Dominação Ancestral Brasileira

Autor(a): Mateus Lopes Jardim


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 211: Dia de Casamento(3)

— Filho...

Baki olha Mythro de cima para baixo. Checando as condições da vestimenta. Uma fina camisa de manga longa feita de Algodão-Nuvem branco, com pequenas barras de ouro clipadas no punho das mangas. Calça azul celeste, com tiras de couro na coxa e calcanhar. Um colar com um canino cinza, da promessa feita há tantos anos atrás.

— Casamento. Como se casam no Abismo?

— Não sei. Sei que no enterro de uma pessoa, o caixão, que é mais apertado e leve para que uma pessoa somente o carregue. Assim o homem mais velho vivo na família carrega a pessoa morta até o lugar escavado para descanso. O fogo o queimando vivo é a representação da dor compartilhada em perder a pessoa.

— Que lindo. Quando eu e seu pai formos, quero que você nos enterre assim.

Brosch, no fundo da sala abre um sorriso, embora uma lágrima escorra também.

— Não precisa pensar que isso significa necessariamente algo. Vamos viver bem, e muito. Seu pai vai proteger sua mãe sempre. E temos você também, o homem que se tornará o mais forte de todo octógono. Mas o tempo é imparcial. Quando formos, nos honre. Assim poderemos viver sabendo que quando deixarmos esta terra. Seremos lembrados. Tudo que precisamos saber ao fechar os olhos uma ultima vez, é que em algum lugar, em alguma memória, nós vivemos. Saber que nossas ações em algum momento, beneficiaram alguém de maneira verdadeira. Assim, nós, seres mortais, podemos ir em frente a um novo desígnio sem temer. A verdadeira vida após a morte é ser lembrado. Nada é mais sagrado do que ser inspiração da ação benevolente de um outro ser.

De alguma forma, Mythro consegue enxergar alguma verdade dentro dessas palavras. Gornn abre os olhos sonolentos, e um leve brilho irradia deles.

“Existem mortais que sabem mais que velhos ancestrais que já viram estrelas nascerem e morrerem”

— Eu encerrarei essa guerra logo. Vinte anos no máximo. Quando alcançarmos a paz, só precisarão se preocupar em como paparicar seus netos.

Brosch e Baki riem juntos e abraçam Mythro. O jovem Hipernova também chora, as emoções, intensas e misturadas, porém puras.

— Filho. Se o casamento que você nos pediu não é do Abismo, é de qual lugar?

— Será misturado. Sei que eu e Mits queimaremos os caninos cinza. Existiu uma dupla de lobos, um casal, que nunca se juntou a matilha alguma. Os caninos deles eram cinza.  Dizem que quando eles foram finalmente mortos por caçadores, enquanto morriam, seus caninos se tornaram pó, e este pó espiralou no ar até tomar forma de dois lobos se unindo. Então o lobo unificado voou em direção ao sol, feliz. Quando queimarmos os caninos, seremos um. Esta é a representação.

— E o quê mais?

— Bem, haverá dança. Daremos 36 passos em cada conjunto de movimento. Serão 10 conjuntos, são uma forma de agradecimento aos céus. Esta é uma dança chamada, Dança Matrimonial Divina. Geralmente ela é para ser feita nas estrelas. Nossos pais preparariam um tapete brilhante em direção uma estrela, dançaríamos 36 vezes por ela. Adaptamos para algo menos extravagante.

— Dançar em volta de uma estrela? Nossa, isso também é possível?

— Com maior cultivação sim, mãe. Muitas coisas impossíveis se tornam possíveis com suficiente força e compreensão.

Núbia aparece na porta da sala. Fazendo sons, ela avisa que chegou a hora.

Brosch e Baki seguram nas mãos de Mythro. Nas vilas do Oeste, o casamento é sempre motivo de celebração.

Mas pode ser feito de maneira particular ou coletiva. Isso depende exclusivamente da condição financeira, ou de relevância do casal em si.

Financeiramente falando, o casamento seria aberto ao público, e quem quisesse ir iria, para desejar saúde e felicidade aos casados e compartilhar da comida e bebida, assim levando o regozijo da união aos demais. Caso o casal fosse mais humilde, ele seria privado, para apenas aqueles que o casal convide.

Quanto a relevância, isso claro tem fator financeiro, mas também tem relação pública. Quando pessoas em cargos de liderança, ou benfeitores anunciam casamento, o Senhor da Casa Maior faz um dia livre de trabalho, claro aqueles que quiserem continuar trabalhando trabalham em condições especiais, porém sem nenhum deletério a suas ausências. Assim todos podem participar na comemoração, e existem subsídios da própria Casa Maior.

Como no caso o Senhor da Casa Maior estava casando, obviamente era um dia para todos celebrarem, e aqueles que precisavam de um dinheiro extra, ajudam servindo aos diversos detalhes e entretendo os convidados.

Clãs e Sectos do Oeste inteiro estavam acomodados dentro das paredes invioláveis. Homens e mulheres, acompanhados ou não, olhavam a região com diversos sentimentos no peito e expressões faciais.

