Farme! Brasileira

Autor(a): Zunnichi


Volume 2

Capítulo 90: Apostado

O humor entre as pessoas que assistiam oscilava entre plena indiferença, igual quando o Brasil ia às olimpíadas, e excitação sem fim, igual o Brasil em época de copa.

Os ricaços, aqueles que mais apostavam nesses eventos que atraia muita gente, eram os principais quando se tratava de reações.

Alguns apostaram nas pessoas erradas e perderam seu dinheiro indevidamente, enquanto outros caíram com uma fortuna gigante nos braços.

A principal catalisadora desse dinheiro era uma garota de moletom amarelo que mascava chiclete, ocasionalmente encarando a competição e outras vezes fechando uma aposta com um desavisado, o que rendia uma quantia agradável de dinheiro.

Era tanto que essa mesma menina acabou ganhando a primeira aposta com dinheiro que nem tinha, e agora seu pix estava gordo.

"Boa, Theo. Sabia que era uma boa ideia te trazer aqui!”

O sorriso no rosto de Alice — outra personagem que fora deixada de lado (esquecida) por 80 capítulos. — cresceu grandemente, como se estivesse saboreando uma boa comida numa escola pública depois de meses de bolacha creme crack e Nescau com gosto de água. 

Na sua frente, havia uma mesa com diversas cadeiras e peças de plástico coloridas que eram usadas para definir a quantia apostada num participante, agindo como fichas de poker, mas as cartas eram os concorrentes.

Uma montanha de fichas estava ao seu lado direito, quase montando um castelo contra os demais apostadores.

— E aí, como vai ser? — provocou, mostrando a língua em seguida. — Ainda tem uns bons momentos até a parada terminar, temos tempo. Bora, bora, não faz mal só uminha...

Ela empurrou uma parte da pilha para frente, parecia até que orelhinhas de raposa cresceram na sua cabeça de tão ardilosa que suas táticas eram.

Todos ali sabiam que não teria como competir direito, mas ainda assim queriam ir mais uma por vez por causa da fé cega de que a sorte dela estava prestes a acabar.

No entanto, antes de começarem, uma pessoa puxou a cadeira e se sentou na cadeira, colocando uma bolsa cheia até o topo para jogar esse joguinho inofensivamente viciante.

— Viviane, eu espero que você não se importe... Hihihi. — A mãe de Lucas arrumou seu vestido e tomou o lugar. 

— Uou… — Alice parou por um momento, meio atordoada pela aparição repentina. — A senhora não tá indo um pouco longe, moça? Apostar não é legal pra certas pessoas…

O motivo para a menina querer se afastar não era porque fazia mal, mas porque ela conhecia bem aquela figura. Era uma renomada dama do qual cuidava de um filho que virou manchete esses dias.

— Ownt, eu agradeço a compaixão, fofinha, mas eu curto uma adrenalina de vez em quando. Diria que é até de família, porque meu filhinho é do mesmo jeito, se é que me entende.

Ela abanou a mão, e claro, como a boa mãe estrela que era, não perderia sua oportunidade em se gabar das suas crias. 

Foi um trabalho gigante para cuidar e fazer eles crescerem, logo, seria justo que usufruísse dos frutos de seu trabalho duro, não tinha problema nenhum em comentar sobre eles.

— Dona — falou Viviane, pondo uma das mãos sobre o ombro da mulher —, por favor, não se distraia muito, eu ainda quero lhe apresentar a algumas pessoas que possam te interessar.

— Não seja apressada, Vivizinha, sente também e vamos brincar um pouquinho! — retrucou ela, puxando-a para um assento ao seu lado. 

O clima ao redor daquelas duas moças parecia excelente, diferente dos demais que resolveram se afastar  para conversarem com qualquer um que estivesse naquela sala de eventos.

A mesa logo diminuiu para apenas elas três, o que trazia uma energia bastante tristonha para o lado de Alice, que por causa de uma pesquisa prévia, sabia quem era as duas pessoas à sua frente.

Viviane era filha de uma família rica e bastante ativa na captura de monstros, tanto que parte dos que seriam liberados num futuro próximo vieram do bolso deles.

