Volume 9 – Arco 6
Capítulo 172: Sentimentos Que Florescem
Daisy e Dahlia deram prosseguimento ao tour pelos andares celestiais do Monte Olimpo.
— A gente só não pode ir no andar em cima do nosso. — A filha de Zeus apontou para o alto, conforme subia os pisos de novo.
A maioria dos aposentos onde paravam pareciam estar vazios, visto que a menina conseguia identificar mínimos traços de influência vital ao chegar neles.
Portanto, era o dia e hora perfeitas para explorarem.
Pelo menos, não precisaria ficar toda hora verificando as passagens com extrema cautela.
Feliz com isso, ela subiu com sua amiga até cada andar e verificou cada uma das portas principais nos locais.
— Deusa do Fogo... — Encarou com brilho nos olhos o símbolo de uma chama cinzelada na estrutura prateada. — Ah, irmão Apolo! Irmã Ártemis também!
Depois, fitou as respectivas marcas de um sol e de uma lua.
Continuou na subida, se deparando com o símbolo de uma árvore, uma bota com asas, um capacete com crina e um martelo.
Houve algumas que a olimpiana não foi capaz de decifrar, como a de um coração partido e um vaso de cerâmica.
Nenhuma delas trazia qualquer indicação à sua mente. Nem por isso ficou triste, apenas curiosa.
— Daisy... — Dahlia não deixava de dar mãos a ela. — Você mora aqui, mas... não costuma explorar muito?...
— Não... — Sorriu desconcertada. — Eu fico bastante com o irmão, em casa, ou com a irmãzona, na casa dela. Quando desço e subo as escadinhas, é só pra ir e voltar. Então ‘tô descobrindo mais com você, hihi!
Esboçou um sorriso radiante que, apesar de não poder ver, contagiou a jovem convidada.
Passadas as explorações até o limite enunciado pela garotinha, as duas voltaram a descer.
Por fim, chegaram a um andar acima daquele visitado mais cedo; o penúltimo sobre a divisão das nuvens.
Quando verificou a estrutura metálica, encontrou o símbolo de duas chaves encruzilhadas. Essa parecia ter um aspecto metálico mais acabado, também.
Se aproximou da porta, a passos curtos. Mas quando pensou em tateá-la com a palma, findou o avanço.
Um influxo pesado irradiou do interior, como se um aviso a fim de a afastar. Num piscar, espalhou-se para a amiga que somente a acompanhava.
“Que energia... arrepiante”, Dahlia, de olhos arregalados em pleno espanto, quase recuou.
Parou ao sentir a paralisia da filha de Zeus, responsável por desprendê-la da súbita distração.
— Daisy?...
— Hã? E-eu... — Como se fosse despertada de um transe, a olimpiana a encarou de perfil. — D-desculpa, Dahlinha! Vamos continuar!...
Percebeu a estranheza, não só pelo punho trêmulo, mas no abalo de sua voz. Ainda assim, resolveu deixar como estava.
Um pouco perdida após experimentar a energia desconhecida, Daisy desceu até o piso inferior.
Sem mais saber para onde seguir, a pequena parou entre as sequências da escadaria. O olhar se perdeu na paisagem de fora por breves segundos.
“Ah... Acho que é melhor voltar”, pensou, cabisbaixa.
— Oh. — A voz madura a puxou de volta à realidade. — Estão de volta, então.
— Hã?... — A cacheada virou o rosto, aturdida.
— Por acaso estão perdidas, meninas?
— Irmã Perséfone...
A Deusa das Flores não demorou a perceber como o espírito da menina tinha mudado de uma hora para outra.
— Aconteceu alguma coisa? — Semicerrou os olhos púrpuros.
— N-nada demais. — Mesmo boa em ler emoções, graças à própria Bênção, era péssima em escondê-las. — Irmã, você conhece algum lugar bom pra explorar por aqui?
Diante da pergunta inesperada, a deusa levou a mão dominante abaixo do queixo.
— Onde deseja chegar?
— Digo... a gente já subiu e desceu todos os andares. Eu queria levar a Dahlinha pra conhecer algum lugar legal. — Aos poucos, foi retomando o fulgor natural da respectiva fisionomia.
Era melhor assim, ponderou a superior.
Portanto, decidiu pensar um pouco mais com o intuito de agradá-las com a resposta.
— Quando falamos do Monte Olimpo, é difícil achar algo interessante além dos santuários. Mas... — Estalou os dedos, como se tivesse desvendado uma charada. — Tem um lugar que conheço... que não é necessariamente aqui dentro.
As palavras despertaram uma nova dose de ânimo às garotas, que se entreolharam.
— Onde fica!?
Inclinou o pequeno corpo na direção da mais velha, as mãos unidas em frente ao torso.
