Dançando com a Morte Brasileira

Autor(a): Dênis Vasconcelos


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 99: Atura ou Surta

Vrr, Vrr... 

Desde que a ligação com Mirlim havia sido finalizada, Alissa continuava deitada em sua banheira. Ouvia uma musiquinha e se embebedava cada vez mais — embora controlasse o efeito do álcool em seu corpo para poder aproveitar tranquilamente apenas o sabor da bebida cara.

Ficava ali, olhando para o teto, sem pensar em nada... apenas passando o tempo. Mas o vibrar do celular tirou sua paz.

Quando o aparelho começou a flutuar até a altura de seus olhos, para mostrar quem estava ligando, sua noite conseguiu ficar ainda pior.

Desligou a chamada de Louis...

Mas Louis insistia.

A cada ligação recusada, ele ligava novamente, até que a exterminadora perdeu a paciência e atendeu furiosa:

— O que foi?!

— Estou recebendo inúmeras ligações e mensagens sobre uma anomalia que surgiu lá em Vila Santos, os g...

— Não ligo. A extermine. Boa noi...

— OS GÊMEOS ESTÃO LÁ!

Ao perceber que Alissa estava prestes a desligar na sua cara, Louis deu um berro tão alto que até assustou Katherine, que, meio sonâmbula, sentada na cama de pijama, piscou com lentidão.

Alissa segurou o dedo, parando antes de encerrar a chamada.

— Como assim? — respondeu, sem demonstrar nenhum ânimo.

— Você já matou essa anomalia antes. É uma Calamidade 1, só que matou lá no Amazonas, e essa coisa agora surgiu aqui! Tá ocup...

— Louis...

Louis parou imediatamente ao ouvir seu nome ser pronunciado com rigidez.

— Minha noite está uma merda. Eu não tô com gracinha. Esse lugar fica a uns 8 km dos apartamentos dos alunos. Tá mesmo querendo que eu acredite que uma anomalia que só surgiu no Amazonas tenha brotado em São Paulo, e os gêmeos estão lá?

— Alissa... Eu quase não consegui ligar pra você com a quantidade de ligação e notificação que o meu celular está recebendo. Não ligo se acredita ou não, a merda é que a imprensa tá lá, todos os canais estão transmitindo os gêmeos lutando contra isso. Inúmeros vídeos circulando na internet. Tão lá, lutando sozinhos, sendo que é a ADEDA que deveria intervir.

Katherine olhava para Louis, furioso, tentando manter o foco. A mulher bambeava para os lados, o cabelo extremamente bagunçado, os olhos semicerrados... o corpo quase caindo de volta no sono.

— Vou dizer só uma vez. Não ligo se você vai ou não. Vou me teletransportar pra recepção do seu prédio e esperar por um único minuto. Se você não aparecer, eu vou até lá e só saio com a vitória... ou morto ao lado dos seus alunos.

Louis disse com firmeza. Seu semblante mostrava a seriedade do que se passava e dizia, mas Alissa não podia ver seu rosto fechado.

Tsi...

Louis franziu o cenho ao ouvir a risada irônica do outro lado da linha.

— Os dois são mais fortes que você. Indo lá ou não, sendo verdade ou não, será inútil. Vai fazer o quê? Tentar cortar uma Calamidade com essa espadinha de metal básica sua? Uma Ruína até vai, mas Calamidade... não.

— Alissa, não é brin...

— Ué...? Não ia dizer só uma vez? — questionou com um sorrisinho malicioso no canto da boca.

— ...

Tsc... Bye bye.

Alissa desligou a ligação, e Louis se ergueu da cama indo atrás da sua "espadinha". Seu rosto bem sério, suas roupas... nem tanto. Sem blusa e com um short bem fino de dormir, correu até o sobretudo, já que não tinha tempo para se arrumar e se produzir.

Enquanto o vestia, falou alto:

— Amor, acorda!

Hrrnmn...

Katherine, exausta, se ergueu por reflexo.

Clap!

Ambos surgiram na recepção do luxuoso prédio de Alissa.

O recepcionista se assustou com a chegada repentina — mas não apenas por isso. Também se surpreendeu... por outro motivo.

— Se-senhor Louis... P-perdoe-me, mas não pode entrar aqui!

