Volume 1

Capítulo 5: Laços de Amizade

“Hmm... acho que está na hora de dormir.”

   Acabava de passar da meia-noite quando o relógio na mesa da sala tocou. Naomi estava prestes a ir para a cama, estendendo a mão para o interruptor para apagá-las, quando de repente...

   Ding dong*.

   O interfone tocou pelo apartamento.

     ...Uma visita essa hora?

   Franzindo a testa em desconfiança, ele verificou o monitor na entrada, mas não havia nada na tela.

   Este apartamento tinha um sistema de fechadura automática, o que significava que qualquer pessoa que tocasse a campainha da entrada teria sua imagem exibida no monitor. Como não havia vídeo, isso significava que alguém havia ignorado a entrada completamente e estava tocando a campainha diretamente do lado de fora de sua unidade.

   Naomi não tinha vizinhos próximos, e a única pessoa que tinha uma chave reserva e poderia passar pela entrada sem permissão era Kasumi. Mas se fosse Kasumi, ela teria simplesmente entrado em vez de tocar a campainha.

   Sem querer ignorar e ficar assustado, ele inclinou a cabeça e apertou o botão de falar do interfone.

“K-Katagiri-san...! P-Por favor...! M-Me ajude, por favor...!”

   A voz assustada e trêmula de Yui ecoou pelo alto-falante.

 

◇         ◇          ◇

 

Eeeeek (grito feminino)!! Está se mexendo!! Está olhando para mim!!!”

   Yui, vestida com um pijama azul-claro, agarrou-se desesperadamente às costas de Naomi enquanto gritava com o rosto branco como um fantasma, apontando para o espaço embaixo da cama.

“C-Calma! É só uma barata! Não vai fazer nada com você!”

“Não, não, não, não!! Não se trata de morder ou arranhar, eu simplesmente não consigo lidar com isso, é um problema biológico. NÃOOOO!!”

   Meio chorando e colada às costas dele, Yui não o soltava. Naomi a arrastou consigo enquanto preparava a lata de repelente que havia trazido de casa e se agachou para espiar embaixo da cama.

   Nunca imaginei que a primeira vez que entraria no quarto de uma garota da minha idade seria para matar uma barata.

[Kura: Não têm como não pensar em várias coisas com essa cena kakakaka]

   Mas com Yui chorando a plenos pulmões, sem se importar com o que os vizinhos pudessem pensar, me preparei e entrei — apenas para ser recebido por um aroma doce que eu não conseguia descrever, flutuando suavemente em meu nariz.

     É este... aquele “cheiro de menina” de que sempre falam em mangás de romance...!?

   Mesmo morando no mesmo condomínio, a diferença no cheiro dos nossos quartos me fez pensar se essas descrições eram realmente verdadeiras. Dei um tapa na bochecha para afastar os pensamentos desnecessários.

“A-ali! Debaixo da cama! Estava lá no fundo!!”

“E-eh...? Quer dizer, qual é, ir para debaixo da cama de uma garota é um pouco...”

“N-nããããoooo…! Meu futon! Minhas fronhas! Sai fora, coisa nojenta! Nunca vou conseguir dormir aí se você tocar na minha cama! Sai, sai, sai, sai — Eeeeeeeeeeeeeeek!!! (Inglês britânico)

“Ei, ei! Está tudo bem, pare de se agarrar em mim! Eu cuido disso, então se acalme logo!!”

 

 

◇         ◇          ◇

 

 

   Cerca de dez minutos depois.

“Obrigada…! Muito obrigada…! Eu nem sei como te agradecer…! Uuuuh… sniff, uuuuugh…!”

   Yui, com os olhos marejados e as pernas bambas, agradecia repetidamente a Naomi com tudo o que tinha.

“E-está tudo bem, sério... Você não precisa mais chorar...”

   Pego de surpresa pela enxurrada de inglês em pânico de Yui, peguei sua mão delicadamente — ela mal conseguia ficar de pé — e a ajudei a sentar na cama. Uma vez sentada, ela gradualmente começou a se acalmar.

