Epopeia do Fim Brasileira

Autor(a): Altair Vesta


Volume 7 – Arco 5

Capítulo 122: O FIM ESTÁ CHEGANDO

Elaine mal conseguia piscar diante do rapaz enigmático que, em contrapartida, deixava os lábios alçarem na formação de um sorriso instigante.

De todo modo, apertava a empunhadura da lâmina em formato de lua crescente, ansiosa.

A coloração purpúrea voltou a preencher a lâmina, através da transmissão de sua Energia Vital ao ponto físico.

Qualquer movimento, por mais simples que fosse, poderia conduzir o instante a seu favor ou desfavor.

Era pura questão de expectativa e reação, na iminência de fazê-la prender o ar de forma quase inconsciente.

Aquele rapaz fazia parte dos ditos Imperadores das Trevas;

E, de quebra, já tinha mostrado ser conhecedor da relação que ela possuía com uma de suas integrantes, a filha da Deusa da Juventude.

Como desejava alcançá-la novamente em prol de resgatá-la daquele caminho sombrio, não podia perder a chance que acabara de surgir em sua frente.

— Por que... a Bellzinha?... — O questionamento nem precisava de mais palavras para se fazer entendível.

O rapaz fechou os olhos negros por um átimo, exalando uma bufada de jocosidade.

— Pois ela busca o que nós buscamos. — Relaxou o rosto acima de um dos punhos, o cotovelo apoiado no joelho flexionado. — Ela anseia por conquistar sua própria justiça.

“Justiça?”, Elaine refugou a postura sem perceber, dúbia no que concernia à tal justificativa.

A tensão corporal aumentou. Seu punho dominante apertou ainda mais o cabo da arma levantada.

Crescia, junto disso, a necessidade de arrancar dele mais informações relevantes.

Tal ocorrência não aparentava ser algo viável ao desejo do atinente, corroborado pela ação a seguir.

Ele levantou-se sobre o galho da árvore na qual se apoiava, para então revelar a palma tenaz aberta, defronte o manto escuro.

— De qualquer forma, nada disso importa. Eu queria deixar meu recado para os deuses maiores, só que calhou de encontrar vocês primeiro. — Sorriu em desdém, antes de completar: — O fim de sua Era está chegando. Todos sucumbirão aos braços dele após seu despertar.

— Como...?

Perante as vistas esgazeadas da descendente lunar, o membro dos imperadores olhou por cima dos ombros, ciente de que a dupla problemática viria em breve.

Os legionários eram lançados pelo espaço, derrotados em montes de uma só vez.

Então, o misterioso retornou o braço que tinha acabado de esticar, em clara afronta à presença da filha de Ártemis.

Estreitou os cílios um do outro, como se ponderasse mais do que tinha planejado fazer até aquele ponto.

— Confesso que não seria bom confrontar esses dois. Talvez nem você a essa altura. — Encarou-a de esguelha. O sorriso se afiou. — Em breve estaremos prontos, afinal...

Num deslocamento impensado, Elaine avançou um passo veloz e esticou o braço livre.

— Espera...!

O grito dela por pouco foi cortado pela pressão de ar lançada, entre os arvoredos, na direção do misterioso.

Ele precisou saltar o mais rápido possível, mas nem isso lhe permitiu evitar pequenas lacerações sobre as pernas.

Estalou a língua com escárnio, conforme pedaços da parte inferior do tecido escuro esvoaçavam, rasgados pela corrente cortante.

Aterrissou, após um deslocamento acentuado, a alguns metros do arvoredo, que silenciosamente tombava no solo para a vertente oposta de onde a garota se encontrava.

Incrédula, ela nem notou os lábios distantes. A paralisia só foi abandonada quando o corpo colidiu com o plano, levantando terra, folhas e mais vento.

Protegeu o rosto ao colocar o braço com a lâmina à frente.

Por outro lado, o desafiador encarou os cortes superficiais nos membros inferiores.

Constatou o deslize de filetes escarlates a escaparem deles...

— Acho que acabei levando mais tempo que pretendia por aqui... ou será que vocês que foram surpreendentemente mais rápidos?

Olhou de soslaio para a região de onde o ataque tinha nascido. O responsável por criá-lo, inclusive, já se aproximava...

Com a foice rósea deitada e apontada à terra, Arthur mirou os olhos circunspectos no rapaz desconhecido.

Era uma repetição do evento de não muito tempo atrás, no Monte Cáucaso — embora fosse outra pessoa em questão.

Para o apóstolo imponente, todos eram o mesmo: inimigos que deveria sobrepujar.

Atrasados — e repentinos — chegaram os fios de Meade, com suas setas de flecha nas extremidades frontais.

