Dançando com a Morte Brasileira

Autor(a): Dênis Vasconcelos


Volume 1 – Arco 3

Capítulo 149: Best Friend

19:58.

Mmn...? — ronronou Nathaly, acordando após um longo cochilo. 

Dormiu no sofá. Passou o dia inteiro sonolenta, como se na madrugada passada não tivesse dormido. Não havia trocado sua roupa. Nem mesmo lembrava-se de que havia lavado-a e colocado-a para secar no box do banheiro do quarto.

Olhou para frente: o ambiente todo escuro.

Sentou-se.

Sua cabeça apoiava-se em uma almofada. Mas, quando foi dormir, era o colo de sua melhor amiga. Onde Nina foi? Seu rosto ainda mostrava um toque triste e desapontado. Pli... Fechou os olhos como se um monstro fugisse da luz.

Samanta, usando um short camuflado e a parte superior do biquíni verde que comprou mais cedo, entrou na sala, acendendo as luzes. Ficou surpresa com a amiga sentada no sofá, em meio à escuridão. Quase um fantasma. Piscou duas vezes e se aproximou. Nathaly tentando abrir os olhos de pouquinho em pouquinho, adaptando-se à luz... mas, mesmo com um rosto fofo, ainda deixava escapar sua dor interna.

— Oi, oi... Que carinha é essa? — questionou Samanta.

— ...Tô meio desanimada. Nino sumiu... — Olhou para o lado onde Nina estava sentada anteriormente, enquanto completava: — e agora Nina também.

Hum... Éé... Tem um salão de jogos lá embaixo. Não quer ir lá com a gente?

— Só nós duas estamos aqui — murmurou, voltando o rosto na direção da amiga.

— Eu só subi para trocar de roupa. Thales e Arthur já estão lá embaixo.

Ah...

— ...Mas, se não quiser ir agora, não precisa. Quando os gêmeos chegarem, se estiverem a fim, vocês descem lá para jogarmos algo — propôs com um sorriso.

— Não, não... Éé... — Olhou para a mesinha. Viu o celular e o pegou. — Vou descer com você. Só vou ver se me respondem no celular — respondeu meio afobada, enquanto abria a conversa com Nino... os dedos hesitaram. Mudou de ideia e clicou na conversa com Nina.

— Ok, vou só molhar o corpo rapidinho e já volto — concluiu, saindo de lá.


Brrr!

Sccrrrchh...

Algo vibrou dentro do sangue de Nina. Parou abruptamente de correr, levantando poeira com os pés no chão. Nino percebeu e parou de correr também. Sem entender, voltou com um pouco de cautela.

"Tá tentando me enganar?" pensou, acreditando que Nina fez aquilo pensando em um plano. Mal haviam descido do prédio onde Nino conversou com Alissa. Precisavam de pouquíssimos segundos para chegarem ao Palace. Deu passos hesitantes, pronto para voltar a correr assim que Nina arriscasse uma arrancada. 

Entretanto, viu-a tirar o celular do sangue e atender uma ligação:

— Nathaly? Alô.

Ao perceber o motivo, fez uma careta de deboche e ficou olhando para ela com desânimo visível em suas íris.

— Entendi... — murmurou em provocação, mas Nina não tinha ouvidos para o irmão.

— Achou ele?

— Já sim.

— Que bom... Eu e a galera vamos no salão de jogos do hotel, tá? Quando você chegar com ele, passa lá — comentou em um tom baixo de tristeza. Nina sentiu... mas não deixou-se abalar.

— Tá bom, estamos voltando já.

— Beleza, tchau.

— ...Tchau.

A Primordial desligou com uma expressão levemente desanimada.

— Conta para ela logo.

— Não.

Nina lançou o rosto na direção dele.

— Olha essa sua cara. Tava doida para soltar um "eu te amo, amorzinho" — brincou, provocando Nina com poses exageradas.

— Você é chato demais.

— Mas o que ela queria?

