Emissários da Magia Brasileira

Autor(a): Gabriel Gonçalves


Volume 1

Capítulo 28: Verdade Dolorosa

No corredor para o quarto de Himiko, Jinn estava acompanhando Margery até o cômodo onde se encontrava a nobre quando escutaram os seus gritos pedindo por ajuda.

Os dois entraram no quarto, preocupados e se depararam com Nádia, que repetiu a informação uma última vez antes de sua garganta secar. Percebendo que as pessoas ao seu redor estavam tensas, Nádia se deu conta de que estava agindo de forma histérica e soltou Himiko e com dificuldade disse:

— Água, por favor…

— Claro, eu vou pegar, só um momento — disse Himiko.

A nobre pegou um copo que havia deixado separado na mesa de cabeceira e entregou a Nádia. Jinn, sem conseguir esperar, se sentou na cama próximo da elfa enquanto ela bebia a água. Quando ela terminou de beber, devolveu o copo e concentrou em acalmar sua respiração, Jinn se manteve em silêncio e as duas mulheres fizeram o mesmo dando o tempo necessário para que Nádia se acalmasse antes de ouvir todas as perguntas que tinham.

— Eu pensei que eu conhecia Bogna melhor do que ninguém, depois de tantos anos, eu… — falou Nádia.

— Não me diga que… é verdade que Freirr e Bogna são Emissárias de Sangue?! — falou Himiko.

“Então foi por isso que eu estava sentindo que havia algo errado com a Nádia, mas como isso é possível? Eu não tenho até onde eu sei esse dom”, pensou Jinn.

Nádia assentiu para Himiko confirmando que de fato havia dito a verdade e Margery e Himiko trocaram um olhar cheio de tristeza e confusão, ambas conheciam Freirr e Bogna desde que elas chegaram a Port Strong e naquele momento se viram questionando todos os momentos que passaram com as duas.

Com calma, Nádia explicou para os três tudo que havia acontecido até o momento que foi atacada por Freirr, dando algumas pausas para controlar o nervosismo e tentando afastar o cheiro de sangue que se recusava a sair de sua memória, fazendo com sentisse que ainda estava presa no momento em Freirr matou os voluntários em sua frente.

— O pior é que mesmo tendo visto a tia matando aquelas pessoas, eu não consigo acreditar! Ela perfurou a barriga de uma pessoa com as próprias mãos como se não fosse nada! — disse Nádia.

A elfa chegou a quase vomitar ao se lembrar do momento que descreveu, ela conseguiu se controlar um pouco com ajuda dos três, mas o processo foi perdido quando ela se lembrou de algo importante.

— O que… o que — balbuciou Nádia, sentindo seu coração acelerado, quase saindo do peito. — O que aconteceu com as pessoas na delegacia? Foram elas que me acharam?

O suspiro pesado de Himiko e as expressões sombrias de Margery e Jinn foram suficientes para que Nádia baixasse o olhar, imaginando o pior. A imagem da delegacia em ruínas e dos rostos daqueles que ela conhecia passou rapidamente por sua mente, deixando-a com um nó na garganta.

— Estão todos mortos, não estão? — perguntou Nádia, sua voz quase um sussurro, como se já soubesse a resposta, mas ainda esperando por uma réstia de esperança.

— Grande parte, sim… — confirmou Himiko, sua voz carregada de pesar.

— Foram elas? — insistiu Nádia, seus olhos brilhando de lágrimas reprimidas.

— Isso é uma longa história. Seria melhor contar depois… — tentou Jinn, hesitante, mas Nádia não deixou.

— Não, eu quero que me contem tudo! Onde elas estão?! Vocês conseguiram capturá-las? Elas estão mortas?! Por favor, eu imploro, eu preciso saber! — disse Nádia, as lágrimas finalmente escapando, seu rosto marcado por uma mistura de dor e desespero.

Himiko ficou em silêncio por um momento, ponderando se deveria ou não compartilhar os detalhes com Nádia.

