Dançando com a Morte Brasileira

Autor(a): Dênis Vasconcelos


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 73: Voluntária

Alissa se ergueu.

Seu rosto bravo ainda fixava Nino... mas logo suavizou, assumindo novamente um semblante sereno, conforme se virou e começou a caminhar de volta para a frente da classe.

Nina a observou, Rnn... mas ao ouvir algo se arrastar, olhou para seu irmão ajeitando a mesa.

A Primordial o encarou com um olhar misto de tédio e raiva, que Nino respondeu com um sorriso alegre, para provocá-la... Conseguiu. Nina revirou os olhos, voltando a atenção para mais à frente, quando Alissa chegou e se virou, com seu sobretudo balançando ao movimento do vento que entrava pelas janelas da lateral esquerda.

— Eeeh... Me desculpem pelo que eu fiz, caso tenha assustado vocês...

Todos se mantinham alertas, encarando-a com exatidão... mas também compartilhavam o mesmo pensamento:

"Essa desculpa assusta mais do que a mesa..."

— Eu não lem...

Alissa interrompeu a fala bruscamente e Nina seguiu a linha do olhar da mais forte.

Quando virou o rosto para a esquerda, viu Nino com um sorriso e os olhos fechados, mantendo uma mão erguida.

— Pode perguntar, Nino — disse Alissa, cerrando os dentes sob o sorriso... enquanto internamente o esfolava vivo.

— Você ia nos ensinar sobre os conceitos da magia, professora!

— Ah, sim. Muito obrigada por lembrar — agradeceu sem desfazer o sorriso, fechando os olhos. Os dois com quase o mesmo rosto. Alissa puta com o menino, e o menino rindo internamente...

"Até onde vai aguentar?" Querendo mais...

Nina se aborreceu, vendo os dois com aquele rosto. Já Nathaly, continuava perdida, embora bem menos que os outros alunos.

— Classe, se tiverem uma dúvida, ou quiserem acrescentar alguma coisa, podem erguer a mão, tá? Estou aqui para ensinar vocês, perguntem quanto quiserem... "Meno..." Alissa abriu os olhos, no mesmo momento que pensava em um complemento proibindo Nino, e o que viu foi o menino erguendo a mão.

Entretanto, Nina esticou o braço esquerdo, segurando o braço dele, impedindo-o.

A Primordial encarou o irmão, que a encarou de volta.

"Para! Pode brincar, mas toda hora?"

Nino via o olhar bravo dela para com ele e então tentou se misturar com ela. Não conseguiu. Mas Nina sentiu que ele tentou, e o pequeno susto que ela levou a fez soltá-lo... Solto, o menino ergueu a mão novamente, sem ser interrompido.

"O que você quer tanto esconder?" pensou ele, olhando-a, no tempo que Nina desviava o rosto, deixando-o encher o saco de Alissa.

— Pode perguntar, Nino — disse a professora, sua voz serena como a ponta de uma munição prestes a sair do fio.

Ao ouvir a voz estranhamente serena da professora, Nino voltou o rosto para ela, e perguntou:

— Magia vem das veias das almas, não é?

Nina arregalou os olhos, mantendo a cabeça levemente baixa para disfarçar o impulso de voar no pescoço do irmão.

"VOCÊ É RETARDADO?! NÃO SOMOS HUMANOS! NÃO SOMOS COMO ELES!" ela gritou, berrou, esperneou em sua mente, querendo quebrá-lo na porrada por ser tão burro. "Merda! Merda! MERDA! Para de falar sem pensar... INFERNO!" Nina quase rugia internamente.

Seu controle imensurável sobre seus sentimentos sendo crucial para não deixar sua marca ser revelada. Um controle que Nino não conseguiria ter em uma situação de tamanha raiva assim.

Nino não se deu conta do que disse, até que Alissa assumisse um semblante perdido em dúvidas. Franziu as sobrancelhas, seus olhos buscando uma resposta, junto com toda a turma que olhou para o menino, sem entender aquilo que o mesmo disse.

— O... quê? Veias... das... almas? — ela disse, com pausas nas falas, movendo o rosto e os lábios em confusão... e Nino entrou em choque.

Olhou para Nina, vendo o olhar escondido irado dela para com ele.

Pressionado a dizer algo... não sabia o que responder.

Começou a suar frio.

