Volume 1: Caçadores – Arco 1: Ressurgimento
Capitulo 3: Do Lado de Fora
De volta ao castelo, eu estava diante daquela mesma grande carroça real, em frente a sua porta se encontrava o homem de cabelo prateado conversando com um outro homem de cabelo lambido.
Aquele mesmo indivíduo antes de nossa chegada, rapidamente seguiu para dentro do castelo.
Enquanto nos aproximávamos eu não conseguia manter minhas mãos longe dos meus olhos, eles ainda estavam marejados e coçando.
Abaixando meus braços, ele apareceu; Dominus. Apoiado na carroça ao lado do homem de cabelo prateado.
Algo naquele homem me era estranho, ele batia com todas as descrições de um Nullu: pele escura, olhos sombrios, nenhuma aparente resida de energia, mas havia uma única diferença, seu cabelo era claro ao invés de escuro.
— Você irá Akiris?
O mesmo não respondeu, apenas fez um sinal de positivo usando sua mão direita sem tirar os olhos da entrada do castelo. Dominus se virou, olhou para nós e começou a explicar.
— Como todos sabem a base dos Caçadores é uma ilha. Normalmente, vocês pegariam um barco no porto rumo a base, porém, ocorreu um imprevisto. Uma criatura destruiu o porto de Bahamut.
Um monstro destruiu o porto? Mas os guardas estão sempre rondando por volta da costa e os Caçadores pelas fronteiras, como é possível que uma criatura tenha passado por eles?
— Precisaremos ir para Dracaries e utilizar seu porto, agora que já sabem o que fazer, se apressem — Em seu final ainda virado para nós, ele apontou para direita.
Por instinto olhei para a mesma direção; não havia nada de relevante lá apenas o horizonte da capital, mas quando retornei meu campo de visão, Dominus não estava mais conosco.
Desapareceu sem fazer barulho ou mesmo deixar rastros. Quase ao mesmo tempo, o homem de cabelo lambido retornou.
— Meu rei, realizei o que me pediu.
— Certo, obrigado Cris, vamos para casa.
Cris subiu para as rédeas e Akiris abriu a porta realizando uma reverência acompanhada de um gesto com seu braço para entrarmos.
O homem do pincel foi o primeiro sem pestanejar, logo atrás eu o segui, em seguida, ainda sem tirar os olhos de mim veio Soltrone, com Akiris sendo o último a entrar.
O interior da carruagem era incrível. Uma madeira clara e resistente, duas janelas na parte mais perto das rédeas, os bancos foram moldados com couro e em cima estava uma ceda vermelha com detalhes dourados. Claramente uma carruagem de um rei.
Logo após o fechar das portas começamos a andar pelas estradas de Bahamut. Nenhuma das três pessoas pareciam terem vontade alguma de conversar... aquela viagem iria ser muito desagradável.
Após um tempo relativamente mediano a carruagem começou a diminuir a velocidade, até que finalmente o galope dos cavalos cessaram.
— Majestade...
Escutei algumas batidas em algum tipo de pequena abertura fechada no centro da parede, ela parecia ficar atrás do banco onde sentava quem guiava as rédeas.
Akiris não respondeu, apenas observou. As batidas ficaram muito mais fortes e então escutei uma voz diferente.
— Akiris me deixa entrar.
— Não Karla.
— Por queee?
— Você vai explodir a carruagem de novo.
— Por favoor.
Pela voz e o nome, Akiris parecia estar conversando com uma mulher através da porta da carruagem.
No último pedido da moça, Akiris olhou de relance para Soltrone por um momento, ao que parecia ele não percebeu ou simplesmente não se importou com Akiris, continuou com os olhos vidrados em mim... que desconfortável.
— Não tem mais espaço, sente no chão — Akiris falou voltando a observar a janela.
Um grande barulho de metal batendo acontecia do lado de fora da carruagem até que em frente a porta, apareceu a mulher chamada Karla. Ela entrou agachada e quase que se jogou no chão.