— Apenas um minuto! Nada mais, eu juro! — A urgência estava estampada no seu tom de voz.

— É uma regra da Srta. Kubitschek... se ela te ver aqui, eu serei demitido... — disse o recepcionista, com um olhar que implorava por piedade.

— Se isso acontecer, eu te dou um emprego que paga o dobro do que ela te paga! Não se preo...

— Aaah! Se é assim, eu me demito pra ir então! — respondeu despreocupado, com uma postura desleixada e um olhar bem sugestivo sobre o tipo de trabalho que imaginava...

Louis o encarou com uma careta estranha, a boca entreaberta, olhos julgando-o de cima a baixo. Começou até a se sentir levemente assediado, ao notar o recepcionista encarando seu tanquinho — levemente visível sob o sobretudo entreaberto. Louis puxou o tecido, desconfortável, tentando tampar a visão.

Katherine, por sua vez, continuava dormindo em pé, sustentada apenas pelo braço de Louis para não cair.

O exterminador olhou para o celular. Ainda não havia passado um minuto... mas já eram muitos segundos desde que a moça desligou a chamada na sua cara.

"...Anda logo!"


Nino ouviu a voz da irmã e jogou o rosto para o lado, olhando na direção, enquanto tudo acontecia, e as novas ameaças desciam tentando o atacar... mesmo que fosse inútil. O menino olhou nos olhos de Nina, e então Nina jogou a cabeça de lado, mostrando a ele a bola com as outras partes, enquanto dizia:

— Junta tudo.

O tempo voltou.

WHAAARRRHKK!

As anomalias rugiam o atacando, e Nino voltou o olhar aos seres se aproximando.

Fu!-FuFu-u-fuuu!

O som do vento sendo rasgado pelos movimentos das criaturas era magnífico.

Nino desviava com precisão... entretanto... não queria perder mais tempo com aquilo.

Avançou em cada uma, BAM-BAM! dando apenas um golpe em cada, direcionando-as ao mesmo ponto.

PLOOOOOCH!

Cravou uma estaca de pedra gigante... fez um espeto com todas de uma vez.

A enorme estaca foi se moldando... curvando.

BAM!

Depois que Nina incluiu a sua cobaia de fotos junto das outras na bola, a chutou na direção de Nino, e seu irmão direcionou as anomalias que estavam com ele, BAMCHT! colidindo-as na bola da irmã, prendendo todas as partes, embora separadas, juntas novamente.

Nino avançou cortando o mato daquela área, Vul! BAAM! e saltou, golpeando a bola com uma voadora na direção de Nina, que esperava aquilo com uma enorme marreta de gelo. 

Seu alvo chegava rápido, mas seu pulo na direção, e seu movimento rotatório com a marreta, era maior.

BRUSFFTT!

O impacto destruiu sua marreta em uma explosão belíssima de flocos de neve, que caíram sobre toda a área — encantando ainda mais a multidão que assistia à batalha, completamente envolvida.

A Primordial direcionou a enorme bola para o céu, mas, quando pulou para ganhar velocidade e impacto... ambos os irmãos pensaram na mesma coisa.

Nino surgiu girando um chute por baixo de Nina, e Nina apenas esperou o recebimento do impulso que seu irmão iria lhe entregar.

BAAMM!

Nino chutou a sola dos tênis da irmã, e Nina avançou na direção da bola no céu mais rápido que uma bala de 7,62 mm.

BRRAAAMMM!

A explosão causada apenas pelo impacto do chute na massa já era avassaladora. Mas não era só isso que os dois haviam pensado.

No chão, assim que aterrissou, Nino esticou o braço direito na direção da bola... e puxou o esquerdo como se fosse uma flecha prestes a ser disparada.

Um forte feixe de fogo foi criado — uma flecha iluminando o menino e boa parte do mato.

Vul!

Disparou.

E...

Do céu...

Após acertar o chute...

Nina girou em um mortal, executando o mesmo movimento com o braço.

Vul!

As duas flechas rasgaram o céu, suas magias de fogo rodando lado a lado.

BURRMNMN!

Se mesclaram em uma implosão que ampliou ainda mais a força, e...

BRRRUUUUMNM!!

Acertaram o ser... criando, por bons segundos, um sol artificial naquela noite — iluminando todos os prédios e uma parte significativa da pequena cidade mergulhada na escuridão.