   ...Agora que penso nisso, isso é meio que um grande problema, não é?

   Enquanto olhava para Yui, que fungava, engoli em seco, tentando processar a situação em que me encontrava.

   Já passava da meia-noite e lá estava eu, no quarto de uma garota — com a dita garota agarrada a mim de pijama. E agora ela estava sentada bem na minha frente, com a guarda completamente baixa, com alívio estampado no rosto.

   Só de me dar conta de como a cena era comprometedora, minhas bochechas queimaram. Desviei o olhar, sentei-me em uma das cadeiras perto da mesa na sala de estar e belisquei minha bochecha com força para me firmar.

     ...Não que houvesse algo romântico acontecendo. Yui tinha acabado de surtar e se agarrado a mim, e a atmosfera não era nada doce ou sonhadora.

“…………”

   Agora que as coisas haviam se acalmado, comecei a realmente absorver o ambiente ao meu redor.

   A casa de Yui era mobiliada com móveis e decoração brancos elegantes. As cortinas e o tapete incorporavam um rosa suave que dava ao espaço uma vibe refinada e feminina.

   Um leve aroma de tratamento capilar e creme corporal pairava no ar, e a fragrância desconhecida do sexo oposto me deixava nervoso, incapaz de relaxar completamente.

   Assim que se recompôs, Yui se levantou e silenciosamente vestiu um cardigã por cima do pijama.

“Desculpe por ter perdido a cabeça daquele jeito. Vou fazer um chá para a gente — por favor, sente-se e relaxe.”

   Ela assentiu com a cabeça, pedindo desculpas, e foi em direção à cozinha. Seus longos cabelos, ainda levemente úmidos do banho, balançavam enquanto ela se movia, liberando outro aroma doce que fez cócegas no meu nariz.

     ...Mesmo que fosse uma emergência, ela não está um pouco indefesa demais?

   Não havia dúvida de que Yui era incrivelmente linda. E quando sorria, era quase fofa demais para aguentar.

   Não que eu a visse sob uma luz romântica — mas, de um ponto de vista objetivo, eu definitivamente poderia dizer que ela estava em outro nível.

   Olhei para ela parada na cozinha.

   Seu pijama era de um azul pastel suave — simples, porém feminino. Seu cabelo comprido, ainda não totalmente seco, estava frouxamente preso com um elástico adorável. E sua pele recém-lavada brilhava com uma maciez que me fez sentir estranhamente constrangido. Havia algo simplesmente desarmante em como ela parecia à vontade.

“Desculpe por fazê-lo esperar. Chá quente está bom?”

“Ah, sim. Está perfeito. Obrigado.”

   Ela colocou duas canecas na mesinha e sentou-se na cadeira à minha frente.

   Tomei um gole do chá morno, e o calor se espalhou lentamente pelo meu corpo, me acalmando um pouco.

“Sinto muito... por causar tanta comoção a esta hora.”

“Não, sinceramente, estou meio aliviado que tenha sido só isso. Você estava tão em pânico que pensei que algo sério tivesse acontecido.”

“...Sinto muito mesmo.”

   Eu disse isso meio brincando, mas Yui abaixou a cabeça, seu rosto ficando vermelho até as orelhas enquanto segurava a caneca com as duas mãos e tomava pequenos goles.

 

◇         ◇          ◇

 

“Eu vi aquela coisa, e simplesmente... entrei em pânico. Antes que eu percebesse, eu já tinha ligado o interfone para o seu quarto, Katagiri-san...”

“Não se preocupe. Eu disse para você vir até mim se alguma coisa acontecesse, não disse?”

“Sim... Obrigada. De verdade.”

   Ainda parecendo um pouco envergonhada, Yui deu um pequeno sorriso, sua expressão finalmente se acalmou.

   Com nós dois finalmente relaxados, a atmosfera normal retornou e eu pude soltar um suspiro de alívio.

“Então, no Reino Unido, não existem ba — uh, ‘Bs’?”

   Quando eu disse a palavra, Yui visivelmente estremeceu, então rapidamente mudei para a inicial.

