Epopeia do Fim Brasileira

Autor(a): Altair Vesta


Volume 3 – Arco 3

Capítulo 54: Batalha Crítica no Deserto 2 - BÊNÇÃO

“Incrível...”, Prometheus voltou a enxergar a natureza do Rei dos Deuses fluir em torno de seu descendente. “Se parece ainda mais com ele.”

Iminente a estremecer o riso contorcido entre os pelos de sua barba ruiva, redefiniu o panorama visual daquele conflito mais uma vez.

Suas provocações tinham acarretado aquilo, afinal de contas. Nada seria tão fácil quanto considerava a priori.

“Preciso matá-lo de uma vez”, traçou o ponto crucial do objetivo.

Essa ainda não era a capacidade absoluta do rapaz, sequer havia dúvidas sobre isso.

O perigo apresentava-se autêntico.

As pontas cacheadas do cabelo bagunçado de Damon meneavam graciosas, à medida que a energia aflorava ao redor.

“Eu sinto... o poder”, fechou seus olhos por um instante.

O fluxo de energia a correr pelos canais interiores, os próprios batimentos cardíacos, os ruídos limpos da respiração branda.

Ele jamais tinha constatado tais detalhes com tamanha clareza.

“Posso vencer”, voltou a abrir as vistas.

Toda a pressão foi dissipada através de um impacto invisível, capaz de trazer calmaria de volta ao recinto.

Prometheus nem pensava em ficar atônito.

Preparado para o reinício da batalha, piscou e, de repente... o jovem simplesmente desapareceu de sua linha de visão, o fazendo arregalar as sobrancelhas.

Não pôde ver, ouvir ou tampouco sentir o punho esquerdo ser rasgado pela espada elétrica do filho de Zeus.

Segundos após o deslocamento ser executado, uma aterradora onda de choque o atingiu, seguida de um estampido ensurdecedor.

O salão inteiro tremeu. Os corredores mais próximos sofreram o mesmo efeito.

Um trovão imponente ecoava sob o Deserto da Perdição...

Velocidade Deus...

Damon falou ao vento, posicionado atrás do titã que levou algum tempo até reagir.

A dor gritante dominou o membro, lacerado num corte límpido. Sangue recheado de pontos dourados derramou sobre o solo.

Foi quando enfim percebeu: tinha perdido a mão que segurava o amuleto.

Um misto de sensações excruciantes lhe correu o corpo e a mente. Pela primeira vez, era assolado por uma aflição inflexível.

Embora fosse um deus, filho de divindade supre ou não...

Ele ainda era só um garoto.

— Seu desgraçado... Me devolva!! — rugiu ao olhar por cima do ombro, perdendo as estribeiras de vez.

Veias saltavam nas têmporas. Os dentes se apertavam na iminência de se partirem.

O apóstolo não delegou qualquer resposta.

Resumiu-se a apanhar o palmo cortado do inimigo e mostrar o objeto, que ainda era seguro por ele, agora sob seu porte.

Num movimento instintivo, Prometheus deu meia-volta e se lançou à direção dele, destruindo até o chão onde pisava ao saltar.

Só que o olimpiano o despistou com sua velocidade anormal, deixando apenas rastros elétricos pelo espaço.

Ainda o presentou com um corte superficial sobre o tórax, percebido de forma tardia.

Sem o amuleto misterioso, o ruivo precisava começar a se preocupar com aqueles ferimentos.

Contudo, a celeridade repentina demonstrada pelo espadachim excedia e muito as expectativas.

Além disso, os estrondos consequentes tratavam de contaminar sua audição.

“Não consigo acompanhar!”, buscou outras maneiras de interromper a velocidade do garoto, então reuniu energia o suficiente para preencher a lâmina com mais Autoridade Elementar do Fogo.

Abandonou o modus operandi silente em prol de gritar com ferocidade. E lançou uma rajada flamejante ao cortar o ar na horizontal.

Por meio da absurda aceleração, Damon desvencilhou-se à esquerda.

Porém...

“Já ‘tô com o amuleto. Não dá pra usar a Bênção por muito tempo”, experimentou um desgaste acima do habitual o acossar.

Enquanto pensava, foi pego de surpreso por outro ataque explosivo do homem.

As chamas lhe atingiram nos braços e pernas, mas conseguiu proteger o artefato ao tomar distância com um salto.

