Emissários da Magia Brasileira

Autor(a): Gabriel Gonçalves


Volume 1

Capítulo 27: Recuperação

Era noite e Castiel e Kira continuavam desacordados após a batalha na praça e Lia trocava as ervas colocadas sobre os corpos dos dois enquanto Luther observava preocupado. Após a sugestão de Himiko, os emissários levaram Castiel, Kira e Ash para a mansão para serem tratados em condições melhores, mas Ash estava no quarto ao lado algemada a sua cama enquanto se recuperava de seus ferimentos.

Tanto Lia quanto Luther haviam acabado de retornar das ruas de Port Strong, onde eles auxiliaram os cidadãos nos inúmeros problemas que estavam enfrentando devido aos estragos da batalha, para checar as condições dos três. 

Infelizmente Luther não tinha o mesmo nível de conhecimento de Lia em cuidados médicos, tudo que ele sabia era o básico que sua mestre lhe ensinou no clã, por isso ele apenas entregava o que a sua colega pedia e aguardava pela explicação do estado dos dois. O emissário estava menos inquieto do que mais cedo por perceber pela expressão de Lia que a situação não estava mais tão preocupante quanto antes.

Após terminar seu trabalho, Lia saiu do quarto para deixar os dois descansando e Luther a acompanhou para o corredor.

— E aí? — disse Luther.

— Continuam do jeito que o doutor disse mais cedo, mesmo não aparentando visualmente, parece que Castiel foi quem sofreu mais dano, principalmente por exigir demais de seu corpo mais cedo. A regeneração mágica de Kira retornou ao normal, porém ela vai ter que ficar um tempo fora de ação. Essa Emissária de Sangue chegou muito perto de matá-los — disse Lia.

— Temos que agradecer aos deuses por eles estarem vivos. Emissários de Sangue são verdadeiros monstros em combate, se as coisas fossem diferentes, poderíamos encontrar corpo nenhum ou ao menos igual aos vários corpos na delegacia.

— É a natureza dos hemallitas. Os filhos do império foram “abençoados” pelo demônio, uma ligação que não pode ser rompida e deturpou suas almas. Fingem ser como nós, mas como vimos na delegacia, aquilo é o que eles fazem.

Cabisbaixo Luther pensou em todos os corpos soterrados pelo desabamento da delegacia, enquanto os emissários retiravam os corpos que conseguiam com os moradores, eles puderam ver a brutalidade que aquelas pessoas haviam sido mortas. Principalmente as que estavam no beco para a entrada dos fundos.

“Como eu não consegui perceber nada! Embora isso não seja surpresa, eles conseguem se ocultar muito bem quando querem. Mas mesmo assim… era isso que Poltergeist queria dizer quando falou que abriríamos o caminho para ele se soubéssemos a verdade? Ele estava atrás da filha do demônio todo esse tempo?”, pensou Luther.

Embora fosse óbvio naquele momento para Lia, ela ser da natureza de Luther pensar e repensar sobre como agiu em uma situação de conflito, afinal foi como eles foram treinados, mas ele sempre adicionava um peso desnecessário em seus ombros. Ela então chutou de leve a perna de Luther o retirando do seu turbilhão de pensamentos e falou:

— Por favor, não faça isso!

— Eu queria poder fazer mais, viemos salvar essa cidade, mas eu não consegui ser atento suficiente aos meus arredores. Fiquei focado demais no Poltergeist e nem ao menos o capturamos! — disse Luther.

— Luther, fizemos o nosso melhor! Você fez o seu melhor! Sua regeneração mágica pode até ser mais rápida que muitos de nós, mas olha como você está cansado por todo o esforço que fez por essas pessoas! Entenda, o mau está por toda parte nesse mundo e ele nem sempre vai se apresentar de uma forma reconhecível. O povo de hemall é caçado há muito tempo, então eles sabem muito bem como se esconder, e essa era excepcional, você sentiu o quanto forte era.

