Volume 1 – Arco 3
Capítulo 148: Rio de Janeiro
O sol chegou e, com sua chegada, Nino cansou de se "fantasiar" de Nina. Embora tivesse esperado algumas poucas horas após o raiar atravessar as cortinas claras do quarto onde dormiu sozinho — já que sua irmã preferiu dormir com o amorzinho do que dividir uma cama como todos os dias de sua"s" vida"s" —, surgiu no quarto, saindo de uma sombra onde sua irmã se encontrava deitada com Nathaly. Olhando-a, escondido como uma entidade no meio do escurinho, Nina abriu os olhos já irritada, lançando um olhar na direção do irmão.
Nino não moveu os olhos caídos em tédio. Só ergueu uma mão, apontou para si com o indicador, apontou para fora da janela, na direção da Av. Atlântica, e moveu dois dedos, simulando pernas andando. Abaixou-a e continuou encarando, com cara de cu, sua irmã com seu rosto fazendo a exata mesma expressão.
Nina colocou as palmas juntas e abaixou-as como uma pequena súplica. Movimentos rápidos e pequenos de cabeça. Nino negou, jogando o rosto na direção da rua... mas Nina queria ficar abraçada mais um tempo com a menina dormindo. Então pensou rapidinho e respondeu o jogo de mímica.
Apontou para Nino, dando ênfase para que ficasse o mais explícito possível. Simulou estar preparando algo no fogão. Depois de misturar o vento na frigideira imaginária, pegou com uma espátula e depositou o sanduíche que não engordava e também não matava fome em um prato inexistente.
Ergueu a mão e rodou o dedo indicador. Nino, ainda com a profunda cara de cu, entendeu. Os olhos giraram em preguiça... mas um sorrisinho surgiu — não estavam em casa. Não havia cozinha, muito menos fogão. O café da manhã era preparado pelo hotel.
Cansado do jogo patético, aproximou-se de Nina e estendeu o braço. Nina tocou-o e Nino levou um choque de nojo e vontade de vomitar. As duas transaram noite passada; ver tudo como um tiro repleto de informações disparado em sua mente era doloroso demais.
Quase lacrimejando, segurando a bronca das informações, continuou misturado, e Nina disse primeiro:
"Por favor, só mais um pouquinho. Depois você sai."
De olhos fechados, com a outra mão — fechada — sobre os lábios, respondeu:
"Não."
"Porra? O que você quer fazer lá fora?"
"Andar."
"Você tá falando sério?!"
Nino abriu os olhos, encarando-a, e vendo a raivinha no olhar do seu rosto emprestado.
"Ô sua imbecil?! Você tá literalmente sentindo o que eu quero! É óbvio que é sério, pergunta burra do cacete. Já transaram já. De noite ficam juntos, transam, sei lá. Fazem o que quiserem. Só devolve o meu corpo logo!"
"Por favor... Só mais uma hora..."
Nino olhava-a com muito tédio. Quase bufou fisicamente, provocando um barulho que não queria naquele quarto. Mas ambos se assustaram de leve. Nathaly, virada para o outro lado, moveu um pouco o corpo... mas não acordou. Continuou dormindo. Só se aconchegou um pouco para trás, como se buscasse a concha maior que Nina estava sendo anteriormente.
Nino se desmisturou da irmã. Seu rosto se mantendo sem muita paciência. Sentou-se em uma poltrona do quarto. Nina vendo como seu rosto ficava quando se irritava profundamente com algo. Nino apoiou dois dedos nos olhos e os pressionou... Aprendeu com Alissa?
Afirmou com o rosto. Olhou-a e ergueu o indicador sutilmente, apoiado no braço da poltrona aconchegante, que passava uma vibe de antiguidade e realeza, nobreza, assim como todo o hotel.
Sumiu de lá.
Nina voltou a abraçar Nathaly, e mesmo dormindo, um pequeno sorriso se formou como se sonhasse e algo bom acontecesse em seu sonho.
Fechou os olhos e deixou-se aproveitar sua pequena vitória.
Exatas uma hora depois, Nino se encontrava sentado na poltrona, agindo como um mafioso, um agiota... um espião de filme de ação. Olhou-a como quem lhe devia milhões de reais, e Nina olhou-o com tédio.
"Pra isso é pontual, né?" resmungou em pensamentos.
Levantou-se com cuidado para não acordar Nathaly. Trocou sua forma; Nino trocou a dele, agora mais tranquilo, sem ao menos a cara de cu o tempo inteiro. Com um sorriso um pouco debochado, virou-se dando um passo para desaparecer, saindo em alguma sombra próxima da rua... mas Nina segurou seu pulso, e Nino olhou-a novamente.
Sem dizer nada, retirou o celular do irmão do sangue de sua barriga, por baixo da blusa de pano humano. Nino olhou e, com aborrecimento, pegou, guardando-o no próprio sangue, já que não queria aquilo incomodando sua mão afundada no bolso da calça.
Nina retirou o colar e o entregou também. O jovem recebeu quase bufando... mais por provocação; não se importava de ajudá-la, mas como pagamento, estressá-la era interessante. Liberado, sumiu de lá, indo passear.
Nina olhou na direção da janela balançando as cortinas com a suave brisa do dia... escutou um resmungo vindo da cama. Olhou com calma na direção. Nathaly não havia acordado, mas movia-se como se procurasse por algo em suas costas...
"Foda-se..." Nina decidiu arriscar.
