Volume 1
Capítulo 13 – Colapso
O ônibus avançava devagar, como se também estivesse cansado do dia. Quase todos os bancos estavam desocupados, rangendo de tempos em tempos com os buracos e lombadas da cidade. Sete passageiros ocupavam o espaço com a apatia de quem já não espera nada além de chegar em casa e se jogar na cama.
Marcos estava ao fundo com seus fones nos ouvidos novamente. A voz rasgada do cantor contrastava com a melodia, que falava sobre a dificuldade de superar traumas e a vontade incessante de querer desaparecer, por estar perdido em meio a turbulência.
Olhou para o cobrador, que estava debruçado sobre seu posto quase caindo no sono. Tirou o celular do bolso e verificou as notícias:
“Aumenta o número de ex-criminosos se convertendo ao Kiraismo.”
Marcos leu com a mesma expressão de quem olha a previsão do tempo para uma cidade onde nunca esteve. Suspirou e foi para as mensagens, mas nenhum sinal dela. As últimas conversas paralisadas, no tempo.
Fazia apenas algumas horas que não a via, mas pareciam semanas. Guardou o celular no bolso e encostou a cabeça na janela, encarando a paisagem que já viu milhões de vezes.
Descendo em sua parada, passou vagarosamente em frente a casa dela, como se esperasse algo. Nem que fosse ela aparecer na janela de seu quarto, para mostrar que estava viva.
Marcos entrou em sua casa escura e abafada depois de um dia quente. Largou a mochila em um canto, como se estivesse se livrando de um fardo, caminhou até o guarda-roupa e parou diante de uma sacola de loja.
Dentro, a roupa que havia comprado para Clara. Com um suspiro, o rosto dela veio à sua mente: os olhos castanhos, avermelhados devido ao choro, a voz doce dizendo que o ama e o cabelo negro contra o vento antes de ela ir embora em silêncio.
Pegou a sacola e saiu em direção a casa do lado, até parar em frente à porta da vizinha e hesitar. Se questionou se era a melhor escolha, ou se deveria voltar para casa antes que piorasse ainda mais a situação que já era delicada.
Em um surto de coragem, bateu na porta e a voz da mãe de Clara veio abafada de dentro.
— Já vai!
A porta se abriu parcialmente e revelou o rosto da mulher. O sorriso dela se esvaiu rapidamente em um olhar frio ao notar que era Marcos.
— Ah... Ela não tá — Ela disse ao tentar fechar a porta, mas Marcos segurou com a mão firme.
— Como assim? Onde ela tá?
— Sei lá... Não vi ela.
— Como assim "sei lá"?
— Ela não apareceu em casa faz dois dias. E quer saber? Espero que nem volte. Tô muito melhor sozinha. Em paz.
— Você está ouvindo o que tá dizendo? É sua filha!
— E você tá ouvindo? Vai embora! Eu não te devo satisfação!
Marcos empurrou a porta, fazendo a mulher recuar e quase cair com o impacto. A voz dele veio baixa, mas afiada como lâmina.
— Escuta aqui, seu saco de pancada ambulante... A sua filha estava pronta pra matar, por você. Pronta para ir presa, para salvar a sua vida. E você trata ela assim? Você não merece o carinho e muito menos o amor dela. assim como aquele esterco que você que você chora de saudade. Ele morreu por merecer.
— SAI DAQUI! — Gritou com lágrimas escorrendo, trêmula e pálida.
Marcos a encarou em silêncio. Ele a encarou como se estivesse vendo uma barata se escondendo no lixo. Se virou e fechou a porta devagar atrás de si, sacou o celular e ligou para Clara, mas a chamada não completava. Ligou para Marcola e ele atendeu rapidamente.
— Fala, meu amigo… Qual foi? Tava quase dormindo.
— Sabe onde tá a Clara?
— Não, pior que não. Aconteceu alguma coisa?
— Ela sumiu.
— Vou fazer umas ligações. Já te retorno.
Marcola desligou e Marcos prontamente fez outra ligação. Vários toques se passam e a pessoa finalmente atende.
— Fala... — atendeu, com a voz arrastada e sonolenta.
— Vê onde tá a localização do celular da Clara.
— "Oi" pra ti também… O que foi que aconteceu cabeça de cuia?
— Ela sumiu, Lucas.
O silêncio durou por um suspiro e uma assoada de nariz.
— Me dá cinco minutos. Já te ligo. — Desligou a chamada.
Logo em seguida, Marcola enviou uma mensagem:
“A Clara foi pra casa da Isa quando a aula terminou. Vou te mandar os números dela e da mãe dela.”
Marcos tentou ligar para a amiga de Clara, mas só chamava. Segundos depois, Lucas mandou a localização. Rapidamente, pediu uma moto pelo aplicativo e enquanto aguardava, fez sua quarta chamada da noite. A pessoa atendeu rapidamente.
— Dan, preciso de ajuda.
— Fala.
— Vou mandar um endereço. Clara tá em uma festa naquele pub no centro. Não tá atendendo minhas ligações. Pode dar uma força?
— Tô indo — Encerrou a chamada.
A moto chegou e Marcos subiu pedindo para que o motorista fosse o mais rápido possível. Sua mente fervilhava com mil sensações. Ele disparou ao local como uma bala.
A festa parecia uma boca de fumo com música horrível e alta. Marcos procurou por algum sinal de conhecidos, mas nenhum sinal sequer de Clara. Viu pessoas bebendo e fumando como de costume. O odor de bebida, suor e urina, fez ele sentir ainda mais repulsa.
Você não deveria estar aqui, Clara… Esse lugar não é pra você.
Desceu da moto agradecendo o motorista e rapidamente puxou o celular para realizar o pagamento. Deslizou a tela para verificar a localização, mas o sinal de Clara estava em movimento a algumas quadras dali.
Marcos reclamou para si mesmo pela perda de tempo. Entretanto, ela não está longe. Pediu ao motorista que levasse até o novo ponto indicado pelo GPS e explicou vagamente a situação.
O motorista hesitou um pouco até Marcos oferecer mais dinheiro e pagar antecipadamente. O destino: um prédio inacabado. Afastado do local da festa, cercado por lojas fechadas e sem movimentação na rua.
Ao chegar, Marcos pulou da moto e adentrou o isolamento sem pensar duas vezes. Com sangue nos olhos e raiva no coração.
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