Eu Apenas Quero Ser Normal Brasileira

Volume 1

Capítulo 3: O Pássaro e o Passarinheiro (3)

*BAM!!!*

 

A porta da sala do clube estava finalmente fechada. Uma sensação horrível, então, percorreu todo o meu corpo. Um arrepio que foi do dedo mindinho até a espinha. Já estava mentalmente exausto naquele ponto e ter que aguentar mais tempo daquilo estava me enlouquecendo. 

 

No entanto, era nítido que eu não teria escolha. Por isso, apenas decidi que seria melhor ficar calado e escutar. Pelo menos, por enquanto. 

 

— Então, esse é o novo membro? — Parecia ser uma voz que vinha do fundo do sala. O tom era suave, como uma brisa gentil. — Me pergunto como ele se parece...

 

— Hahaha! Não se preocupe! Daqui a pouco ele se acostuma! — Exclamou, Yoshiko-sensei com seu jeito animado de ser. — De certa maneira, foi igual quando foi a vez de vocês, não é? — Indagou, com certa pitada de provocação na voz. 

 

— Humhum, Talvez. Tirando a — apresentação calorosa — dele.

 

Minha cabeça que estava virada para o chão, logo, procurou pela presença da garota. A sala estava cheia de carteiras, mas fazendo uma pequena contagem rápida, eram cerca de quarenta carteiras — Tendo cinco fileiras, e cada fileira, oito carteiras.

 

A garota estava na quarta fileira ( a penúltima fileira antes da porta do clube ), era fácil notar a presença dela. Seus cabelos grandes e loiros chamavam bastante atenção. Ela estava com as suas duas mãos em cima da carteira, como que pensando no que dizer a seguir. A princípio, seus olhos estavam fechados, mas ao abrí-los acabei notando seus olhos azuis. Realmente, uma garota muito bonita. 

 

No entanto, mesmo que fossem azuis com o mar, não havia brilho algum neles. Como se ela não pudesse enxergar o que era importante, mesmo tendo olhos. 

 

"Ela é cega?"

 

— Perdoe ele, Yumi-chan. Acredite, ele é um menino muito bom. 

 

— Sendo bem sincera, isso já quase não me afeta. Porém, acho que não posso dizer o mesmo de Rina-san. 

 

— Isso é verdade. Eu vou ter uma conversa com ela mais tarde. — Disse, Yoshiko-sensei.

 

— Ei! Seu cafajeste! — Disse, Yumi. 

 

— Hã? Você está falando comigo? — Indaguei. 

 

— É óbvio! Com quem mais estaria falando? 

 

— Bem... é que você está apontando pra Yoshiko-sensei! 

 

— GAH! 

 

Apartir daquela reação exagerada, a minha dúvida anterior foi facilmente respondida. Além disso, ela acabou perdendo alguns pontos de respeito comigo. 

 

— Caham! Bem, isso não importa... 

 

—...De qualquer forma, trate de pedir desculpas a minha querida Kouhai! Está me ouvindo? 

 

— Certo, certo... 

 

Me perguntava a todo momento se elas não estavam exagerando. Tudo bem que eu havia sido um tanto rude, mas, era para tudo isso? Pelo menos, naquele momento eu achei bem exagerado. De qualquer jeito, não é como se um pedido de desculpas fosse me matar. 

 

— Bom, de qualquer forma, acho difícil Rina-san perdoá-lo. Não depois do que ele disse, não é Yuki-chan? Acho que ela vai procurar uma forma bem cruel de puní-lo! Coitadinho...

 

— Yuki-ch...?

 

Um nome que eu ainda não tinha escutado foi colocado no meio da conversa. Entretanto, eu tinha jurado que havia apenas 3 pessoas naquela sala. 

 

— Realmente... 