Sem tempo para pensar, ajeitou a postura e aguentou as leves queimaduras.

Caso vacilasse por um átimo, seria severamente atingido e perderia a vantagem pela qual batalhou tanto para construir.

Assumiu uma postura ligeiramente inclinada adiante. Posicionou a espada ao lado do torso, a ponta da lâmina voltada para sua retaguarda.

Os raios que estouravam no espaço deixaram o entorno da própria estatura e se acumularam sobre a chapa metálica.

Os globos noturnos perderam o cintilar chamativo...

Arte do Relâmpago, Primeira Centelha. — Mirou o homem em antecipação a sua próxima ação. — Espada Relâmpago!...

O filho de Zeus, por um instante, pareceu ter se tornado um raio. Foi assim que avançou daquele ponto e atravessou a guarda do titã, lhe cortando com afinco na altura do peitoral.

Um lanho profundo se abriu, deixando que uma quantidade exorbitante de sangue jorrasse à sua frente.

Prometheus resistiu. Ainda procurou o perseguir em prol de devolver o favor, lançando outra lâmina de fogo contra ele.

Damon se jogou no chão como pôde, no reflexo. Sentiu o tórrido atributo raspar em seu antebraço, mas conseguiu evitar algo pior.

Pensar que nem mesmo um golpe concentrado foi suficiente a fim de interromper o Titã Condenado lhe despertou inéditas indecisões.

E nem por isso o ferido desistiu de atacar; criou outro corte, esse que passou rente ao rosto do prodígio, após desviar num giro apressado.

Depois, contorceu o corpo desgastado e usou as mãos — sem soltar o punho com o artefato — para empurrar-se para trás, num giro mortal veloz.

“Mesmo atingido com um ataque poderoso, ele ainda...!”, Lilith afundava ainda mais a mão livre sobre o peito.

Por mais que o cenário parecesse tão promissor quanto na ocasião de Delos, a vitória ainda não se mostrava próxima.

— Me devolva esse amuleto!! Ele é quem irá abrir meu caminho para destruir os deuses!! — vociferou o esguio ao descer a espada em chamas ao solo. — Não me atrapalhe!!!

Outra vez, o cacheado fugiu das labaredas que destruíram o cenário em alguma parte.

Depois, partiu em disparada, buscando um ataque de curta distância.

— Agora ‘cê tá falando demais!

Damon desistiu de desviar e aceitou o embate, devolvendo o golpe com sua espada.

A colisão entre as lâminas ocorreu com um ímpeto descomunal comparada às vezes anteriores.

— Eu vou fazer vocês pagarem por tudo que fizeram!!

Frente aquela declaração, não houve possibilidade de fugir das comparações com as palavras rugidas por uma certa Sirena, há dois meses.

O mesmo tipo de desculpa e motivação era cuspido em sua cara, deixando-o contra a parede.

Não obstante a isso, a estranha vivência de seus sonhos passou a também o atiçar naquele momento.

O cenário branco, a figura borrada... Todos os mínimos detalhes ganharam destaque em sua mente por um milésimo.

Enquanto absorvia a gama de sensações, voltou a erguer a cabeça. O brilho divino regressou à dupla de íris.

Isso o levou a grunhir irritado...

— Isso de novo... sempre isso.

Naquele período, o primeiro dentre todos, Damon aceitou todos os sentimentos.

E, conduzido por eles, venceu a disputa de força contra o inimigo ao empurrá-lo com os braços.

Sem parar por ali, disparou a nova investida.

O ataque veloz recebido por Prometheus mostrou-se ainda mais violento que os demais. Só ficava atrás para a Arte do Relâmpago usada há pouco, ponderou no desespero.

A pressão da colisão entre os armamentos fez suas pernas afundarem na terra. Rachaduras grossas se alastraram por boa extensão da superfície.

Depois de forçar ao limite e ser repelido pelo flanco, o descendente olímpico pegou impulso na parede com as pernas e regressou ainda mais rápido.

Outra defesa instintiva do titã, que quase caiu.

“Ele está...!”, na terceira evasão, sentiu uma descarga elétrica aquecer seu corpo. “Ele está evoluindo cada vez mais!!”

Mesmo a filha de Hades podia enxergar com precisão as melhorias de força e velocidade adquiridas pelo companheiro.