Karla era muito alta, aparentava possuir quase o tamanho de Gaius, seu longo cabelo vermelho vibrante parecia um fogo em brasas e seus olhos eram vermelhos com pupilas pretas como as de Soltrone.
Mas, o que mais chamava atenção naquela mulher não era seu cabelo, mas sim sua armadura.
Uma defesa pesada com uma semelhança a escamas vermelhas de um animal, aquela armadura tinha diversos compartimentos de itens que eu desconhecia totalmente.
A carruagem retomou seu caminho após Karla fechar a porta. Agora eramos cinco estranhos na mesmo apertado local... em completo silêncio.
Passaram-se cinco, dez, quinze, vinte minutos, e nada, nenhuma palavra foi proferida.
As ruas que estávamos passando eram diferentes, eu nunca havia passado por alí antes.
Eu encontrei pessoas com roupas completamente diferentes, na verdade... assemelhavam-se mais a trapos do que roupas.
Já havia um bom tempo que tinhamos saído da parte central da capital, as casas bonitas, pessoas elegantes, os sorrisos de cada cidadão de Bahamut; tinham desaparecido.
Acreditei que aquela área fosse um local de mão de obra, claro, isso era apenas uma forma mais bonita de chamar um campo de concentração.
Perante aquela espécie de novo habitat, mais uma vez a carruagem parou. Cris abriu a pequena abertura e com um olhar preocupado falou com Akiris:
— Majestade, temos um problema.
Akiris se levantou um pouco inclinado com Karla se movimentando rapidamente para abrir a porta e logo em seguida sair junto de Akiris.
Com a porta ainda aberta, senti um calor escaldante emanando do lado de fora da carruagem, um calor estupidamente forte.
Eu não precisava nem mesmo ver ou sair, a certeza absoluta da resposta já estava em minha cabeça, aquele calor só poderia ser uma coisa, magia!
Eu sabia que eu deveria ficar na carruagem, era óbvio e o racional a se fazer, mas não me aguentei, fui direto para fora.
Do lado de fora da carruagem, fiquei abismado. A área que estávamos passando antes era uma obra para o reino, mas ali onde pisávamos, aquele cheiro ruim, ar pesado, lixos empilhados, casas frágeis de pano e tendas... eram as moradias dos Nullus.
Quase todas as espécies de casas eram de tendas feitas de pano, com poucas possuindo ao menos algum tipo de teto de madeira para se esconderem da chuva, sendo diversas daquelas casas... em combustão. E a causa de todo aquele fogo estava em frente a carruagem, magma.
Aquele magma que estava emanando todo o calor fulminante. Do lado contrário a carruagem haviam diversos Nullus espalhados, todos acorrentados, machucados, vestindo roupas rasgadas e tremendo.
No centro deles eu enxerguei um homem com roupas marrom escuras completamente limpas. Pela sua aparência era um oficial de Bahamut.
De volta a magma, Akiris caminhava e caminhava bem próximo, olhando de um lado a outro, ele não parecia ligar para o calor absurdo de toda a lava em sua frente.
Observou e retornou com suas roupas intactas, sem nem ao menos uma queimadura na ceda. Aproximou-se e virou para Karla que parecia bem animada.
— Consegue empurrar o magma?
Karla olhou um pouco mais baixo em direção a Akiris e abriu um enorme sorriso, sorriso aquele que me assustou um pouco.
— Você ta me pedindo pra explodir?!
— Sim, mas espere todos se afastarem primeiro.
Akiris caminhou em direção ao oficial enquanto Karla pulava com seus braços esticados para cima.
Dentro da carruagem os dois Caçadores de Dominus não aparentavam possuírem qualquer intenção de fazerem alguma coisa. Na verdade, Soltrone foi diferente do seu colega, o mesmo em seguida saiu para continuar a sua vigilância.
O oficial também se aproximou em direção a Akiris, entretanto, a vão entre eles era nitidamente distante.
— Mande todos se afastarem, vamos abrir o caminho — Akiris ordenou com um tom de firmeza.