— Avisar que estão no salão de jogos... O que é aquilo ali? — Nina apontou para um lugar à frente, e Nino olhou.

— O quê?

Fu!

Nina saiu correndo, soltando uma risada provocativa.

Fu!

Nino não perdeu tempo e correu atrás dela.

— MENTIROOOSA! — gritou irritado, sabendo que não era possível passá-la, com os dois possuindo a mesma velocidade. Nina sorriu, soltando uma risada bem sincera. Nino rangeu os dentes, irritado por mais uma "derrota". 


Instantes depois, Samanta e Nathaly chegavam ao salão. Thales, de prontidão, chegou mais perto da namorada. Braços para trás. Estendeu. Uma mão segurava uma flor simples que coletou de um jardim. Na outra havia uma trufa de pistache que pegou no buffet. 

Samanta ficou levemente envergonhada pela demonstração de carinho na frente dos amigos. Não importava que tivesse visto outras centenas da mesma flor quando entrou no hotel, ou que poderia ir até o buffet pegar por si mesma uma trufa. Ele foi até lá. Ele pensou nela. Ele quis agradá-la. Isso que valia. O sentimento. O carinho.

Ah... Você é um fofo! Obrigada...

Os gêmeos chegaram a tempo de ouvir o que Samanta disse. Nino olhou para Thales... tentou segurar, mas não suportou o riso. Começou a rir enquanto tentava falar em meio às gargalhadas fortes, apontando o indicador da mão direita na direção do melhor amigo:

— Um cara desse tamanho sendo chamado de fofo. Tsihihe...

Thales lançou um olhar sinistro quando escutou o primeiro som de risada. Assim que escutou a última palavra, Bm! Disparou na direção de Nino, mas com cautela. Treinou para isso. Apanhou igual um escravo para isso: saber usar sua força bruta. O som do avanço foi alto, mas o chão não foi rachado, e Nino saiu correndo, zoando a cara dele.

Enquanto isso, Nathaly observava a cena, pensamentos confusos passando por sua mente:

"Nem me deu um... Oi...? Quando estamos a sós, você me conhece tão bem, mas, quando estamos com os outros, você age como um estranho. Por que você é assim? Desde que contei a verdade pra Nina, essa sensação só aumenta... Cada noite juntos é completamente diferente da nossa interação na escola. Será que eu só existo para você na hora do sexo? Sou apenas um passatempo? Do mesmo jeito que você disse que contaria a verdade para ela e demorou mais de dois anos, você prometeu me pedir em namoro e nunca mais tocou no assunto... Me diga de uma vez: o que você quer de mim?" 

Queria desesperadamente expressar esses sentimentos, mas o medo de ser deixada a impediu. Então, engoliu o desconforto e manteve uma expressão neutra, forçando um sorriso tranquilo que tentava refletir ao ver Samanta olhar com olhos brincalhões para Thales atrás do amigo.

Nina, por sua vez, percebeu o olhar distante. Não sabia, mas queria saber o que se passava dentro da cabeça dela. Aquele olhar na direção de seu irmão brincando era triste. Era visivelmente triste. Nino passou ao lado dela e nem olhou-a. Nino nem se importou. Proposital? Era na maldade?

Querendo quebrar a cara dele, Nina foi até seu irmão.

Ele corria de Thales; não tinha como alcançá-lo, e, nessa brincadeira, os dois acabaram derrubando várias coisas no salão. Nino se escondeu atrás de uma mesa de hóquei, enquanto Thales tentava alcançá-lo do outro lado, cortando espaço pelo meio da mesa com os braços.

Foi nesse momento que ambos ouviram uma voz:

— Vocês dois aí, dá pra parar? Já são velhos demais pra isso, não acham? — repreendeu, olhando seriamente para ambos.

Os dois se entreolharam, depois olharam para ela e colocaram a mão na boca.

Iiiiiiii, Chatona.

Iiiiiiii, Chatona.

Nina ficou irritada.

— Eu vou ligar pra Alissa e con...

