Dançando com a Morte Brasileira

Autor(a): Dênis Vasconcelos


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 89: Machão

[ A namorada de Felipe já havia finalizado o preparo da pizza intitulada "Especial da casa". Uma pizza com direito a tudo, todos os ingredientes que o rapaz decidiu pôr ao inventá-la. A moça passou a pizza para o forno, quando Felipe chegou atrás dela.

— Lara.

Lara soltou a pizza com cuidado, usando uma pá própria para o serviço. Assim que escutou seu nome, se virou, olhando seu namorado um pouco ofegante. A pele mais brilhosa. Era nítido que não era do calor do forno. Ainda mais notando que, em seus cabelos, uma umidade contracenava.

— Oi?

— A Beca tá passando mal. Deixei ela ir embora. Cuida do caixa hoje. Vou assumir os pedidos que você tava preparando.

"'Beca'? Chamando uma funcionária de apelido fofo?" pensou, com um aperto no peito. — Ok. As comandas estão no varal da minha mesa.

— Aham, eu sei disso — respondeu Felipe, grosso, já se afastando de perto da namorada, indo até a mesa, onde puxou uma comanda e foi buscar os ingredientes do pedido.

Lara sentiu o coração murchar.

"Faz tempo que só me chama pelo meu nome... O que eu tenho que fazer pra você voltar a ser quem era? O que eu fiz pra você me tratar assim? O que você quer que eu faça? Eu te amo... Você é meu primeiro amor... o amor da minha vida..."

Tudo...

O relacionamento não começou assim.

Juras de amor... Flores... Presentes simples, feitos à mão, e também caros... era comum antes... antes da conquista. O tratamento perfeito, a família perfeita. Todos adoravam ela, e Lara se sentia bem, tendo agora uma família — e não a sua, que mal se importava com a tal.

Um relacionamento rápido. Em pouco tempo foi pedida em namoro, e também em pouco tempo já se via morando com Felipe, dependendo do Felipe, sendo completamente sustentada pelo Felipe. Entregou sua vida para o Felipe, e agora, ele a tinha por completo...

E enjoou.

Sem um lugar para voltar, morar. Sem dinheiro para sair, desistir. Sem amigos para procurar, pedir ajuda. Sua liberdade era completa, poderia sair se quisesse, mas não queria. Preferia viver ali, preferia viver nas regras que seu primeiro amor colocava. O dinheiro que ganhava trabalhando com ele... era dele.

Deixava que ele cuidasse das contas... ficando por vontade própria, sem nada. Decidindo por vontade própria que um outro alguém decidisse tudo por si: o que comer, vestir, o que falar, onde ir.

Mudar de vida... Sair do neutro, do normal, da área de conforto.

Sua falta de experiência em relacionamentos, a falta de um pai, a falta de uma mãe — uma mãe de verdade, que se importasse com sua filha, protegesse e cuidasse — a deixaram à mercê da inocência para com um relacionamento extremamente abusivo.

Ah... "Mas os homens são assim."

Será?

Uma conversa, um desabafo para uma amiga, abriria seus olhos... ao menos era para ser.

As poucas amizades de escola que manteve após sair das mesmas, Lara destruiu. Contava o que começou a acontecer dentro de casa, o início das agressões, mas... defendia seu namorado, dizendo que o mesmo estava certo, e ela precisava de uma correção.

Ora, ora... Se antes mesmo que suas amigas palpitassem, você já cortava a própria fala e começava a defendê-lo, dizendo que não era tão ruim assim... você tinha certeza mesmo de que o que seu namorado fazia não era tão errado assim?

Suas amigas tentavam ajudá-la.

Falavam para sair de lá, procurar ajuda, ligar para a polícia... Mas Lara se irritava e dizia: "Vocês sentem inveja de mim! Se não conseguem um namorado, a culpa não é minha! Vocês não entendem ele, ele não é uma pessoa ruim, e vocês não vão estragar o meu relacionamento!"

O que aconteceu?

...Ficou sozinha.

Suas amigas tentaram muito, já até mandaram a polícia até lá, mas Lara desmentiu a história, dizendo que não era vítima de agressões, e que era tudo mentira.

O que aconteceu?

