Epopeia do Fim Brasileira

Autor(a): Altair Vesta


Volume 9 – Arco 6

Capítulo 170: O Despertar Fleumático

“Explosões” não necessariamente remetem a fogo.

Essas podem vir a ocorrer em uma disputa entre energias e Autoridades, igualitárias ou distintas, que excedam a condensação inicial depositada pelos combatentes — ou por somente um deles.

Nos casos referidos, ocorre uma produção reativa muito rápida ou forte entre os fluxos vitais em contato — ou dispersados na Autoridade usada —, causando uma violenta deflagração.

Quentes ou frias, não importam.

Tais “explosões” romperiam ondas do próprio espaço, afligindo aqueles que estivessem próximos, para o bem ou para o mal.

Foi assim que Silver e Heath provocaram a reação que fez o pântano inteiro chacoalhar.

Foram engolidos pela esfera de fumaça originada da detonação descontrolada, até serem arremessados para fora por conta das ondas de choque.

Heath experimentou uma vibração agonizante por todas as partes do corpo.

Vinha tanto da reação provocada pelo embate quanto pelo fato de estar, outra vez, forçando a própria energia além do que podia.

Depois de viajar por alguns metros, aterrissou em uma das plataformas remanescentes de lazulita. Quase rebaixou um dos joelhos a tocá-la.

Manteve-se postado na pura força de vontade.

Só não esperava que Silver já estivesse em ação outra vez, a atravessar a cortina nebulosa num rompante para lhe atingir um chute agressivo na barriga.

O movimento, apesar de intenso, foi tão refinado que o filho de Nice mal reagiu até sentir o abdômen ser esmagado e o corpo impelido de novo.

Viajou pelos ares até capotar nos destroços das plataformas minerais e afundar na água obscura.

Já com pouquíssimo fôlego por conta do golpe sofrido, Heath viu-se numa escassez de opções. Portanto, decidiu deixar de almejar o controle vital.

Só o deixou explodir de vez.

Ainda com o cabo da lazulita em mãos, usou a própria água como ponto físico em prol de fazer um novo bloco nascer abaixo de si.

Esse bateu em suas costas, o fazendo subir até emergir num estrondo. Ao retornar à superfície, todo encharcado, enxergou o adversário inerte a alguns metros.

No entanto, ele não estava de pé sobre qualquer pedaço de terra ou rocha.

Pensando sobre como aquilo era incrível, ajeitou a postura ao ser puxado de volta pela gravidade, junto de novas gotículas que formaram uma nova chuva artificial.

O olhar do filho de Poseidon vinha de baixo para cima, intimidador.

“Que energia é essa surgindo dele!?”, rangendo os dentes, se deu conta de que podia ver uma fina aura remansada circundá-lo.

As pontas do cabelo prateado, sustentadas pela tiara a cercar a testa, pareciam levitar como se fossem ondas flutuantes.

Dentro do subconsciente, já era tragado pela escuridão de uma zona abissal jamais alcançada.

Seu corpo começou a mudar.

Marcas estranhas de aspectos irreconhecíveis surgiram nos braços. Tais símbolos cintilaram a princípio, até adquirirem uma tonalidade azulada bem escura.

Gradativamente, essas “tatuagens” tomaram conta dos demais membros. Iam até os ombros, depois espalhavam-se pelo torso inteiro.

Imerso na mansidão absoluta, o filho de Anfitrite deu um passo à frente. Logo depois, só sobrou as ondulações no ponto onde havia pisado, pois a figura desapareceu num piscar.

Aterrorizado, Heath sentiu o vento frio arranhar seu rosto. Só então percebeu a chegada imediata do atlanti atrás de si.

Mais uma vez, em dois deslocamentos delicados, antecipou toda e qualquer reação possível do imperador, que se sentiu congelado a priori.

Desprovido de perturbações, o apóstolo agiu com exímia liberdade. Assim, sem permiti-lo perceber, enfiou a lâmina d’água em seu peito.

O empalamento fez mais sangue escorrer da boca do filho de Nice, que esgazeou as vistas sem saber o que fazer.

Nas rédeas, Silver colocou força extra nos braços e o jogou da plataforma de lazulita.

Outra vez colidiu com a superfície aquática, que se tornara uma parede de cimento tamanha a velocidade do contato.

Os ossos gritaram, dolorosos. Prestes a ser puxado de novo, direcionou as esferas castanhas ao oponente.

