Volume 2
Capítulo 94: Berserker
Bianca sentiu seus pulmões inflando e perdendo tamanho a cada segundo, como se pudesse estourar a qualquer instante.
O uso excessivo de manipulação de fogo estava tendo seus efeitos, tanto o cansaço físico quanto a falta de ar eram sinais de fadiga e o meio de seu corpo não exagerar demais.
Ela se encostou numa árvore e desabou, suas pernas tremiam demais. Não conseguia mexer um centímetro, o coração batia tão forte que podia ouví-lo como se estivesse ao lado.
“Eu posso ter a qualquer momento um ataque cardíaco…” El levou a mão ao rosto e limpou o suor escorrendo pelas sobrancelhas e cabelo. “Merda, quem foi o gênio do mau que colocou aquela salamandra estranha contra mim? Poderia ser o Romeu? Não, o desgraçado tem se mantido muito quieto ultimamente, então quem será?”
Sua mente estava procurando todo tipo de nome que pudesse ter uma rixa com ela, por mais boba que fosse a razão.
Não se podia duvidar de ricaços, qualquer besteira seria o bastante para por seu nome de pessoas mais odiadas do mundo.
No entanto, levando em conta a aparição da lagartixa bicha, não correlacionou com ninguém. Talvez fosse só alguém detrás das cortinas arquitetando encontros para que o resultado fosse como quisesse.
De qualquer forma, possivelmente o erro de cálculo seria enorme por uma série de motivos: haviam candidatos que mais se classificariam como um ponto fora da curva.
Essa grande equação para adivinhar o que aconteceria erraria de qualquer forma por conta deles, querendo ou não.
Bianca, após recuperar fôlego o bastante, ergueu-se e continuou o caminho, mas dessa vez tomando uma velocidade lenta e apurando seus sentidos para absorver qualquer coisa nos arredores.
Com certeza tinha outras anomalias a esperando, e ainda por cima teriam monstros para atrapalhar daqui alguns minutos, o que tornou crucial conservar sua energia o máximo possível.
Só que, para sua infelicidade, isso acabou não acontecendo. Alguns metros de distância, podendo ser visto pelas frestas da folhagem, ela avistou um homem sentado numa pilha de corpos.
“Merda, por que eu tô tendo esse tanto de azar?”
Bianca rapidamente se escondeu e observou. Uma pessoa gigante, com um bíceps maior que a cabeça, estava contando a quantia de pessoas caídas.
Rapidamente a ruiva o reconheceu, era aquele apelidado de “Berserker” que recentemente alcançou o rank B entre os raiders.
Ele não estava na lista disponibilizada pelo torneio, ou seja, deveria ser um dos concorrentes secretos não comentados, o que por si só era um grande problema.
“Se esse brutamonte estava dentro do evento, quer dizer que os outros monstros dos últimos três anos também estão aqui.”
Cerca de três anos atrás, uma leva de pessoas com habilidades e feitos excepcionais surgiu, o Berserker era um desses, tendo lidado com um monstro de classificação C com as mãos nuas na época.
Três anos se passou desde o ocorrido, então seus feitos atuais eram muito maiores.
— Humm, queria poder sair daqui… — comentou o gigante, soltando um bocejo e puxando um concorrente com sua própria mão enorme. — Ei, você, o que você sabe fazer?
— Por favor, me perdoa por ter aparecido! — implorou a pessoa, que mal conseguia se mexer direito. — Eu fa-faço qualquer coisa, qualquer coisa mesmo!
— Ah, então use sua habilidade naquele cara se rastejando ali.
Berserker apontou para um homem se arrastando, em busca de fugir da presença do gigante. Assim que escutou as palavras, seu corpo paralisou e seu sangue gelou.
Como não tinha muita paciência para esperar, o brutamonte só jogou a pessoa que estava segurando e assistiu de longe.
Já que aquele pobre coitado queria mais do que tudo sair inteiro e vivo, ele usou sua habilidade, que consistia numa simples transformação em ratinho e mordeu a pessoa.
Ver uma cena tão ridícula assim só serviu para deixar o Berserker puto, porque ele queria bastante olhar alguém queimando ou eletrocutando outra pessoa.