Assumiu o corpo do irmão e voltou a abraçar Nathaly, que vestia peças leves de roupa fornecidas pelo lugar, naquela tranquila manhã. Era 10:02 quando Nino saiu de lá. Nathaly ainda se encontrava no mundo das nuvens depois do belo chá que recebeu durante algumas horas, horas atrás. Samanta e Thales já haviam saído para passear.
A menina queria comprar um biquíni para curtir o "calor" que sempre escutou que fazia no Rio de Janeiro. Mas era setembro e estavam na primavera. Naquela manhã, fazia exatos 22 °C. Não era frio, mas não era o calorão esperado.
Arthur também havia saído. Mas, diferente do casal, o menino saiu trajado formalmente como sempre andava e, além de tudo, saiu com os equipamentos de exterminador... Quem caralhos usaria um sobretudo na praia?
Nina abraçava sua amada como se aquele fosse o último dia que poderia fazer aquilo. Seu rosto, sua respiração sentindo o cheiro mágico do cabelo e o fogo que circulava dentro daquelas mechas laranjas. O cheiro da pele que tanto beijou atrás daquele cabelo, naquele pescoço que quase se transformava em um osso para o cachorro demônio roer.
Corpos colados. Não moldou um pênis. Só sentia o calor mágico que aquele corpo humano passava para ela. Uma sensação de vida que seu sangue frio não era acostumado. Era viciante. Se pudesse, ficaria assim por anos. Abraçada e sentindo o cheiro da pessoa — exceto Nino — que mais amava... Mas o peso do que estava fazendo bateu com força.
Sentia como se estivesse traindo a confiança do irmão. O abraço ficou frouxo. Uma necessidade de sair dali e respeitar tanto o corpo de Nathaly como o corpo do seu sangue versão masculina...
Dor...
Era dor.
O soltar...
O afastar.
O sair de perto dela, do conforto e calor dela... doía muito.
Nina sentiu.
Nina sabia exatamente por que Nino se afastou naquele quarto, "exatas" uma hora atrás. Mesmo estressadinho, querendo sair daquele hotel, sua feição e modo de agir eram quase inteiramente teatrais. Mesmo Nina tendo mais experiência e contato com o amor, também não entendia muito.
Não entendia a ponto de conseguir sentir toda a dúvida e estranheza que Nino sentia em relação àquilo, e não saber entregar uma resposta. Não saber pensar em uma solução. O saber tudo ao mesmo tempo em que não sabia nada.
Nino não cedeu.
Nino quis e permitiu porque sabia que faria Nina feliz, ficar mais uma hora naquele quarto aconchegante. Mas seu egocentrismo e fogo no cu para encher o saco fez com que continuasse em seu mundinho rebelde e irritante, fingindo estar irritado em deixá-la lá com sua aparência. Mas no fundo... soltou-a para que Nina não sentisse, por meio da mistura do sangue que dividiam, o conforto e alegria quase boba que Nino sentia por vê-la feliz.
Fresco...
Sabia que se soltou tarde demais. E ainda que, na próxima vez em que se misturassem, Nina saberia o que sentiu e pensou... mas preferia fingir que aquilo não aconteceu, mesmo que não tivesse como um esconder absolutamente nada do outro.
— Vou ir caminhar na praia, tá? Mwah... — Nina sussurrou no ouvido de Nathaly, deu um beijinho na cabeça e saiu da cama. Olhando-a resmungar como um pequeno animal acordando com fome.
Nina sumiu assim que sua aparência voltou ao normal.
Surgiu saindo de uma sombra no quarto que o irmão passou a noite. Não sabia se tinha alguém por perto e decidiu não arriscar alguém vê-la sair do quarto de Nathaly. Segundos depois: Toc, toc, toc... nenhuma resposta da dorminhoca.
Entrou.
Nathaly ainda se mantinha deitada, agora levemente desperta. Tampava-se de corpo inteiro; nem a cabeça escapou ao ver que Nino saiu sem mais nem menos, do nada.
— Nathaly?... Tá acordada? — chamou baixinho.
— Mmmnmnhum... — resmungou.
— Nino me avisou que foi pra praia. Levanta, bora achar ele lá! — chamou com ânimo.
— Nmnmmn...
— Oi?
Nina sentou-se na cama, tocando no relevo do pé da jovem sob o cobertor. Tudo que Nathaly falava saía abafado pelo tecido grosso.
— Agoranm nmmnãonnm...
— Bora lá? A gente come algo antes de ir. O hotel deve servir café da manhã. Cê bebe seu café com leite bem quentinho e come uma fatia de bolo de morango bem fresquinho, que tal?! — sua voz mansa tentando convencer sua amiga não surtia efeito algum.
— Já bebi bastante... — balbuciou.
Nina entediou o olhar com tal resposta sem vergonha na cara.
— Acorda loooogo, Nathalyyy... — resmungou com um drama fofo, puxando-a pelo pé com carinho e suavidade para de fato não arrancá-la de lá.
— Nmnmnãomnn... Depoooisnm... — Puxou o pé, ficando ainda mais encolhida sob os cobertores.
Nina olhou-a na fantasia de fingir-se ser um casulo de borboleta e ergueu-se meio cabisbaixa. Sabia que não adiantaria chamá-la. Não tinha o mesmo poder de Nino sobre ela. Não adiantaria falar da forma que falava usando a voz dele... ela não era e nunca seria ele.
Seu rosto na direção... abatido... mas não disse nada.
