Farme! Brasileira

Autor(a): Zunnichi


Volume 2

Capítulo 91: Dupla

Lucas ficou num tédio gigantesco. Só andar e evitar conflito trazia um grande peso a sua consciência, que entrou na competição tanto por causa da aposta quanto pra se exibir um pouquinho.

No entanto, ao lado de uma garota indefesa abaixo do seu braço e com uma mente racional operando, decidiu não fazer nada. Ele não sabia das capacidades dos outros, e quanto mais pudesse esconder as suas, melhor.

Mesmo sem nenhum equipamento, ainda tinha suas magias, artes, skills e o Olho do Lorde de Sangue, do qual não era possível tirar.

“Não é uma boa ideia arrancar o próprio olho, de qualquer forma.”

Somado a outros fatores menores, como o fato de que talvez fosse importunado mais tarde por Deus sabe-lá-quem para arranjar um trabalho, que inclusive nem precisava, preferiu se manter na sua.

Muitas vezes, durante o caminho, seus olhos caiam num drone timidamente voando para perto. Pelo tanto que se repetiu, havia até a possibilidade de um tarado ou pervertido ter interesse nele.

Dada as últimas experiências de Lucas, o pavor em sua cabeça não podia ser maior.

“Eu tenho que diminuir meu contato com pessoas malucas.” Enquanto pensava, seus olhos acabaram caindo na garota por baixo de seu ombro. — Ei, Yasmin, só pra saber… Você é normal, né? 

— Hã? Eu acho que sim? — Ela levantou a sobrancelha, com os braços estirados e pernas balançando. — Por que a pergunta?

— Só pra saber. É meio complicado achar gente normal hoje em dia.

— Concordo, senhor Lucas. Meu pai diz que é culpa do celular, e eu acredito.

— Levando em conta como as pessoas podem falar tanta besteira hoje em dia, eu diria o mesmo também. Pô, talvez seja até por conta do celular que eu tenha mudado de uns tempos pra cá…

Com certeza não foi culpa do celular, mas havia quem acreditasse e dissesse que o celular fazia maravilhas e desgraças na mente humana.

De qualquer forma, ele se atentou mais uma vez ao caminho, com um certo olhar de desdém e uma mescla de raiva por ter que continuar andando para o nada.

Felizmente, para aliviar tirar parte do sentimento, Yasmin conversava como uma boa colega. Chegava a ser estranho o quão sociável ela era.

Lucas não se acostumou a viver numa bolha social, muitas vezes um quarto e um controle era o bastante, mas entrar em contato com outras pessoas era uma experiência da qual não se acostumou.

Um suspiro saiu da sua boca, ele balançou a cabeça em busca de ignorar a sensação de desconforto se apoderando de seu ser.

— Senhor Lucas, está tudo bem? Você parece meio cansado.

— Estou sim, Yasmin, só tenho pensado demais em coisas que eu não deveria… — Revirou os olhos, procurando algo para jogar sua atenção.

Só nesse gesto, deparou-se com uma pessoa muito excêntrica, que poderia ser identificada há quilômetros de distância por ser uma parede larga e alta.

O rapaz sorriu, andando na direção daquele cara, o que fez os dois encontrarem os olhos.

— Opa, Theo! — disse Lucas, sorridente e acenando, enquanto Yasmin abaixo de sua axila só esboçava puro desespero. — Faz muito tempo que a gente não se vê. Como que tu tá, cara?

— Estou indo... — A resposta veio de forma lenta, mas ao mesmo tempo não houve nenhum sinal de agressividade. — Quem é essa aí com você...?

— É uma parceira. A menina pediu pra fazer duplinha comigo lá na recepção das inscrição e eu aceitei, tá ligado? 

— Entendo... que bom pra você... Aliás, por que estamos conversando assim? Não era para lutarmos?

— É, eu acho que sim...

Lucas levantou a cabeça, mais exatamente na direção de um drone que voava não muito distante, e cuja lente da câmera se focava nos dois.