Já a outra mulher era um completo mistério, ninguém sabia seu nome, mas reconheciam a quem era relacionada, e por isso a maioria ficava meio receosa de conversar ou até mesmo se aproximar.

“Eu me meti numa furada…”, pensou Alice, em tempo de sair correndo e empurrando um pouquinho para trás as fichas.

— Oh, que surpresa agradável…

Outra pessoa tomou um lugar, mas ao invés de ser um qualquer, era um senhor velho e de expressão gentil, de hanfu preto com dourado e com uma barbicha curta e olhos cansados.

— Perdão a intromissão, senhora — disse o sujeito ao lado, Xing Xong, para a mulher mais velha da mesa. — Agradeço por estar com um bom estado de saúde. Permita-me apresentar…

— Não precisa, Xong — interrompeu o velho, erguendo a mão ao mesmo tempo. — Sou o mestre do garoto ao meu lado. Escutei sua conversa de revesgueio e me interessei, há algum problema na minha participação?

As três encararam o sujeito, Alice demonstrou um espanto absoluto e queria se transformar num avestruz, enquanto Viviane só esboçou uma certa surpresa ao levantar as sobrancelhas.

Quanto à matriarca, ela esboçou um rosto bastante sério e seus olhos analisaram até o fundo da alma daquele homem. Sua intuição formigava por dentro, alertando-a de algo que não via nessa pessoa.

— Fique à vontade, bom moço. Também é um prazer vê-lo novamente, Xong querido. 

O chinês sortudo acenou com a cabeça positivamente e se manteve de pé, mas já o Patriarca soltou uma leve risadinha que estremeceu a alma da garota de moletom amarelo.

Por que tinha que estar no meio dos figurões numa hora como essa? Como se não bastasse aquelas duas, tinha o tal indivíduo com o título de “Trevo Dourado da China” e o suposto homem mais forte do Brasil atualmente.

A Seita do Sol Nascente era bastante conhecida na cidade e nos estados próximos, no entanto, o motivo mais especial para tanta fama era aquele velho, que parecia mais acabado que um maracujá super maduro.

Este tal homem, somente conhecido pela alcunha de “Patriarca”, era supostamente uma das pessoas mais fortes do país por ter atingido um nível de pico diferente nas suas artes místicas.

A maioria gostava de dizer que tal coisa como “cultivo” era ladainha, um folclore muito bem construído na cabeça dos outros, no entanto, o Patriarca era uma antítese a essas palavras.

E, exatamente por causa disso, Alice não podia se sentir mais desconfortável. Às vezes pensava se até sua respiração era julgada, quem sabe sua postura na cadeira também fosse.

Por se prender tanto nos próprios pensamentos, não reparou que na verdade o olhar do velhaco se dirigia à mulher mais velha do outro lado da mesa. 

Faíscas invisíveis oscilavam no ar entre os dois. Era alguma suposta rivalidade que não havia captado?

“Pensando bem, o filho da madame ali e o prodígio da Seita do Sol Nascente estão na competição, o que quer dizer que…”

Sim, talvez houvesse algo nas entrelinhas. Uma mãe e um filho, um avô e um neto, os pontos se conectavam muito bem para o seu gosto. No entanto, a realidade estava longe do que se acreditava.

— Não esperava vê-la aqui, Cristina — disse o Patriarca, com uma pequena tosse. — Desde quando você permite seus filhos a irem a esportes tão radicais?

— O que faço com meus filhos não é da sua conta — respondeu a mulher mais velha, seus olhos ficaram mais afiados que facas. — Eu devia perguntar o mesmo. Desde quando você permite seu precioso pupilo que chamou diversas vezes de… como era mesmo? Ah, “coelhinho branco”, de participar também? Não só isso, também levou aquela outra menina mimada consigo…

— Huhuhu, a idade deixa os outros mais ousados mesmo… Há bastante tempo faço isso, não é novidade.

— Aham, sei… e sim, a idade deixa os outros mais assim mesmo, além do mais, você veio tão casualmente conversar comigo e ainda por cima quis começar me chamando pelo meu nome… não acha que está ficando senil por causa da idade?