Os pequenos fios de sangue a escorrerem pelas coxas e panturrilhas do rapaz repentinamente se moveram... para o ar. E subiram em sua vanguarda.

Se tornaram espécies de lâminas que serviram de proteção para defletirem os disparos fibrosos do apóstolo.

Elaine levaria ambas as mãos à frente da boca aberta, se não estivesse em guarda com sua arma.

Mesmo Arthur, que demonstrava ser inabalável, estremeceu as sobrancelhas em leve espanto.

— Ah, essa é nova — resmungou Meade, trazendo os fios de volta às bocas de caveira.

Com mais calma ao ter seu ataque surpresa barrado, andou a passos curtos até se juntar ao aliado.

Sem afobação, o misterioso respirou fundo, conforme o sangue voltava a se tornar viscoso para, em um movimento de seus dedos da mão, retornar às feridas.

Que se fecharam na sequência.

— Vocês parecem ser mesmo duros na queda, não só as divindades maiores. Acabou que subestimá-los não parece ser uma opção viável. Também apresentam ameaça... — disparou entre os dentes e retirou uma esfera acinzentada de baixo do manto. — Vou repassar isso àquelas megeras, para ver se tomam jeito com os peões que trouxeram. Sabe, ser forte faz com que você se descuide às vezes...

Antes que ele executasse qualquer ação, Arthur saltou num rompante. A foice, posicionada para trás, vinha em sua companhia no intuito de desferir um golpe agressivo.

E assim o fez.

O golpe foi puro, sem qualquer resquício de energia. Mesmo assim, a explosão foi brutal ao entrar em colisão com a terra.

Sim, ele percebeu meros segundos após que não tinha atingido o alvo...

— E descuidos... — A voz, assim como a presença do sombrio, surgiu detrás dele. — Devem ser evitados ao máximo.

Apertou o apetrecho redondo e, com a ponta dos dedos, o fez estourar.

A camada de fuligem com fumaça se alastrou, atrapalhando a reação do loiro, que já pensava em um segundo corte simultâneo a um giro corporal.

Sem muitas opções além daquela, assim o fez, cortando a neblina negra em um único movimento.

Mas era tarde.

A presença do visitante indigesto já tinha esvanecido por completo. Ainda o caçou com o olhar pelos arredores, tal como os outros dois adiante.

Nenhum sinal dele permaneceu. Nem mesmo sua influência vital, mascarada por aquele “truque” de última hora...

Mais uma dose de frustração e vazio se apossou do Classe Superior, que já tinha passado pela mesma situação no Deserto da Perdição e no Monte Cáucaso.

Só que tal sentimento não durava tanto. Superou rápido ao balançar a arma longa, como se para se livrar da sujeira na lâmina.

Depois, conferiu o fragmento rochoso que ainda carregava, sem quaisquer avarias durante os combates.

Outros mistérios perdurariam no ar, mas não havia muito o que fazer a partir dali.

Os Imperadores das Trevas, salve as exceções de quase três meses atrás, pareciam estar buscando mais contatos e menos conflitos.

Sempre evitavam essa segunda parte — e, de quebra, duas vezes consecutivas tiveram os enviados da Deusa do Amor como “testemunhas”.

— Que saco... — Meade seguiu o exemplo e, ao bufar as palavras de sempre, passou a mão pela cabeça. — Esses malucos parecem estar querendo brincar com a gente...

Elaine continuava congelada na posição, pensativa quanto aos dizeres daquele garoto.

Citar Bluebell a trouxe ainda mais pesar ao peito. Tentou diminuir o incômodo ao apertar o palmo livre sobre ele, mas foi em vão.

Uma dor interior jamais poderia esvanecer com aquilo...

Estava certa de que se reencontrariam, cedo ou tarde.

Claro, não podia deixar de pensar na gravidade pela qual o cenário se desenrolava num geral.

Entretanto, as circunstâncias envolvidas com sua amiga de infância jamais seriam rebaixadas em valor disso.

Não poderia descansar enquanto soubesse que ela estava ligada a algo tão sórdido.

Ainda desejava conhecer toda a verdade por trás daquela reaparição e a consequente união àqueles que queriam, com todas as letras, acabar com a Era dos Deuses.

— Vamos voltar logo.

Arthur irrompeu o silêncio, tomando a linha de frente do grupo para si.

O esverdeado o acompanhou no mesmo átimo, conforme a descendente lunar perdeu mais um intervalo de segundos em ponderações.

Manteve-se assim até os dois subirem a passagem de árvores com espinhos, para então tomar a iniciativa de persegui-los.