Seus olhos roxos tremiam — discretamente — no esforço insano de não deixar transparecer o desespero.

"Merda! Mer..."

Antes que Nino cometesse um erro ainda maior, Nina agiu:

— Nossa avó tinha um livro antigo de uma história que se passa em outro mundo. No livro, que tinha vários monstros, raças e coisas assim, a magia humana vinha das veias das almas... E como meu irmão é muito burro, e não sabe diferenciar a ficção da realidade, acredita até hoje que a magia do nosso mundo funciona assim.

Nina foi cirúrgica.

Embora sua voz e linha de raciocínio se diferenciassem da de uma pré-adolescente de 14 anos.

Não foi nada para fazer Alissa desconfiar de alguma coisa.

Sabendo da força dos dois, e que perderam tudo nessa vida, o que mais esperava era maturidade e cabeça... dos dois. Mesmo que Nino não conseguisse demonstrar isso.

Nino quase colapsou.

Sua mente não conseguia pensar em nada além da merda que fez. Mas Nina o salvou, mesmo que tivesse o ofendido no processo. Aquilo era o mínimo, comparado aos mil socos no rosto que a mesma desejava desferir nele.

"Obrigado... Obrigado... Vou ficar quieto... Foi mal..."

O olhar que ela lançou para ele dizia tudo, e Nino abaixou a cabeça em pura obediência, deixando que Nina assumisse o momento.

A menina viu o gesto, e se voltou para a professora.

— Professora, como a magia funciona de verdade? Posso ir aí e ser sua voluntária?

— O-oi? — Alissa piscou, surpresa. "Quê?"

— Sim! Você explica a aula, e eu digo o que eu entendi! — disse bem animada, tentando ajudar no plano. — Seria legal se os outros também participassem!

Alissa entendeu.

— S-sim! Seria mesmo!

Os "robozinhos" apenas olharam, com os olhos arregalados, como se acabassem de ser convidados para um ritual satânico.

Mas Alissa manteve o sorriso:

— Pode sentar na minha mesa enquanto eu explico. Presta atenção, hein! — brincou, tentando deixar o ambiente mais divertido.

Uhum! — concordou Nina, erguendo-se e indo até a mesa da professora.

Quando chegou lá, enquanto sentava-se, uma caneta flutuou e começou a escrever sozinha em um papel:

"Além de você e o seu irmão, apenas mais três alunos da sala são classe A, todo o restante é classe C. Alunos que nem mesmo tentaram o duelo da classe B... O que significa? Que além de serem fracos, não sabem controlar muito bem seus poderes..."

Nina leu, entendendo o recado.

"Tá... Eu faço uma demonstração, depois que entender o que é pra fazer, e deixo por isso. Não tento chamar ninguém para participar..."

Suas intenções eram as melhores... além do principal, que era o egoísmo que corria na veia dos dois. Precisava salvar Nino, e encontrou a melhor forma, que seria também ajudando Alissa a se enturmar melhor com os alunos. Mostrá-los que ela não era um monstro, o monstro que criaram na cabeça de cada um.

"Katherine... Pegou todos..." Mesmo que sentisse uma raivinha interna pelo fato de sua prima pegar todos os classe A e B, deixando só o que restou ao concluir os 30 da sua sala, foi escolha da própria Alissa não querer perder seu precioso tempo de leitura em seu escritório para selecionar seus alunos.

Não era hora de pensar nisso.

Huhum... Vamos lá! A magia, respondendo ao Nino...

O menino abaixou um pouco a cabeça, envergonhado, perante Nina.

— Não vem das veeeiiiiaas da alma — disse com um tom zombeteiro. — Ela... é como um sexto sentido humano. É algo automático, você apenas... sente.

Andava de um lado para o outro, uma explicação clara, e de uma forma mais imersiva em suas expressões e gesticulações.

— Vamos lá. Quando você vai comer algo, você faz o quê? — Apontou para uma menina na primeira mesa.

— E-eu pego e coloco na boca — respondeu de forma meio acanhada, mas o sorriso de Alissa ao escutar a resposta a fez se acalmar e se sentir acolhida.

— Isso... Mas no processo, mais alguma coisa acontece? Precisa fazer algo além disso?