— Calado! E não aproxime-se mais! Não irei ouvir uma aberração suja como você, sou um leal súdito do rei, suas ordens são absolutas. Agora, volte ao trabalho!
Akiris por sua vez moveu sua mão direita para dentro de seu bolso, retirando um documento, andou três passos para frente e mostrou uma pequena fração.
— Estamos aqui por Javier Bahamut.
Aquele oficial olhou e tocou naquela pequena fração; a troca de expressão foi impressionante. Ele levantou sua mão esquerda e a passou no rosto.
— Claro... o rei é absoluto — oficial encarando o chão falou puxando seu quepe para baixo.
Em seguida o mesmo deu alguns passos para trás e cuspiu na frente de Akiris, virou-se e ordenou para que todas aquelas pessoas se afastassem.
Elas obedeceram no mesmo instante, todas de uma só vez. Todos caminharam para trás, cerca de vinte à trinta passos, estavam relativamente distantes, assim como o oficial e a carruagem.
Akiris olhou para nós e apontou em direção a todos sem falar nada. Entendi a mensagem e também me afastei.
Ao me virar, observei Karla levantando os braços para cima deixando suas mãos próximas umas das outras, porém, não juntas.
Entre elas começou a surgir uma esfera vermelha meio distorcida, aquela esfera parecia estar pulsando na mão de Karla, seu grande cabelo aparentava reagir a esfera, eles se mexiam quase que em sincronia. Karla abaixou seus braços um pouco e soltou a esfera no magma.
O som da explosão foi enorme, todos ouviram. Acompanhado do barulho havia magma voando pelos arredores de Karla, respingando até em algumas casas mais próximas.
Completamente suja de magma do rosto para baixo ela não aparentava se importar... Karla nem mesmo estava queimando!
Comecei a me aproximar na tentativa de entender o que ela havia feito. Aquele magma foi empurrado para todo canto, deixando para trás somente a estrada quase sem brasas, ela realizou algum tipo de grande explosão, mas, não existia buraco ou fenda no chão.
Pela primeira vez na minha vida... eu havia presenciado magia em ação.
Akiris se aproximou olhando a estrada e fazendo um sinal para prosseguir usando sua mão direita.
Cris passou com a carroça em cima das brasas quase apagadas. As rodas e a carruagem estavam ilesas.
— Wally, entre — disse Akiris.
Eu estava pasmo, pensando que talvez Soltrone fizesse algo semelhante, não o questionei e entrei na carruagem.
Prestes a me sentar, encontrei o segundo Caçador conversando com seu próprio colo. Novamente, ele olhava e acariciava o vento, aquele Caçador até aparentava ser um cara legal, mas ele também era muito bizarro.
O rosto dele, a pele e até os dedos eram muito estranhos, ele era pálido e gelado, nem parecia uma pessoa de verdade.
Eu estava esperando nossa partida observando o Caçador. Olhando pela janela, enxerguei Akiris quase na porta e Karla olhando os arredores. Soltrone entrou, sentou perto do segundo Caçador e perguntou:
— Yuki, ta falando com quem?
Soltrone estava tão confuso quanto eu. O Caçador chamado Yuki olhou para ele... confuso? Ele aparentava realmente estar tão confuso quanto nós.
— Como assim? Com meu irmão mais novo, ele veio na carruagem dessa vez.
Yuki sorriu de canto e voltou a acariciar o vento como se fosse algo normal. Abismado com Yuki... senti um forte arrepio.
Meu corpo paralisou, eu me encontrava completamente imóvel.
Eu estava sentindo uma mão no meu ombro. Mas os Caçadores estavam na minha frente, Karla e Akiris se encontravam lá fora... então, quem estava tocando meu ombro?
— Quem foi que espalhou o magma?
Soltrone demonstrava uma expressão tranquila e Yuki parecia completamente relaxado. Graças as suas reações, eu respirei, parei e pensei por um segundo. Reconhecia a voz, aquela voz era de Dominus.
De fato era ele, bastante apertado pela altura da carruagem e esperando minha resposta. Eu me inclinei um pouco e apontei para a Karla através da janela lacrada da carruagem.