Os policiais foram embora, e, de noite, Lara apanhou do namorado, que ficou irritado por ela estar contando as coisas para terceiros.

Esse era o seu exemplo... desde cedo.

O que via como pai agredia sua mãe, e o que via como mãe a agredia sem pena.

A... "agressão".

Um evento presente em toda a sua vida, que acabou se tornando rotineiro e normal. Sempre que apanhava, sentia e pensava se merecia aquilo, se aquilo era certo. Sentia raiva de Felipe, ódio, e até o xingava... Mas... o que sentia era quase uma nostalgia boa, um sentimento de que aquela era a sua natureza.

Um trauma que, quando revivido, mesmo dolorido... era reconfortante.

Uma prisão sem grades.

Uma prisão da qual tinha as chaves, mas não saía.

Por quê...?

...Nem mesmo ela sabia.


Após vê-lo saindo atrás dos ingredientes, Lara seguiu até o caixa, retirando apenas as suas luvas, descartando-as em uma lixeira. Quando chegava na bancada para ver como estavam as coisas no caixa, olhou para a sua direita, no corredor onde ficava o estoque e a porta dos fundos.

No momento em que olhou, a porta se abria, e a menina que foi abusada saía.

Sua bochecha inchada e vermelha. Seu cabelo bagunçado... seu rosto visivelmente abalado.

A moça viu que Lara a olhava, e não conseguiu dizer ou fazer nada além de desviar o rosto, tentando sair de lá rápido, na direção dos fundos.

"Desculpa... eu não queria fazer aquilo. Não me odeie. Não tô tentando tirar seu namorado. Só quero dinheiro pra manter minha família." pensou a menina, se afundando na vergonha, abrindo a porta e saindo sem fazer muito barulho.

Lara notou tudo...

Era nítido o que havia acontecido, mas acreditava que era apenas sexo consentido.

"Ele gosta dessa expressão triste? De choro? É isso que falta eu fazer?!" Enquanto pensava em uma forma de tentar reacender seu relacionamento e voltar a tê-lo só para ela, um homem bonito, bem-vestido mesmo na casualidade, de pele negra impecável, entrou no estabelecimento.

Em sua mão, um celular caro, refletindo a luz em seu rosto.

Movia-se com uma confiança tranquila até o caixa. Era sua primeira vez ali, mas a naturalidade com que chegou até lá parecia que já era um cliente fiel da casa. Ainda distraído com o celular, notou que chegou na bancada, e logo desceu-o para guardá-lo.

Ergueu o rosto, vendo Lara, e se encantou.

Seus olhos se abriram um pouco mais que o comum, sua boca entreaberta, sem conseguir iniciar o diálogo naquele momento. A redinha, a falta de maquiagem, eram coisas fúteis. Mesmo sem nada... o homem a achou muito bela.

— Boa noite! Nunca te vi aqui, quer dar uma olhadinha no cardápio? — disse de forma receptiva, um sorriso gentil atendendo o cliente, pois sabia que uma das coisas que mais importava em um estabelecimento era a forma como tratava seus clientes.

Puxou o cardápio: três grandes folhas plastificadas presas em argolas. Uma para bebidas, uma para pizzas e a outra para hambúrgueres e porções — desde macarrão na chapa até caixas de pizzas repletas de batata frita com cheddar e bacon.

— Sim, haha, claro... — respondeu o homem, com uma risada sincera, ligeiramente nervoso.

Uma risada descontraída deslizou dos lábios dela, uma risada que Felipe ouviu enquanto voltava para a bancada de Lara, para continuar os trabalhos dela. Felipe olhou a cena, e mesmo sendo o "machão" perante mulheres indefesas, se sentiu um garotinho vendo que o cara era muito bonito, um pouco maior que ele, e mesmo que estivesse vestido com uma blusa longa, com mais músculos que ele.

Seu sangue ferveu.

Rangendo os dentes, amassou com força a massa da pizza, deixando marcas de seus dedos... no tempo em que assistia ao atendimento da sua namorada naquela noite fatídica.

O homem pegou o cardápio, levemente nervoso em acabar demorando muito, com o olhar e a atenção dela voltados para si. Mesmo que estivesse olhando fixamente para os nomes e os ingredientes de cada pizza, não via nada. Sua atenção era apenas ver, em seu campo de visão, se a moça o olhava.