As pessoas continuavam filmando. Repórteres, impressionados, narravam tudo ao vivo com emoção.

Fush...

Nina aterrissou ao lado do irmão. 

Os dois olhando a bola de chamas no céu, sem nenhum sinal da anomalia... ao menos... naqueles três segundos de uma vitória... falsa. 

A magia que usaram só serviu de alimento.

E com o alimento... veio a mutação.

Com a mutação... a adaptação.

Com a adaptação... a evolução.

WHAAARARRRHHTKK!!

A criatura se fundiu completamente.

Criou asas. Seu corpo triplicou do tamanho original. As asas eram puro fogo, a bola flamejante no céu foi absorvida, e agora, o que iluminava tudo eram suas asas e barriga incandescentes.

Sua cabeça cresceu na mesma proporção. A aberração se tornara uma Calamidade 2, com um poderoso domínio elemental de fogo.

— Alguma ideia? — questionou Nino, encarando aquela coisa com uma preguiça quase cômica.

— ...Vamo isolar essa coisa e usar o sang...

CRA-...!!

Nina parou de murmurar quando os dois, juntos dos humanos, viram o ser ter seu corpo um pouco... amassado.

CRI-... KR-... CRACRECRASSHH!!!

As asas se quebraram, o corpo se dobrou inteiro. 

Aquele ser foi amassado igual uma pessoa amassava uma bolinha de papel. Aquela aberração de 60 metros virou uma bolinha minúscula, a ponto de caber na palma de uma mão, maciça, de pura carne queimada... sem vida.

Ninguém entendeu... o silêncio reinou por um tempo... mas então Nino sentiu a presença de um olhar, e com o corpo inteiramente se arrepiando... olhou para o lado de onde sentia, e, junto de Nina, Nino viu Alissa, com sua roupa típica e seu sobretudo balançando ao vento, em pé... parada no céu... olhando diretamente para os olhos do menino.

"Fudeu..." pensou ele, já abaixando a cabeça.


"Nem parecem cansados... Era tudo verdade. Realmente estavam vencendo a Calamidade..." pensou Louis, de pé no telhado de um dos prédios, com Katherine dormindo de cavalinho em suas costas, as pernas pendendo e o cabelo balançando com a brisa.


No instante em que os gêmeos olharam para Alissa, todos olharam na mesma direção, vendo a mais forte voando. As câmeras mudaram de foco, indo todas para a exterminadora... que, de repente, sumiu do céu, reaparecendo na frente dos gêmeos.

Sua feição?

...Nada amigável.

— Por que estão aqui? — sua voz arrastada revelava a raiva contida.

Nino estava visivelmente assustado.

Não sabia o que fazer ou falar. As palavras fugiram na pressão do momento. Sua reação e vontade perante Alissa era de não mentir, ser aberto e contar a verdade, mas sabia que não podia — e isso o deixou sem saída.

Nina, com mais cabeça no momento, assumiu a conversa, bem tranquila:

— Desculpa, professora. A gente estava matando a saudade da floresta.

— Hãm? Como assim? — questionou ela, a dúvida visível em seus olhos quase brilhantes.

Nino olhou de canto para a irmã, seu rosto ainda bem baixo, em vergonha e respeito.

— Quando éramos mais novos, nós brincávamos no quintal de lutinha, e o nosso quintal dava em uma mata. Então viemos aqui treinar. Lembrar um pouco do passado em um ambiente parecido. Só que fomos atacados por aquela anomalia horrorosa.

— Desculpa, professora... eu que tive essa ideia... — disse Nino, em voz baixa.

— AVÁ! Nossa... pode ter certeza de que eu achei que essa ideia de girico tinha vindo da sua irmã! — respondeu em ironia, sua voz mais doce, quase risonha em brincadeira.

Nino ergueu o rosto para olhá-la. Seus olhos mostravam um aborrecimento sincero, e o biquinho de emburrado só piorava a cena. Nina o olhou com deboche... e Alissa continuou, sorrindo de canto:

— Você não consegue me deixar em paz um único dia, né? — brincou, seu tom zombeteiro, mas sem nenhuma verdadeira raiva.

Sua chegada mais brusca fora apenas para entender a situação.

"Que bom que estão bem..." pensou, alegre. — Vou ter que aturar essa criança até quando? — apontou com o dedão, num joinha torto e desleixado, na direção de Nino.