Virou-se e saiu do quarto, fechando a porta com calma para não provocar nenhum ruído irritante.
— "Ayrton Senna. 1960-1994. O medo me fascina". — Enquanto passava pelo calçadão, com seu desenho ondulado tão característico na praia de Copacabana, Nino viu a estátua de uma Lenda segurando a bandeira do Brasil. Chegou mais próximo e leu em tom baixo o que havia escrito na placa.
Não sabia quem era, mas a frase o fez arrepiar. Não por ser forte ou por ser algo de fato fascinante, mas sim porque seu medo veio à mente: uma aranha gigante o perseguindo por toda uma cidade.
O corpo inteiro tremelicou. O rosto indo para um lado e outro bem rapidinho, forçando os olhos fechados e uma expressão que mais parecia que havia tomado um shot de álcool puro.
A praia não estava cheia, mas ainda assim havia muitos banhistas. Mulheres pegando sol de costas, crianças brincando, correndo de um lado e outro. Trabalhadores vendendo água de coco, milho, espetinho de camarão e até cocada. Homens jogando altinha no campo atrás da estátua. Outros jogando vôlei, acertando perfeitas bicicletas em um jogo disputadíssimo no quesito habilidade. Pessoas caminhando, correndo e tentando melhorar o tempo em que precisavam para correr 1 quilômetro inteiro...
Mas...
A tranquilidade do dia foi embora de uma forma muito repentina. Algo simplesmente insano e anormal. Em uma torre vermelha de salva-vidas, um homem com seu uniforme ficou em choque ao avistar uma sombra imensa chegando cada vez mais próxima da praia. Vinha das profundezas do oceano... não era nada natural.
Não foi atraída. Não veio por fome ou necessidade.
Foi enviada.
Não conseguiu gritar. Sua garganta fechou, mesmo que tivesse aberto a boca para tal ação... não precisou. O caos se instalou de imediato. As águas se agitaram com muita ferocidade. Uma criatura linda emergiu. 10 metros só do que era possível ver do corpo fora d’água... Um Kraken.
Cabeçudo, tinha duas cabeças, embora não juntas. Um tentáculo muito mais grosso que os outros interligava-as. Seu corpo era escuro, embora fosse branco. As ventosas em azul-neon. Se fosse noite, aquela coisa mostraria sua beleza exuberante e perigosa.
Agitava-se com muita violência. Seus tentáculos, muito mais longos que o corpo visível, batiam na água descontrolados. Não sabia o que fazia, não sabia por que estava ali, mas a razão de ter sido enviada até ali vinha em sua direção.
Shhhuaa...
Sem perder tempo, Nino avançou, deslizando pela água como se estivesse surfando, enquanto a água e ondas eram congeladas... mas... não como costumava fazer. Não foi no egoísmo de se divertir, se entreter com um brinquedo novo para matar... destruir. Foi para salvar, criar. Foi para cumprir o pedido de Alissa.
Ainda era egoísmo?
Os movimentos que a anomalia fazia criaram uma correnteza embaixo da água, puxando tudo no mar em sua direção. De todas as pessoas que correram como loucas, subindo o pé desesperadas para saírem da água, uma criança não conseguiu.
Não sabia nadar e muito menos tinha força para lutar contra aquela força da natureza o puxando. Usava uma boia ao redor do corpo; era o que lutava para deixá-lo na superfície. Era a sua linha de vida. Sem aquilo, já estaria no fundo, se afogando enquanto sua mãe, na areia, olhava em choque, sem forças nas pernas para fazer absolutamente nada.
Pessoas corriam ao lado. Passavam como vultos, gritando desesperadas... mas seu rosto continuava olhando o filho indo para a morte. Ninguém se importava. Ninguém ajudava, e como ajudariam? Mesmo que no Rio de Janeiro tivesse uma ADEDA, ainda assim era como na Bahia. Só procuravam potenciais e mandavam para São Paulo. Ninguém poderia ir e salvar seu filho...
Mas um foi.
Nino surfou tranquilo, embora muito rápido, e resgatou o menino de se afogar. Segurou-o no colo; o pequeno tossia assustado. Olhou-o naquele mísero segundo passando lentamente. Conseguia sentir o tremor de medo que o corpo fazia... olhava curioso. Aquilo era uma refeição. Sentir aquela emoção transbordar era gostoso. O sangue pediu por sofrimento, mas Alissa pediu para não escutá-lo.
Uma onda imensa surgia nesse meio tempo. Era mais rápida do que o tempo passando. Não foi natural. Foi a anomalia que enviou... mas Nino não se importou. Frrrst... parou de dar voz ao sangue. Olhou o "ataque" e o mesmo congelou-se inteiro, criando uma rampa. Rampou e no céu os dois surgiram.
Fruusst...
Soltou uma pequena explosão de gelo criando um escorregador divertido, com vários loopings e voltas até chegar nos braços da mãe... soltou. O menino que antes sentia pavor sentiu-se cuidado nos braços do Primordial, e o medo deu lugar ao conforto.
Riu inocentemente, escorregando enquanto o escorregador atrás de si deixava de existir, até que, Thumpf... a mãe aos prantos o segurou com uma firmeza além do normal em seu colo. Um abraço tentando esconder a dor e medo que sentiu. O desespero e sentimento de inutilidade ao saber que não podia fazer nada além de assistir seu filho morrer.
Agradeceu...
Desceu o rosto segurando o choro em um cumprimento para Nino... que logo viu-a virar-se e correr o mais rápido que conseguia, com suas pernas que receberam força do nada para tirar e proteger seu filho daquele lugar.