— Eeeh... Teria alguma recomendação? — ergueu-se um pouco, olhando-a, vendo-a olhá-lo com o rosto um pouco curvado. — Mas uma boa, hein, haha. Tô com muita fome.

— Já que é assim! Que tal a Especial da Casa? Vem de tudo um pouco, é gigante, e se quiser adicionar bordas recheadas, fica melhor ainda — respondeu ela, sempre com um sorriso no rosto e bem educada.

— "Especial da Casa", é? Se for você quem prepara... deve ser especial mesmo, haha.

Lara deu um sorrisinho, abaixando levemente o rosto com a cantada...


Felipe...

Felipe apertou a massa da pizza, aquilo rastejando para fugir do aperto, segurando a raiva que lhe consumia vendo aquela cena.


— Que besta... — murmurou ela, com a voz carregada de uma timidez verdadeira que o cliente achou encantadora.

— Mas... então? Tô com muita fome, hein? Vai caprichar, né?

— Infelizmente, hoje tô no caixa. Mas posso pedir alguém pra caprichar pra você!


"'Infelizmente'...?" A palavra ecoou como uma punhalada no peito de Felipe.


Hum... que pena. Vi a redinha e achei que era da cozinha. Mas já que a senhorita me indicou essa, pode ser ela mesmo. Tem esse combo aqui... Essa pizza, mais um refri 2L, com direito a uma borda à escolha e muita, muita maionese verde da casa, haha! É muita mesmo?

O olhar dele, divertido mas afiado, examinava Lara, notando que a moça estava gostando da conversa, e então se sentia mais livre para brincar.

— O dono gosta muito de maionese verde, então manda um — a mulher estendeu as mãos, gesticulando um tamanho imaginário no ar, que poderia ser entendido com duplo sentido — sacão de maionese junto dos lanches — respondeu com um tom brincalhão em sua voz.


"'O dono'? Sua cachorra. Me respeite!" Felipe quase mastigava a própria língua. 


Lara, porém, não fazia aquilo por maldade.

Um atendimento de qualidade gerava clientes fixos.

Uma atendente chata, com a cara fechada, sem paciência e, muito menos, com empatia, de que não era apenas a vida dela uma porcaria, gerava boatos, que se espalhavam, e ninguém iria até lá para receber o mesmo tratamento que o amigo, ou o amigo do amigo, disse que era.

O homem soltou uma risada espontânea, ainda apoiado no balcão, fechando o cardápio.

— Pode ser esse mesmo. A borda... Hum... vou querer de catupiry!

— Se me permite lhe dar uma dica... — Lara inclinou levemente a cabeça para o lado, sua voz doce como mel — já vem bastante catupiry na pizza, recomendo uma borda doce. Você gosta?

— Ah... aí depende do doce — disse com um tom de um ataque... disfarçado. Mas seu sorriso enviesado, deixando seus olhos escorregarem para os lábios dela antes de subir novamente para encontrar seus olhos... deixaram bem claro.


Felipe amassava a massa com tanta força que parecia querer espatifá-la contra a bancada de mármore. Seu olhar, frio como o aço inox do ambiente, jamais deixava de espreitar cada movimento, cada sorriso trocado.


— Depende? Huuum... Que tal de brigadeiro? Ou de brigadeiro daquele leite em pó famoso?! Ou de brigadeiro de paçoca?! Haaaammm... Doce de leite?!

Hum-huhum... — o homem deu uma risadinha em murmúrio. — Pode ser esse "brigadeiro daquele leite em pó famoso" — disse de forma descontraída, notando que a moça se defendeu com uma esquiva.

— Uma ótima escolha! — exclamou ela, dando um tapinha no vento, um semblante imerso na brincadeira, enquanto digitava a comanda do pedido.

— Eu sei, eu sei... — respondeu ele, os olhos fechados, um passo para trás com as palmas abertas, empurrando como se pedisse para parar.

— O refrigerante do combo é um 2L de guaraná, pode ser?

— Pode tudo. — Uma resposta direta, assim como seu olhar nos olhos.

Lara soltou uma risadinha sem graça, uma defesa automática, o tipo de coisa que mulheres aprendem desde cedo para evitar escaladas indesejadas. O desconforto era nítido em seu comportamento, mas o homem não entendia, e acreditava estar arrasando em sua investida.