“Essa expressão...”, ainda assim, hesitou ao notar um detalhe a mais naquilo tudo.

“Essa sensação...!!”, igualmente ao Titã Condenado. “Seu poder cresce conforme sua ira se eleva!?”

Ao ter o torso lacerado por uma nova incisão, viu o jovem ranger os dentes e afiar o olhar através de sobrancelhas muito enrustidas.

Xingando em sua cabeça, executou uma resposta de emergência e acertou o plano com a espada de fogo, provocando outra explosão.

Foi encoberto por uma densa camada de fumaça. Seu sorriso regressou ao experimentar tamanha adrenalina governar todo o corpo.

Estava mais vivo do que nunca.

Do lado contrário, Damon abriu a cortina desbotada, trazendo o olhar do inimigo para onde estava: perto do teto do salão.

Prometheus demorou a crer que ele tinha chegado até lá sem que pudesse perceber. Um efeito ignorado de seu esperneio anterior.

Quando a gravidade executou sua ação, o garoto voltou a cair em direção ao inimigo atônito.

A influência esmagadora, liberada pela Energia Vital reunida na espada apontada para o alto, paralisou as ações do esguio.

— Chega dessas razões... — rugiu com ódio, adotando uma empunhadura de mão dupla. — Eu vou destruir todas elas!!!

“Não posso defender...!”, o barbudo esgazeou as vistas ao perceber que não haveria tempo hábil a fim de sequer posicionar a lâmina de fogo.

O olimpiano desceu um corte no ar e a lâmina elétrica atingiu o ombro canhoto do titã.

Uma repercussão devastadora atingiu aquele ponto, sucedida pela trovoada que fez parecer com que um raio de verdade tivesse atingido o local.

As correntes elétricas seguiram pelas vertentes do subsolo do deserto junto com o tremor. Mesmo região distante, acima, sofreu um terremoto de baixa magnitude.

Na pura intuição, Lilith fincou a extremidade afiada da foice no chão e se segurou no cabo com força. Seus pés se arrastavam só de sofrer a onda de choque terrível.

Tentou abrir as vistas, mas não conseguia suportar à corrente de vento.

Levou um tempo maior do que o habitual para que as consequências do ataque impetuoso cessassem.

Uma densa concentração de fumaça eletrizada preencheu todo o salão. Todas as tochas tinham sido apagadas, trazendo um breu inédito ao local.

A visão noturna da apóstola se ativou de imediato. Buscou o parceiro entre os destroços remanescentes.

Embora não funcionasse e plenas condições, esforçou-se a fim de atravessar a faixa desbotada ao estreitar as vistas.

“Incrível...”, não pôde deixar de pensar ao enxergar o estado do cenário adiante.

O teto tinha sido quase que completamente destruído. Mas já permitia que um fragmento de luar atravessasse as passagens até iluminar parte das ruínas subterrâneas.

Pequenas cachoeiras de areia caíam pelas beiradas abertas. Os aglomerados de pequenos minerais pareciam reluzir sob a luz.

Quando a fumaça passou a se desfazer, pôde enxergar sem o auxílio da habilidade singular.

Inapta a manter os lábios unidos, a jovem voltou o foco à procura do parceiro.

Envolta por arrepios criados pelo ar eletrizado, tirou a foice do chão e caminhou alguns passos.

Não demorou muito a achar sua silhueta, sobre uma plataforma desconexa do restante do plano que resistiu à colisão.

Chegou a esboçar um sorriso de contentamento, mas logo o desfez ao enxergar seu corpo ligeiramente trêmulo.

Ele não se movia. Ambos os braços estavam abaixados.

Já na cratera aberta em torno do pilar específico, estava o Titã Condenado. Derrubado, tinha mais de metade do torso destruído pelo golpe sofrido.

Continuava vivo, por mais incrível que aparentasse. Porém, aquela batalha certamente tinha sido encerrada.

Um alívio dominou Lilith quando constatou o estado do homem. E achou, ao mesmo tempo, impressionante o fato de seu amigo ter sido bem-sucedido em derrotar um titã.

Só que, de repente, o filho de Zeus caiu sentado no chão.

Constatou, em meio à torrente de emoções, que não conseguia fechar as mãos. Então, tanto a espada quanto o amuleto foram soltos de maneira involuntária.

A arma caiu ao seu lado e ali ficou.