Distraiu-se...
O contrário do que queria. Não queria receber agradecimento. Queria receber gritos de dor e medo... mas esse extremo do contrário o distraiu demais. Mantinha-se parado no ar. Não voava, não planava, só se mantinha parado, olhando na direção que enviou o garotinho.
CREEK!
Um tentáculo envolveu-o e apertou-o com muita brutalidade... os ossos rangeram... os ossos foram esmagados. O Kraken fez uma vitamina. Pressionou o sangue parecendo que queria fazer dele um sólido... Nino desmaiou instantaneamente.
...Rag assumiu.
A Marca se revelou, e o olho logo tomou o lugar.
BOOOMM!
Um estrondo ensurdecedor ecoou, sendo ouvido a muitas ruas de distância. Rag usou magia escura, soltou sangue do corpo nos tentáculos e explodiu aquela coisa grosseira que o aprisionava. Os ossos se regeneraram, dando sustento ao sangue e órgãos necessários... mas aquilo... era uma Calamidade 1.
BA...CRAAASH!
O tentáculo se regenerou em um tempo parecido, contra-atacando de imediato, acertando-o com uma agressividade insana, disparando-o pelo ar como uma munição ao sair de uma arma. Nino chocou contra o Quiosque Cabanna, destruindo tudo e assustando ainda mais os curiosos que se arriscavam querendo filmar o que estava acontecendo.
Ao menos, despertou mais medo nos irresponsáveis. Os que ainda estavam próximos do lugar, agora destruído, correram de medo. Não sabiam qual distância era segura, logo dispararam para o mais longe que conseguiram pensar, impossibilitando-os de ver e escutar:
— GrrRRAaAAAWRR...!
Nino ranger e rosnar como um selvagem em meio aos destroços... Havia acordado, mas Rag se recusava a devolver o controle do corpo. O que os colocou em uma briga, onde nenhum conseguia fazer nada. Mexia-se estranhamente pelo chão, quase uma tartaruga que caiu de costas e agora não conseguia se virar.
Só conseguia rosnar de uma forma tão estranha e sinistra que nenhum animal do planeta Terra conseguiria imitar...
— O que cê tá fazendo? Se controla, caralho!
Nina mal havia acabado de sair do Palace quando viu toda a merda começar. Surgiu em frente ao irmão caído, desceu o corpo e o segurou pela gola da blusa, aproximando o rosto do ser descontrolado ao seu, enquanto o sacudia com agressividade para frente e para trás diversas vezes.
Ao ouvir a voz de sua irmã, Nino conseguiu retomar o controle de seu corpo.
Rag fechou o olho e a Marca logo foi-se embora... mas a agressividade se manteve. Colocou a mão esquerda no braço de Nina, ganhando sustento enquanto encarava-a no fundo dos olhos. Ambos estavam putos. Nino com aquela anomalia, e Nina com ele, ao ver que usou novamente a Marca em público.
— O que voc...
Nino se levantou olhando na direção da aberração.
— O que você tá fazendo?! — questionou-o encarando-o de costas, após também se erguer.
— Essa aberração é fraca, mas se regenera rápido demais. Eu tive uma ideia.
Nina negou com o rosto e um desviar de olhos rápido, percebendo que aquele idiota não mudava em nada, mesmo recebendo esporro atrás de esporro diariamente por Alissa... Não viu ele salvar o humano...? Mas ignorou tudo e focou em resolver o problema mais urgente.
— ...Fala.
— Assim que eu pisar na água, você vai mandar uma flecha na cabeça da esquerda.
— Qual elemento?
— Não importa, apenas abra um buraco — rosnou, irritado, olhando no fundo dos imensos olhos que o encaravam diretamente lá naquele mar agitado.
— Ok.
Olhos quase em tédio, mas cravados e com nenhum pingo de sono. Um passo foi lançado, o pé se aproximava do solo. Fu! Nino disparou, cortando e subindo areia como um torpedo. Splsshs... tocou o tênis na água. Sil... Nina disparou uma flecha insana, colorindo aquela área de vermelho intenso.
Nino não congelou a água como antes... sua velocidade era muito alta, não precisava daquilo. Corria sobre elas. Sobre ondas. Não importava, só avançava em uma velocidade calculada para que o ataque chegasse sincronizado como queria... Mesmo sendo impossível de não ser vista, Nina brincou como Nino também queria.
Disparou mirando na cabeçona do ser, mas também no cabeção do irmão. Nino jogou a cabeça para a esquerda e a flecha passou por si, mudando a água de cor, quase evaporando com a temperatura enviada. Nino não se queimou e muito menos sentiu; Nina controlou sua magia para não feri-lo... mas apenas ele.
SHKRR-R-RUNCH!
O Kraken tentou atacá-lo com tentáculos que vieram de baixo, mas a claridade da flecha o deixou com um ponto cego, impossibilitando de ver quando Nino cortou os tentáculos usando uma espada de sangue. Embora a anomalia se regenerasse rapidamente... e os tentáculos descessem na direção novamente... já era tarde demais.
BOOOMM!
Saltou, desviando da investida de tentáculos emanando uma aura azul de cada ventosa em seus tentáculos grosseiros e pegajosos. O impacto foi perfeito. Aquela coisa tinha razões para não se preocupar com danos. Era só regenerar, afinal... mas era isso que Nino queria que o Kraken pensasse.