Dominus se levantou muito agachado, quase engatinhando, passou por Akiris e ficou de frente com Karla. Ela estava o encarando com o corpo totalmente parado e acho que até mesmo tremendo.
— Você que espalhou o magma?
Karla juntou seus braços e pernas ao corpo em uma espécie de contingência e balançou sua cabeça em positivo.
— Pra, pra, pra, prazer... senhor Dominus
— Saia daqui, agora.
Imediatamente Karla começou a seguir para a esquerda em direção contrária a carruagem.
— Eii! Eiii! Assim não vale! — Gritou Karla com sua cabeça virada mais para nós do que o resto de seu corpo.
Akiris bem próximo de Dominus estava preparando alguma coisa, pela janela, eu o vi levantar sua mão direita, morder a pele do lado interior de seu dedão, raspar na outra mão, juntar as duas e dizer alguma coisa.
Mais ao lado, em direção a Karla, ela tinha parado de se mover. Ajeitou sua cabeça e apertou os punhos.
Aos poucos ela se virou para a carruagem. Enquanto ela virava algo caía de seu rosto, em seus olhos... haviam sangue!
Karla realizou um pequeno grunhido mostrando os dentes e bateu o pé no chão algumas vezes.
Olhando para Dominus, percebi que seus punhos estavam fechados firmemente, aquilo era bem semelhante ao que aconteceu na arena, entretanto, eu não sentia nada vindo do chão.
— Ela não vem com a gente — Dominus falou ainda olhando para Karla.
— Ela é minha guarda costas, e a pessoa mais perigosa atualmente em Bahamut, ela vem.
Akiris se virou e entrou na carruagem enquanto Karla se aproximava com um pouco de distância de Dominus. Ela entrou limpando o que sobrou em seu rosto encarando Akiris.
— Já falei pra avisar quando for fazer isso!
Estava cada vez mais confuso sobre todas aquelas pessoas, Akiris parecia ter a minha idade e era um rei e um rei Nullu? Karla parecia ser maluca, uma verdadeira doida de pedra.
Yuki era recluso e conversava com o vento... e por que raios Soltrone estava sujo de sangue da boca até o pescoço?... Ele devorou alguém?!... Será que todos os Caçadores de Venatorum seriam assim?
— Saiam, vamos caçar a criatura agora — Dominus ordenou encarando o magma.
Yuki e Soltrone levantaram e saíram na mesma hora, surpreso, eu segui os dois e também desci, com Akiris e Karla saindo da carruagem por últimos.
— Vamos rastrear a criatura pelo grande rastro de magma.
Estranhamente, Akiris se distanciou, caminhou até Cris, entregou um papel e comunicou algo. Consequentemente a carruagem partiu pela estrada numa grande velocidade.
Dominus rapidamente saiu seguindo o rastro do magma, com Yuki logo atrás e Akiris posteriormente, Karla foi seguindo Akiris, enquanto eu comecei a caminhar ao lado dela, com Soltrone sendo o último de nós.
Isso que era ser uma verdadeira autoridade, ninguém sequer questionou Dominus ou mesmo disse algo, o lider da Ordem dos Caçadores era realmente tudo o que Gal dizia.
Quanto tempo se passou? Cinco minutos? Dez? Eu não saba dizer, já estavamos caminhando a muito tempo.
Já cansado e sem entender de onde vinha toda aquele magma, eu levantei minha cabeça em direção ao horizonte, e que visão horrível beirou meus olhos perto do fim daquela caminhada silênciosa.
O barulho da lava destruindo tudo o que tocasse acompanhada daquele horizonte avermelhado, eram devastadores.
Junto ao som das brasas que pularam da lava queimando o gramado, eu escutava algo se arrastando.
Virei-me para saciar meu temor e encontrei Soltrone se afastando para a direita. Ele puxou sua foice enquanto retirava mais alguma coisa de baixo de seu manto.
