenas por isso, Besker se manteve firme.

— Acredito que possa concordar que Ranpa não é seu mestre, porém dizer que não deve nada a ele é mesquinho de sua parte.

Besker armou um sorriso em seu rosto. Badak tremeu ligeiramente sua face e perguntou:

— Hou! Então está dizendo que eu devo a Ranpa?

O servo de Badak perdeu a paciência e gritou:

— COMO OUSA INSOLEN…

Badak levantou sua mão parando o grito vivido de seu servo, que se calou instantaneamente com o balançar do braço do grande bestial.

Besker manteve sua postura firme e continuou:

— Independente de qual é o motivo de cada um, uma coisa é certa, Ferus é nosso inimigo.

Badak deu um breve sorriso.

— Uhuhuhuhu! “O inimigo de meu inimigo pode ser meu aliado” hã? Nada mal.

Besker continuou:

— Meu mestre ordenou o ataque pois o melhor momento é agora. Alba Lepus está longe de seu lar, os habitantes de Harp já estão cientes de nossos movimentos. Por isso não podemos deixar que Ferus fuja.

Badak abriu um sorriso em seu rosto e deu uma resposta confiante:

— Uhuhuhuhuhu! Duvido que o lobo negro fuja de uma luta, afinal ele colheu muita honra depois de tudo. O mestiço que venceu o senhor Laruk em seguida Jù Yuán, esses feitos já o colocaram em um patamar de prestígio em minha opinião, mas esse bastardo ainda ousou vencer Darts que foi um Adamantium — Badak mostrou um sorriso cheio de vigor. — Quero lutar contra esse mestiço desgraçado e mostra-lhe seu devido lugar.

Besker pensou:

“Tsk! Esses malditos cérebros de músculo. Bem, suponho que tudo vai acabar bem contanto que ele cumpra seu papel.”

— Senhor Badak, peço para que prepare seu exército e invista em Harp o mais rápido possível.

— Não vai acontecer — respondeu Badak com unanimidade.

Besker cerrou os dentes irritado e contestou:

— Por que isso agora?

— Só partirei depois que Bertis chegar, prometi isso a ele.

“Entendo, o urso branco Bertis. Esses dois foram aqueles que derrotaram sozinhos um grande exército de invasores no reinado do rei anterior.”

Besker pergunta:

— Alguma notícia sobre o atual paradeiro de Bertis?

— Ele está a duas horas daqui, logo chegará.

— Nesse caso porque não prepara as tropas de antemão, assim vocês poderiam partir o mais rápido possível após sua chegada.

Badak fechou seus olhos por um instante e depois de ponderar por um momento decidiu:

— Umu! É uma boa sugestão, vou acolher seu conselho, entretanto que fiquei bem claro que só me moverei após a chegada de Bertis.

— Não há problema, o tempo que levaria para aprontar o exército seria mais ou menos o mesmo que o urso branco levaria para chegar. No final das contas tudo vai ser como deve ser.

Badak fechou seus e concluiu:

— Então não há mais nada a ser dito.

Besker fez um arco respeitoso e deu as costas, antes de ficar longe do olhar de Badak ele falou:

— Besker…

Besker virou-se para Badak que perguntou:

— O que Ranpa realmente quer?

Besker mostrou uma face tranquila e sorriu com cinismo, em seguida deu a seguinte resposta:

— E isso importa?

Badak mostrou um sorriso irônico e respondeu calmamente:

— Não, não importa.

— Com sua licença.

Dessa vez Besker foi realmente embora dali, mas o olhar de Badak ainda se ligava a sua figura até desaparecer de sua vista por completo.

O servo de Badak veio até seu mestre com o rosto amargo.

— Mestre, porque tolerar esse imundo?

— Hunf! Paciência, assim vencerá os obstáculos de forma magnânima.

Longe dali, uma pessoa observava sem ser percebido, pois era sua especialidade mover-se furtivamente.

Nilo que estava escondido entre as árvores e arbustos observando todos os movimentos do exército da Predatory.

O roedor sente o suor frio correr por seu rosto e pensa consigo mesmo:

“Droga! Ferus me pediu para ver a situação de sua amiga e logo de cara a vejo sendo sequestrada por Besker. Como vou resolver essa situação?”



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