Realmente se regenerou de imediato... Mas Nino já havia mergulhado e estava dentro da sua cabeçona. Assim que entrou, um sorriso foi se alargando em seu rosto esquisito, querendo aquela coisa morta. Um brilho forte em ciano vinha de uma bola conectada por tendões e linhas gosmentas... o núcleo. O coração.
Nem havia aterrissado do salto, mas sua espada descia na direção.
SH-BUUMMM!!
Tocou.
Sua lâmina cortou, e um brilho insano se revelou, explodindo não só em azul, mas também com o poder escuro que Nino liberou em contra-ataque, não querendo ferir-se por burrice. Sua explosão sobressaiu o ataque suicida, mas o Herdeiro foi lançado ao céu, cerca de 15 metros acima do topo da segunda cabeça olhando em sua direção.
No ar, jogou as duas mãos na direção da segunda cabeçona e jogou-as para trás, fazendo de suas mãos arminhas com o dedão de mira e o indicador de cano. Quase um L, mas sem tanta firmeza. O sorriso quase diabólico se mantinha, junto de seus olhos abertos em ódio para com aquele ser nojento. Nem pensou, só berrou ao vento:
— KABOOOM! FILHA DA PUUTAA!
Das arminhas, sangue escorreu por seus dedos. Fu-Fu! Formando duas espadas que ele arremessou na outra cabeça sem hesitação alguma. P-PLOCH! Muito rápido. Não era um ataque que necessitava de esperar uma sincronia de imediata.
As lâminas rasgaram o ar com imponência; o Kraken não viu, só sentiu quando aquilo penetrou seu corpo... Mas no cabo das espadas, correntes viscosas foram formadas saindo das mãos de Nino, que segurou-as com firmeza, esticando as correntes para puxar-se na direção.
Nina olhava com um olhar aborrecido de tédio e preguiça ao escutar o berro que seu irmão deu... e com essa mesma expressão, puxou outra flecha e disparou com uma intensidade maior de magia, para cruzar a distância necessária mais rápido que antes.
BOOOOMM!
O míssil em chamas passou dessa vez possibilitando ver a areia por uma grande parte até se aproximar da anomalia. Evaporou a água instantaneamente, além de alterar a tonalidade de uma larga área para vermelho, novamente.
O impacto foi brutal. O Kraken perdeu todo o rosto... mas regenerou-o instantaneamente, mas não rápido o suficiente para que Nino não conseguisse adentrá-lo. Nino viu aquele corpo se fechar, entrou por uma abertura minúscula, mas entrou com raiva. O sorriso presente, o olhar sádico.
Tocou os pés no piso molenga; uma espada sendo formada em cada mão. Saltou e virou seu corpo no ar, rodando as lâminas em todas as direções, dilacerando aquela coisa de dentro para fora. SHKRUNCH!-BUUUMM! Que mais uma vez optou por uma decisão desesperada de eliminá-lo com um suicídio voluntário.
Nino não usou magia escura.
Percebeu que o mesmo anterior não iria fazer nada com seu corpo. Deixou-a explodir, jogando sangue e partes do corpo para todos os lados, deixando aquelas dezenas e mais dezenas de metros de centenas de tentáculos boiando na superfície da água, onde se mantinha em pé, sem mais suas espadas, mas com um olhar sério, rosto empinado, vendo o cadáver que decidiu desafiá-lo.
Gritos. Explosões. Era possível ouvir tudo, mesmo que estivesse caminhando pela R. Barata Ribeiro, duas ruas atrás do Palace. Arthur foi uma das pessoas que se assustaram, mas, diferente dos outros, o jovem correu para entender o que se passava.
Vindo pela R. Rodolfo Dantas, o sol impossibilitava-o de ver a cena com nitidez, mas viu um menino usar uma magia estranha para criar espadas com correntes. Era longe e o sol deixava tudo escuro. Sombras distantes se matando... embora soubesse que era Nino, pelo corpo e por estar enfrentando uma anomalia "sozinho".
Entretanto, seu corpo se arrepiou inteiramente, do nada.
— ...Eu já vi isso? — murmurou para si, colocando uma mão sobre os olhos, tentando enxergar melhor ao tampar o sol.
Teve um déjà vu, mas não conseguia entender tal sensação inquietante.
Distraído, Thumpf... Thales, que vinha de trás, também curioso pelos barulhos, esbarrou em Arthur sem querer.
— Opa, foi ma... Arthur? Você ouviu os gritos?
— Sim... Vim ver o que estava acontecendo, mas parece que Nino já resolveu. Oi, Samanta — cumprimentou Arthur, notando Samanta de biquíni nos ombros de Thales, sentada confortavelmente enquanto ele a carregava.
— Oi — respondeu normalmente.
Arthur fitou Thales, depois ela.
— Sem blusa, de bermuda... e você de biquíni. Onde estão os equipamentos?
— Ah, é que é chato ter que carregar isso pra todo lado — Thales respondeu em tom baixo, desviando o olhar do parceiro de equipe.
— A pistola é obrigatória. Regra é regra. A única exceção é para a zona rural. Enquanto estiverem em áreas urbanas, é necessário ter o equipamento — repreendeu-os.
— Mas estamos de férias — ponderou Samanta, já desanimada com o tom sério e certinho de Arthur... desarmou-o. Não havia argumento.
— É... um bom ponto. Aff, deixa pra lá — Arthur suspirou, frustrado por ser o único a levar as regras a sério.