Não era o mesmo, nem de longe. Se tratava de outro ser.

“Não adianta...”, antes de deixar-se ser engolido pelas profundezas do pântano, usou outro bloco rochoso contra as costas a fim de regressar. “Vou ter que usar tudo que tenho!”

Respirou fundo, à medida que retomou parte da concentração necessária no intuito de condensar ao máximo a energia nas inclusões.

Os rubis a cobrirem o braço e parte do rosto e do tronco foram desfeitos, dando lugar a novas gemas intactas.

Essa era sua única saída.

Afinal...

— Você também está arriscando ao limite, não é?...

A determinação sorridente fez a vontade reacender, tão impetuosa como naquele dia.

Os olhos escuros aderiram ao aspecto das chamas que arrancaram de si sua cidade e sua mãe.

Enquanto isso, as marcas oceânicas continuaram a preencher a pele alva do descendente dos mares.

Naquele instante, já alcançavam o rosto. E quando ultrapassaram as linhas dos olhos, a íris desses tornou-se também azulada.

A frieza determinante daquele olhar...

Foi o anúncio decisivo para que os dois investissem ao ataque simultaneamente.

Com suas “formas descontroladas”, colidiram um contra o outro. A vegetação nos arredores quase foi arrancada da terra. Ondas intensas foram expulsas de perto dos dois.

A lâmina revestida pela Autoridade Elementar da Água originou um rebuliço poderoso ao entrar em contato com o braço coberto pela Autoridade Artificial dos Cristais.

Dessa vez, ninguém saiu vencedor.

Então, ao descerem sobre uma plataforma lazulita, ambos iniciaram a grande sequência de ataques e defesas.

Nada remediavam as forças alucinantes a cada disputa.

Na impossibilidade de se defenderem, desviavam da forma que era possível e continuavam a se atacar.

Gotículas d’água e fragmentos cristalinos voavam pelos arredores. Os tremores se intensificaram, na iminência de rachar a estrutura rochosa abaixo dos pés.

No entanto, com a passagem dos embates, a vantagem começou a pender ao lado de Silver.

Heath já se via incapaz de ir além daquele ponto.

Por mais que utilizasse de todo o potencial inato, agora enfim chegando a um estágio de aperfeiçoamento, as dores o impediam de continuar.

Claro, nunca venderia a vitória tão fácil. Empenhava-se ao limite, recusando-se a desistir.

Mas não seria suficiente.

Depois da sequência incansável, as marcas tatuadas no prodígio voltaram a brilhar, assim como os olhos azuis.

A Energia Vital elevou-se a um estado irreconhecível para o filho da Deusa da Vitória, que foi impelido pela pressão fria das pequenas explosões.

Nesse ritmo, Silver inclinou-se e executou um golpe ascendente, abrindo os braços do imperador.

Com a guarda exposta, não pôde evitar o giro elegante do prateado, deixando um rastro luminoso provindo do cintilar ocular.

Arte do Oceano, Quarta Onda: Turbilhão Fluido”, permitiu à densa energia se alastrar, até iniciar uma sucessão de ataques velozes em curta distância.

Todos atingiam o torso desprotegido de Heath, que ainda se empenhou a fim de defender-se com o braço rubi. No entanto, eles voltaram a rachar, pouco a pouco.

“Isso é...!!”, antes mesmo de completar, o fleumático rodopiou-se no ar e o acertou outro chute no peito.

De certa forma, agradeceu por ter sido afastado pelo próprio inimigo. Assim, pôde recuperar o oxigênio, além de se habituar aos inéditos cortes medianos pelos braços e tórax.

A camada de gemas terminou de ruir.

Sua pele caucasiana foi revelada, recheada de escamas sangrentas a escorrerem pelo membro pêndulo; o preço a se pagar por ter aderido ao descontrole da Autoridade.

Nem por isso Silver parou.

Já armava um próximo golpe, na mira congelante do olhar coberto pela franja úmida.

“Eu não vou...!!”, na última pontada de agressividade, Heath ergueu o braço todo ferido pela extrapolação do respectivo limite.

Diamante!!!

Surpreendendo o sereno, a forma cristalina surgiu na área inteira do torso, indo a ambos os braços.

Desprovido de temor, ele desceu-os com ímpeto até tocarem o bloco lazulita.

Então, ergueu o rosto desfigurado no mais puro desespero.