Já o artefato... esse teve o azar de quicar na beirada e rolar pela queda de terra.

Indo justamente à vertente do titã.

“Meu corpo... não consigo mexer”, a intensidade da tremulação cresceu. Os olhos arregalaram. “Usei muita Energia Vital? O que tá acontecendo!?”

Nem mesmo os dedos era capaz de mover. Até para piscar encontrava dificuldades.

O choque interno o corroía por completo.

Sentia claramente uma eletrocussão subir por seus canais vitais. A dor incômoda só somava às sensações excruciantes do momento.

Tanto que, ao perceber o deslize cometido por aquele efeito estranho, quase sucumbiu em desolação.

A sorte não parecia estar ao seu lado.

O Titã Condenado sentiu um toque quente atingir seu braço destro, um dos poucos membros ainda intactos.

Teve forças ainda para delinear um sorriso em seu rosto ensanguentado. E, mais do que isso, para apanhar o objeto com adversidade.

Aguentou a queimadura na palma, a fim de superar o desgosto por ter sido derrotado.

“Peço perdão... você é mesmo poderoso”, divagou ao apertar o objeto com afinco. “Lhe subestimei... e paguei seu preço. Mas...”

O trouxe até próximo do tronco quase partido pela metade, a partir do ombro à cintura.

— O destino... sorri ao... meu favor...

A energia branca escapou da pedra e se alastrou por todo o tronco do titã.

Sua composição passou a ser recuperada por inteiro; além de fechar os ferimentos fatais, reconstituía partes perdidas pelo corte do filho de Zeus.

Em um átimo de minuto, ele já sentia a vitalidade ser recobrada. Pôde reerguer-se conforme a cura finalizava os processos regenerativos.

Mesmo ao ter o físico recuperado, porém, não deixou de experimentar as dores causadas pelo desgaste.

Afinal, o poder daquele amuleto usava muito do seu próprio corpo em prol de o recuperar.

Mais à frente, Damon e Lilith não acreditavam.

“Como isso foi acontecer...!?”, rangeu os dentes, angustiado.

O rapaz tinha disparado um golpe fora dos padrões e que sequer fazia parte de sua Arte do Relâmpago. Manteve a vitória mais próxima do que nunca ao ser guiado pela raiva.

Nem ele tinha noção sobre o nível de energia utilizado naquele momento.

“Se mexe!! Se mexe!!”, tendo todo o estoque de vigor arrancado do corpo, insistiu e foi presenteado apenas com um singelo deslocamento dos dedos destros.

Prometheus olhou para o alto. Mirou o apóstolo e puxou de volta a espada fincada ao seu lado.

— Ofereço meus parabéns, jovem deus. — Ainda precisava de um pouco mais de esforço para falar. — Agora vou ser obrigado a descansar mais antes de ir para o Olimpo.

O releixo foi envolto por uma nova camada de fogo. O calor da morte exalou contra o rosto do incrédulo rapaz.

— Nos despedimos aqui...

Depois de mussitar, cortou o ar e lançou a rajada flamejante em horizontal.

Damon gritava com a mente para que o corpo obedecesse aos comandos desesperados. Pôde mover os dois braços, contudo não existia mais tempo hábil em prol de sua fuga.

Quando o titã já ameaçava dar meia-volta e deixar a região, uma laceração certeira desfez todo o aglomerado de chamas.

Os olhos semicerrados voltaram a fitar a vertente do inimigo.

Ou melhor... dos inimigos.

— Ainda não acabou.

A voz feminina ecoou pelo espaço, à medida que sua figura de caudas gêmeas se tornava evidente.

Com convicção nos olhos rubis, Lilith portava a foice rubro-negra com ambas as mãos.

O Titã Condenado franziu a testa, desfazendo o sorriso vitorioso.

“Ainda restava essa. Me esqueci completamente.”

Tão focado no final alucinante contra o olimpiano, acabou varrendo qualquer outro foco no recinto.

— Lilith... — Damon murmurou, ainda perplexo.

— Não se preocupe, Damon. — Ela delegou uma olhada por cima do ombro. — Agora é minha vez.

Sorrindo, determinou a segunda rodada da batalha crítica no Deserto da Perdição.

Agradecimentos:

Gostaria de agradecer imensamente ao jovem Mortal:

Taldo Excamosh

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