“Ela vai acabar sabendo de um jeito ou de outro. Vou pelo menos tentar falar de uma forma mais suave, dentro do possível”, pensou Himiko, respirando fundo antes de continuar.

— Não posso te confirmar se Freirr e Bogna mataram mais gente, mas havia uma terceira Emissária de Sangue entre nós… Ena, a assistente do governador. Parece que houve uma luta na delegacia que acabou causando o desabamento do prédio, matando quase todos os detentos. Mas os voluntários… eles tinham ferimentos que indicavam que foram mortos antes do desabamento.

Nádia ficou em silêncio por um momento, processando as palavras de Himiko.

— Espera, tinha mais uma Emissária de Sangue? Não devia haver poucos deles por aí? Como tinha tantos aqui? — perguntou Nádia, sua voz tremendo de incredulidade.

— Isso é algo que queremos saber também — respondeu Himiko, sua expressão séria. — Quanto a como você foi encontrada… foram algumas pessoas que estavam recuperando os corpos que te acharam, com a ajuda da emissária Lia e de Luther. Eles foram os que te trouxeram para cá. Freirr e Bogna desapareceram sem deixar rastros, assim como Ena, após lutar contra os emissários.

Nádia voltou sua atenção para Jinn, seus olhos ainda úmidos, mas agora cheios de uma determinação silenciosa. Ela se lembrou de todas as histórias que ouvira sobre o quão poderosos os Emissários de Sangue eram, e uma onda de preocupação tomou conta dela.

Jinn, percebendo seu olhar, pegou a mão de Nádia com cuidado, segurando-a com carinho.

— Eu estou bem — disse ele, com um sorriso tranquilo. — Não sei ao certo o quão forte Ena era, porque não a vi em ação, mas ao menos conseguimos fazer com que ela fugisse.

— Como? — perguntou Nádia, sua voz ainda carregada de incredulidade.

— Suponho que ela tenha percebido a chegada de Sira. Ter a Princesa do Vento por perto deve ter sido o suficiente para ela decidir partir.

Nádia arregalou os olhos, surpresa.

— A Princesa do Vento está em Port Strong?! A Sira Aerius?! — perguntou, sua voz quase falhando de espanto.

Himiko e Jinn trocaram um olhar, e Himiko respondeu com um aceno de cabeça.

— Sim, ela está aqui. E, graças a ela, conseguimos evitar que a situação ficasse ainda pior.

Nádia ficou em silêncio por um momento, absorvendo as informações. A presença de Sira Aerius em Port Strong era algo que ela nunca imaginaria testemunhar. Mas, ao mesmo tempo, uma sensação de alívio começou a tomar conta dela. Se a Princesa do Vento estava envolvida, talvez houvesse uma chance real de justiça.

— Então… o que acontece agora? — perguntou Nádia, sua voz mais firme, mas ainda carregada de emoção.

— Agora, nós nos preparamos — respondeu Jinn, sua voz calma, mas determinada. — E garantimos que isso nunca mais aconteça.

O emissário assentiu casualmente, deixando Nádia perplexa.

— E você chama ela só de Sira? — falou Nádia.

— Somos amigos de longa data, por isso que para mim ela é só a Sira — disse Jinn.

“Luther tem uns amigos interessantes, um draconiano em carne e osso e a Princesa de Vento, não consigo pensar em quão poderosos esses dois devem ser. Senti algo especial nele antes, mas agora tenho certeza de que Luther é uma pessoa extraordinária", pensou Himiko.

Com a imagem de Freirr matando os voluntários e repetindo em sua mente, Nádia ficou uma expressão triste e Jinn a abraçou para a consolar. 

“Quando foi que esses dois ficaram próximos? Com tudo que estava acontecendo, vejo que perdi algumas coisas interessantes”, pensou Himiko.

— Vamos sair um pouco Margery, agora que Nádia está bem, precisamos ajudar as pessoas lá fora. Há muita coisa a ser feita — disse Himiko.

— Sim, senhora — disse Margery.