O seu manto branco sujo de sangue se levantou aos poucos, revelando... asas?! Ele possuía asas?! Pelos Deuses por que raios o Soltrone tinha asas?! Aquilo era normal?! Não, não, não, não, obvio que não!
Eu nunca tinha visto asas assim na minha vida, ao invés de penas... se assemelhavam mais com... cabelos.
Fios longos entrelaçados entre si formando longas camadas que balançavam com a ventania.
Por baixo daquela camada gigante de cabelo eu conseguia enxergar pele. Os cabelos estavam saindo de uma camada de pele humana, como se fosse uma variação de seu corpo e não algum tipo de magia.
Aquele cara tinha asas de verdade... ainda assim o mais curioso era que mesmo com aquela aparência, suas asas não me amedrontaram, do contrário; elas acolheram.
Soltrone começou a levantar voo subindo reto para cima, provavelmente usando alguma magia para impulso.
Já em boa altitude, bateu suas asas mantendo algum tipo de estabilidade no ar, ele olhava para um lado, depois para outro, procurando algo nos arredores.
Em um rápido momento ele olhou para baixo e então desceu em frente a Dominus.
— Lava chegando, e rápido!
Junto a sua breve explicação aquele barulho aumentou. Algo estava se arrastando quase ao nosso lado.
De repente escutei um grunhido totalmente grave vindo de baixo da terra, instintivamente direcionei minha visão para a origem do som perturbador; e eu o vi. Uma criatura gigante que havia saído da terra pulando em nossa direção.
Seu pelo curto de cor mais escura distacava seus músculos enormes com seus olhos brilhando ferozmente em vermelho.
Mantendo-se de pé, percebia-se presas afiadas em suas patas. Ele se assemelhava a um urso, mas existia algo muito mais diferente nele que apenas sua cor, sua boca não possuía apenas dentes afiados, mas também uma fonte de magma sem fim!
Aquele monstro saiu do fundo da terra direcionando seu punho esquerdo em minha direção... eu estava paralisado.
Nunca pensei que as criaturas que os Caçadores enfrentavam... seriam tão assustadoras! Eu queria correr, mas minhas pernas não se mexiam, eu queria gritar, mas minha boca não abria, eu só queria... ve-la de novo.
Com minha visão tomada pela criatura e minha morte iminente, minha mãe foi a única coisa que eu enxerguei nitidamente.
Até que Karla apareceu de repente socando a boca do monstro o jogando para a direita. O barulho e a pressão do impacto foram surreais.
O punho de Karla estava repleto de magma, embora ela tenha demonstrado resistir a aquela lava, agora sua armadura estava deteriorando e sua pele queimando bem lentamente.
Karla caminhou um pouco para o lado e se pôs entre mim e a criatura. Suas costas longas repentinamente me lembraram de Gaius, minha vida inteira parecia estar sendo reprisada em minha cabeça.
Tenho certeza que ele ficaria decepcionado comigo naquele instante. Eu via Karla, uma mulher que eu nem mesmo conhecia, caminhar até a criatura para me proteger... todos aqueles anos pareciam simplesmente terem sidos jogados no lixo em poucos segundos!
— POR QUE CARALHOS VOCÊ NÃO SE MEXE?!! — eu gritava em silencio.
Mas não havia resposta para minha pergunta, não havia nada para acalentar meu lamentom... ou talvez... o próprio silêncio fosse a minha resposta. Eu não me movia porque era fraco, não me mexia porque eu era uma decepção, não conseguia porque eu era um fracasso... ponto final.
Segurando minhas lágrimas o rugido do monstro a minha frente rouba minha atenção outra vez, e acompanhado dele um vento veloz aconteceu rapidamente pelo meu lado esquerdo. Soltrone fez uma investida rápida no ar para cima do monstro, fincando a lâmina de sua foice por pouco no ombro da criatura.
Com o monstro de costas para Karla ela não hesitou. Daquela vez com a mão esquerda, Karla o acertou enquanto o urso se virava de volta rugindo como uma fera selvagem.
Mesmo golpeado a criatura jorrou magma de sua boca em direção a Karla, que com sua mão direita conseguiu se proteger utilizando a sua esfera explosiva. Todo aquele magma havia respingado de volta na criatura e nos arredores.