— Boa! Toca aqui — Thales levantou as duas mãos, T-Tap! e Samanta bateu as mãos nas dele, rindo vitoriosos como idiotas sozinhos em um manicômio.
Arthur ergueu uma sobrancelha olhando para um e para outro, alternadamente sem entender muito bem... até que tentou cortar tal estranheza bizarra:
— Bora perguntar o que aconteceu pra ele — sugeriu.
— Mas... cadê ele? — perguntou Thales, olhando na direção.
Arthur olhou, e não havia ninguém além de curiosos chegando na rua para ver o corpo daquele ser imenso boiando e reagindo às ondas sujas com seu forte sangue em tom azul-escuro, sujando as areias de uma praia tão bonita.
Nina ligou para Alissa, que atendeu imediatamente. Lia um livro (Novidade.) em seu escritório na escola e forneceu à Nina o que a menina queria: o número da Limpeza do Rio de Janeiro. Ligou, pediu e arrastou Nino de volta ao Palace.
Nathaly continuava morta na preguiça. Não havia trocado as leves roupas fornecidas pelo hotel, mas tomava seu café da manhã em uma mesinha onde foram deixados por Louis. Com preguiça de ficar na área de alimentação, além de se sentir estranha por só haver funcionários em todo o hotel, pegou seu café com leite quentinho e uma generosa fatia de bolo de morango; só não sabia se era fresquinho.
Viciada em café, assim como Alissa, era um canecão toda manhã.
Degustava com calma seu café quando os gêmeos entraram no ambiente.
— Bom di...
— Nathaly, preciso conversar com o Nino, e ninguém pode escutar. Fica lá fora no corredor, olhando se ninguém vai chegar do nada, por favor — pediu Nina, extremamente séria.
A jovem que ouviu com riqueza de sons todo o caos e não quis ir ver o que acontecia por estar em suas "férias" olhou-os alternadamente, notando que a coisa estava feia. Ambos estressados com algo. Rostos fechados. Um silêncio chato de torturante.
Pegou mais um pedacinho do bolo e engoliu.
— Tá bom — respondeu e saiu, deixando seu pratinho na mesinha que devia valer uns 15 mil reais. Fechou a porta, e Nina olhou o irmão com um rosto que exalava raiva, frustração e preocupação.
— O que você acha que tá fazendo?! Cheguei na praia e te encontrei entre destroços, com sua Marca à mostra — Nino a olhava sério, atento às palavras dela. — De que adianta matar a anomalia se coloca sua vida em risco?! Você usou o sangue em público de novo! Cadê a merda da nossa promessa?! Cadê a porra da nossa promessa, caralho!? — exclamou em tom baixo. Nervosa, olhando-o profundamente, mas em tom controlado e nitidamente preocupado com o irmão.
Nino não sabia o que responder. Não havia o que dizer. Nada ia mudar o que fez.
Encarou-a em silêncio por um longo momento. Nina, furiosa, manteve o olhar fixo nele, movendo um pouco o rosto de tempos em tempos, aguardando uma resposta, aguardando alguma coisa da boca dele.
— Me desculpa.
— "Me desculpa"? "Me desculpa?" E isso resolve alguma coisa!?
— ...Não resolve, mas é a única coisa que posso te oferecer agora.
Desanimado, Nino se virou e caminhou em direção à porta. Nina não impediu, mas ficou olhando-o sair de costas. Ainda se mantinha irritada. Indignada por mais uma falta de responsabilidade que poderia custar suas vidas, colocando em guerra contra um mundo inteiro.
Nathaly achou que era espertinha. Ao fechar a porta, logo colou sua cabeça na mesma, tentando escutar algo, e conseguiu escutar tudo, menos os passos silenciosos do menino chegando, Pahff... Ppara abrir a porta, fazendo-a cair no chão sem reação devido à sua vergonha.
O Primordial olhou-a por um momento; Nathaly ficando ruborizada, olhos bem abertos na direção do nada, fingindo que nada aconteceu, embora quisesse uma coisa, coisa essa que foi ignorada por ele, que deu um passo por cima dela e saiu andando, deixando-a lá.
Olhou-o desaparecer. Levantou-se devagar, com o rosto na direção... bochechas cheias em seu rosto frustrado.
"Nem pra me ajudar a levantar." pensou, fazendo um biquinho. Foi até Nina e perguntou: — Você não acha que foi muito dura com ele, não?
Nina olhou na direção da amiga, que sentou-se ao seu lado no sofá... sem fome. Olhou para o bolo e o canecão cheio de café, mas a atitude de Nino em ignorá-la a deixou de estômago embrulhado. Sem apetite. Ergueu o rosto para o teto, olhos entristecidos.
— Talvez um pouco — Nina respondeu sem muito ânimo. Desviou o rosto logo após e voltou a olhar para frente, para o mais profundo vazio. — Quando ele voltar, eu peço desculpas.
— ...Se ele voltar, né?
Nino ergueu um pouquinho o rosto e virou para olhá-la. Viu-a inerte, assim como si, segundos atrás. Voltou o rosto ao nada em sua frente. As duas com a mente em lugares semelhantes, embora distantes.
Ficou em silêncio, assim como a amiga... mas os pensamentos? Não.
"Só quero protegê-lo... por que ele não entende isso?"
Vrrr, Vrrr...