— Também lhe digo o mesmo, não era para você estar comprando o mundo com sua carreira de sucesso a essa altura?

Uma veia gigantesca surgiu no rosto da mãe, que cerrou seus punhos e ameaçou subir na mesa para espancar aquele cadáver vivo com todo seu ser.

No entanto, Viviane interviu ao pôr as mãos rapidamente em seus ombros, puxando-a de volta à cadeira. Ela queria entender ao que exatamente se referiam, mas, a julgar pela reação de Cristina, achou melhor manter quieto.

Com um suspiro, Viviane olhou de canto para Xing Xong, seu olhar dizia muito por conta própria e os dois não queriam uma briga incendiando naquele momento. 

O chinês sortudo beliscou de leve o braço de seu mestre por baixo da mesa, o que o fez ter certas ciência de si e reparar em como estava indo longe demais.

— Desculpe, fui mal-educado… — disse, enfim levantando-se da cadeira. — Eu devo ter estragado o clima, então irei na frente para assistir mais de perto ao evento…

Ele somente acenou e deu as costas, enquanto seu pupilo Xong fez uma reverência muito respeitosa, que Cristina dispensou ao dar um sinal para ir embora.

Ela estava irritada, vermelha de raiva e fervilhando cada partícula de água dentro de seu cérebro. 

Como poderia permitir alguém debochando dela e de seus bebês queridos? Se fosse presidente ou uma tirana, tal coisa seria passível de morte. 

Respirou fundo, querendo que aquele ar refrigerasse sua mente furiosa. Talvez, na volta de casa, fosse uma boa ideia comprar um saco de pancadas e luvas para colocar em seu quarto.

— Dona Cristina — chamou Viviane, encarando-a —, eu irei brincar um pouco, então por enquanto não pense muito e só escolha em quem você quer dar um lance. Vai ser tudo por minha conta.

— Hah, Vivizinha, você é uma benção. — Ela arrumou a franja do cabelo e piscou diversas vezes, murmurando baixinho: — Quem dera o Lucas percebesse isso…

— Hum? Disse alguma coisa, dona? 

— Não é nada, é só eu pensando em como meu filho é lesado, cruzes! — Enfim, virou o rosto para Alice, que estava em tempo de se esconder debaixo da mesa. — Ei, garotinha, por que você tá aqui sendo nova assim?

— Hã? Fa-falou comigo? — A menina de moletom amarelo apontou para si, recebendo um aceno de cabeça em resposta. — Meu… o meu irmão mais velho tá participando…

Alice saiu de seu esconderijo de forma meio tímida, mas não sabia direito como se comportar ou o que fazer. 

Aquelas duas mulheres tinham mais estilo e beleza que ela, logo, era como se estivesse sendo meio diminuída no meio de duas beldades.

No entanto, Cristina não pensava o mesmo. A verdade era que achava a garotinha uma fofura, ao ponto de querer apertar suas bochechas. 

Diria que parecia até uma versão ideal de uma filha que nunca teve, já que só cuidou dos meninos. 

Com uma risadinha fraca, a mulher apoiou ambas as mãos na mesa e analisou mais um pouquinho a garota, antes de virar a cabeça rumo às telas no canto da sala que projetaram as gravações da competição.

— Oh, olha ali, pelo visto meu filhinho querido vai bater em mais alguém de novo… 

— Sério? — perguntou Viviane, levantando a sobrancelha. — Tava demorando, esse cabeça oca só tem evitado qualquer coisa e ido de lá pra cá quando viemos assistir a ele… 

Hum? — Alice também observou o telão. — Mas aquele… aquele é o…

Para resumir a cena, Lucas estava parado na frente de um gigante bombado, meio moreno que mostrava uma expressão nada agradável para ninguém.

A preocupação de Alice disparou como um foguete indo para a órbita da Terra. Não, era uma péssima hora para isso acontecer, a pior possível!

— Então, vamos apostar?  — indagou Cristina para a garota, esboçando um largo sorriso, que pareceu ameaçador de tão grande. — Eu vou colocar tudo no meu filho.



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