Demon And Human Brasileira

Autor(a): The_Mask

Revisão: Hide


Volume 2

Capítulo 32: Máscara de chamas

Soava como uma piada de mal gosto um momento como aquele. Uma desgraça sem tamanho, digna de teatro. Matou um homem, e agora teria de matar aquele que buscava vingança por isso. Arcava com as consequências de seus atos, da forma mais descarada possível. Só se podia rir disso, e era o que Maike fazia. 

Boa sorte peninha, vai que ele fura tua asa de novo!

O vingador de Maike encarou na direção de Arnok, como se o dissecasse. Suas mãos se agitavam, seus pés batiam ansiosos e uma veia em sua testa saltava. 

— Chegou o momento, seu desgraçado. — Ele disse, entre dentes. — Lembre-se do nome daquele que vai te arrancar o couro e depenar suas penas, Isac! Um assassino humano!

Seu grito soou como o sino do início do combate, e todos os telespectadores foram ao delírio. A luta começou, e Isac avançou com velocidade. Arnok ainda estava distraído quando recebeu o primeiro golpe. 

O que diabos deveria fazer? 

Não podia ficar parado, não podia perder ali e agora. Serra não o perdoaria e a pior coisa que poderia fazer era dever para ele de alguma forma. Talvez se ele ficasse se esquivando? 

Os movimentos de Isac não eram nada sofisticados. Previsíveis até certo ponto, dava golpes baixos, seguidos de chutes altos. Então avançava como se estivesse armado com uma espada ou uma faca. Ele talvez fosse muito bom quando armado com suas armas e outros equipamentos, mas ali e agora, Arnok dava conta dele.

Diferente de anos atrás. 

Parece que você ficou mais forte, peninha. Ou Isac que ficou muito fraco?

E se eu tentasse algo?

Em meio a chutes, socos, pontapés e tentativas de imobilização, Arnok apenas se cansava se esquivando dele a todo momento. A platéia já começa a se cansar daquilo. Pedia por sangue, golpes de verdade e que aquilo terminasse de uma vez. O asa negra notava com atenção a cada comentário, a cada xingamento e denegrimento contra sua pessoa, a cada crítica vazia, a cada olhadela de nojo. Todos o conheciam e sabiam de sua capacidade ali, e por isso o menosprezam. 

Ninguém conhecia aquele humano além dele, um fantasma. Um ninguém que era permitido a ser fraco. 

O que acha em peninha?

A voz de Maike ressoava no fundo de seus ouvidos enquanto cada punho de Isac zunia próximo de seus ouvidos. Arnok ainda não havia lhe desferido nenhum golpe, e ele não acertou nenhum contra ele. 

Não gostava da forma como Maike estava agitado. Ele repetia sem parar que tinha esse tal plano, sua presença se agitando e se esgueirando, como uma serpente, no fundo da sua cabeça. Uma sensação horripilante e desconfortante.

Isac parecia ter uma energia sem fim, já o asa negra, a esta altura da luta, já teria derrubado seu inimigo, feito ele desistir, ou pior. Todos na platéia notaram isso, e vaiaram aquele conflito que para quem estava acostumado às lutas daquele lugar, parecia uma partida fajuta. 

Aquelas vaias, todo aquele barulho, a incessante voz de Maike e as ocasionais pontadas de dor no corpo de Arnok pelas queimaduras que causou a si mesmo, além de todos os problemas que havia tido até então naquele dia, fizeram o asa negra descarrilhar. Estava exausto demais para aquilo e queria apenas que acabasse. Apenas não suportou e gritou a plenos pulmões que o fantasma em sua mente fizesse como quisesse. Foi nesse momento de distração que Isac o golpeou, bem no rosto. 

Que assim seja, peninha. 

De cabeça, ainda atordoado pelo golpe, Arnok ouviu a plateia vaia-lo ainda mais. Todas as vozes em uníssono, com um único objetivo, ridicularizar e diminuir o asa negra. Borbulhava em seu âmago uma sensação familiar e anabolizante, que desligava seus intermédios e percepções do que era correto ou não, real ou não, bom para ele ou não. Só sabia que repudiava aquele momento, e uma chama fervilhava seus nervos, como numa enorme forja. Se virou para golpear Isac, finalmente, mas ele não estava lá. 