— E aí, vai querer lutar comigo? Eu não pego leve só porque te conheço, sabe?

— Hum... seria interessante lutar, mas acho que temos problemas maiores...

Theo apontou para algo atrás de seu colega, e ele instintivamente olhou para trás. Havia uma turminha vindo na direção dos dois, cada um mais ranzinza que o outro e cheios de más intenções.

Lucas largou um suspiro, pondo Yasmin no chão e puxando as mangas, ao mesmo tempo que também tirou o blazer do terno e entregou nas mãos da garota junto da gravata.

— Segura pra mim? Não quero deixar muito sujo. 

— Cla-claro! — A garota deu uns passos para trás e apoiou as coisas sobre o ombro. "Caramba, ele tá parecendo um machão assim... Pera, Yasmin, o que tu tá pensando?!?"

— Ei, Theo, tem problema eu te pedir ajuda agora e recompensar mais tarde? — Ele estalou o pescoço e ergueu os punhos na sua já acostumada postura de boxe. — Só uma colaboração pra se livrar deles e aí a gente combina depois, que tal?

— Não vejo problema... — O cara bombado girou o pulso, a terra em volta de Yasmin se transformou numa cúpula fechada. — Também farei o favor dessa vez... Não gosto que quem não tem nada a ver seja afetado...

— É disso que eu tô falando!

Lucas nem perdeu tempo, aquele seu jeito apressado e caótico queria partir pra porrada ao invés de esperar pelos inimigos, então quando seu pé causou rachaduras ao redor de onde pisou, ficou claro o resultado da luta.

 

45% de Potencial Liberado.

 

Ele pareceu se teletransportar para perto dos oponentes, cerca de cinco e cada um com suas próprias habilidades que em breve seriam reveladas se houvesse algum tempo real para revidarem.

Seu punho voou na direção do que estava mais a frente, um homem forte cujos músculos eram um tipo de muralha impenetrável, mas quando o golpe acertou bem no meio do abdômen, essa muralha estremeceu.

Uma marca deu lugar a região atingida. O tal homem voou para trás como um boneco de pano, sua visão estava girando conforme se afastava, e a confusão logo se apoderou do corpo.

"O que? Como... Não, era só pra ser um trabalho de derrotar um rank C usando números!"

O mesmo sujeito deu um jeito de arrastar seus dedos pela terra e por os pés no cão novamente, mas uma dor infernal continuou tocando sua barriga, junto de uma cor meio avermelhada e vapor saindo. 

— Huuu... — Lucas olhou o resultado e demonstrou ficar meio impressionado. — Caramba, eu tô realmente muito bom…

Estilhaços de gelo vieram rumo ao seu rosto, mas sua cabeça se mexeu por instinto e esquivou de todos com uma fácil rotação.

Ao lado, havia um cara de cabelo espetado e prateado preparando uma leva de novos projéteis, da qual ele nem se incomodou direito, porque bastou um piscar de olhos para um círculo de fogo emergir ao seu redor.

A sua visão estava tapada, mas os outros sentidos aguçados, ao ponto dele ouvir a terra se mexendo ao seu redor. A silhueta de Lucas permaneceu tremulando no meio do fogo.

“Agora é a chance, ele não pode sair do lugar!”, pensou o homem que havia levado o socão na barriga, o suposto líder do grupo.

Sua mão se ergueu como se estivesse segurando um canhão na ponta dos dedos, e ele realmente estava, ao ponto de disparar balas de metal.

Theo ergueu um muro a tempo para evitar os tiros, no entanto, não houve sinal algum de Lucas, as únicas pistas eram os buracos na lona de fogo que ainda balançava.

— Acertei! 

Um pensamento de principiante, já que aquele garoto gostava de surpreender. Quando as chamas abaixaram, o corpo de Lucas não estava em lugar nenhum.

Havia somente um buraco no mesmo ponto em que ficou poucos segundos atrás.