Instigada pela vontade da garotinha, Perséfone avançou na vertente delas, as ultrapassando logo após.
Enquanto as conduzia no olhar a priori, foi até a balaustrada que circundava o saguão exterior.
Apoiou a palma canhota nele, virou-se pela metade e, com a outra mão, chamou as duas.
Daisy guiou Dahlia consigo até se juntarem à Deusa das Flores, que mirou abaixo, apontando às nuvens aglomeradas.
— Na base da montanha, caso procurem direitinho por ali... — Apontou mais à direita do caminho coberto pelos relevos rochosos. — Tem uma passagem secreta que poucos conhecem e que leva a um lugar bem bonito.
— Sério? — Apesar de curiosa, a menina se retraiu. — Mas é do lado de fora...
Desafiar a ordem de Atena sobre ficar enclausurada e explorar o Olimpo por dentro era uma coisa — mesmo que errada, de qualquer forma.
Sair da montanha em si já se mostrava um ato muito mais arriscado. E isso freava o ímpeto aventureiro dela.
— Se forem rápidas, ninguém irá notar. — Mas a voz afável da deidade puxou os olhos cerúleos da caçula de volta ao alto. — Além do mais, prometo que não irei contar à nossa irmã.
“Eu já teria que contar sobre elas estarem andando por aí”, guardou o pensamento.
— É verdade!? Obrigada, irmã Perséfone!! — Puxou a menina pelo braço. — Vamos, Dahlinha!
— S-sim...
As duas correram de volta às escadas.
Daisy parou antes de pegar os degraus que a levariam, pela primeira vez, para fora dos domínios da montanha sem a presença de seus irmãos.
Ainda assim, reuniu coragem suficiente para completar sua aventura. Amparada por sua amiga, tomou em definitivo o acesso descendente.
Perséfone observou-as até o final de novo. Quando as duas desapareceram rumo ao plano terreno, arriou os supercílios.
— Fiz como pediu. Certo, irmã?...
O sibilo foi tão fraco a ponto de ser apagado pela brisa...
Enquanto isso, as meninas atravessaram o aglomerado de partículas suspensas em questão de segundos.
A melodia das Cárites foi perdendo intensidade até desaparecer; sinal de que as duas estavam longe da zona celestial.
Ainda um pouco nervosa por descer sem a tutela da Deusa da Sabedoria ou de seu irmão, Daisy ergueu os lábios em um sorriso entusiasmado.
Dahlia pôde reconhecer a mudança no clima; a entrada na região que era permitida aos mortais, nas sombras da luz divina.
Sentindo o nervosismo também aflorar na menina, a olimpiana sentiu-se amparada. Assim, apertou ainda mais a mão dela, de modo a fazer seus dedos se entrelaçarem.
Agora, ambas estavam seguras a fim de seguirem ao ponto mais alto — apesar da ironia — de sua aventura olímpica.
Enquanto estivesse com ela, não sentiria medo em avançar rumo ao desbravamento do desconhecido.
Quando chegaram no fim das longas escadas, o entardecer já entrava em seu ápice. O céu carregava tons degradê de laranja e azul-escuro.
Pisaram na passagem que indicava ao portal responsável por dividir os deuses dos mortais.
Daisy observou a passagem aberta, onde tinha encontrado a amiga que trazia consigo naquele momento.
Conforme o vento fazia seus cachos dançarem no ar, pensou na possibilidade de Atena chegar na montanha durante o desfecho do crepúsculo.
Por isso, sabia que lograva de pouco tempo para explorar.
Numa decisão rápida, assentiu consigo e levou Dahlia pelo trajeto informado por Perséfone.
Enquanto davam a volta, foram acobertadas pelas sombras do relevo alto.
Circundaram as elevações mais baixas das formações montanhosas, até encontrarem...
— Tem mesmo!...
Abismada, deparou-se com a pequena falha geológica; uma fenda escondida entre ranhuras de outras rochas bem aglutinadas.
Não tinham levado tanto tempo para achar, mas realmente ficava bem distante de olhares ordinários.
Ainda mais para as divindades que mal desciam e tampouco deviam explorar os entornos da montanha na “região mundana”.
De todo modo, comemorou internamente por conta da descoberta e, sem pensar duas vezes, tomou o rumo da passagem que era coberta; um túnel em declive de leve acentuamento.
Andou por alguns minutos, cada vez mais intimidada ao experimentar a passagem de uma lufada gelada por aquela região escura.
Ela e Dahlia apertaram as mãos que davam uma à outra, em prol de conseguirem coragem a fim de continuarem.
Depois do período em que somente os passos arrastados e cuidadosos delas ecoavam aos ouvidos, um uivo mais agudo do vento as recebeu.
Arrepiadas, chegaram a parar o avanço por breves segundos, até que os olhos azuis da olimpiana se depararam com uma luz no fim do túnel.