— Tudo deu... 66,50.

— Débito, por favor.

— Claro. — Puxou a maquininha e logo estendeu para o homem. — CPF na nota?

Pii!

— Não... mas se quiser meu número nela... — disse e desviou o olhar.

A mulher deu uma risada e fingiu ser só uma brincadeira:

— Você até que é engraçado... Vai comer aqui ou levar?

— Levar — respondeu rápido.

Huum... Demora cerca de 40–50 minutos. Não quer que um motoboy entregue na sua casa?

— Ahh, já que quer me tirar daqui...

— Ahh — soltou uma leve risada descontraída — eu não disse isso!

— Mas deve ter pensado — brincou ele, crente na sua abordagem impecável. — Como vai demorar, daqui a 40 minutos eu volto, então, para receber a pizza pelas mãos de uma atendente tão charmosa.


Felipe esmagou a massa com tanta força que ela quase se esfarelou sem liga em seus dedos.


— "Charmosa"? Faz tempo que não escuto algo assim. Obrigada.

— Uéé? Não vai me elogiar também? — brincou, em uma atitude carente.

— Ahh, vou pensar no seu caso...

— Rum... Pensa com carinho, tá? — finalizou ele, se afastando com a autoconfiança de quem acreditava ter plantado uma semente.

Lara abaixou a cabeça em um aceno afirmativo, vendo-o se virar e sair andando pela calçada. O homem caminhou confiante, postura ereta, como se nada pudesse abalá-lo. No caminho, indo até seu carro, podia-se ver do outro lado da rua um ônibus parado, com poucas pessoas descendo.

Nem se ligou muito, apenas entrou no seu carro e voltou para sua casa, a duas quadras de lá. Dentro do ônibus... Thaís acordava, mas dentro da pizzaria, outra cena se iniciava.

Felipe, estressado com o que viu, tentou se conter ainda amassando a massa da pizza, quando outro pizzaiolo retirou uma pizza já pronta do forno. O cheiro da massa quentinha, dos temperos e ingredientes disputando com o cheiro do ódio queimando na mente do machão.

O pizzaiolo colocou a perfeição levemente esfumaçada e muito suculenta em uma tábua, junto com o restante do pedido de uma das mesas.

Logo levou à bancada, deixando-a para que a caixa — agora, Lara — entregasse.

— Qual mesa? — perguntou ela, olhando a pizza de calabresa com um cheiro irresistível.

— Cinco.

— Obrigada.

— Nada... — respondeu o colega, desviando o olhar, evitando qualquer contato com Lara, já sabendo do estado temperamental em que Felipe sempre se encontrava.

A mulher segurou a pizza com firmeza e atravessou o salão com um sorriso forçado, servindo a mesa com toda a simpatia que lhe restava... Um sorriso que estressou muito Felipe, que saiu da bancada da namorada, enfurecido, largando a massa como se não fosse nada, e marchou até a menina, que já se virava para voltar ao caixa.

Thunf!

Felipe a agarrou pelo pulso, e saiu puxando para fora do estabelecimento com muita brutalidade... sem se importar com as pessoas olhando o que estava acontecendo. Lara ficou mais preocupada em ser vista daquela forma do que com a dor do aperto no pulso.

— Tem gente aqui, para! — sussurrou baixinho, sem resistir muito ao agarro.

Felipe não parou.

Arrastou-a pela calçada como quem puxa um pedaço de lixo. Cada passo de Lara era um tropeço desesperado para não cair, no tempo em que era levada para a casa ao lado.

— Tá doendo, para! — exclamou ela, tentando se desvencilhar, mas o homem não respondeu e nem se importou com o olhar sem discrição nenhuma de Thaís, do outro lado da rua.

Chegou no portão, Scktszt!, onde o abriu com sua chave, afobadamente, balançando o chaveiro igual a um doente, e entrou. BRANK! bateu-o com raiva... e então, Pá! a primeira agressão da noite se iniciou com um tapa na cara, que devido à sua força, a arremessou no chão.

Um tapa tão violento que arrancou a touca de sua cabeça e desmontou seu coque, espalhando os fios no ar como penas de um pássaro abatido.