Theo abaixou a parede, seus pés conectados ao chão repassavam uma ideia aproximada de onde Lucas se encontrava. 

Era uma propriedade nova de seu poder da qual ainda precisava se acostumar, mas muito útil em horas assim.

Ele sabia onde Lucas queria chegar, e concordando silenciosamente com o plano, mirou seus pedregulhos e moldou parte do terreno para isolá-lo com aquele manipulador de gelo.

— Fuu… — Theo controlou sua respiração, separou as mãos e flexionou os joelhos. — Concentre-se…

Seus olhos travaram naquela pessoa, os calcanhares pressionaram a terra abaixo das botas, estourando-as numa explosão repentina.

Somente o som foi escutado do outro lado daquela estranha parede, enquanto o homem com mãos capazes de atirar balas e outro companheiro ficaram de costas um para o outro buscando o alvo principal.

Os segundos seguintes se desenvolveram como uma cena de um filme de terror.

— Uaahh!

O homem tomou um susto, virando-se rapidamente na mesma direção, apenas para ver o corpo inteiro de seu colega desaparecer enquanto era puxado para baixo da terra.

Naquele instante, ele entendeu o que estava acontecendo e se moveu de um lado para o outro, temendo que o quer que estivesse abaixo de seus pés fizesse o mesmo.

Seus dedos dispararam diversas balas de metal, mas foi um reflexo desesperado, porque todas as prenderam no meio da grama. Talvez o excesso de filmes com atores atirando na água atrofiou um pouco o cérebro.

O chão se partiu atrás dele, o que revelou Lucas emergindo com o corpo sujo de terra. Seu oponente se virou a tempo de atirar dezenas de balas.

“Elas são muito lentas…”

 

Postura de Contra-Ataque Ativada.

 

Existia um uso secundário a essa postura. Não necessariamente precisava só atacar, podia também ser usado para repelir ou rebater coisas. Ou, até mesmo, aparar balas com a mão. 

Lucas apanhou cada esfera metálica como se fosse piada, suas palmas se mexeram em alta-velocidade como se fosse fazer um truque de mágica, truque este que consistiu na pegada de cada um dos disparos.

Nem ele próprio esperava isso acontecer, no entanto, não iria reclamar por fazer uma cena fodona de permitir as esferas esmagadas caírem feito uma cachoeira de suas mãos.

“Nossa, eu me sinto muito foda fazendo isso!” O sorriso maníaco se alargou de uma ponta a outra. — Ei, cabeça, não ligue se for a sua vez agora de levar umas porrada na testa.

— Nã-não se aproxime! — Ainda assustado, atirou mais e mais daqueles projéteis na direção do rapaz. — Maldito! Maldito! Fique longe de mim, seu monstro!

Lucas sequer se importou, concentrado demais em repetir o processo de agarrar as esferas de metal no meio do ar, achando até engraçado seu oponente insistir em algo tão fútil.

Depois de defender de todos, o garoto jogou a maioria de volta como o tiro de uma espingarda, e o homem à sua frente não pode fazer nada além de colocar as mãos na frente do rosto para se defender.

Infelizmente, seu erro foi justamente esse, pois no momento que perdeu Lucas de vista, acabou sendo acertado no meio da testa por uma de suas incontáveis esferas.

O que o rapaz fez foi meramente devolver o ataque ao usar toda a força do polegar para lançar a esfera como uma bolinha de papel, o único porém é a tamanha eficiência num gesto tão simples.

Ele observou o corpo daquele líder cair, e então, deu as costas e seguiu rumo a cúpula de pedra em que uma garota meio amedrontada foi presa.

— Yasmin, consegue me ouvir?

— Senhor Lucas! — a voz estava abafada do lado de dentro. — Eu não consigo enxergar nada e só ouvi umas coisas! Pode me tirar daqui?

Antes dela sequer continuar, o rapaz usou Demolir na rocha e criou um buraco no lugar, puxando-a para fora e pegando o terno de volta para por nos seus ombros.



Comentários