Uma estaca gigantesca de diamante surgiu do plano, semelhante ao que ocorria com as rochas azuis.

Essas, contudo, foram ainda mais rápidas, até alcançarem o filho de Anfitrite.

No reflexo, interrompeu a ordem do ataque derradeiro em prol de se desvencilhar com um salto à direita, ainda auxiliado pela lâmina d’água.

Um corte raso ainda se formou no queixo, tirando a lasca de sangue sobre o ar.

Ao voltar o rosto ao inimigo, observou inclusões rubis crescerem acima da crosta diamantina.

Diferentes de qualquer outro utilizados até então, as características de esquema claro e incolor proporcionavam efusivas dispersões luminosas que criavam arco-íris ofuscantes ao seu redor.

Perante tamanha beleza, o apóstolo pisou na água como se fosse em terra, com delicadeza, e disparou em busca da vitória.

Entretanto, a energia descontrolada do filho de Nice só aumentou, até produzir espinhos gigantescos de diamante a nascerem da grande crosta dominante no torso.

Silver precisou desviar de novo. Agora seria mais difícil de se aproximar, mas nem por isso perdeu um milésimo de foco.

Através de saltos bem calculados, recheados de fluidez, ele cortou os caminhos conforme o imperador se deixou levar pela loucura ao gritar à plenos pulmões.

Tentou as lacerar, porém nem com inclusões longas elas se desfizeram como o rubi.

Se era assim, então seria ainda mais complicado lidar com o revestimento principal, responsável por proteger o peito do jovem.

Durante uma das tentativas de aproximação, acabou sendo pego desprevenido por uma dor aguda a alastrar-se do peito ao restante do corpo.

Enfim a mansidão pendeu ao desequilíbrio.

Mas, ele ergueu o rosto, seguro de que conseguiria permanecer ativo, sem deixar a grotesca energia a fluir nos canais vitais o derrubar.

Quando freou o avanço numa zona coberta de vegetação, finalmente percebeu as marcas a brilharem nos próprios braços.

Ao invés de ficar impressionado ou amedrontado, ele assentiu consigo mesmo, apegando-se apenas à confiança.

Não fazia ideia do que significava tudo aquilo. Ainda assim, seria com esse poder desconhecido que superaria as últimas adversidades e venceria o confronto.

Portanto, apenas fechou os olhos.

Escolheu seguir a sensação extravagante de minutos atrás, a conexão com o que vinha em sua volta.

Então, ao abri-los de novo, esticou a mão canhota na direção do acúmulo d’água pantanosa.

A atração cresceu até partículas do líquido se desprenderem do todo, sendo levadas até a palma aberta.

A aliada imprevisível lançou um fluxo de energia a entrar em contato consigo. Sentiu-se revigorado. Então, entendeu ao menos uma coisa.

Foi assim que, de forma inconsciente, lançou-se das profundezas para retornar à batalha.

Diversos outros pensamentos atravessaram sua mente, inclusive um acontecimento parecido, quando ainda se preparava a fim de ingressar a corporação.

Seguindo esse momento, ergueu o membro controlador até, de forma definitiva, manipular a água a bel-prazer.

Ainda era instável, podia ver isso pelas gotas trêmulas, além do esforço depositado física e mentalmente para realizá-lo.

Porém, a vida ou a morte deveriam ser decididas ali.

Desprovido de outro rumo, ele arriscou tudo, assim como o inimigo. Deixou a parte coberta, revelando-se outra vez para o controlador de cristais.

Assim, os diamantes dispararam em sua vertente, para serem defendidos pelas camadas de água misturadas à Autoridade Elementar.

Quando as primeiras explosões passaram, ele exalou um lamento profundo...

“Agora.”

Na determinação exata, direcionou as mãos esquerda e direita na direção do filho de Nice.

A energia reunida solidificou-se até a nova atração das porções d’água em seus arredores, na criação de um intenso redemoinho que o carregou junto.

Fora de controle quanto à respectiva postura, Heath continuou a produzir mais e mais diamantes na tentativa de impedir a chegada do apóstolo.

Enquanto uma dor sinistra assolava os braços, como se fossem espetados por mais de mil agulhas simultâneas, Silver depositou peso nas sobrancelhas e nos dentes.

As tatuagens brilhantes pareciam fazer pele e carne queimar, ao que os ossos aparentavam estar prestes a serem esmigalhados.