“‘Bs’ invasoras... Ouvi dizer que elas existem, mas nunca vi um em nossa casa.”

“Você nunca viu um, mas só de ouvir o nome te assusta?”

“Não, eu já vi uma antes.”

“Hã?”

“Hã?”

   Inclinamos a cabeça um para o outro em perfeita harmonia.

“Mas... você disse que nunca viu um no Reino Unido?”

“É isso mesmo. Nunca vi uma no Reino Unido. Mas vi uma no Japão, há muito tempo. Deixou uma impressão tão assustadora que me lembro muito bem.”

   Ela estremeceu levemente, como se estivesse revivendo aquele encontro traumático.

“Espera aí, no Japão? Há muito tempo?”

   Agora era a minha vez de inclinar a cabeça, e Yui soltou um pequeno “Ah”.

“Desculpe, eu nunca mencionei isso, né? Morei no Japão até os cinco anos. Foi quando as vi algumas vezes.”

“Ah, entendi. Isso explica.” Assenti, entendendo.

   Isso explicava por que ela falava japonês tão fluentemente, porque se transferiu repentinamente para cá para estudar e por que não parecia ter dificuldades com a vida no Japão. Saber que ela já havia morado aqui antes fez tudo se encaixar.

   E se ela viu uma ‘B’ naquela época, a história se encaixava.

“Então isso significa que Villiers é meio japonesa, meio britânica?”

“Sim. Minha mãe é japonesa e meu pai é britânico.”

   Enquanto ela assentia, seus longos cabelos negros balançaram suavemente.

   Isso explicava tudo: seu nome em inglês, seus cabelos negros, seus olhos azuis-claros e seus traços faciais com uma suavidade nitidamente japonesa. Tudo fazia perfeito sentido agora.

   Enquanto eu olhava para seus cabelos e assentia, Yui pareceu notar e levou a caneca aos lábios novamente, escondendo o rosto com uma expressão tímida.

“Aceita mais?”

“Ah, não — desta vez, deixa que eu pego. Fique sentada.”

   Me sentindo um pouco constrangido por encará-la, levantei-me e fui para a cozinha — apenas para soltar um suspiro involuntário.

“...Uwou.”

   O micro-ondas, a torradeira e a geladeira eram todos de última geração. E até mesmo os pratos e utensílios de cozinha cuidadosamente dispostos nas prateleiras eram de marcas famosas e sofisticadas que qualquer um reconheceria.

     ...A Villiers é realmente uma princesa, né?

   Ela disse que nunca tinha entrado em uma cozinha antes e, considerando o quanto ela odiava gastar dinheiro — a ponto de pular o jantar — provavelmente foram os pais dela que compraram tudo isso para ela quando começou a morar sozinha.

   Enquanto eu estava ali, tomada pelo medo e pela admiração de quanto tudo aquilo devia ter custado, me vi olhando para os utensílios de cozinha brilhando, sem um único grão de poeira. Então, franzi as sobrancelhas quando algo começou a parecer estranho.

“Esta cozinha... você mal a usa, não é?”

   Quando apontei como os utensílios da cozinha pareciam praticamente intocados, Yui deu um sorriso tímido e assentiu.

[Moon: “Essa frigideira está implorando para ser usada…” | Del: Congrats! | Yoru: Qualquer semelhança é mera coincidência.]

“Tentei seguir seu exemplo, Katagiri-san, e cozinhar para mim algumas vezes... mas o gosto ficou horrível, e eu não conseguia nem acertar as medidas. Então percebi que comprar bentos e pratos prontos com desconto era muito menos trabalhoso — e mais barato também.”

   Ao ouvir isso, olhei para a lixeira no canto da cozinha. De fato, havia vários recipientes de plástico empilhados de refeições prontas e macarrão instantâneo.

   Por um momento, fiquei preocupado que ela estivesse pulando refeições de novo, mas parecia que não era o caso.

     É verdade que cozinhar para si mesmo nem sempre é mais barato...

   As pessoas sempre dizem “cozinhe em casa para economizar dinheiro,” mas depois de morar sozinha por um ano, aprendi da maneira mais difícil que isso nem sempre é verdade.