Alissa fazia o que mais gostava: beber um bom vinho tinto enquanto ouvia suas músicas favoritas, deitada nua na banheira de hidromassagem da sua luxuosa cobertura. Era noite quando ela recebeu uma ligação muito inesperada. Ao redor de sua banheira, dezenas de garrafas vazias... algo aconteceu em seu livro. Sofria pelo imaginário.
Com sua magia, ergueu o celular para ver quem era... rindo maliciosamente, atendeu:
— Você não consegue viver longe de mim, né? — provocou quase deixando o riso passar para o outro lado.
— Sim... Mãe.
Ssshhhuaaa...
Nino amava lugares altos. Gostava de ficar sozinho nesses pontos quando se sentia mal ou sentia que precisava de algo, mas não sabia o quê exatamente. Sobre um grande prédio, mantinha-se sentado na beira do edifício.
Embaixo, na rua, um semáforo permitindo a saída da Av. Atlântica para a entrada da Av. Princesa Isabel. Naquela noite, permitia-se sentir o ar fresco. Os ventos calmos, enquanto seus olhos se mantinham na direção das águas, observando pequenas ondas se quebrarem.
Engraçado.
Uma manhã tão agitada dando lugar a uma noite tão tranquila.
A Limpeza não conseguiu recolher todo o material biológico presente na água da anomalia, mas chamou reforços e caminhões de Brasília já estavam a caminho. Muita parte daquela coisa ainda boiava. Conseguiram puxá-la e prendê-la na areia, mas isso era trabalho para no mínimo dois dias inteiros.
Os sons das ondas quebrando eram relaxantes. Nino experimentava o que Nina conseguia sentir ao tomar banho de água quente. O relaxamento que o sangue tão frio e agitado conseguia absorver e aproveitar.
— Owntt, que fofo — Alissa girou o dedo na borda da taça. — Não esperava por isso, mas... por que me ligou?
— Ah, sei lá... Só queria ouvir sua voz um pouco — assumiu em tom baixo.
— Quer conversar sobre algo? — perguntou erguendo uma sobrancelha. Desconfiada que o menino havia aprontado.
— Não sei. Lembro que você mencionou que a professora Katherine te odeia, mas nunca explicou o porquê.
— Aah, Katherine... Nós éramos melhores amigas há muitos anos atrás.
— Como assim?
— ...Somos primas. Crescemos juntas e fazíamos tudo juntas. Quando fomos enviadas para a ADEDA em 2004, tínhamos oito anos e caímos na mesma sala, com o professor Louis, que na época tinha 24 anos. Fomos enviadas porque desenvolvemos nossos poderes, que são únicos e muito fortes.
— Qual é o poder de vocês? Você disse o seu, mas não entendi naquele dia.
— Vou terminar a história e depois explico.
— Ok. — Nino estava muito curioso. Olhos atentos, embora não estivesse presencialmente. Orelhas como de gato.
— O problema é que a Katherine acabou desenvolvendo uma paixão doentia por Louis, e isso a cegou cada vez mais. Ela começou a se afastar de mim e não suportava nem que eu interagisse com ele, por puro ciúme. Chegou a um ponto tão absurdo que decidi não fazer parte do primeiro esquadrão, para não deixá-la desconfortável. Eu era a única exterminadora que trabalhava sozinha; o segundo esquadrão era composto apenas por mim.
Lembrando do passado, seu olhar era um tanto desapontado na reta do seu rosto. O dedo ainda passeando suavemente pela borda da taça ainda com vinho dentro.
— Desde que os exterminadores existem, apenas eu, e agora você também, conseguimos matar uma anomalia de classificação Calamidade sozinhos. Isso só aumentou a insegurança dela, porque eu era o centro das atenções, recebia todos os elogios. Mesmo que Katherine tenha um poder forte, ele é inútil sem ajuda, e ela temia que eu a substituísse no primeiro esquadrão. E... embora Louis sempre a rejeitasse. Sempre e sempre. Sempre negasse as investidas estranhas que ela arrumava, ela não se afastava dele, com medo de que ele acabasse gostando de mim. Isso... isso... ISSO É DOENTIO! — Alissa se exaltou.
Cr-r-r-recsshh!
Cerca de nove garrafas vazias explodiram, estilhaçando-se com a pressão que a raiva dela criou no ambiente. Aborreceu o olhar, juntando os cacos com gravidade e os levando até uma lixeira. Ao menos trocou seu ódio por algo mais leve.
— Tá tudo bem? Eeeh... escutei alguns estalos depois de ficar surdo — provocou.
— Eeeh, quebrei umas garrafas sem querer — respondeu com um tom e reação similar.
— Uhum... Continua aí — pediu, curioso.
— Isso tudo era muito doentio. Eu era uma criança, e ele, um adulto. Mesmo ele deixando claro que não a queria, a única coisa que ela fazia era pedir para que ele a esperasse. Eu sempre mantive distância dos dois, e em 2005, nossa amizade acabou de vez. Depois do incidente com seu pai, ela nunca me perdoou pela morte dos amigos dela. Mas não faz sentido... — Alissa continuou alisando a borda da taça, mas agora com uma expressão abatida. — Ela não queria minha presença, mas esperava que eu estivesse lá para salvá-los?
Nino abaixou o olhar quase como um reflexo do que ela fazia.
— Você disse que ela é forte... mas então, por que ela precisa de ajuda?
— O poder dela é cancelar os poderes dos outros.
— Cancelar?