Ele se levantou da pilha de corpos, seus passos fizeram a terra tremer, ao mesmo tempo que o homem-ratinho só teve como rezar a Deus para poupar sua alma.
A punição que o gigante deu foi simples: pegou o ratinho pelo rabo e jogou com toda a sua força para longe, tão longe que possivelmente conseguiu dar a volta no mundo dentro do portal pelo menos duas vezes.
Bianca rezou por aquele pobre coitado, mas também serviu de referência para não sair de onde estava. Esperar poderia ser o melhor, assim que ele saísse, continuaria seu caminho em outra direção.
No entanto, esse pensamento era o equivalente a subestimar demais um monstro sobrenaturalmente forte.
O Berserker arrancou uma árvore do chão com as mãos nuas, mirando no meio da floresta e arremessando com tudo o que tinha.
Aquilo pareceu uma estaca voltada ao coração de Bianca, que saiu do caminho antes que fosse tarde demais, no entanto revelou sua posição no meio do caos.
Os dois trocaram olhares, o que para a mulher ruiva significou estar em sérios apuros. A forma como ele a observava era de um ser humano encarando uma formiga.
Bianca odiava muitas coisas, no entanto, aquele tipo de olhar era o que revivia toda raiva primordial num único ponto.
“Que se foda.”
Ela puxou as mangas do manto vermelho, a roupa colada preta revelou uma sequência de granadas em um braço e no outro um tipo de bastão transparente.
Primeiro, ela puxou uma granada, que por sinal não possuía nenhum pino.
— Oh, agora lembrei — disse o homem gigante, cruzando os braços. — Você é aquela CEO que desistiu do seus negócios que todo mundo falou. É uma pena ter que me enfrentar nesse evento… Hah, uma pena que não posso dizer “Vou chutar sua bunda de volta para o seu escritório”, levando em conta que você não tem mais um, né?
Veias pulsaram na testa de Bianca. O filho da puta cruzou uma linha que não deveria. Ela puxou mais uma granada, labaredas circularam pelos seus dedos e pelas fissuras de ambas as granadas.
As chamas criaram um tipo de núcleo no objeto, fazendo o calor se acumular ao redor do centro e girar. Bianca largou a granada, que flutuou abaixo de sua mão e se moveu sozinha de acordo com os comandos de sua manipulação de fogo.
— Você vai se arrepender de cada palavra que disse…
Um breve movimento fez o objeto voar em alta-velocidade na direção do Berserker, explodindo em um grande raio e varrendo aquela região, também por acidente jogando os outros competidores no chão em direção a água.
Uma nuvem de cogumelo subiu para o alto, rajadas de vento derrubaram a floresta atrás, a temperatura estava tão alta que as pontas do cabelo de Bianca ganharam uma cor preta.
Aquilo, no entanto, não a satisfazes. Outra granada foi perfeitamente preparada para dar fim ao sujeito, o núcleo em seu centro rodopiou no sentido inverso e se lançou contra a parede de chamas diante de seus olhos.
As duas explosões se combinaram e viraram um tipo de furacão caótico, em que até mesmo relâmpagos vermelhos cruzavam o céu no topo da nuvem de cogumelo.
Bianca observou a cena se desenvolver com pleno encantando, mas assim como esperado, o Berserker sobreviveu a esse ataque semi-nuclear.
Sua silhueta apareceu conforme o fogo abaixava, sua regata foi completamente consumida e o peitoral musculoso ficou amostra. A única coisa que sobrou foi a calça.
— Fuuu… se continuasse por mais um tempo, daria para eu aplicar cota…
— Que monstro absurdo… — Ela cerrou os dentes, mais do que irritada por tê-lo como seu inimigo.
— Vamos logo acabar com isso, pode ser?
O gigante pisou no chão, causando um tremor e se impulsionando de uma vez na direção da mulher como uma fera descontrolada.
Bianca saltou para o lado, desviando por pouco de ser agarrada, e conjurou um punhado de bolas de fogo para acertá-lo nas costas, mas o ataque mais pareceu vários mosquitos tentando picar uma parede de ferro.
O homem sequer esboçou alguma reação, ao invés disso, fincou a mão na terra e levantou, conseguindo levantar parte do chão na direção dela.
