Volume 1
Capítulo 14 - Bagagem
Luzes chamativas vinham do subsolo do prédio, onde futuramente se tornaria uma garagem e era também para onde Marcos estava indo sem nenhuma discrição. Avistou cinco garotos rindo, com cervejas nas mãos e entre dois carros estacionados.
Marcos se aproximou deles como um pitbull marcando território. — EI! Onde tá a Clara?
Os garotos se entreolharam desconcertados e cada um deles fez algum comentário.
— Quem é você?
— Tá seguindo a gente, por acaso?
— Calma, gente... Ela tá bem, cara — Disse Ruan, com voz calma.
— "Calma" o caralho — Rosnou Marcos, empurrando ele e indo direto para os carros.
No primeiro, Bia estava jogada no banco traseiro, descabelada, inconsciente e com suas roupas meio puxadas revelando o bojo de seu sutiã e com o batom borrado. No segundo, Isa e Clara estavam em estado semelhante.
Marcos se voltou para eles, com um olhar de predador, os interrogou sobre o que fizeram com as garotas.
— Nada, cara... A gente só tá de rolé... — Respondeu Talison.
Marcos puxou o celular.
— Que tá fazendo, cara? — Ruan se aproximou.
— Vou chamar um carro e tirar elas daqui.
— Ei, cara... Relaxa — Pediu o moreno, ao encostar no ombro de Marcos, que em um repente afastou a mão dele com força.
O garoto sentiu o gesto como uma provocação e respondeu com um soco. Marcos conseguiu esquivar, mas o susto fez seu celular cair. Em seguida, um empurrão e Marcos quase se juntou ao smartphone.
— Ei, ei, ei! Parou aí, vocês dois! — Gritou Ruan, se colocando entre eles. — Cara, mete o pé. A gente só tá se divertindo. Depois a gente deixa as meninas em algum lugar ou na casa delas, Sei lá. Só vai embora.
— A gente tá em maior número aqui... Vai dar ruim pra você — Disse o rapaz que começou a briga.
Analisou rapidamente a situação: Cinco o cercando, em meio a dois automóveis grandes e de costas para a parede. Marcos pegou o telefone do caído e não hesitou em mandá-los se foder. Ruan coçou o rosto com um meio sorriso e penteou seu cabelo platinado.
— Pra “que” tentar bancar o herói, cara?
Dois se aproximaram para levantar Marcos à força pelos braços. Ele tentou se soltar, mas Ruan desferiu um soco rápido em seu maxilar. A terra girou e um zumbido ecoou em seu ouvido.
— Se você não fizesse todo esse showzinho e pedisse com jeitinho, talvez a gente até te deixasse assistir.
— Te falei pra ir embora — Disse o que segurava um de seus braços.
Outro soco, direto na boca do estômago. Marcos, mesmo enrijecendo seus músculos sentiu, além da dor, uma vontade de vomitar. Ele tossia enquanto Ruan ria, debochado, como se tudo fosse um jogo.
Marcos cuspiu um pouco de sangue, mas não desistiu de tentar se soltar. Os que estavam assistindo já estalavam os dedos de ansiedade. Quando Ruan se preparava para mais um golpe, um som alto de algo caindo alertou a todos.
Ao se virarem, um dos agressores estava caído naquele chão cinza e inacabado. Acima dele, uma figura forte que vestia uma jaqueta camuflada, cabelo curto e encaracolado, encarava os garotos com um olhar ameaçador.
O Ruan e o loiro correram pra cima dele como cães raivosos. O camuflado, com seu coturno, pisou por cima do garoto desmaiado, avançou para eles lentamente como um trator.
Marcos aproveitou o momento e conseguiu soltar um dos braços. E com um pedaço de tijolo, acertou o joelho do outro que o segurava, ficando finalmente liberto.
O garoto se contorcia de dor enquanto Marcos se preparava de forma rápida e partiu para cima do segundo. Com socos ágeis, tentou ao máximo acertar a base das costelas e maxilar, dominando seu adversário com destreza.
O camuflado assumia uma posição de boxeador. Seus pés se moviam em um quadrado com precisão, dominando toda a área. Os dois que o cercavam estavam hesitantes, pois sabiam que um passo em falso poderia os derrubar.
Os braços dele eram grandes e sua mão era larga. Em um piscar de olhos, aproveitou a distração de um deles e avançou, encaixando um cruzado de direita no loiro, que não teve tempo de reação e caiu com o nariz jorrando sangue, como uma torneira aberta.
Marcos se recompôs após ser derrubado pelo segundo garoto. Seus pés deslizam para a postura de karatê enferrujada. Quando o moreno tentou um chute, Marcos segurou sua perna e o lançou contra o outro, fazendo ambos caírem sobre o capô de um carro.
O som da lataria amassada despertou Clara, que ainda estava zonza. Ela conseguia ver os vultos da movimentação do lado de fora, mas não conseguia distinguir quem eram.