Quem estava lá, na verdade, era Maike. De rosto e corpo, o homem que ele havia matado, se levantava para golpear ele mais uma vez. 

É agora a hora peninha! 

Ele partiu para mais golpe, e Arnok apenas se esquivou mais uma vez, no entanto, o asa negra retribuiu o golpe de antes. Tamanha foi a força de seu golpe, tamanha precisão, que Maike foi lançado para o outro da arena. A madeira se quebrou, a plateia se silenciou, e todos encaravam Arnok. 

As penas em suas asas se erguiam como se fossem adagas, seus punhos se fecharam com tanta força que gotas de sangue escapavam por entre seus dedos. As gotas vermelhas que caiam no chão, de um instante para o outro, se incendiaram. Em chamas azuis, o piso da arena foi pintado por uma cor azulada e opaca. O sangue fervia, e o calor naquela arena subia cada vez mais. 

A plateia começou a se afastar, mas eles agora gritavam em delírio. Chegou o momento, Arnok perdeu as estribeiras, estava com raiva, não havia quem o parasse nesse momento. O demônio com o maior número de vitórias que já esteve sobre as mãos de Serra. 

Maike não sairia vivo dessa vez. 

Não podia sair. 

Não tinha como sair.

— Você morre hoje! — Arnok falou entre os dentes, pouco antes do fogo que estava no chão subir pelas suas mãos. Já não se importava mais com as regras daquela competição, nem com o julgamento. As chamas tudo iriam consumir, e nenhum incômodo em sua cabeça restaria.

Foi a vez de Arnok avançar. Passos pesados e com punhos armados. O asa negra deu o primeiro golpe. 

Finalmente a luta começou, onde Maike desviava de certos golpes e tomava outros, enquanto seu adversário raramente tentava evitar algum golpe. Os socos de um humano morto não podiam feri-lo. 

As chamas azuis escalaram lentamente os seus braços, aos poucos consumindo sua roupa, suas asas, seus cabelos e finalmente chegaram em seu rosto. Arnok sobressaia em meio arena com uma forte luz azulada, que tudo consumia, aos poucos se perdendo. Devagar, ele deixava de ser o jovem asa negra, e se tornava apenas um monstro.

Seus socos agora tinham a força de uma avalanche, não eram mediados, nem sequer hesitavam, e Maike já não parecia ser capaz de se esquivar deles. No entanto, seu rosto ainda estava inteiro, sem arranhões ou queimaduras, sem sangue. Limpo como um homem vivo e bem. 

Isso apenas deixava Arnok ainda mais irritado, fazia suas chamas arderem, estalarem e irradiavam não somente na cor azul, mas, agora também, um brilho negro surgia. Algo como uma negritude que absorvia qualquer luz. 

Os golpes não cessaram. Maike foi ao chão em dado momento, mas ele ainda mantinha um sorriso. Ainda dava uma risada alta e estridente, definitivamente sobrenatural. Arnok respondia a altura, gritando a plenos pulmões palavras que não compreendia. Um ódio tão pleno surgia em seu cerne, que ele simplesmente se esquecera de racionar. 

Foi então que se viu preso em uma espiral infinita, onde sempre golpeava Maike e ele se mantinha intacto. O homem morto, não podia morrer. Se viu diante de uma escolha, uma repetição de coisas que já aconteceram. Uma memória antiga, algo que já havia feito contra Maike. A única solução. 

Agarrou seu rosto com ambas as mãos, e num impulso, fez todas as chamas se rodearem ali. Gritavam, enquanto as chamas em seu rosto mascaravam partes de suas expressões. Manifestações de uma fraqueza que ninguém poderia enxergar. Tinha de mascarar, esconder, virar outra coisa. 

Uma coisa com um bico, que brilhava em um tom azul e que sugava toda luz que recendia sobre ele com suas chamas negras. 

Enquanto o cheiro de carne queimada começava a se espelhar pela arena, Arnok queimava o próprio rosto com a máscara de seu interior deformada e enraivecida.



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