Bn-Pah!

Antes que ela pudesse terminar, os dois se jogaram de joelhos, encostando as testas no chão.

— Por favor, não faça isso — implorou Thales.

— Prometemos que não vamos mais fazer nada disso.

— Jura? — perguntou exclusivamente para Nino.

— Juro juradinho — Nino respondeu-a.

Enquanto isso, Arthur se aproximou com quatro raquetes e uma bolinha de pingue-pongue.

— Gente.

Todos voltaram sua atenção para ele.

— Querem jog...

Nino e Thales imediatamente pularam na mesa, pegando uma raquete cada um. Nina os olhou com desdém, irritada pela rapidez com que quebraram o juramento.

— Eu quero ir — respondeu Nathaly.

— Vou também! — respondeu Nina, imediatamente após Nathaly.

— Bom, se todos vão, eu também vou... — Samanta juntou-se ao grupo.

Nino percebeu a animação de sua irmã quando Nathaly disse que queria ir.

Em seguida, notou que Nina olhava para ele e, com o olhar, o guiava para Nathaly. Compreendeu o que sua irmã queria dizer.

— Então, as duplas serão: eu e Arthur, Samanta e Thales, Nathaly e Nina.

— Ué, por qu... RF-A-a-fh...

Nino puxou Arthur para perto, abraçando-o no pescoço com o braço esquerdo até ele ficar sem ar.

— Porque quero ver se você manda bem como minha dupla — respondeu.

Haaaarfff!

Arthur, um pouco tonto, foi solto, buscando por ar apoiando as mãos no joelho.

"NÃÃO, SEU IDIOOTA!" Nina ficou irritada, mas tentou não demonstrar externamente. Lançou um olhar para Nino com um sorriso forçado, tentando comunicar com os olhos o que sua mente gritava com ódio: "ERA PRA VOCÊ CHAMAR E IR COM EEEELA!" 

Nino sorriu de volta, sem perceber a raiva que ela sentia. Nina ficou ainda mais irritada.

"ESSE ANIMAAAAL!!"


Jogaram várias partidas e trocaram as duplas após um tempo, mas ninguém conseguia competir com os gêmeos... eram rápidos demais. Eventualmente, todos desistiram e apenas os dois ficaram: Nina descontando todo o seu ódio na bolinha, tentando ganhar de Nino, e Nino se esforçando ao máximo, recusando-se a perder para sua irmã. 

"VOU DESTRUIIIR ESSA ANTA!"

"VAI GANHAR ROUBANDO DE NOVO, NÃO!"

Todos assistiam aos dois, impressionados com a velocidade absurda do jogo.

POW-POW-PÁÁ!-PÁ!

Mal conseguiam ver os movimentos e só ouviam o som das raquetes batendo na bolinha, que parecia um tiroteio.

Nino recebeu uma bolinha, fingiu que não ia acertá-la e, em seguida, a devolveu para Nina com um movimento mais que veloz, colocando a raquete para trás das costas.

PÁÁ!

PUC!!

Ela recebeu mal e, furiosa, deu uma brecha para Nino, que recebeu um balão. POW! Aproveitou e respondeu rapidamente, uma investida fechada. A bolinha bateu na mesa e, se fosse uma área aberta, pararia em meio às nuvens mais altas.

No auge da raiva, Nina saltou, encarando com fúria e atenção aquela bolinha branca girando no ar. Com uma força descomunal, a esfera viu a raquete descer em sua direção.

CRAASH!!

Acertou a bolinha para baixo, destruindo a raquete, varando a mesa que se fragmentou quase como rocha seca e parando ao destruir uma parte do piso. Deixando rachaduras de muitos metros ao redor de todo o salão.

Nino não conseguiu nem rebater. Não esperava que aquilo iria acontecer.

Todos ficaram com expressões de surpresa e medo, olhando para eles... que se peitaram parecendo que iam sair no soco.

— GANHEI, SEU OTÁRIO!