A ex-CEO não viu outra escolha a não ser propulsionar seus pés com fogo e habilmente rotacionar e se mover para que não fosse acertada.
Isso, no entanto, virou um grande problema quando o Berserker voou em sua direção, mais uma vez querendo pegá-la como uma de suas mãos.
Tendo aprendido algumas coisas nos seus bons meses de treino, Bianca levantou a perna para o alto e fechou o espaço entre a ponta do seu calcanhar e o rosto do homem, lançando-o para baixo num único golpe.
Ver a cara amassada dele arrastada pela grama preta era uma coisa boa de se ver. A mulher retornou ao chão, meio ofegante, mas sorrindo por estar quase de igual para igual com um classe B.
— Bianca?
Ela se virou de uma vez para ver de quem era aquela voz. Lá estava um garoto de terno, cabelo curto e carregando uma garota abaixo da axila, agindo com a maior normalidade do mundo.
— Espera, você é…
Interrompendo por completo o que falaria, um soco a atingiu pelo lado, lançando-a para longe e tirando por completo o seu fôlego.
Lucas fez uma expressão de dor igual a homem vendo alguém levar pancada no saco, e internamente pediu desculpa por ser o responsável disso acontecer.
— Yasmin, vou precisar que você se afaste de novo.
— Pra-pra já! Eu que não quero ficar perto de vocês! — A garota saiu daquele aperto e correu para o mais longe possível, mas como mal tinha algum espaço para se esconder, ficou parada no meio do nada. — Aqui está bom?!
— Tá sim! Agora só espera!
Depois de acenar por um tempinho para a garota, o rapaz suspirou e decidiu se intrometer no meio da briga. Ele avistou as protuberantes costas do Berserker se projetando a sua frente.
Escutando ele se aproximar, o gigante se voltou para o garoto, com uma expressão parcialmente irritada pelo seu intrometimento.
— Não tenho tempo para você agora, espere a sua…
Lucas não era um fã de papo-furado, e como estava prevendo que aquele maromba de perna fina iria agir todo arrogante, disparou uma lâmina de vento em seu rosto.
A magia bateu no rosto e não causou nenhum efeito físico, mas o psicológico foi imenso. Aquele rosto raivoso era uma graça de se ver, até faria o rapaz rir.
Assim como esperado, um punho veio em sua direção para esmagá-lo contra a terra, mas um simples jogo de pés evitou o golpe e abriu uma curta distância, que logo foi cortada pelo avanço do maromba.
Um enorme punho veio em sua direção, mas Lucas simplesmente conseguia ver com tamanha facilidade, ao ponto de precisar de poucos movimentos do quadril e torso para desviar.
O melhor veio depois. Uma rajada de socos tentaram acertá-lo, a força era tanta que o vento era empurrado só com um golpe, mas o rapaz mal se esforçava para continuar inteiro.
Em uma determinada hora, ele viu uma parte do terreno atrás, completamente varrido e com somente rochas no lugar de cinzas.
— Eita, você daria uma ótima vassoura se usasse seus punhos pra isso, sabia?
Desistindo de ir pela abordagem convencional, o Berserker pegou-o pelo ombro com somente uma mão, e puxando as forças do fundo de seu pulmão de tanta raiva, esmagou-o contra o chão.
Pedaços de terra voaram para todos os lados, rachaduras foram tão longe que Yasmin precisou se afastar ainda mais por medo de que o chão colapsasse.
O grandalhão soltou um suspiro de alívio, vendo metade do corpo do garoto afundado, indo assim na outra direção para terminar seu outro serviço.
O que ele não esperava, no entanto, era que houvesse um som amaldiçoador vindo atrás dele. Lucas saiu do meio dos escombros, sangue escorria por uma de suas narinas.
Ele limpou com as costas da palma, mas ainda saiu um pouco mais de sangue.
— Oh, não faz mal, assim eu testo melhor umas coisinhas que aprendi…
O sangue jorrou para fora, rodeando-o e flutuando como se fosse vivo, ao mesmo tempo que refletia a forte luz do sol e se modelava sozinho.
— Vamos começar a brincadeira de verdade?