— Tem razão, ela conseguiu lutar sozinha contra a caçadora, Ena e Castiel. As histórias estavam certas sobre o poder demoníaco deles, afinal foi necessário todos os clãs unidos para derrubá-los.

— Exatamente, devemos aceitar o que passou e focar no que podemos fazer por essas pessoas agora.

Luther sorriu para Lia agradecido por ela ter o ajudado, mesmo que ainda estivesse pensando no que poderia ter feito.

Caminhando em direção ao final do corredor, os dois emissários encontraram com Sira, Jasmim, Alastar e Sho que haviam retornado da busca na floresta por mais caçadores.

— Prima, como eles estão? — disse Sira.

— No mesmo estado de antes, acredito que eles só vão acordar amanhã — disse Lia.

— Onde está o Jinn? — disse Luther procurando pelo seu amigo.

— Ele foi ver a Nádia e avisar a senhora Kami que a floresta está livre de caçadores, finalmente acabou. Ainda faremos uma nova busca para ter certeza, mas parece que Poltergeist foi embora e não tem intenção em retornar — falou Jasmim.

As palavras de Jasmim trouxeram um enorme alívio no peito de Luther, porém ao sentir o olhar de Sira, ele se lembrou que havia algumas questões importantes a serem tratadas com a Princesa do Vento e a cara de Jasmim apenas reforçou isso.

— Eu conversei com Jasmim e Jinn sobre o draconiano com mais calma e chegamos ao acordo de deixar ele sob vigia de Alastar, não quero ouvir reclamações sobre isso Luther — disse Sira.

— Se alguém for vigiar Castiel, serei eu. Ele confia em mim e isso vai ser bem menos desconfortável para ele do que ter um desconhecido o vigiando — disse Luther.

— O conforto dele é irrelevante e você sabe muito bem disso! Está claro que nesse pouco tempo vocês se apegaram ao draconiano e não entendem o nível do problema que ele representa.

— Sira, eu estava na praça com você, você se esqueceu? Eu sei bem que ele é perigoso.

— Ótimo, chegamos a um acordo. Alastar você vai ficar de olho no draconiano.

O guarda assentiu ao ouvir as ordens da princesa e quando Luther estava prestes a protestar, Jasmim interviu dizendo:

— Sira, o Castiel não representa risco a ninguém, como eu expliquei antes, aquilo só aconteceu porque ele foi provocado. Deixe que o Luther fique de olho nele, vai ser melhor. Ele já está desconfortável o suficiente por não estar com suas memórias e vai acordar se sentindo terrível pelo que aconteceu mais cedo. Não precisamos tornar as coisas ainda piores para ele.

— Aquele homem é da raça mais poderosa que esse mundo já viu! Segundo as histórias um draconiano sem runa é uma força a ser temida, mas este tem uma runa elemental e mesmo à beira da exaustão ele ainda podia ter matado um de nós se não tivéssemos tido cuidado. Eu entendo que vocês se importam com ele, mas não podem agir baseados em suas emoções. Pensaram no que pode acontecer se ele recuperar as memórias e virar nosso inimigo? — disse Sira.

Luther, Jasmim e Lia se mantiveram em silêncio, aquela era uma possibilidade que normalmente preocupava os três, porém seus sentimentos diziam que aquilo não era possível e isso era a prova de que Sira estava correta em seu argumento. Eles não estavam agindo de forma imparcial.

O som da porta de um dos quartos se abrindo chamou a atenção de todos e se apoiando no portal estava Castiel ainda fraco. Jasmim correu em sua direção para auxiliá-lo a ficar de pé e ele disse:

— Está tudo Luther, não tem problema de vigiarem. Eu peço desculpas do fundo do meu coração por todo o dano que fiz e de verdade eu não fazia ideia de que eu era tão perigoso assim, porém se minhas palavras valerem de algo… eu prometo que não vou ferir ninguém. Não sou um monstro!

Castiel colocou a mão em seu abdômen ao sentir uma pontada, deixando os seus amigos preocupados.