— Roubando de novo é fácil! — Nino virou o rosto, fechando os olhos e cruzando os braços.

— ONDE QUE EU ROUBEI?! — Nina não aceitou bem a tentativa de invalidar sua vitória.

— QUEBRANDO A MESA, TALVEZ?! — Nino abriu os olhos e voltou a peitá-la, agora gritando também na cara da sua cópia.

Se encaravam com ódio, quase rangendo os dentes, enquanto o resto do grupo só observava com expressões atordoadas.

— Com licença.

— O QUE É?!

— O QUE É?!

Lançaram o rosto na direção do funcionário que surgiu "do nada". 

— É-é... É que, devido a vocês terem... feito essa bagunça, precisam pagar pelo prejuízo.

Ah, tá. Quanto é? — Nina perguntou ao funcionário. Sua expressão mais natural, assim como a de Nino, que já não se importava mais com a disputa, assim como Nina.

— Bom... — ele pegou um caderninho do bolso e anotou. — Mesa, bolinha e duas raquetes danificadas. Uma enorme área de porcelanato danificada... Acredito que menos de quinze mil reais não fique.

— QUINZE MIL?!

— QUINZE MIL?!

— É-é... mas é só uma estimativa. Caso for um valor mais baixo, haverá um estorno.

— Isso não é nada, Nino. Você já matou uma Calamidade; deve ter dinheiro sobrando no banco — ponderou Arthur.

Os gêmeos olharam o companheiro de equipe. Nina mudou o olhar para o rosto do irmão e estendeu a mão.

— Me dá seu celular — pediu com um semblante sério.

Nino levou a mão ao bolso direito, fez com que o celular dentro do sangue fosse até lá, rasgou o tecido humano, segurou-o e entregou para Nina.

A Primordial desbloqueou com o próprio rosto, olhou o App do banco e "jogou" o braço na direção do peito dele, colidindo o aparelho com um pouco de agressividade. Nino segurou e Nina saiu andando, ordenando:

— Você paga.

Hihi... — respondeu uma risadinha forçada.


21:03.

Passaram um tempo brincando nos outros jogos... mais dívidas que o menino criou ao destruírem tudo em novas competições aleatórias na guerra de não aceitar perder para o outro.

Voltaram aos quartos juntos. Nathaly ainda mantendo o sorriso forçado.

Sentia vontade de chorar, mas chorar fazia lembrar-se da infância. Não gostava de chorar. Não gostava de nada que a fizesse parecer infantil ou que não era alguém de sua idade, embora tivesse feito 18 anos há poucos meses. Ser forte era ser adulto. Ser responsável era ser adulto. Aguentar as dores era ser adulto?

Sua mente continuava fervendo entre contestá-lo e deixar como estava seu "relacionamento". Não olhou para trás e entrou sozinha no quarto. Samanta e Thales foram de mãos dadas e em clima alegre para o deles.

Por quê? 

"Por que não pode ser assim comigo?" Fechou a porta e foi deitar-se sem nem trocar de roupa. 

Nina viu e olhou para seu irmão tranquilo, seguindo para onde dormiu na noite anterior. Assim que Arthur saiu, Nina impediu o irmão, que olhou-a ao sentir o aperto no pulso. Entendeu. Estendeu o colar e mudou de aparência. Nina assumiu a dele e não disse nada. Só correu na direção do quarto de Nathaly, para tentar salvar o dia desastroso que seu irmão conseguiu criar.

Entrou em silêncio e fechou a porta.

Tudo escuro. Nathaly deitada.

Se aproximou e deitou-se atrás dela.

Cobriu-se.

Abraçou-a pela cintura e foi com um beijo na cabeça.

— A luz lá de baixo se curvava para os seus olhos. Você é tão linda que nem parece real... — murmurou carinhosamente.

— Por que não disse isso lá embaixo, então?

Nina congelou... não sabia e nem tinha cabeça para conseguir responder.

Silêncio...

— E-eu não sei... não consegui.

— Sente vergonha de mim?