— Aaaaarrh, imagina eu que moro com esse treco... quase surto todo dia com essa criançona irritante... Tsi... hhihaha...

Nina não aguentou e explodiu numa risada sincera. Alissa riu também, mas de forma mais elegante — consciente de que estava sendo filmada e de que sua imagem pública precisava manter-se respeitável.

— Ha... Ha... — murmurou Nino, ironicamente.

— Ok, chega de graça. Não façam mais isso. Temos o Allianz justamente para ter espaço e treinar. Não têm culpa do que aconteceu...

Nino tentou manter seu rosto o mais normal possível, para que nada parecesse estranho em seu comportamento. Já Nina, sorrindo de leve, fechou os olhos para não mostrar, em suas íris, sua vontade de voltar uma voadora em Nino.

— ...Mas não quero que vocês se exponham assim novamente... entenderam? "Ainda mais com a mídia de olho em vocês agora." — pensou, enquanto via os dois assentirem com movimentos positivos de cabeça.

— Alissa... — chamou Louis em voz baixa, aproximando-se.

Estava sozinho agora, havia teletransportado Katherine de volta para a cama, para não ser gravada de pijama pela imprensa.

Logo surgiu ao lado dos três.

Ainda usando apenas seu short fino, sem camisa — mas protegendo-se com o sobretudo fechado.

— Diga — respondeu ela, quase não virando para olhá-lo.

Louis se deu bem... Alissa, estando ao lado dos dois, não devolveu uma patada seca no diretor, já que tinha que mostrar exemplo de educação, respondendo-o.

— Pode dar a entrevista pra imprensa hoje? — pediu com um tom de vergonha na fala e no rosto. Seu cabelo preso, seu rosto sem um pouco dos retoques que passava para ser sempre o bonitão nas câmeras.

Alissa olhou para baixo, avaliando a cena.

— Veio de chinelo e sem calça? — comentou, quase com uma careta de nojinho.

— Não deu tempo de me arrumar... por favor, só hoje. Não quero aparecer na televisão nem na internet assim.

A mulher cruzou os braços e o olhou nos olhos, o semblante claramente aborrecido com o pedido.

— Por favor... — reforçou ele, humilde, quase se ajoelhando com a testa no chão.

— ...Ok. Mas mande os dois pra casa.

Louis assentiu e olhou para os gêmeos:

— Bloco um, sétimo andar, certo?

Ambos afirmaram em sincronia com a cabeça.

Clap!

Os dois sumiram, reaparecendo no corredor do prédio.

Nina olhou para Nino com o rosto aparentemente normal... mas não queria.

Sabiam bem das câmeras ao redor, então caminharam normalmente até o apartamento.


— Obrigado — Louis murmurou bem baixinho, Clap! e também desapareceu de lá.

Sniiiffff, Harrrrff...

Alissa respirou fundo e seguiu em direção à imprensa.

Assim que perceberam a exterminadora se aproximando, os repórteres se desesperaram — todos querendo ser o foco, ser o primeiro a conseguir uma resposta direta da mais forte.


Os gêmeos entraram e, Tlac! assim que a porta fechou, Nino viu o semblante de Nina mudar instantaneamente: um olhar de "vou socar você até a morte".

Entretanto, a menina não disse nada... quem tentou falar foi Nino:

— Aquel...

— Calado.

Nina rangeu os dentes, o repreendendo, mas não avançou ou começou uma sequência de xingamentos. Só se dirigiu até o sofá e ligou a televisão em um dos jornais que estavam transmitindo a entrevista de Alissa.

— Vamos escutar, depois conversamos — disse ela, sem olhá-lo.

Sua voz era fria, dura... mostrava uma raiva tão grande que Nino, por um momento, notou um tom parecido com o que escutou na visão do pai.

Apoie a Novel Mania

Chega de anúncios irritantes, agora a Novel Mania será mantida exclusivamente pelos leitores, ou seja, sem anúncios ou assinaturas pagas. Para continuarmos online e sem interrupções, precisamos do seu apoio! Sua contribuição nos ajuda a manter a qualidade e incentivar a equipe a continuar trazendos mais conteúdos.

Novas traduções

Novels originais

Experiência sem anúncios

Doar agora