   Cozinhar barato só é possível quando você pretende cozinhar barato — supondo que você já tenha os utensílios e temperos básicos, saiba escolher e comprar ingredientes, aproveite as sobras, divida as coisas corretamente e controle as datas de validade, a lavagem da louça, a limpeza, o descarte do lixo... Se você não estiver acostumado, acaba custando mais e dando muito mais trabalho.

   Mesmo que você consiga cozinhar, não há garantia de que ficará gostoso. E mesmo que seja barato, não há como saber se será nutricionalmente equilibrado.

   Para alguém como Yui, que estava focada em minimizar despesas, comprar descontos em supermercados ou comida instantânea fazia todo o sentido.

   Sabendo como eram as refeições dela agora, levei a mão ao queixo e pensei:

     ...Há uma outra maneira de ela economizar dinheiro.

   Seria mais nutritivo do que o cardápio atual. E provavelmente teria um sabor melhor do que macarrão instantâneo ou bento com desconto, pelo menos.

   Mas, dada a natureza atual do nosso relacionamento, não era algo que eu pudesse simplesmente propor — ainda não.

     Ainda assim... se eu já estou fazendo isso de qualquer maneira...

   Não consegui chegar a uma conclusão, mas trouxe o chá de volta para a mesa e tomei outro gole enquanto refletia sobre o assunto.

“...Katagiri-san, você não pergunta nada, não é?”

   Yui murmurou, com os olhos baixos enquanto segurava a caneca com as duas mãos.

“Pergunto o quê...?”

“Qualquer coisa.”

   Ainda sem entender direito, olhei para ela, e ela deu um fraco sorriso.

“Você não pede nada, mas é gentil e me ajuda. Não espera nada em troca. Não tenta me usar.”

   Sua voz era suave e tranquila, mas tinha peso.

   Yui continuou, seu sorriso gentil, este estava tingido de algo caloroso. “Por que você é tão gentil comigo, Katagiri-san? Eu nem sou sua amiga.”

   Suas palavras foram simples e diretas.

   Então respondi com a mesma honestidade.

“...Eu não sou uma pessoa gentil.”

   Não sou do tipo que demonstra amor e gentileza com todos. Não abro mão do meu tempo livre para fazer trabalho voluntário. Não assisto a tragédias no noticiário e perco o sono por causa delas.

   É por isso que eu não conseguia concordar em ser chamado de “gentil”. Balancei a cabeça.

“Eu só... vi você, Villiers, lutando na minha frente.”

   Era só isso. Eu via uma parte de mim nela — meu eu do passado — e só queria ajudar. Não era gentileza por ela. Era egoísmo.

   Dei um sorriso irônico e dei de ombros, mas Yui balançou a cabeça gentilmente, ainda sorrindo suavemente.

“Mas para mim, isso é gentileza. Suas palavras, suas ações... me deram forças para seguir em frente. Se não fosse por você, acho que não teria mudado nada. Não é motivo suficiente para dizer que você é gentil?”

“...Villiers.”

   Yui olhou diretamente para mim, com a voz calma e sincera.

“Não importa o que os outros digam, eu acredito que você é uma pessoa gentil, Katagiri-san. Mesmo que digam o contrário, fui ajudada pela sua gentileza. Isso é o suficiente para mim.”

   Sem constrangimento, apenas palavras honestas e um sorriso sincero.

   Aquela simples expressão de gratidão dissipou a névoa em meu peito.

     ...Certo. O que eu tenho feito não é gentileza — é apenas autossatisfação.

[Moon: “Por que você está fazendo tudo isso por mim?” “Por autossatisfação… Você tem um estilo de vida muito problemático…” (modificado)]

   Convidá-la para jantar, intervir quando aqueles caras a estavam incomodando, ajudá-la a comprar um celular — nada disso era sobre ser legal. Eu fazia isso porque queria. Só isso.

   Não era sobre parecer bem ou ser visto como um cara legal. Eu agia puramente de acordo com o que tinha vontade de fazer.