— Você consegue usar seus poderes normalmente, não é? O poder dela é fazer com que você não consiga usar os seus de jeito nenhum. Mas, para fazer isso, ela precisa estar próxima, não colada ao alvo, mas não muito distante também. Ela não sabe lutar, não tem força para isso, nunca foi em uma missão sozinha. Louis usava o poder dela apenas para facilitar as missões do seu esquadrão. A escola busca poderes únicos, mas é raro aparecer alguém com algo assim. A última aparição relativamente interessante foi Vinícius, com uma espécie de fogo azul, mas ele nem sabe usar direito. Quem sabe um dia ele aprende e se torna minimamente forte. Tem um menino que usa um baralho também, mas fiquei com preguiça de ler o relatório.
— Uhum — resmungou Nino, aborrecendo o olhar em ciúmes.
— Aquele dia na escola, eu te contei só meia verdade sobre o meu poder.
— Meia verdade? — animou-se novamente.
— Katherine anula poderes; já eu posso controlá-los e usá-los contra você, se eu quiser. Existem duas formas de controlar alguém: entrando na mente da pessoa ou manipulando a gravidade e o espaço ao redor dela.
Alissa levantou uma garrafa de vinho vazia ao lado da banheira, usando sua magia. Controlou o espaço ao redor da garrafa. Crec... Fazendo-a flutuar antes de destruí-la, comprimindo o espaço ao seu redor.
— Olhe para o seu braço.
Nino esticou o braço e olhou para ele.
— O que foi?
— Mesmo que você não veja, há gravidade e espaço em volta do seu braço. Meu poder me permite controlar isso, fazendo com que seu braço se mova conforme eu quiser.
Não importava a distância. Alissa só precisava ouvir, sentir, ver ou querer para conseguir usar seu poder com efetividade. Não precisava ver ou estar com Nino; através do áudio da ligação, adentrou pela audição e tinha livre acesso para controlar o corpo do menino... e foi o que fez.
Mas não o controlou internamente, igual quando o obrigava a se beliscar. O controlou manipulando a gravidade ao redor do braço direito, movendo-o como quisesse. Fez com suavidade; sua intenção não era machucá-lo.
— Você tá me controlando?
— Sim, e através dos seus olhos, vejo que você está em cima de um prédio. O que está fazendo aí? — questionou um tanto desconfiada.
— Então, você consegue usar isso para esmagar anomalias? — perguntou de imediato.
— Sim, eu consigo. Não tente mudar de assunto. O que está fazendo aí?
— É que...
— "É que"?
— É que eu briguei com minha irmã — confessou.
— Certeza que fez alguma coisa pra deixar ela brava — respondeu apaticamente.
— Tipo isso.
— Vá até ela, dê um abraço e peça desculpas — ordenou.
— Isso aí não é demais? — protestou, visivelmente indignado.
— Obedece a mamãe — riu.
— Sabia que não deveria ter falado isso — respondeu cabisbaixo, olhos quase completamente fechados em tédio.
— Aaah, para — brincou em tom divertido.
Nino ficou alguns segundos apenas ouvindo as leves risadas que vinham do celular... era estranho. Uma sensação muito estranha. Mas era gostoso, e não queria parar de sentir aquilo... mas era mais difícil lidar com sentimentos e sensações que não conhecia do que enfrentar seres poderosos.
— ...Vou voltar para o hotel então... Tchau aí — despediu-se acanhadamente.
— Bye-bye — Alissa respondeu normalmente, embora ainda com risadas leves.
Nino desligou olhando para a tela do celular. Uma mensagem surgiu: "Anda, vai lá e faça o que a mamãe mandou". Alissa enviou. Aborreceu o olhar e bloqueou o aparelho. Passou por baixo da blusa e enfiou-o em seu sangue.
Virou-se, ficou de pé e viu Nina surgir em sua frente, olhando-o com aborrecimento.
— Previsível. Lógico que ia estar em um dos mais altos — resmungou.
— O que você tá fazendo aqui?
— Te procurando. Você estava demorando e achei que ia passar a noite fora de novo. — Nino caminhou em sua direção, e Nina o observou, confusa, enquanto respondia-o.
Thumpf...
— Quem é você e o que fez com o meu irmão?
— Ô sua infeliz, custa retribuir carinho? — resmungou com o rosto no ombro dela.
Nino abraçou-a. Nina não mudou o semblante, muito menos voltou o abraço.
— Você não é assim. A última vez que me abraçou assim foi no telhado daquele armazém, à noite, quando a vovó morreu.
— Desculpa por mais cedo. Não deveria ter usado o sangue. Fui muito irresponsável, foi mal mesmo.
Nina cedeu.
Os braços se moveram e o abraçou de volta, apoiando o rosto — de olhos fechados — no ombro dele também.
— ...Desculpa por te xingar também. Fiquei brava e passei do limi...
— Chega, né? Não é para tanto.
...O abraço morreu. Nina abriu os olhos. O semblante autoexplicativo no quesito tédio e vontade de acertar-lhe um soco no meio da cara. Olhava-o com desdém, e o menino passava as mãos pela blusa, como se limpasse as mangas longas, cheio de nojinho.
— Aí ó? Já tô até fedendo a esgoto. Não toma banho, não?
— Já voltou com a chatice? — perguntou exalando apatia.
— Só falo verdades.
Encararam-se em silêncio por alguns segundos. Ninguém piscava. Muito menos se moviam.
Fu!
— Quem chegar por último paga um lanche!
— AAAAH, SEUU!
Fu!
Nina disparou atrás do irmão, correndo não muito atrás do ladrão, que iniciou mais uma competição boba do nada.
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