 

Sentada do outro lado, havia uma presença ainda mais difícil de notar que a minha. Era uma garota sentada em uma cadeira de rodas. Ela parecia olhar para fora da janela, como se tudo que houvesse dentro daquele lugar fosse desinteressante para ela. Seus cabelos brancos como a neve fazia parecer que a garota fosse um fantasma. Eu pensei nisso por uma fração de segundo. 

 

—...No entanto, isso foi exclusivamente culpa dele. Eu não sinto pena alguma. 

 

Mesmo que conversasse conosco, a garota permanecera olhando para a janela. Como se procurasse desesperadamente por algo valioso que perdeu, talvez... a sí mesma...

 

— Nossa! Não seja tão cruel, Yuki-chan! Vai acabar assustando ele. 

 

— Hunf! Quem foi cruel não fui eu. Pelo menos, não dessa vez. 

 

De repente, as duas acabaram tomando as rédeas da conversa. Era como se eu estivesse no meio do oceano atlântico sendo movido apenas pela correnteza sem poder fazer qualquer coisa. Eu deveria fazer algo, claro. Mas, eu ainda estava processando o aparecimento repentino daquela fantasma.

 

— ARGH! F-fantasma!

 

— Hã? Fantasma? — Perguntou, Yumi. 

 

— ELA! Q-quem é você e desde q-quando você está aí?

 

— Espera aí... Você está falando de Yuki-chan? 

 

— E eu sei lá o nome dessa coisa?! Eu tenho certeza que ela não estava ali quando eu cheguei! 

 

—...Pfffffff Hahahahhahahahhahaha!! 

 

Yumi começou a rir tanto que perdeu totalmente a compostura séria e requintada que ela mostrara apenas alguns momentos atrás. Ela alternava entre segurar a barriga com a mão, e se apoiar na mesa para não se desequilibrar. 

 

— Arf... parece que temos mais um cego na equipe... — Suspirou, a garota fantasma. 

 

— O que você disse?! Tá tirando uma com minha ca- 

 

—...Apesar que... de uma certa maneira, você não está totalmente errado... 

 

— Hã? 

 

— [...]

 

Em um estalar de dedos, as gargalhadas barulhentas de Yumi desapareceram. Sumiram como se nunca tivessem existido em primeiro lugar. O clima amigável e leve que estava na sala do clube a poucos segundos, deu lugar a um pesado e incômodo silêncio.

 

— [...]

 

— O-o que você quer dizer co-

 

— Bem, vamos direto ao ponto...

 

De repente, Yoshiko-sensei que estava o tempo inteiro na frente da porta, se dirigiu para o meio da sala. Como eu não sabia exatamente como reagir, decidi que seria melhor continuar aonde estava. 

 

Não havia uma mesa de professor, então, Yoshiko-sensei ficou em frente ao quadro negro. Em pé, na frente de todos. 

 

— Como vocês sabem, o clube contará com um novo membro apartir de amanhã. Ryoichi-kun estará vindo aqui todos os dias, então, sejam legais com ele. 

 

— Ei! Espere, eu não...

 

— Ryoichi-kun. Nós já falamos sobre isso, certo...?

 

— Khh... certo... não é como se eu tivesse alguma escolha...

 

— Ainda bem que entendeu! — Disse, com um sorriso enorme em seu rosto. 

 

Eu tinha que mudar de estratégia. Se nadar desesperadamente. contra a correnteza não estava surtando efeito, o que deveria ser feito? Obviamente, eu precisava primeiro manter a calma. Não era o fim do mundo! (pelo menos, não ainda...)

 

Não tinha muito o que fazer naquela situação. Eu teria que entrar naquele maldito clube. Entretanto, isso não significava que eu precisaria ficar muito tempo. Eu posso ter uma conversa franca com minha mãe depois, ou até mesmo, se eu não causar qualquer problemas e até manter boas notas talvez eu possa sair rapidinho desse lugar. 

 

— Ryoichi-kun. Você sabe qual é a finalidade desse clube?