   Ajudei Villiers simplesmente porque ela estava se esforçando na minha frente — e eu não podia simplesmente ignorar isso. Alguém já fez o mesmo por mim, e agora eu estava apenas retribuindo.

“É realmente delicioso.”

   Aquela boquinha, cheia de karaage, mastigando de prazer.

“É uma sensação tão maravilhosa, não é? Fazer alguém feliz assim.” Ela até fez biscoitos para me agradecer.

“Não sei o que teria acontecido se eu não tivesse te conhecido, Katagiri-san.”

   Ela falou da nossa conexão com genuíno carinho.

     ...Eu realmente gosto de ver a Villiers sorrir.

   Talvez só isso já fosse motivo suficiente. Eu não precisava de uma justificativa ou definição perfeita do nosso relacionamento para agir.

   E com essa percepção, a névoa no meu peito finalmente se dissipou — e a proposta que eu vinha segurando escapou da minha boca sem hesitação.

“Ei… eu tenho uma sugestão.”

   As palavras de Naomi fizeram Yui levantar a cabeça.

“Que tal jantarmos na minha casa a partir de agora?”

“Juntos...? Quer dizer, eu e… você, Katagiri-san?”

“É. Eu e você, Villiers.”

   Yui piscou surpresa, arregalando os olhos ligeiramente diante da sugestão completamente inesperada de Naomi.

“Cozinhar para uma ou duas pessoas não muda muito o esforço. E mesmo que eu faça o suficiente para dois, o custo dos ingredientes não dobra. Se dividirmos, o custo por pessoa cai bastante. Então, se ‘dividirmos’ o jantar, é um ganho para todos, certo?”

“Um ganho para todos, hein...”

   Enquanto ouvia a proposta, Yui franziu as sobrancelhas levemente e deu um sorriso fraco, como se pedisse desculpas.

“Essa é uma oferta muito gentil para mim, mas não seria um fardo ainda maior para você, Katagiri-san?”

“Não, de jeito nenhum. Eu também posso economizar dinheiro, e se você ajudar com a preparação e a limpeza, é metade do esforço. É por isso que eu disse que beneficia a nós dois.”

“Bem... quando você coloca dessa forma, eu acho...”

   Ainda insegura, Yui olhou para baixo e parou de falar. Naomi coçou o nariz dele, parecendo um pouco tímido.

“E, bem... tem outra grande vantagem para mim também.”

“Uma grande vantagem?”

“É. Você sempre come minha comida como se fosse a melhor do mundo.”

   Naomi respondeu com um sorriso um tanto tímido.

   Comer com alguém era muito mais divertido do que comer sozinho — e ver Yui apreciar a comida que ele preparava dava sentido a isso.

   Se algo tão pequeno a fazia sorrir, então, honestamente, ele não se importava nem um pouco.

“É por isso que estou dizendo que funciona para nós dois.”

“Katagiri-san...”

   Yui deu um sorriso hesitante e feliz, estreitando os olhos gentilmente.

“Você é realmente gentil, Katagiri-san.”

   Enquanto soltava uma risada suave, Naomi sorriu também, coçando a ponta do nariz dele novamente.

   Yui pousou a caneca e sentou-se ereta, abaixando o olhar como se estivesse se preparando, e então começou a falar lenta e cuidadosamente.

“Eu nasci de mãe japonesa e pai britânico e cresci no Japão. Desde que me lembro, éramos só eu e minha mãe — meu pai nunca estava por perto.”

“Villiers…?”

   Os suaves olhos azuis de Yui encontraram os de Naomi, pedindo silenciosamente permissão para continuar.

   Naomi entendeu e permaneceu em silêncio.

“A família do meu pai é de uma antiga casa nobre, então eles não permitiram que ele morasse no Japão com minha mãe. Quando eu tinha seis anos, minha mãe faleceu. Sem parentes próximos, fui acolhida pela família do meu pai na Inglaterra.”

   Seu olhar caiu para a mesa enquanto ela franzia as sobrancelhas, trazendo à tona memórias amargas do passado.