Nina ergueu-se, sentando-se na cama. Nathaly fez o mesmo e encarou-a. Nina paralisada, buscando palavras, mas não encontrava.

— Você sente?

— N-n-não! Óbvio que não!

— Então por que me faz parecer que sim?

— É-é-...

— ...

Nina desviou o olhar; não conseguia mantê-lo sem conseguir falar nada.

— ...

— Você realmente gosta de mim?

— S-sim! — gaguejou afobadamente, voltando o olhar o mais rápido que pôde, com medo de não ser o suficiente para não deixá-la ir.

— Então prove. Nino, só me prove... Me peça em namoro se realmente gosta de mim.

...Nina começou a chorar.

Não conseguia segurar as lágrimas. Olhar fixo no rosto de Nathaly, mas as íris roxas do rosto copiado do irmão não conseguiam ficar um instante sem tremer. Entreabriu a boca; queria falar a verdade, mas doía demais pensar que seria rejeitada. Não queria perder Nathaly, mas ela nunca havia sido sua.

— E-e-eu... Eu não posso... — balbuciou.

Nathaly sentiu dor com a resposta.

Desviou o rosto e uma lágrima descia.

— E-eu juro que não posso agora... Nathaly, eu te amo... Mas eu não posso fazer isso agora.

— Por quê?! Por quê?! Me diz! Por favor, me diz! Se realmente me ama, me fale a verdade. Me conte o motivo de não poder fazer isso — cochichou em gritos. Não queriam que os outros escutassem, mas o desespero das lágrimas caindo deixava tudo pior.

— E-e-eu... Eu juro. Eu juro que vou pedir. Eu prometo. Eu prometo pela minha vida. Eu juro que vou pedir! Por favor, acredite em mim! Acredite em mim, Nathaly! — implorava aos prantos, quase curvando-se na cama. Nathaly prendia os dentes. Não rangia, mas tentava dessa forma conter a dor.

Sentia que aquelas palavras eram verdadeiras, mas não conseguia entender por que não podia ser assumida. Era muito confuso. Queria se dar valor e sair daquela relação, tentando assim ver se ele realmente a amava... mas não queria ter o risco de perdê-lo.

Amava Nino.

Descobriram gostos. Descobriram parte da vida juntos. Não conseguia vê-lo fora de sua vida. Não conseguia ver outra no seu lugar. Outra substituindo-a. Não conseguia imaginar Nina se tornando mais amiga de outra garota, outra garota que Nino começasse a ficar.

Virou-se e deitou-se frustrada, tampando até a cabeça com o cobertor.

— Confia em mim... por favor, por favor... só confia em mim...

Embaixo do calor do cobertor sobre o corpo e do queimar das lágrimas no rosto, Nathaly não conseguiu responder.

Nina não conseguia parar de chorar... não tentou tocá-la. Só ficou do lado da cama até que as lágrimas passaram; mais de uma hora foi embora e encontrava-se agora olhando para o teto do quarto com Nathaly dormindo "sozinha" ao seu lado.

Olhos um tanto caídos.

Se culpava mais do que culpava Nino... mas Nino não estava dormindo.

Um cheiro.

Seus olhos travaram na direção da porta fechada.

Quem era?

Ninguém; não era lá que o demônio passava.

Nino entrou no quarto de Thales e Samanta. Dormiam abraçados. Os olhos do Primordial assumindo seu verdadeiro corpo ficaram tediosos com a cena. Thales era a concha menor; Samanta quase não conseguindo envolvê-lo com a perna.

Tac.

Nino lançou um peteleco na direção, fazendo com que o pouco sangue jogado assumisse a forma de uma bolinha de papel. Acertou o rosto do amigo e Thales acordou meio confuso. Viu Nino no escuro. As íris roxas pareciam brilhar com uma luz sombria, mas não sentia medo do amigo.

Hum? — murmurou extremamente baixo.

Nino não respondeu em palavras; só jogou o rosto na direção da porta.