Limites diferentes demarcavam o quão próximo da cerimônia poderiam estar os convidados. Aqueles das Vilas poderiam estar o mais próximo. Seguido do Oeste de Fora, Meio-Oeste e Oeste Profundo. O mesmo valia para o Leste. Poucos vieram, mas ainda assim marcavam sua presença.

Mythro não excluiu nenhum clã ou secto em seu convite. Inimigos e aliados assistiriam à cerimônia. Presentes se amontoavam numa parte do pátio, alguns guardas do clã da Lua vigiavam e protegiam os presentes. Como os mesmos eram desassociados das Vilas, eles seguiam uma outra agenda.

Alguns em exceção, estavam em assentos exclusivos, devido a proximidade com o casal.

Nestes assentos de madeira elegante e bem talhada, estavam Craz, irmão mais velho de Bijin e Mythro, ele foi aliviado de seus deveres no Clã da Lua para este evento importante. Além dele, Ariã, Mirmo Mopak, Munica e Marsha Yulang, Maki e o jovem esquadrão de expedição a qual Mythro pertencia, Oprita e Tuin, os artesãos do Clã da Lua que ajudaram Mythro depois de uma intensa batalha contra os Coelhos de Chifres, Kou Yulang, o Patriarca da Lua, e alguns outros.

Um trio de pessoas aguardavam sob uma construção feita apenas para o casamento, de madeira. Ela assemelhava uma torre de castelo, mas claro, só tinha 3 metros de altura e espaço para 10 pessoas no máximo. O espaço de visão era amplo, já que não eram paredes que erguiam a “torre”, e sim vigas finas e firmes para que todos pudessem acompanhar a cerimônia.

Dois tapetes alcançavam a torre. Vindo uma do leste e outra do oeste. Na do Oeste é possível ver Mythro chegando, de mãos dadas acompanhado de seus pais adotivos. Do outro, Mits chega andando, com seu pai, segurando sua mão, e Fernan acompanhando mais afastado de lado. Invisível aos mortais, Mutima segura a mão de Mits.

Eles andam no mesmo ritmo. Nem rápido, nem devagar demais. Seus olhos se encontram e não saem um do outro por todo o percurso, até finalmente serem deixados um na frente do outro.

Os acompanhantes se cumprimentam, e juntam suas testas ao noivo(a) de seu familiar. Então, se movem para o lado e ficam em pé assistindo. Somente eles estando tão próximos da cerimônia.

Mythro segura a mão de Mits e ambos sorriem se olhando fundo nos olhos.

Os três casamenteiros batem as palmas. E qualquer barulho que houvesse se cala.

— Estamos aqui hoje, todos, para unir em matrimônio o casal abençoado de Dominum. Mythro Zumb’la e Mits Paschi. Vocês estão presentes hoje sob seus desejos íntimos e verdadeiros?

Ambos respondem “sim”.

— Então que se iniciem os votos. Que o Louvor, o Alcance e a Lei sejam seus guias.

Estes três eram casamenteiros comuns do Óctogno, foram instruídos a fazerem o casamento como seres divinos geralmente se casam. Pelo menos, parte de como acontece.

Ao dizer isso, cada um dos três levantavam uma joia cuspida. A primeira tinha um contorno humano, porém somente com o esboço da cabeça escupido, o resto era uma forma lisa sem membros, levemente arredondada. Ela representava a alma. O segundo era uma bola de energia cheia de linhas, e algumas pequenas imagens talhadas de animais, armas de guerra, livros, entre outros. Representava a cultivação. O último era um corpo desenhado, de mãos e braços estendidos, mas com uma mão fechada e outra aberta. Falava sobre a Lei de Corpo.

O casamento de seres místicos ou divinos tinha este elemento principal. O respeito pelos 3 caminhos de comunhão com o cosmo.

— Mits Paschi, hoje quero firmar com você um pacto eterno reconhecido pelos homens, o céu e a terra, e o universo. Neste pacto prometo cumprir meu dever como seu escolhido as vicissitudes da vida. Manter-me sob nossos acordos, te respeitar e amar, me doar as suas tristezas, e ser parte de suas alegrias. Ser seu escudo e espada, fogo para a noite, e sombra para o dia.

Mits, já com lágrimas nos olhos, mas com o sorriso mais belo já visto por seu pai em seu rosto, começa seus votos:

— Mythro Zumb’la, hoje quero firmar com você um pacto eterno reconhecido pelos homens, o céu e a terra, e o universo. Neste pacto prometo cumprir meu dever como sua escolhida as vicissitudes da vida. Manter-me sob nossos acordos, te respeitar e amar, me doar as suas tristezas, e ser parte de suas alegrias. Ser seu escudo e espada, fogo para a noite, e sombra para o dia.

Tendo os votos formais sido feitos, eles se ajoelham cada um em frente ao(s) pai(s) de seu companheiro, e recebem em suas cabeças água, terra e uma Jasmim-Borboleta-Branca. Flor que representa transformação e recomeço. Iniciando uma nova etapa da vida que poderia por eles ser escritas.

Agora com os votos formais feitos, eles poderiam dizer seus motivos para os votos. Ou como todos conheciam: Votos Informais.



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