— Você não devia ter saído da sua cama, Castiel. Vamos voltar — disse Jasmim.

Após falar como uma mãe preocupada, ela levou Castiel de volta para sua cama e Luther entrou no quarto com Lia.

— Desculpe pelas coisas que você ouviu, nós não consideramos você um monstro e vamos te ajudar, como eu prometi que faríamos — disse Luther envergonhado.

— Sei que começamos com o pé direito, mas eu também não acredito que você seja um monstro Castiel — disse Lia.

— Obrigado gente, eu sei que vocês não me veem assim, embora tenham suas preocupações. Não se preocupem em deixar aquele cara me vigiando, vai ser melhor para mostrar que eu não sou uma ameaça — disse Castiel.

Deixando que o draconiano descansasse por mais tempo, os emissários deixaram o quarto mesmo tendo perguntas sobre a sua batalha com a emissária e esconderam o fato de estarem intrigados que Castiel conseguiu acordar e até mesmo se levantar da cama em tão pouco tempo.

Do lado de fora, Alastar estava ao lado da porta de guarda e Sho ficou de guarda na outra porta onde estava a caçadora. Aborrecido por Castiel ter escutado o que Sira havia dito, Luther encarou a princesa que estava com a postura mais rígida do que o normal, nada que seria significativo para muitos, mas para Luther que a conhecia muito bem, era intrigante.

“Vou conversar com ela quando estivermos a sós, tem alguma coisa errada acontecendo. Eu tenho certeza, a Sira não é desse jeito, pelo menos não normalmente”, pensou Luther.

 

 

No quarto de Himiko, o doutor da cidade conferiu Nádia, que estava deitada na enorme cama do quarto, após ter sido encontrada no beco para a saída dos fundos da delegacia com os corpos dos voluntários mortos.

Quando ela foi encontrada e levada para Himiko, a nobre quase teve um ataque de pânico pensando no pior, mas foi logo tranquilizada pelo médico que não parecia ser nada grave e mesmo sabendo que tinha várias obrigações, Himiko se manteve ao lado de Nádia, sentada em uma cadeira ao lado da cama, desde que foi levada ao seu quarto.

Assim que o médico terminou, ele voltou sua atenção para a nobre que aguardava pacientemente pela informação do estado de Nádia e falou:

— Ela está bem, parece que ela levou uma pancada muito forte na cabeça, muito forte. Isso seria problemático se ela não fosse uma usuária de magia, mas parece que o fator de cura mágico dela já está cuidando do problema. 

— Então ela vai ficar bem? — disse Himiko.

— Sim.

Aliviada, Himiko segurou a mão direita de Nádia e agradeceu ao doutor que se retirou para voltar a cuidar dos cidadãos feridos.

— Desculpe ter te ignorado depois da morte da sua mãe, eu usei de desculpas que precisa lidar com os problemas da cidade, porém a verdade é que não queria te enfrentar também. Sua mãe morreu por minha causa, seja por escolha dela ou não, e sinceramente parte de mim não sabe como lidar com isso — disse Himiko.

Himiko ficou em silêncio por um instante pensativa e então continuou a falar:

— Eu prometo que vou fazer melhor do que fiz até agora, vou tentar com todas as minhas forças. Desculpe, de verdade.

A nobre encostou sua cabeça na cama fazendo seu melhor para não chorar mais e se assustou ao sentir alguém apertando seu pulso.

Se lembrando de tudo que havia acontecido antes de ser atingida, Nádia se sentou na cama assustada e confusa e falou repetidas vezes:

— Freirr e Bogna são Emissárias de Sangue!

— Calma, Nádia, por favor se acalme! — disse Himiko.

Porém, Nádia pareceu não escutar a nobre e continuou repetindo o mesmo e sem conseguir se soltar de sua amiga, Himiko falou:

— Margery! Alguém me ajude!

“O que fizeram com você Nádia?”, pensou Himiko.



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