Empurrado pela explosão, a criatura teve sua visão tomada pelo seu próprio magma, entretanto, Karla não moveu mais nenhum dedo, ela permaneceu imóvel, enquanto Soltrone aproveitou voando, batendo e retornando, progressivamente.
Diante daquela paisagem passos rápidos soaram pelos meus ouvidos, alguém estava correndo em minha direção. Aquela pessoa... era Akiris.
Ele passou do meu lado direito correndo em direção a aquela aberração!
Do mesmo lado que Akiris veio encontrei mais uma visão horrenda, uma onda gigante de magma vindo em direção ao caçador Yuki.
Ele estava relativamente distante com os braços para frente brilhando em azul, brilho esse que parecia estar direcionado para Karla.
Com os passos de Akiris já relativamente baixos, eu observei de volta o lado da batalha. Uma silhueta azul estava surgindo perante a Karla, fazendo-a parecer cada vez mais outra coisa.
Ela ficou azul, maior, e quase idêntica a criatura, com sua silhueta azul sendo a única diferença.
O monstro vermelho se defendendo dos ataques consecutivos de Soltrone retomou sua visão. Virou seu pescoço bruptamente e jorrou magma perante os céus.
Soltrone desviava o máximo que conseguia enquanto se afastava. Logo em seguida a fera preparou outro soco focando completamente na silhueta azul.
Quando Akiris já se encontrava entre a Karla e o monstro, enquanto a lava estava prestes a encomtra-los Akiris preparou um ataque de mãos nuas, porém, ele simplesmente se dissipou no ar.
Então uma pequena fumaça estranha surgiu em cima do urso, era Akiris! Ele agarrou o pescoço do monstro com seus braços e rapidamente... o quebrou.
O estalo seguido do cair final da Magma no chão foi o clamado do final daquela batalha.
O pescoço do urso ficou totalmente molenga e seu corpo decaiu para frente com Akiris caindo ao seu lado.
Parecia tudo acabado... e realmente apenas parecia, o corpo do monstro começou a emanar uma forte energia, pouco a pouco a criatura foi começando a brilhar, sua pele vermelha escura ficava cada vez mais clara, brilhando fortemente em vermelho, até que simplesmente, explodiu!
Uma grande explosão que me arremessou longe junto a todos os outros. Fui jogado a poucos metros, até que quando cai no chão senti uma enorme dor na cabeça e minha visão totalmente embaçada.
Minha cabeça ardia muito enquanto ouvia meus ouvidos zumbindo. Os únicos sons que conseguia reconhecer eram da grama sendo queimada pelo magma enquanto minha visão aos poucos se apagava.
Um pequeno, leve e aconchegante susurro veio até mim, completamente incompreensível. Onde está? De onde vem? O susurro se tornava mais nítido aos poucos, até virar um cochicho.
— Eu... você... não! Eu não sou você!... não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não, não! NÃO PORRA! Eu não sou você! maldito seja!... MALDITO SEJA O SANGUE!
Ao abrir meus olhos, não sentia dor nenhuma. Conseguia me levantar aos poucos sem problema.
Já de pé, minha cabeça ainda estava doendo um pouco e minha visão se encontrava meio turva. Em minha frente novamente estava ele, Dominus.
Parado olhando os arredores. Com minha visao retornando completamente, eu conseguia enxergar melhor, dos demais, pelo visto apenas Akiris estava no chão.
— Está tudo bem Wally?
— Sim, senhor Dominus... estou bem.
Eu apenas fiquei... parado. Eu apenas observei enquanto pessoas que nunca tinha visto na vida partiram para cima da criatura sem pensar duas vezes.
Treinei minha vida inteira, para no momento decisivo... ficar parado. Definitivamente aquilo não era estar bem.
O impacto da explosão acalmou meu corpo, eu já não estava tremendo, ao menos isso consegui fazer sozinho.