Thales entendeu.

Segundos depois, com a ajuda de Nino, substituiu-se na cama como um aventureiro trocava uma joia rara em uma ruína histórica por uma pedra do mesmo tamanho. Ao menos não ativou nenhuma armadilha. Samanta agora abraçava diversas almofadas.

Saíram.

Nina esperou e foi atrás, assumindo seu corpo real.

Os dois sumiram... mas conseguia sentir o cheiro por onde passaram.

Momentos depois, chegou. Estavam na academia e, quando olhou pelo vidro, de fininho, viu os dois correndo em uma esteira, um do lado do outro. Em seus braços, vários pesos e máquinas penduradas. O teto não era muito alto, e esse era o desafio. Equilibrar o máximo de coisas sobre o corpo, e a quantidade de equipamento na horizontal nem parecia real.

Lei nenhuma de física se aplicava naquela proeza, e nem magia estava sendo usada.

No tempo que equilibravam, tinham que correr na velocidade máxima da máquina, o que era bem inferior às suas velocidades normais. Nina entediou o olhar, e Nino teve um tremelique no corpo inteiro. Lançou o olhar certeiramente na direção da irmã. Thales seguiu o olhar quando viu Nino congelar o rosto, embora as pernas continuassem correndo comicamente.

Travou... também.

Nina afastou o rosto, saindo do vidro.

Crashhh!

Ao escutar um som alto, voltou o rosto no mesmo instante.

Todas as máquinas haviam voltado para o lugar original. Tudo arrumadinho, e os dois corriam "normalmente", conversando de forma leve: 

— É tão bom andar na esteira com meu melhor amigo! Ha-Ha-Ha! — Nino falou de maneira exagerada, olhando Thales.

— Oh yeah, my super best friend! Ha-Ha-Ha! — Thales respondeu com um tom igualmente estranho, olhando-o.

HA-HA-HA-HA-HA!

HA-HA-HA-HA-HA!

Riram juntos, completamente enlouquecidos. Pararam do nada e Thales olhou para o vidro.

— Acho que ela saiu — comentou como se devesse dinheiro para um agiota.

Ah, é? — Nino olhou na direção.

— Estão aprontando o quê?

Nina surgiu atrás deles.

AAAAH!!

AAAAH!!

Se assustaram com um pulinho de gato, aterrissando na esteira e continuando a corridinha estranha na velocidade de "caminhada" escolhida.

Br-Br-Vrrr...

Os celulares dos três vibraram simultaneamente com uma mensagem.

Nino retirou do "bolso" e resumiu em voz alta:

— Alissa encaminhou uma mensagem de Louis no grupo. Precisa da gente pra uma missão urgente no Amazonas. Já avisou que agentes do governo irão nos esperar amanhã cedo na entrada do hotel pra levar-nos até o aeroporto.

— "Levar-nos"? Ish... Calma aí, Machado de Assis — provocou Thales. 

Nino encarou-o, estreitando os olhos.

— Foi mesmo aqui — comentou Thales.

Nino assentiu com a cabeça.

— Aqui também.

Nino olhou para Nina com um tom de deboche.

— Óbvio, né? Ele mandou no grupo. Cê é burra?

— Muleque... eu vou te matar — Nina abaixou o rosto ao referir-se a ele... e ergueu-o com um olhar assassino ao finalizar sua ameaça.

Nino ignorou por parte.

— Sinceramente... Melhor acordar geral e avisar agora — ponderou Nino, com preguiça.

Nina olhou-o... e Nino leu exatamente o que ela estava dizendo com os olhos. Não se fez de burro e otário desta vez.

F-Fu!

— Quê?

Thales piscou e os dois já haviam desaparecido.

Trocaram suas aparências no meio do caminho e Nina entrou no quarto onde Nathaly dormia... A mão flutuou na direção. Hesitante, mas tinha que avisar.

Tocou o braço tampado pelo cobertor.

— Nathaly — sussurrou.