Saindo do quarto, a nobre refletiu sobre as informações dadas por Nádia enquanto se questionava sobre as reais intenções de Poltergeist em Port Strong. A ameaça dos caçadores aparentava ter acabado, todavia, ainda questões a serem respondidas e Himiko torcia para que os caçadores capturados ajudassem ela a entender o que realmente aconteceu.

“Ainda preciso encobrir o fato de Castiel ser um draconiano, não sei como o Luther pode me pedir isso com toda aquela destruição, vou ter que colocar toda a culpa na Ena. Com tantas coisas grandes acontecendo ao meu redor, eu me sinto tão pequena. As coisas vão mudar, não só em Eskos, mas no mundo inteiro e vou precisar mudar junto se não quiser ficar para trás”, pensou Himiko.

— Está tudo bem, senhora Kami? — falou Margery.

— Sim, estou apenas pensando em tudo que tem acontecido na nossa cidade — falou Himiko.

— É, acredito que acabamos nos envolvendo em muito mais coisas do que deveríamos, os olhares das outras cidades se voltarão para nós.

— Ha! Ironicamente consegui fazer em dias o que meus antecessores não conseguiram.

— O que seria?

— Colocar Port Strong no mapa.

Ao chegarem na sala principal da mansão, as duas mulheres encontraram com a comandante Carla que as aguarda com uma expressão que deixou as duas preocupadas.

— Comandante, o que aconteceu? Nossos inimigos retornaram?! — disse Himiko.

— Não, senhora Kami. Com a ajuda de alguns usuários de magia nós encontramos os corpos dos Damaris. Agora podemos confirmá-los como mortos.

Em um segundo que pareceu durar uma eternidade para Himiko, ela pensou em todos os anos que passou sozinha, sem sua família para inspirá-la e auxiliá-la presencialmente e nas crianças que se tornaram órfãs porque ela colocou seus pais no lugar errado.

 

 

Sentado sozinho na areia da praia de Port Strong, Luther admirava as estrelas que cintilavam no céu, pintando a madrugada com seu brilho suave. O som das ondas quebrando na costa trazia uma calma, o ajudando a relaxar após o dia exaustivo que tivera. Ele sabia que a conversa que estava prestes a ter com Sira não seria fácil, mas acreditava que o cenário tranquilo da praia poderia ajudá-los a encontrar um terreno comum.

Ao ouvir passos se aproximando, Luther não precisou virar-se para saber quem era. Um sorriso involuntário surgiu em seus lábios, mesmo sabendo que a conversa seria complicada. Ele sentia uma estranha tranquilidade apenas por saber que ela estava perto.

— Desculpe a demora, fui checar algumas coisas com Lia — disse Sira, sua voz suave, mas com um tom de cansaço que Luther reconheceu imediatamente.

— O que importa é que você veio, como eu pedi. Agora podemos conversar com calma — respondeu Luther, olhando para ela enquanto ela se sentava ao seu lado.

Sira sentou-se na areia, mantendo uma postura relaxada, mas Luther percebeu que algo a incomodava. Seus olhos, sempre tão firmes e determinados, agora pareciam carregados de preocupação e algo mais que ele não conseguia decifrar.

— Sira, o que está acontecendo? — perguntou ele, quebrando o silêncio. — Sei que chegou no meio da batalha e que toda a situação com o Castiel é complicada, mas você parece estar prestes a explodir. Eu sempre pensei que fosse o mais denso do grupo.

Ela soltou um suspiro, como se estivesse segurando algo há muito tempo. 

— O mundo todo acreditava que os draconianos estavam extintos, Luther. Além de serem poderosos, o conhecimento que eles tinham sobre magia era imenso. É claro que estou prestes a explodir! A existência dele muda tudo, Luther. Já está mudando. Você sabe disso. E se ele existe, tenho certeza de que há outros por aí. Isso levanta uma série de questões. Eles podem estar conspirando contra nós.

Luther olhou para ela, tentando decifrar o que estava por trás daquela fala.

 — Pare com isso, Sira. Você parece um político falando, e isso não combina com você.

Ela ficou em silêncio por alguns instantes, como se estivesse escolhendo suas palavras com cuidado.