Relaxou o braço que empunhava a lâmina purpúrea, logo a deixando perder a coloração da transmissão de Energia Vital.

No fim das contas, experimentava o cansaço acumulado do dia inteiro, prestes a derrubá-la de vez após aquela pequena atribulação.

Por algum motivo, no meio do caminho o grupo se separou.

Arthur e Meade optaram por pegar o rumo direto à Corinto, onde a Deusa do Amor os esperava, deixando Elaine ir sozinha pela trilha que levava ao templo de Éfeso.

Compreensiva quanto às parcas chances de um novo ataque, porém, sustentou o estado de alerta até atravessar o bosque e regressar à residência.

Lá estava a Deusa da Lua, observadora nata do satélite natural que cada vez mais se aproximava da sombra de sua fase nova.

Logo percebeu a chegada da garota, virando o rosto a fim de observar de soslaio antes de completar a mudança de foco.

A recebeu no alargamento do leve sorriso de acalento, ao que a apóstola devolveu o gesto.

Rapidamente questionou, conforme a descendente encerrava a aproximação:

— Como foi?

— Eles levaram o que queriam, mas... — A execução da repentina pausa, seguida do desvio de olhar cabisbaixo, levantou curiosidade na genetriz. — Um deles apareceu de novo...

Ártemis, a princípio, abriu a boca no intuito de entoar algo, porém logo recuou o ímpeto.

Observou os arredores nas minúcias, somente pela precaução.

— Vocês lutaram?

— Nem pudemos... Ele só disse que o fim está chegando... e fugiu... — Apertou o braço esquerdo com a outra palma. — E, também..., citou a Bellzinha...

Naquela situação, a deusa não teve muito o que dizer.

Apenas avançou e a abraçou, sendo aquela a melhor opção imaginada para o momento. Trouxe-a, cabisbaixa, para seu peito.

As duas permaneceram ali, banhadas pela luz da lua e das estrelas, enquanto essas podiam cintilar livres das parcas nuvens a correrem sob a extensão celestial.

Os rapazes já tinham atravessado o caminho quase inteiro através das Passagens Espectrais.

Com o fragmento de ouro envolvido pela rocha da caverna em mãos, não deixavam de pensar sobre a nova aparição de um inimigo declarado.

Aquele cenário começava a escalar a novos níveis imprescindíveis, do qual poderia estourar num problema ainda mais difícil de ser resolvido a qualquer momento.

E a atribulação desse fator se dava pela falta de possibilidades quanto a tais circunstâncias.

Os deuses continuavam numa posição em que seria impossível agir à frente dos Imperadores das Trevas.

Portanto, ao ser levado em consideração, nenhum dos dois se dispunha a quebrar a cabeça ou tampouco se preocupar demasiadamente.

O cálculo era simples; caso fossem afligidos, devolveriam na mesma moeda, e com juros.

Essa era a mentalidade daqueles que foram moldados no topo da cadeia olímpica.

— Bem-vindos de volta! Vejo que tiveram sucesso na missão! — Afrodite os recebeu no mesmo palco de outrora, a colina de Corinto. — Isso será suficiente.

Recebeu de braços abertos a dupla, assim como o metal precioso.

— Se era só isso, então...

— Não se precipite, meu filho — disse para interromper a debandada apressada de Meade. — Podem me contar sobre o que aconteceu com maiores detalhes?

Num primeiro momento, tanto o esverdeado quanto o loiro trocaram olhares.

Na sequência, contudo, escolheram por acatar o pedido da Deusa do Amor e destilaram a ordem dos acontecimentos, desde a chegada a Delfos e o retorno recente.

Ela escutou a tudo sem oferecer qualquer opinião, até que assentiu positivamente, agradeceu pelo esforço da dupla e os liberou para enfim regressarem.

Também desprovidos de novas argumentações, ambos só aceitaram e seguiram seus caminhos.

Depois de descerem e desapareceram da vista na região de relevo elevado, a deusa, solitária outra vez, deu meia-volta e encarou o horizonte noturno.

— Está crescendo... — Alisou, delicada, a superfície fria do metal dourado com a ponta dos dedos. — Logo, logo isso irá estourar. Só resta saber por onde e como farão a maior jogada.

As divagações em voz alta se perdiam no espaço de segundos, à medida que o vento fazia o mato alto dançar abaixo dos pés, assim como os fios sedosos do ondulado cabelo loiro.

— Pelo menos agora o pequeno Hefesto pode fazer um anel bonito para mim — completou ao fechar os olhos carmesins e alargar o sorriso.

O intuito duplo da tarefa chegara à sua definição e ela não tinha mais do que reclamar.

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