— [...]

 

— É... pelo jeito, não... Caham! Você pelo menos sabe qual é o nome desse clube? — Indagou, Yoshiko-sensei.

 

— Clube dos Anormais. 

 

— Hahahahahahaha! — Gargalhou, Yumi-san. — Então, ainda nos chamam assim? Até que é nostálgico! 

 

— Isso não tem nada de engraçado... — Suspirou, Yoshiko-sensei. —...Mesmo lutando tanto atrás de quem espalhou esse nome, pelo jeito, se tornou pior do que eu pensava... 

 

O Clube dos Anormais é amplamente conhecido. Talvez, o clube mais famoso de toda escola. Só que a — fama — desse lugar, não é nada positiva. Depois que eu entrei nessa escola, não demorou até que eu descobrisse sobre a existência desse clube. Eles são os principais alvos de piada e zombaria de todo colégio. Inclusive, eu já escutei falar de alguns rumores que dizem que alguns professores chegam a ameaçar os alunos que tem notas baixas e mal comportamento, falando que vão os inscrever nesse clube. Apesar, que eu nunca vi isso acontecendo de fato. 

 

Por que — Clube dos Anormais? Mesmo que a escola seja inclusiva com pessoas com deficiências, isso não significa que todos os alunos sejam. O Clube dos Anormais é composto inteiralmente por pessoas com deficiências. Provavelmente, algum aluno em algum momento notou isso e acabou fazendo piadinha sobre o clube, e por alguma razão, o nome acabou pegando. De repente, esse lugar se tornou o verdadeiro saco de pancadas de toda escola. Alguns alunos novatos chegam até evitar de falar o nome desse clube. 

 

— Obviamente, esse não é o verdadeiro nome do clube. — Afirmou, Yoshiko-sensei.

 

— Ainda bem, né? 

 

— Hahaha! Você é muito engraçado, garoto! — Exclamou, Yumi.

 

"Mas, eu não fiz nenhuma piada... e eu sou apenas um ano mais novo que você!" 

 

— Yuki-chan! Você é a presidente do clube, você gostaria de apresentá-lo ao novato?

 

Yuki parecia estar ocupada demais olhando através da janela, entretanto, ela virou seu rosto em direção a sensei. 

 

— [...]

 

Mesmo sendo a presidente do clube, ela claramente não estava com vontade alguma de apresentar nada. 

 

— Eu não quero. Esse nome é muito idiota.

 

— [...]

 

 No entanto, Yoshiko-sensei pareceu quase que implorar para ela com os olhos. Ela permaneceu indiferente, mas após suspirar profundamente, decidiu quebrar o galho da sensei. 

 

—...Aff... ok, ok... pare de me olhar com esses olhos...

 

— Obrigada, Yuki-chan! Te devo uma! 

 

—...Tanto faz...

 

A garota chamada Yuki, voltou sua a atenção para mim. Seu olhar é tão gélido e penetrante que fez gelar a minha espinha. Sua expressão corporal também é fria e sem qualquer emoção. Ainda sim, tentei o máximo manter a minha compostura, não seria bom ela notar que estava nervoso. 

 

— Clube dos anormais é um nome falso. O verdadeiro nome desse clube é...

 

— Gulp... 

 

—...Clube dos Amigos. 

 

— Cl-clube dos Amigos...?

 

— Eu disse que era um nome idiota. — Completou, Yuki. Antes de voltar a olhar pela janela. 

 

— Isso mesmo, Ryoichi-kun. Esse é o clube que você fará parte! Tem mais alguma pergunta?

 

— Espere, espere aí... Clube dos Amigos? Que nome brega é esse?! 

 

— Ei! Isso dói... fui eu que dei a ideia desse nome... — Murmurou, Yumi. Com um pouco de decepção em sua voz

 

Não era apenas o nome. Não tinha a menor ideia do que esse clube fazia. Nem como sequer ele funcionava. O clube parece ter mais que o suficiente de pessoas para funcionar, mas isso não explica a funcionalidade dele — o seu intuito e objetivo. 