 — Muita coisa muda em um ano, Luther. Além disso, eu sou uma princesa. Faz parte do meu trabalho pensar nos impactos que a existência do seu amigo traz para o nosso clã e para a paz que a Aliança lutou tanto para construir com os clãs elementais.

— Pode ser que muita coisa tenha mudado em um ano — respondeu Luther, seu olhar fixo nela — Mas eu sei que você não mudou.

Sira olhou para ele, e por um breve momento, um sorriso bobo surgiu em seu rosto, como se algo dentro dela tivesse se soltado. Mas, ao perceber que Luther não corresponderia ao gesto, ela desviou o olhar, virando o rosto para o mar.

— Como você saberia se eu mudei? Você está fora esse tempo todo… — disse ela, sua voz quase um sussurro.

— Eu perguntei se você queria que nós ficássemos. Você disse que podíamos ir e deixou bem claro que não teria problema algum — respondeu Luther, sua voz suave, mas firme.

— Eu sei bem o que eu disse, afinal, eu estava lá — retrucou Sira, seu tom um pouco mais áspero, mas ainda carregado de algo que Luther não conseguia nomear.

Ele suspirou, voltando a olhar para as estrelas. A estratégia que ele imaginara para a conversa não estava funcionando, e ele sentia que estava perdendo o controle da situação. Luther sempre soube como lidar com Sira, mas algo naquela noite parecia diferente.

Os dois ficaram em silêncio por um bom tempo, apenas ouvindo o som das ondas e sentindo a brisa suave que passava por eles. Para ambos, aquela calmaria era um refúgio dos problemas que os cercavam. E, lentamente, Sira pareceu relaxar, como se o ambiente a tivesse ajudado a encontrar um pouco de paz.

— Desculpe por estar agindo assim — disse ela, finalmente, sua voz mais suave. — Sei que não era dessa forma que vocês esperavam que nosso reencontro fosse. Muitas coisas aconteceram no clã. Eu não vim até aqui para passar um tempo descansando com vocês. Vim para trazê-los de volta. Preciso de vocês em casa. Mas o que eu não imaginava é que você estaria lidando com problemas tão grandes. Embora… esse seja o seu jeito.

Luther riu baixinho, o som quase se perdendo no barulho das ondas. 

— Hahaha, eu me empolguei dessa vez. Quem diria que tanta coisa aconteceria em um lugar como esse? Sempre pensei que nada de importante acontecia em cidades pequenas, mas estava enganado.

Sira olhou para ele, e um leve sorriso surgiu em seu rosto. Ela sentia-se mal por trazer mais problemas para Luther, especialmente depois de tudo o que ele já estava enfrentando. Mas, ao mesmo tempo, sabia que, como soldados, eles conseguiriam lidar com a situação. E, de alguma forma, ambos os lados se ajudariam.

— Estamos tendo problemas com os templários — continuou Sira, seu tom mais sério. — As coisas têm piorado devido à Insurgência. Essa organização de usuários de magia está se tornando uma ameaça crescente para a paz, e isso está dando suporte a mais restrições para nós. Tenho certeza de que o que aconteceu aqui vai piorar as coisas para todos. E eu não acho que poderemos reverter isso.

Luther olhou para ela, seus olhos estreitando-se em preocupação. 

— Espera, você quer contar para o clã sobre Castiel? Com tudo o que está acontecendo?

— Luther, eu vou dar o meu melhor para ajudar você com Castiel. Sei que está receoso com o que pode acontecer, mas o mundo precisa saber. É o nosso dever relatar isso.

Ele ficou em silêncio por um momento, olhando para o mar. “Mas será que o mundo está pronto para isso?”, pensou Luther, sentindo o peso daquela decisão pairando sobre eles.

Enquanto isso, Sira o observava de relance, seu coração apertado por uma mistura de sentimentos que ela não conseguia — ou não queria — nomear. Havia algo entre eles, algo que nem mesmo o tempo ou a distância pareciam apagar. E, naquela noite, sob o céu estrelado de Port Strong, aquela conexão parecia mais forte do que nunca.

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