— Onde você tava? — respondeu, erguendo-se sentada na cama.

Nina desviou o olhar.

— Com Nina.

— ...

O silêncio veio, mas decidiu quebrá-lo de uma vez:

— Alissa mandou uma mensagem no grupo. Eu tava na academia com o Thales e minha irmã. Conversando um pouco enquanto fazíamos algumas máquinas. Temos trabalho. Aparentemente as férias acabaram.

Nathaly desviou o olhar para o lado, mais embaixo.

— Nunca acreditei que estávamos mesmo — sussurrou.

— Amanhã cedo carros do governo irão nos esperar para levar-nos até o aeroporto. A missão é no Amazonas.

Olhou-o.

— Não pediram para Alissa pedir para Louis nos teletransportar?

— Na mensagem estava escrito em letras maiúsculas: "LOUIS NÃO VAI TELETRANSPORTAR VOCÊS"— respondeu brincando, e acabou tirando uma pequena risada de Nathaly, fazendo assim que o clima de merda ficasse um pouquinho de lado. 

— Entendi... Tá bom, vamos dormir então — finalizou, deitando-se de costas. Nina deitou-se, mas não ousou tocá-la.

— ...Posso te abraçar? — pediu... depois de cinco segundos de silêncio... pediu.

— ...Sim — permitiu.

Thales retirou a cena do crime — vulgo almofadas — e deitou-se na mesma posição... antes de acordar com manhosidade e carinho sua namorada. Avisou sobre a missão. Samanta, bem sonolenta, reclamou em balbucias, mas não havia o que fazer senão aceitar.

Pah!

Nino esqueceu que estava no corpo de Nina... acordou Arthur com um chute na lateral do corpo, pegando na costela. Arthur acordou assustado e viu Nina olhando-o entediado. Nino mandou-o olhar o celular e desapareceu. Depois de aliviar a dor, obedeceu.

Viu a mensagem.

Mesma reação de todos... mas ficou mais animado que todos.

Nunca quis essas "férias", e agora elas acabaram. 


05:27.

Todos arrumados e com seus equipamentos examinados.

Desceram até o térreo.

Entraram em dois carros diferentes.

Nina, Nino e Nathaly em um; o restante no segundo.

Nino ficou no meio das duas. Olhava para o motorista quando decidiu perguntar:

— Tem alguma informação sobre a anomalia que está lá?

— Infelizmente, não. Apenas o diretor geral da ADEDA recebe as informações sobre as missões de extermínio.

— No caso, o Louis?

— Exatamente.

— Entendi. Obrigado — respondeu e a viagem seguiu-se tranquila e em silêncio. Nathaly olhando para fora da janela. Nina tentando encontrá-la pelo reflexo da sua e Nino entediado por estar no meio daquilo.


Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro – Galeão – Antonio Carlos Jobim... Chegaram. 

Poucos minutos depois já haviam embarcado.

O voo não tinha tantos passageiros. Não eram tantas pessoas que queriam ir até Manaus naquele horário. 

Os TriN sentaram juntos. Nos três assentos à frente, o restante do grupo ficou.

Thales retirou o cinto de segurança que espremia sua cintura, sentiu-se aliviado por não precisar forçar o corpo mais para não rompê-lo e depois ficou de "joelhos" no assento, para olhar Nino atrás de si por cima.

— Quando a gente voltar, eu vou ganhar de você no ping-pong — desafiou.

Nino riu e respondeu em provocação:

— Vai sonhando.

— Gente, façam uma pose! — Samanta se ergueu com o celular na mão esquerda, enquanto estendia o braço. Tchik! Todos obedeceram o pedido, e a menina tirou uma selfie com todo o esquadrão rindo durante a viagem.


09:37.

— Por que escolheu o esquadrão dela para a missão?! — Katherine descobriu que Louis passou a missão diretamente para Alissa, sem dar chance de a mulher aceitá-la primeiro. Entrou na sala com uma raiva que quase não conseguia controlar.