 

— Yuki-chan, eu sei que já pedi demais de você, mas acho que é melhor você explicar ao Ryoichi-kun. 

 

— Muitas obrigações? — Perguntou, Yuki.

 

— Infelizmente, sim... 

 

— Fazer o quê, né... 

 

— Ótimo. Eu vou deixar ele sob seus cuidados agora.

 

Yoshiko-sensei, logo se moveu em direção a porta do clube. Ela passou por mim e provavelmente notou minha ansiedade no meu rosto, porque ela deu dois tapas no meu ombro. 

 

— Isso doeu... 

 

— Ryoichi-kun.

 

Ela abriu a porta da sala do clube e antes de se dirigir para fora, olhou de relance para mim e me deu um grande sorriso. 

 

— Se esforce, tá bom? 

 

— [...]

 

— Não sei o que você quer dizer com esforço. Mas, vou tentar...

 

— Bom garoto! 

 

*BAM!*

 

O som da porta se fechando mais uma vez me deu um pouco de medo. Eu praticamente não falo com ninguém e de repente, estava sozinho com duas senpais que sequer conhecia direito. Além de que não sabia o que deveria fazer a seguir. 

 

— Então, ela se foi... — Murmurou, Yumi. 

 

— Ela é sempre assim. Impressionante, como não mudou nada. — Respondeu, Yuki. 

 

Virei meu rosto mais uma vez em direção delas. Yumi estava por alguma razão mexendo os pés para frente e para trás. Já Yuki apesar de ter parado de olhar pela janela, ainda permanecia com aquela aura gélida instransponível. 

 

— Bem, bem... por que não nos apresentamos de novo? — Perguntou, Yumi.

 

— O quê? Você está brincando né...?

 

— Por que não, Yuki-chan? Vai ser divertido... 

 

— Eu não sei o que tem de divertido nisso. — Disse, Yuki. 

 

A garota de cabelos loiros, então, se levantou com graciosidade. Foi quando ela se pôs de pé, que notei que ela era alta. Talvez, ela tenha quase a mesma altura que eu. 

 

— Meu nome é Yumi Natsuki. Sou a Vice-Presidente do Clube de Amigos! Você pode me chamar de Natsuki. — Disse, ao levantar sua saia como uma verdadeira dama.

 

— Prazer...

 

Virei-me então em direção a garota fantasma. Diferente de antes, ela não olhava para fora. Ela estava olhando para baixo, na direção de suas pernas. A luz do sol refletia em sua pele pálida e em seus cabelos brancos. 

 

Foi quando notei que ela também é uma garota bonita. 

 

— Meu nome é Yuki Haruka. Eu sou a Presidente do Clube de... Ah! Esquece! Me chame pelo sobrenome, por favor. 

 

— É-é um prazer te conhecer também...

 

Foi quando a atenção das garotas se voltaram a mim. Pelo jeito, era minha vez de me apresentar. Dizem que a primeira impressão é a que conta, então, eu não podia decepcionar. 

 

— M-Meu nome é- 

 

*BAM!*

 

— YAYYYYYY!! — Gritou, uma voz desconhecida. Quase tive um ataque do coração! Quando olhei para a porta, lá estava uma garota animada de cabelo azul. Seu cabelo parece ser do mesmo tamanho que o de Natsuki-senpai. — Meu nome é Risa Himari! E eu sou a membro mais idiota do Clube de Amigos! Me chame de Himari-chan! Hehehehe! — Exclamou, a garota idiota. 

 

Por causa daquela idiota, minha apresentação perfeita foi totalmente destruída. 

 

Notas do Autor: Todas as Ilustrações dessa novel são feitas por IA. Comentem e façam teorias, leio e respondo todos os comentários