O platinado, furioso, pegou uma viga de ferro e partiu para cima do camuflado, que se esquivou com facilidade e contra-golpeou suas costelas. Ruan soltou a viga e enquanto apertava o local batido, recebeu outro gancho na base do queixo.
Seguraram o pescoço de Marcos com antebraço, prenderam um de seus punhos contra a parede e o acertaram com vários golpes seguidos. Ele tenta se defender, mas os dois o sobrecarregam.
— Olha a pedra! — Disse o camuflado dando uma tijolada na cabeça do que segurava Marcos, que por sua vez, empurrou o outro e o golpeou na garganta.
A porta de um dos carros se abriu com um ranger pesado. Uma voz baixa e quase irreconhecível rompeu o ar:
— Marcos…?
Ao se virar para Clara, ele recebeu um último soco. A tontura já o dominava e em um surto, empurrou o moreno em cima do outro com raiva. O camuflado ajudou Marcos a se manter de pé.
— Esses foram os últimos.
— Valeu, Dan... — Marcos respirava pesado.
— Tá enferrujado.
— Vai se fuder — com um sorriso leve, deu um abraço em seu amigo.
Clara sai do carro com passos lentos, o corpo cambaleante e olhos semicerrados. Marcos correu desengonçado para a segurar, antes que ela caísse sozinha e a sentou de volta na beira do carro.
— Já peguei o celular daqueles três. Se fizeram alguma coisa, a gente vai saber
— Nem tenta, só joga fora — Marcos respondeu, com a voz rouca. — Não esquece dos outros também. Falando nisso, cadê seu celular, Clara?
Ela olha confusa e ainda zonza.
— Celular?
Marcos fez carinho em sua cabeça, depois se afastou e foi até o porta-luvas. Os celulares das meninas estavam lá entre algumas tralhas.
— Dan, pode levar as outras meninas pra casa enquanto eu levo a Clara?
— Beleza. E cadê elas?
— Uma tá nesse carro e a outra naquele. Me fala depois quanto deu o carro que eu pago.
— Beleza.
Daniel apenas jogou a chave da moto para Marcos e chamou um carro de aplicativo.
— Cuida bem dela!
— Beleza...
— E da Clara também.
Marcos o encarou por um instante, longo o suficiente para que Daniel entendesse. Em seguida, pegou Clara nos braços. Ela estava sonolenta, com a cabeça encostada no peito dele.
Daniel, rapidamente foi em busca dos celulares dos outros garotos e verificou as meninas. Uma estava querendo acordar, a outra estava completamente apagada.
Marcos caminhou em direção à moto sem dizer uma palavra. Clara continuava no mesmo estado, sem entender o que estava acontecendo, somente vendo vultos e tendo lapsos de memórias de como chegou ali.
A garota olhava para Marcos devagar e fazia um leve carinho em seu rosto com sangue. Por cima do ombro de Marcos, os garotos jogados no chão — manchas vermelhas, rostos inchados, o sangue escorrendo pelos cantos das bocas. E o rosto de Daniel, distante, olhando de volta, acenando para ela com um sorriso triste.
Ela olhou para suas próprias roupas, amassadas e esticadas. Clara voltou-se novamente ao rosto de seu amigo que a carregava. Um olho roxo.
As lágrimas começam a descer em silêncio pouco a pouco, como se estivessem criando coragem para sair. O grito da alma não tem som. Só dor.
Ela esfregava com força os próprios braços com força e nojo. Como se pudesse arrancar a pele. Como se a sujeira fosse mais profunda do que qualquer banho poderia tirar. Como se ela fosse a culpada de tudo.
Ela escolheu sair com as amigas. Ela escolheu usar a droga. Ela escolheu esquecer e agora, mais do que nunca, ela quer sumir da existência.
Mais uma vez, Marcos a salvou.
Mais uma vez, ela precisou ser salva.
Mais uma vez, o mundo foi cruel.
Ela limpava os olhos com as costas da mão, mas não conseguia parar de chorar. Se agarrou ao pescoço de Marcos e o abraçou com força, como se ele fosse a última âncora num mar de horrores.
A mente dela estava em colapso — um labirinto de vozes, medo, culpa, imagens que ela não sabe se são lembranças ou pesadelos. A voz de sua mãe não sai da cabeça, dizendo o quanto ela é culpada por tudo de ruim que aconteceu.
Mas entre tudo isso, uma única certeza pulsava, firme, dolorosa e reconfortante: Marcos sempre vai voltar. Sempre vai me buscar. Mesmo que o mundo me rejeite, ele vai me carregar no colo.
Ela não precisava mais entender o que aconteceu e nem saber onde errou. Ela só precisava que ele continuasse ali. Salvando. Protegendo. Existindo.
Clara o abraçou forte, seu olhar mudou e um sorriso pequeno e quebrado surgiu. Marcos apenas caminhou devagar, escutando um ronronar estranho no seu ombro. Ele sentia os dedos dela apertando sua camisa como se nunca mais quisesse soltar.
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