Louis parou o que fazia em seu computador e olhou-a.

— Por favor, não começa — pediu.

— Sempre confia mais nela do que em mim.

— O que isso tem a ver, Katherine?

— Por que escolheu o esquadrão dela, então?!

O rosto de choro chegou... e o de acabado no rosto do homem retornou.

— Ontem eu recebi uma enxurrada de ligações vindas do Rio de Janeiro. Uma anomalia surgiu do nada em Copacabana. Não havia informações. Não havia agentes próximos para analisar de olho e me passar uma classificação provisória. Dois minutos de spam depois, recebo uma imagem da anomalia morta e uma mensagem de agradecimento de uma mulher, dizendo que um menino que vestia calça e blusa longa de cor preta salvou seu filho de morrer e matou a anomalia com a ajuda de uma garota que também se vestia de preto.

Katherine escutava em silêncio, embora forçasse um rosto de choro quase infantil.

— Isso foi ótimo... Não preciso dizer que estamos falando dos gêmeos, né?

Katherine não respondeu.

— Ontem foi um dia puxado. Foi ótimo os dois terem cuidado disso sem que eu precisasse mandar seu esquadrão. Ontem foi um dia especial. Queria que eles tivessem o direito de assistir seus antigos amigos de sala se gladiando pelo título de quinto e sexto esquadrão.

— Não minta para mim... você acha eles fracos.

"Talvez..." — Não é isso. É que os gêmeos já lutaram contra uma Calamidade juntos. Nino já eliminou uma Calamidade sozinho. E ontem, a Limpeza me mandou um laudo. A anomalia eliminada pelos dois era também uma Calamidade... Katherine, é óbvio que escolhi o terceiro esquadrão por serem a escolha mais segura. Não sei o que surgiu lá no norte. Não sei para o quê estou os mandando. Não há uma comprovação nem de olho da classificação da anomalia. Colocaram classificação Ruína 4 de provisório só pelo fato de um professor Classe A ter ido atrás de seus alunos na floresta, depois de desaparecerem em uma atividade da ADEDA amazonense. O professor também desapareceu. 

— Por que não o meu esquadrão? Por que não dá uma chance pra mim? Pra você se orgulhar de mim? — Lágrimas... Lágrimas.

"..." — Não é uma competição; eles salvaram vidas de vários civis ontem. Quem garante que, até eu chegar e teletransportar o quarto esquadrão, teríamos o mesmo resultado? — Louis se levantou e caminhou até ela. Segurou suas mãos. A mulher virou o rosto. — Olhe para mim — ordenou. 

A mulher obedeceu e o olhou nos olhos.

— Hoje é um dia especial. Temos que oficializar o quinto e sexto esquadrão daqui a pouco. Eu preciso de você. Preciso que me ajude com isso. Precisa parar de chorar. Você é minha mulher e o que eu mais quero é ver seu sorriso enquanto eu estiver no meio daquele estádio apresentando nossos novos esquadrões oficiais.

Thunf...

Abraçou-o... e, com o rosto afundado no peito dele, balbuciou:

— Não seria melhor, então, enviá-los por teletransporte? — sugeriu.

— ...Não vou estar vivo para sempre. Não quero que se acostumem com a comodidade que meu poder pode trazer — murmurou... seu pensamento que não ficou somente em sua cabeça.

Katherine afastou o rosto, olhando-o.

— O-o quê?

— Oi?

— O que você disse?

Louis fez uma expressão de dúvida.

— Eu... eu não lembro.

— Vo... Você vai me deixar? — Beiço... Lágrimas.

— N-não... Como assim? Claro que não!

— Promete...? — Lágrimas... Lágrimas.

— ...Prometo. — Mentiras... Mentiras.

Com um sorriso inocente, apoiou o rosto novamente no peito do homem. Louis apoiou a mão na cabeça dela, tentando reconfortá-la... mas o desgaste acumulado de anos em seu rosto era cada vez mais visível. Seu olhar distante era cada vez mais notório.

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