Na luta até mesmo contra o nível vital além da compreensão e de seu domínio, o descendente dos mares juntou as palmas.

A explosão do redemoinho lançou uma onda por um raio de distância considerável, pegando toda a superfície do pântano no caminho.

Heath surgiu no epicentro do baque. Ele permaneceu consciente, por isso as crostas de diamante ainda estavam intactas.

Quase sucumbindo à agonia de extrapolar um limite já desconhecido, Silver aproveitou os resquícios de vigor para voltar com o manuseio da lâmina quebrada.

Usou uma última explosão abaixo dos pés, de maneira a ser lançado a toda velocidade contra o corpo inerte no ar.

Graças ao somatório das experiências, das dores gritantes até a sensação mística a chacoalhá-lo por inteiro, ele expressou algo nada próximo de seu feitio:

— Isso termina aqui!!

Ao soltar o grito profundo da alma, o atlanti preencheu o releixo com a Autoridade da Água.

A navalha se formou sendo a maior de todas já utilizadas na vida. Mesmo fora da zona de mansidão, o fluxo ondulado não apresentava quaisquer anomalias.

Era perfeito.

Quem pensou isso foi Heath, ao encarar a investida derradeira vir de encontro a si.

Assim, o corte atravessou a camada impenetrável até atingir o peito do imperador.

Bastante sangue espirrou ao ar, misturando-se às gotas de água liberadas da soma de fatores.

O efeito cascata criou a destruição de todo o revestimento de diamante. Então, após mais alguns segundos no ar, a gravidade começou a exercer sua força sobre o corpo pesado do filho de Nice.

Enquanto se afastava do céu nublado, tomado pela escuridão da noite, a consciência passou a esvanecer de vez.

Agora, não havia mais formas de impedir.

“Me desculpe... Leon... Mamãe...”, esboçou um sorriso tênue, à medida que era amortecido pelas vegetações altivas, até cair em terra firme.

A derrota o abraçou de vez. Nada além disso restou.

Um pouco distante, Silver tombou, já sem muitas forças na terra úmida da parte rasa do pântano.

Mesmo se tivesse alguma dúvida sobre matar ou não o inimigo, o corpo sequer o permitiria fazer qualquer coisa.

Conforme as tatuagens azuis regrediram em sua pele e a íris dos olhos voltou à original coloração de mel, o atlanti cuspiu uma boa quantidade de sangue sobre a água.

Fechou os punhos, na tentativa de se reerguer, mas o peso das pernas o manteve no solo.

Assim, o restante do vigor da parte superior foi perdido, o fazendo cair deitado. Largou a lâmina quebrada no processo.

No mínimo, pôde dar a volta com o tronco, ficando de barriga para o alto. Os olhos carregados encontraram as nuvens carregadas no topo celestial.

Conforme tremulava de frio, na sensação plena dos choques de colapso da energia grotesca utilizada, tentou respirar fundo em busca de oxigênio.

Nada fazia sentido.

Gostaria tanto de se questionar sobre o que foram aqueles minutos finais de batalha. Que tipos de poderes foram aqueles utilizados para vencer.

Mas, agora, todos os sentidos voltavam-se a um único desejo: o de sobreviver.

— Merda — resmungou entredentes.

Ninguém poderia escutá-lo.

Mesmo normalizando a respiração, a consciência só gostaria de apagar. Pouco a pouco, isso passou a ocorrer.

A cada nova piscada, novos traços de escuridão surgiam no campo de visão.

Antes de desmaiar, experimentou um pingo atingir a bochecha. E depois outro. E depois outros...

Lentamente, a chuva passou a cobrir a região pantanosa, assim como os incapacitados combatentes.

Conforme a audição aguçada vibrava com os ruídos incessantes da queda d’água ao seu redor, Silver enfim conectou os cílios.

De alguma maneira, sentir aquilo, graças à queda da impermeabilidade, o fez regozijar em silêncio.

Era parecido com quando sua mãe o enchia de carinho. Lhe ajudava a relaxar, não importava o momento.

— Mãe... Eu...

Foi assim que se desprendeu da lucidez, deixando as memórias o levarem uma última vez até a voz calorosa daquela que mais amava na vida.

A canção de ninar tomou conta da mente cansada, o fazendo adormecer tranquilo.

A missão do pequeno deus prateado no Berço da Terra estava completa.

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