“Sendo de uma casa como aquela, uma criança mestiça como eu nunca foi bem-vinda. Eles me tratavam como um incômodo. Meu pai nunca me defendeu ou sequer prestou atenção em mim. A única que ficou do meu lado foi minha meia-irmã.”

   Yui manteve a voz calma e neutra, seus lábios formando um leve sorriso que tentava mascarar as emoções subjacentes.

“Então eu vivi com cuidado, tentando não incomodar ninguém, tentando não me destacar. Mas, eventualmente, um grande incidente aconteceu... e não havia mais lugar para mim naquela casa. Foi quando minha irmã providenciou para que eu estudasse no exterior e me mandou para o Japão.”

   Ela respirou fundo e tomou um gole de chá, franzindo as sobrancelhas suavemente.

“Foi assim que eu vim parar aqui.”

   Naomi não conseguia encontrar palavras enquanto ouvia o relato sem emoção de Yui. Seus olhos caíram sobre a mesa.

   O sorriso em seu rosto era fraco e resignado, o tipo que surge depois de desistir por um longo tempo.

   Era completamente diferente dos sorrisos suaves e genuínos que ela às vezes lhe mostrava — e vê-lo fez algo doer profundamente no peito de Naomi.

“…Entendo.”

   Então Villiers se deixou levar pelas expectativas de sua família aristocrática e foi enviada sozinha para o Japão.

   Mudar-se pouco antes do início do ano letivo, não querer tocar na mesada, sempre se recusar a depender dos outros — agora ele entendia o porquê.

   Uma menina que nem sequer estava no ensino fundamental havia perdido a mãe e sido levada para um país estrangeiro onde não falava a língua, cercada de inimigos e má vontade.

   O fato de uma criança de seis anos só conseguir suportar isso em silêncio... Era um nível de dor que Naomi nem conseguia imaginar.

   Yui notou os punhos cerrados dele sobre a mesa e suavizou um pouco a expressão.

“Mas comecei a pensar — ​​talvez esta seja a minha chance de mudar. Sair de casa... conhecer você, Katagiri-san... talvez fossem coisas que eu precisava para crescer. É nisso que acredito agora.”

“...Villiers.”

[Moon:... Eu quero abraçar a Villers… Yuizinha]

   Quando Naomi olhou para cima, Yui o encarava com um sorriso gentil.

   Não era o sorriso frio de antes, mas um sorriso caloroso e reconfortante — um que o envolvia como a luz do sol.

   Aquele único olhar acalmou a turbulência que crescia dentro dele.

“Eu já disse isso antes, mas... eu quero mudar. Não quero continuar vivendo de cabeça baixa. Foi a gentileza de alguém que me fez sentir assim. Então, por favor... deixe-me dizer isso corretamente.”

   Com uma expressão clara e serena, Yui olhou diretamente nos olhos de Naomi e fez uma reverência profunda e lenta.

“Até que eu consiga me sustentar sozinha, você poderia me ajudar? Estou pedindo.” Suas palavras eram cheias de uma determinação forte e inabalável — ditas por sua própria vontade.

   Ao vê-la se curvar daquele jeito, algo quente cresceu no peito de Naomi.

     ...Quando a Villiers disse que queria mudar, isso demonstra o quanto ela quis dizer isso.

   Uma jovem, criada sem ninguém em quem confiar, com medo de ser um fardo, viveu sua vida em silêncio, se escondendo nos bastidores.

   Ela havia sido expulsa da única casa onde seu único parente consanguíneo — seu pai — ainda vivia. E, ainda assim, ela olhou para frente e pediu: “Por favor, me ajude” com suas próprias palavras.

   Esse tipo de força apertou algo, no fundo do peito de Naomi.

“Villiers, olhe para cima.”

   Quando Yui levantou a cabeça, seus lindos cabelos negros caíram suavemente sobre seu rosto. Naomi encontrou seus olhos azul profundos diretamente enquanto ele continuava.

“Vamos parar com essa conversa de pedir ajuda ou precisar de favores.”

“Parar com isso...?”

“É. Em vez de pensar em termos de uma pessoa ajudando e a outra sendo ajudada, não seria melhor se nos ajudássemos apenas porque somos amigos?”