Nos arredores não restou nada do monstro, nem ao menos seu sangue. O local da explosão parecia apenas barro comum em meio a uma grande cratera, até mesmo quase toda a magma havia desaparecido.
A única prova que aquele monstro esteve alí era a destruição e devastação que ele havia deixado para trás.
Até mesmo eu conseguia entender, um demônio como aquele na capital, acabaria com centenas de vidas e talvez apenas a guarda real além dos Caçadores pudessem para-lo.
Mais a diante, Akiris estava se levantando próximo a Karla, para um Nullu, ele se aparentava ileso.
Como? Como aquilo podia ser possível? Aquela explosão foi forte o suficiente até mesmo para me alcançar, e apenas sua blusa vermelha e a jaqueta branca foram destruídas? Aquilo não fazia sentido.
Soltrone retornou flutuando com suas asas semiabertas, em sua mão estava sua foice, mas sua lâmina possuía algo de diferente, um tom avermelhado parecido com o da criatura, por algum motivo eu não gostava de olhar para aquela coisa vermelha, ela me causava uma breve dor de cabeça.
Yuki não parecia ter sido atingido pela explosão, ele caminhou tranquilamente em nossa direção com os braços esticados a alguns centímetros de seu corpo.
— Todos aparentam estarem bem, foi um bom trabalho — Dominus os parabenizou com seu tom contínuo e postura perfeita. — Agora que a criatura foi destruída, vamos retornar para Bahamut e pegar uma carroça — Dominus terminou se virando para Akiris.
Ele se aproximou de Soltrone e lhe entregou um papel. Meu corpo ainda estava molenga, não sabia dizer nem mesmo como ainda estava de pé. Logo, quase sem forças acabei me jogando para trás.
Sentado, ainda me encontrava confuso, talvez até mesmo debilitado, precisava de respostas, respostas para muitas perguntas.
Entretanto, quando procurei o portador das respostas, ele já havia sumido outra vez. Como sempre, sem deixar rastros ou mesmo fazer um simples barulho.
Soltrone parecia bem confuso, ele virava o papel de lado, de cabeça pra baixo, para esquerda, para direita... Será que... ele não sabia ler?
Akiris logo se aproximou, estendeu a mão direita e pegou o papel de Soltrone. Leu por alguns segundos e se virou para nós.
— Conheço o caminho, vamos continuar.
Ele devolveu o papel para Soltrone e começou a caminhar, Karla o seguiu fazendo sinais para acompanharmos.
Um pouco menos zonzo comecei a me levantar e me aproximar de Karla, enquanto Soltrone e Yuki estavam por últimos lado a lado logo atrás de mim.
Minha cabeça ainda ardia muito, mas estava dimuindo aos poucos, diferente de minha mão direita, ela parecia me incomodar muito mais. Talvez um machucado pela queda? Quando a virei, encontrei algo que não deveria estar ali.
Existia um símbolo desenhado em minha mão. Uma espiral quebradiça brilhando fraco em azul com um olho preto fechado no meio.
Exatamente no instante que observei aquele símbolo, minha dor cessou de uma vez. Assim como ontem na arena, um sentimento estranho e frio começou a tomar minha pele, mas para minha sorte, foi apenas um desconforto breve.
Agora que a calmaria havia retornado, eu reprisei direito. Eu sai de casa, conheci Dominus, e presenciei uma batalha real dos caçadores pela primeira vez. Comparando com a arena, aquele meu treinamento pareceu coisa de criança.
Aquele urso... não poderia ser derrotado com apenas força bruta, quantos soldados reais seriam necessários para vencer aquilo? Quatro talvez? Lutar contra uma pessoa é uma coisa, mas uma criatura com sua afinidade descontrolada é totalmente diferente, e eu havia acabado de testemunhar aquilo na pele.
Era como se eu fosse uma formiga perante a ele... e exatamente por isso, algo não saía de minha mente, uma dúvida muito maior do que o motivo do Soltrone possuir asas ou de Karla mal se queimar com a lava mesmo com sua armadura devastada; como? Como um simples Nullu... poderia ser tão forte?
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