Antes que pudesse atingir o chão, Felipe puxou-a pelos cabelos e, semi-erguida, deitada no terreiro, Sccrrrchh... foi arrastada como um saco de batatas até dentro de casa.

— Para! Para! — soluçava ela, segurando o braço dele mais por instinto de tentar amenizar a dor do que por esperança.

Than!

Puxou a maçaneta e usou o corpo para abrir a porta, entrando diretamente na sala.

— Amor, para! — exclamou ela, seu corpo deslizando e juntando um pouco da poeira do chão.

— Acha que sou otário? Sorrindo pra macho? Sua puta de merda.

— Ai! Ai! — gemia de dor, sentindo que seu cabelo seria arrancado à força, rasgando sua pele.

O homem passou por um breve corredor, onde uma porta aberta revelava o banheiro, mas não foi ali que entrou com ela — entrou diretamente no quarto dos dois. Bam! com um último puxão, impulsionando-a à frente, fazendo-a cair, batendo o cotovelo no chão.

— Desculpa! E-eu só tava sendo simpática! — gritou ela, caída no chão, seu braço reprimido pela dor de não conseguir fechá-lo direito.

— O cara dando em cima de você e você dando mole. Queria dar pra ele? Sua puta!

Pah!

Um chute foi disferido na barriga de Lara, que se encolheu em posição fetal, tentando se proteger e amenizar a falta de ar que o golpe gerou. Sua boca se abrindo e fechando, buscando por ar.

— Acha que sou o quê?!

Pah!

— Responde, caralho! Vou ter que te espancar de novo? Vai aprender a ser mulher quando?

Lara não respondia, apenas apanhava com leves grunhidos, segurando a dor para que os vizinhos não escutassem a agressão.

Pah!

— TÁ SURDA, SUA VADIA?!

— Eu... eu só atendi o caixa como me pediu... só queria agradar você... tudo... tudo que eu faço é o que você quer e pede... — Sua voz saiu fraca, ainda mantinha o rosto um pouco escondido, seus olhos fechados... respiração fraca.

Felipe se aproximou, o rosto distorcido pela raiva.

— Mandei atender a porra do caixa, não rir de piada de macho, desgraçada!

— Você... — tentou dizer, mas a voz fraquejou.

— Você o quêê?! Fala logo.

— Você me trai com diversas garotas... Todos os dias... você não se importa se eu vou escutar você no banheiro com alguma menina em ligação... Não se importa de apertar a bunda de funcionárias... transar com elas ainda no trabalho... e-e-e eu apenas respondo a um homem que queria uma pizza e você fica estressado comigo?

Felipe sorriu com desprezo, aquele sorriso frio, desumano, que ela aprendera a temer.

— Elas não me enchem a porra do saco. Não são inúteis. Me obedecem caladas.

Lara começou a chorar com o tom de voz agressivo, ríspido e sem remorso algum... Seu choro foi se transformando em fúria, mesmo de olhos fechados, mesmo com o cabelo tampando seu rosto, um sorriso de frustração, de dor — um sorriso que era o início de um grito da alma — surgiu em seus lábios, com um pouco de sangue do tapa recebido.

— Ahhhr... Vai começar o draminha, é?!

Pah!

Mais um chute foi disferido, o homem olhando-a com repulsa.

— Chora baixo. Se alguém te escutar, eu juro que te mato.

— Mata... é? Hi... Haha... Eu te odeio... — murmurou ela, entre um choro rasgado e uma risada quebrada de puro desespero.

— Fala mais alto, retardada. Nem pra isso tu serve?

— Sai daqui... Eu não quero mais você aqui... Morra... MORRA! SOME DAQUI! EU TE ODEIO! QUERIA QUE VOCÊ MORRESSE! — gritou ela... um grito forte, um reflexo do desespero que parte da sua alma sentia.

O grito ecoou pelas paredes vazias.

A mulher ergueu o corpo, olhando na direção de Felipe... mas Felipe... já não estava mais lá.

Lara congelou.

Olhava na direção...

A porta sempre esteve aberta, mas ninguém conseguiria sair assim, sem nenhum mínimo barulho de passo... O silêncio após o grito era insanamente... gritante.

A mulher olhava para os lados, o desespero que sentia... só aumentava.