“Amigos...?”

“Isso mesmo. Amigos.”

   Yui piscou, ainda insegura, mas Naomi assentiu firmemente enquanto ele se repetia.

   Ainda mantendo o olhar fixo em seu rosto, Yui ecoou em um sussurro fraco: “Amigos...”

“Não posso fingir que entendo completamente o peso do que você carregou ou a força que isso exigiu. Mas se eu posso ser alguém que te apoia, então quero fazer isso em pé de igualdade. Quero ser seu amigo, Villiers.”

“Katagiri-san...”

“Se um amigo está com problemas, você não precisa de um motivo ou de um convite para ajudar. Certo?”

   Contendo a vontade de desviar o olhar por vergonha, Naomi manteve o olhar fixo nela enquanto falava.

   Era sua maneira de demonstrar sinceridade — por Yui, que havia lhe confidenciado um passado doloroso, e pela decisão que tomara por si mesmo.

   Palavras que ele normalmente não seria capaz de dizer, ele disse agora. E os olhos azul-claros e semicerrados de Yui começaram a brilhar com lágrimas.

“...Sim. Eu também gostaria de ser sua amiga, Katagiri-san.” Sua voz tremeu levemente enquanto ela sorria.

   Não era o sorriso equilibrado e polido que ela costumava usar — ​​era puro, jovial e real.

   Pego de surpresa por quão inesperadamente adorável era aquele sorriso, Naomi mal conseguiu manter a compostura enquanto ele acenava de volta.

   E Yui, igualmente lutando para não se desfazer emocionalmente, entrelaçou os dedos finos e retribuiu com um pequeno aceno de cabeça.

“Hum... sobre isso. Se não for pedir muito, eu tenho um favor... só um pequeno.”

“Ah... claro. Já somos amigos agora, certo? Então, um favor... ou mesmo alguns... está ótimo.”

   Ambos respiraram fundo, tentando acalmar os rostos corados enquanto trocavam olhares um tanto constrangedores.

   Yui limpou a garganta baixinho e se virou para Naomi com um olhar concentrado.

“Se não for muito incômodo... você se importaria de me chamar pelo meu primeiro nome em vez do meu sobrenome?”

“Você quer dizer... não ‘Villiers’, mas ‘Yui’?”

“Sim... isso mesmo.”

   Ela o encarou com um olhar um tanto tímido e, em seguida, assentiu com firmeza.

“Eu entendo que no Japão, usar o primeiro nome de alguém geralmente implica um relacionamento próximo... mas eu nunca gostei de ser chamada pelo meu sobrenome.”

   Ela olhou para baixo novamente, cerrando os punhos e mordendo o canto do lábio.

“Tudo bem se os colegas continuarem usando... mas se você me chamasse pelo meu nome, acho que isso me deixaria… bem feliz.”

   Um sorriso fraco e inquieto cruzou seus lábios, como se tentasse mascarar a vulnerabilidade em seu pedido.

   Ver aquele sorriso — tão silenciosamente corajoso — apertou algo bem fundo dentro de Naomi.

     ...A Villiers é realmente forte.

   Ela disse isso como se não fosse nada, mas não tem como aquele passado não doer.

   Se só de ouvir seu sobrenome a lembrava, devia ser exaustivo — e aquele sorriso contido dizia isso.

   Não se tratava de proximidade ou amizade casual. Se Yui tivesse escolhido abrir seu coração para alguém, é claro que ela não gostaria que usasse o nome que carregava tanta dor.

   Naomi engoliu em seco e ignorou o constrangimento dele.

“Tudo bem, então... Yui. Vou te chamar pelo seu nome de agora em diante.”

“Sim... Obrigada. Isso me deixa muito feliz.”

   Enquanto sorria aliviada, Naomi retribuiu o gesto, tentando esconder o próprio constrangimento com um sorriso tímido.

“Então, nesse caso, posso te pedir para parar de adicionar ‘-san’ ao meu nome? Seria estranho se eu fosse o único a ser chamado pelo meu primeiro nome.”