Com a nova dose de confiança vinda daquela paisagem, ela assentiu para si mesma, apertou a mão da amiga e a guiou pelo restante do trajeto.
Logo, saíram da cobertura delongada, alcançando a luz solar em seu poente mais uma vez, ainda que mais fraca.
Foi quando Daisy notou que as duas tinham atravessado, no sentido literal da palavra, a montanha através de sua base.
Se encontravam, agora, do outro lado. Porém, se tratava de uma região bem delimitada; conferiu isso ao olhar para os lados.
Eram as “costas” do Olimpo, mas apenas uma singela fração delas. Afinal, o restante ainda se seguia, estendendo-se às porções de terra das quais jamais poderiam enxergar...
Até o Mar Egeu.
Quando encarou o que vinha de frente com atenção, as vistas da filha de Zeus cintilaram.
O vento vinha do próprio mar, que quebrava em ondas não muito fortes sobre uma faixa de areia a alguns metros.
E entre essa faixa e a saída do túnel, havia um campo.
Um campo gramado com diversas flores, a dançarem graças à ação da lufada cheia de maresia que se acumulava naquele pedaço escondido dos domínios divinos.
Um arrepio diferenciado permeou o corpo da olimpiana. Os lábios se afastaram, mas nenhum ruído da voz escapou da garganta.
Dahlia sentiu a mão carregada pela menina ser apertada.
E encarou de soslaio, embora sequer pudesse a ver.
Mesmo assim, sabia que ela sofria uma torrente calorosa do peito ao restante do corpo. Estava enrubescida, enquanto os globos celestes...
— Daisy...
Ao ouvir aquilo, Daisy “despertou” do repentino transe provocado pela vista.
Notou, então, que tinha as vistas marejadas. Por isso tinha se tornado um pouco mais difícil de ver, pensou.
Incompreensível quanto aos sentimentos que afloravam, a filha de Zeus engoliu em seco. Forçava-se a fim de não derramar as lágrimas que já vinham com ímpeto.
— É lindo. — Antes de a mortal completar, voltou a sorrir com placidez. — É lindo, mas... por que meu peito... ‘tá doendo assim?...
Levou a palma livre a se apertar contra o lugar onde acusou sentir a tal dor.
Aquele calor extravagante continuou a envolvê-la, até que se tornou algo não tão estranho.
De certa forma, Daisy conseguia enxergar algo vazio ali.
Naquele espaço singular, era como se existisse uma lacuna.
Queria completá-la a partir das próprias memórias, porém, apenas borrões e chiados de estática vinham à tona.
O máximo que conseguia era regressar ao espaço de seus sonhos; a imagem da figura escura, no fim, aparentava trazer uma sensação equivalente à enfrentada ao contemplar aquela paisagem.
Sem ter muito mais o que fazer a respeito, apenas abaixou a cabeça, melancólica.
Foi então que Dahlia, de súbito, a envolveu em um abraço.
Pega desprevenida, a olimpiana deixou de piscar ao arregalar os olhos. O gesto evidenciava a leve diferença de altura entre as duas.
A cega moveu a mão atrás da nuca da garotinha, trazendo-a para mais próxima de seu peito.
Em aceitação àquele enlace caloroso, Daisy fechou os olhos e aproveitou-se do momento.
Buscou tal proximidade, o alento ao deitar o rosto no peito da amiga, enquanto recebia carinho em seus cachos bagunçados.
Assim permaneceram durante um período delongado.
Um misto de conforto e incômodo voltou a crescer, para as duas. Era como se ressoasse por inteiro nelas... algo que foi esquecido há muito tempo.
— Obrigada... Dahlinha... — Ao derramar um fio de lágrima do olho direito, a descendente divina sorriu. — Já passou.
Genuinamente feliz por ter a ajudado, mesmo sem dizer alguma coisa a respeito, Dahlia também projetou um sorriso leve.
— Não há de quê, Daisy...
Quando a luz do sol ameaçava desaparecer, dando lugar ao brilho pulsante das estrelas, as duas retomaram o equilíbrio.
De mãos dadas de novo, contemplaram aquele cenário por mais algum tempo.
— Vamos voltar. — Deu meia-volta, num giro delicado. — A irmãzona deve chegar a qualquer momento.
— Sim...
A cega assentiu com a cabeça, a acompanhando no retorno para o Monte Olimpo.
No átimo de um instante singelo, Daisy ofereceu uma última encarada àquele lugar, por cima do ombro.
Solitária, ponderou sobre a razão para tais emoções terem se manifestado de forma tão efusiva.
Algo insubstituível. Embora, até então, inapta a alcançar...
Com tais devaneios, deixou o litoral escondido sob o Olimpo junto de sua amiga.
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