Um medo... surgia com violência.

— F-Felipe? C-cadê você?

"Hãm?!" exclamou em pensamento... Nino, do escuro... escutando aquilo com seu semblante apático, agora levemente interessado na reação da "inseto fêmea".

— A-amor?! É-é era brincadeira... Volta, por favor, volta... — a voz de Lara quebrou em soluços. — Desculpa! Desculpa! Eu vou mudar! Eu vou! Eu juro! Por favor... por favor, não me deixe! — exclamava com sua mente a milhão, seu coração disparado.

O arrependimento e o medo visíveis e palpáveis em sua voz trêmula e medrosa.

Em um piscar de olhos entre as lágrimas que transbordavam... Nino surgiu de pé, perante a mulher. Embora a cerca de um metro e meio. O quarto se mantinha escuro desde sempre, com a única luz iluminando o lugar sendo da porta aberta, iluminando a silhueta de Nino... por trás.

Lara só via um ser inteiramente preto, com dois olhos roxos, e uma marca preta, brilhando mais que o escuro.

Nino a encarava curioso.

"Humanos são tão manipuláveis assim?"

Quando Lara o viu... sentiu medo, mas o medo fez seu semblante se enrijecer, seus dentes como presas sendo mostrados, seus olhos em uma fresta — o olhar de um predador indo atrás de sua presa na savana.

— QUEM É VOCÊ?! CADÊ O MEU NAMORADO?! — berrou, cega pela raiva, erguendo-se e correndo na direção do pré-adolescente.

Nino apenas a olhou... com um misto de nojo e tédio.

Lara foi... lançou sua mão em um tapa de mão aberta, mas...

Shk!

Paf...

O braço foi cortado sem a mulher nem ver... Nino não se moveu, e um olho... se abriu em seu pescoço. Rag, olhou diretamente para a mulher, que, em choque, com a dor inexistente do corte perfeito... se encheu de terror.

A dor logo veio.

Não demorou mais que apenas um olhar na direção para notar a falta do cotovelo para baixo.

Burnmn!

Pahf!

— ArragarrRrghg!

Caiu de joelhos... Seu corpo sendo carbonizado por uma explosão rápida de chamas escuras.

Seu braço cortado desapareceu do chão em fumaça, já a carne do seu corpo... Nino aproveitou o momento, deixando-a viva... agonizando enquanto escutava os gemidos de sofrimento, mantendo seu semblante enojado... com uma pitada de deboche em suas sobrancelhas e olhos.

— Me responda antes de deixá-la ir... Como não reage a um inseto lhe espancando, mas avança em um demônio lhe olhando?

— Agrrrgrhht! AHhh!

— Ahhh... Tsi... Esqueci que tá ocupada. Você é interessante. Eu deveria ter ficado quieto. Ter deixado você viver no inferno que vive por vontade própria. Seria mais interessante que morresse pelas mãos do seu deus... igual você foi ameaçada. Uma peninha... Você me viu... Não posso te deixar viva... gracinha.

Crunch!

O corpo da mulher foi dilacerado por milhares de cortes de Rag, e as chamas carbonizaram tudo, não deixando que restasse absolutamente nada além de um cheiro que subiu e foi embora com a fumaça.

Nino ainda olhava na direção da humana... quando...

Tap, tap, tap...

Hum?

Ouviu pequenos passos chegando pela porta, e virou o rosto para trás... vendo um menininho pequeno, Shrk-Schrk! coçando os olhinhos.

— Mamãe...? O papai te bateu de novo...?

Os olhos de Nino se arregalaram... o ódio que sentiu não era nada normal. Nem mesmo em relação ao prazer e desejo de exterminar por completo a raça humana no mundo em que vivia.

Fu!

O movimento foi suave... O menino nem mesmo viu... e... pelo cuidado de Nino... não sentiu.

Ploch!

O Primordial surgiu agachado perante a criança.

Uma lâmina cravada no coração do menino, varando as costas.

Nino o abraçava com um cuidado, quase... humano. Seu rosto travado em ódio, mas suas mãos, seu corpo, era como um caixão suave e confortável, dando ao menino uma rápida morte, indolor e respeitosa.

Burnm!