“Então... eu deveria te chamar de ‘Katagiri’...? Mas isso também não parece certo...”

“É, sinceramente, você me chamar de ‘Katagiri’ parece muito estranho...”

   Claro, os caras da turma que a chamavam de “Kuuderella” provavelmente ficariam felizes com isso, mas não era isso que Naomi buscava. Ele só queria estar em pé de igualdade — como amigos.

“Então você pode usar meu primeiro nome também. É normal nos chamarmos pelo primeiro nome em países ocidentais, certo?”

“Ah... bem, em famílias como a minha, usar nomes próprios não é exatamente comum...”

   Yui desviou o olhar, corando e com a voz embargada.

“...Eu nunca chamei um garoto pelo primeiro nome antes. É meio... constrangedor.”

“Ei, eu também nunca chamei uma garota pelo primeiro nome. Então estamos quites.”

“C-certo. Eu pedi por isso, afinal...”

   Respirando fundo, Yui assentiu para si mesma e então ergueu o rosto novamente.

“...Na-Naomi...-san...”

“-san?”

“Na... Naomi...?”

“Você está perguntando como se fosse um teste.”

“Na... Naomi...”

“Talvez algo mais fofo?”

“...Hum, eu estou tentando ser séria, sabe.”

“Desculpe, só saiu meio engraçado.”

   Enquanto Naomi se desculpava sob o olhar impassível de Yui, os dois não conseguiram conter o riso.

   Ambas tomaram um gole do chá, agora morno, exalando lentamente antes de erguerem o rosto novamente.

“Estou animado com isto tudo, Yui.”

“Sim. Eu também estou animada, Naomi-san.”

“Então, no fim das contas, você vai ficar com ‘-san’?”

“Eu só senti que combina melhor assim. Não está tudo bem?”

“Não, não — está tudo bem. Vamos com isso.”

   Honestamente, o título honorífico parecia mais com Yui. Combinava com ela.

   Para os dois naquele momento, parecia o suficiente. Naomi assentiu sem insistir no assunto.

“Então, devemos parar com o discurso formal também? Afinal, somos amigos agora.”

“Ah, mas... falar assim virou uma espécie de hábito para mim...”

   Yui começou a explicar, mas hesitou e se interrompeu.

“C-certo... afinal, nós somos amigos... Quer dizer, sim, certo? Já que somos amigos...? Espera...”

   Ela se atrapalhou com as palavras certas, inclinando a cabeça em confusão enquanto sua frase ficava mais incerta.

   Naomi não conseguiu evitar — sua falta de jeito naquele momento era fofa demais, parecia um pequeno animal, e ele soltou uma risada discreta.

“N-não é como se eu estivesse fazendo isso de propósito! Só estou acostumado a falar assim...”

   Yui corou e lançou-lhe um olhar irritado.

   Até aquela expressão tinha seu charme, e Naomi quase perdeu a batalha com o sorriso repuxando seus lábios — mas ele se conteve, achando que seria maldade provocá-la demais.

“Bem, não precisa forçar nada. Vá no seu próprio ritmo.”

“Sim, vamos passo a passo, por favor.”

   Eles compartilharam um sorriso tímido, ainda se adaptando à nova dinâmica entre eles, enquanto Naomi erguia sua caneca em sua direção.

   Yui percebeu o gesto e gentilmente ergueu sua própria caneca em resposta.

“Certo, mais uma vez — estou esperando por tudo, Yui.”

“E eu também. Conto com você, Naomi-san.”

   As canecas deles tilintaram suavemente, e mais uma vez, o riso irrompeu naturalmente de ambos.

   E assim, Yui e eu nos tornamos algo novo — vizinhos, colegas de classe, colegas de trabalho no mesmo emprego de meio período... e agora, amigos que também passariam o jantar juntos.

     Me pergunto o que devo fazer para o jantar amanhã.

   Se adiantando um pouco, Naomi tomou um gole de chá enquanto olhava para a amiga ao lado dele, com as bochechas levemente vermelhas, e pensou: talvez eu comece perguntando que tipo de comida ela gosta.

 

 

Traduzido por Moonlight Valley

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