A criança explodiu em chamas, sendo excluída da existência como sua mãe... e Nino... surgiu diante de Felipe na floresta. O homem não entendia nada, olhava para os lados, procurando um ponto de luz para ajudá-lo a enxergar no ambiente denso... e encontrou...

Dois olhos roxos vindo em sua direção.

BAM!

O corpo do lutador e pizzaiolo dobrou no braço do jovem. Todos os ossos presentes em seu peito sendo dilacerados antes do corpo sair voando com o impulso criado.

PAHH!

Colidiu contra uma árvore.

Não conseguia se mexer, falar e nem ver.

Seu corpo colapsava.

A perda de sangue o mataria... quando...

GurgshT-gUrth!-glu-glu!

Nino forçou a boca do homem e injetou seu sangue... controlando-o por completo e regenerando a ossada. Contudo, a visão opaca e cinza retornou ao normal, vendo o olhar do Primordial encarando-o com o mais puro ódio.

— VorrrcÊêÊ... ÉÉ PÁÁÁÍÍI!!

BAM!

Nino acertou mais um soco no homem, fazendo-o voar longe, após atravessar o tronco da árvore que caiu sem sustento, com outros jogadores escutando o barulho e olhando com medo na direção, enquanto os clones de Nino, responsáveis por cada um, os observavam... sorrindo sadicamente.

Blearghh!

O homem caiu vomitando, mas Nino travou sua garganta, fazendo-o engasgar por não conseguir vomitar seu sangue vermelho, humano, fedorento e sem... graça.

— Que porra de pai você éÉahrr...? — Cada palavra saía arrastada, um rosnado, pelos dentes afiados, sedentos para dilacerar e rasgar a carne daquele humano. — Que exemplo de merda é esse que dava para o seu filho, seu filho da puta?! Bater na mãe dele...

Nino abaixou o rosto, olhando para o chão. Seus braços retos, suas garras ficando cada vez mais afiadas.

— Vocês dois... doentes do caralho... deveriam cuidar dele... estar presentes na vida dele... mas são dois insetos doentes... fazendo ele crescer achando essa porra normal. Você não maltrata quem tá na porra do teu lado. Você protege... cuida.

Felipe ainda não conseguia falar.

Apenas se sentia sem ar, mas não morreria nem mesmo se de fato ficasse completamente sem respirar.

Nino aumentava os batimentos cardíacos.

Seu sangue impedia que os humanos ali conseguissem até mesmo desmaiar. Tinham que se manter de pé e obedecer o jogo que começaria lá.

— Do fundo da minha alma, seu filho da puta. Se você for um dos "inúteis" da rodada. Se você passar da porra da primeira rodada sem fazer nada... vou rasgar cada fibra da sua carne... Vou arrancar lentamente cada costela desse seu corpo, mantendo esse seu coração de merda estralando de tanto bater. Você vai sentir... e vai ver tudo. Com a porra da sua carne, vou fazer o que você gosta... pizzas. E vou enfiar essa porra toda na sua garganta, fazer você sufocar com o próprio fedor de merda. Não adianta se vomitar, não adianta se tentar se matar. Torça pra vencer, ou torça pra morrer pra outro inseto... porque se eu tocar nessa sua carne nojenta...

Rarsgrunch!

RmnrmnmnrnrahtTtm!

Felipe começou a chorar.

Seu corpo se contorcendo no chão, ainda com a forte sensação de estrangulamento. Nino enfiou as garras no ombro direito do homem e puxou para baixo, rasgando e arrancando o braço inteiro.

O sangramento da ferida exposta foi cessado pelo sangue preto... mas a dor... a dor continuava, e mesmo que o cérebro, em uma missão para com a dor, tentasse fazê-lo desmaiar... era impossível.

O sistema nervoso apitava, e a cada uma dessas pulsadas, o homem agonizava no chão, no mesmo tempo em que... Scrrrrechh! o número 3 foi marcado com o sangue rasgando de dentro para fora na testa do machão.

— ...Irei destruir você. Sua falha de homem. Seu verme de merda.

Nino o olhava — o homem no chão, com cara de coitado, com lágrimas nos olhos. O machão, agressor de mulheres, recebendo um tratamento especial, enquanto se encontrava no chão... da mesma forma que deixava suas vítimas. ]

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