— Não... Eu apenas pego a comida, e levo até a boca... Ah! E mastigo também! — completou ela, com um sorriso na resposta, acreditando que aquele complemento era o que Alissa queria.

— A magia é exatamente assim... — Alissa saiu de perto da mesa, voltando a caminhar em sua explicação. — Você não precisa pensar e mandar cada parte do seu corpo fazer algo. É automático, você quer, você executa. O desejo lhe move. Não é necessário pensar em cada parte do seu corpo, desde o braço, mão e boca para comer algo. Você vai, segura, coloca na boca e mastiga... Você quer, você faz... Assim é a magia. Se você possui o elemento vento, você apenas precisa querer controlá-lo, para conseguir. Mas... medir a força já depende de pensamento. Depende do controle sobre o quanto consegue, e o quanto precisa para executar o que precisa ser feito.

"É... Dá pra seguir essa linha de querer e fazer, mas a nossa magia é bem diferente da deles... Ou só temos mais controle." Nina pensava. Mesmo que também sentisse nojo daquela raça, vendo Alissa, um ser tão forte, não conseguia acreditar que aquela mulher era uma exceção tão rara. "Talvez só entendeu como usar todo o poder que tem..."

"Não são fortes... A linha é parecida, mas o controle que esses insetos possuem é ridículo..." Nino pensava parecido, vendo seus colegas de classe, mas não via que tinham potencial. Não acreditava em humanos fortes... Alissa para ele não era humana... era, mas era mais reconfortante dizer que não, assim como colocou na sua cabeça que Marta e Nathaly também não eram.

— O seu poder... é literalmente... você... — Apontou para a turma e virou-se para Nina, que a observava de costas, e então a chamou: — Vem cá!

Nina se levantou sem hesitar.

Dirigiu-se até o centro da sala, sua postura confiante, seus passos leves.

— Qual o seu poder?

"Ish..." — Tenho vários... Sei usar fogo, vento, água, pedra, gelo... Acho que só.

— Só? — Alissa ergueu uma sobrancelha. — A maioria dos alunos domina apenas um.

Nina deu um sorrisinho nervoso.

"...Ao menos não achou estranho." pensou, mas quando olhou os alunos... esses acharam estranho. "É... É algo diferente sim..."

Nino ficou preocupado com a reação da turma à resposta, mas vendo que Alissa não ligou... ficou tranquilo. Seu olhar mantendo a normalidade.

"Será que ela vai brigar em casa comigo?" Embora esperasse um sermão bravo.

— Qual você tem mais afinidade?

Nina voltou o olhar e respondeu naturalmente:

— Qualquer um... Ééé... Como você disse... A magia é algo automático... você deseja — Nina ergueu a palma aberta para cima, e cristais de gelo minúsculos foram formando uma esfera perfeita e azulada — e acontece. — Erguendo a mão, FuUu... arremessou-a para cima, deixando-a planar no vento que controlou sob a mesma.

— Seu controle é bom. Além de usar dois elementos ao mesmo tempo. Parabéns. Agora me mostre um exemplo do que eu disse de fato. Você e seu irmão são cotados na escola como possíveis destaques pelo diretor...

Um aluno, da primeira fileira, o mesmo que tinha medo e vergonha de ir conversar com Nathaly, escutou aquilo, e ficou um pouco... sentido.

"Meu tio me considera também?" pensou, mas não conseguiu perguntar para Alissa.

— ...Crie algo que exija um controle de força bem grande, que use mais do que apenas o desejo de criar a magia.

Uhum... Agora mesmo.

Burmnm...

A esfera azulada de cristal de gelo se incendiou em chamas vermelhas, e logo em seguida, a bola de chamas controladas, dando um tom avermelhado ao ambiente, se moldou no formato de um canarinho, com perfeição em seus detalhes flamejantes... assim como viu no ninho, junto de sua avó e Nino.

O passarinho flamejante flutuava sobre a palma da mão de Nina, cada pena parecia real.

Delicado.

Vivo.

O pássaro voou pela sala, passando próximo dos alunos, sem que nem sentissem calor. O controle de Nina era tão refinado que inibia isso, apenas mesclava ar e fogo, formando tamanha beleza e demonstração de controle.

O pássaro encantou a todos, uma beleza hipnótica que soava até como natural.

Voava livremente, fazendo pequenos círculos dourados no ar, até pousar na mão de sua criadora.

Balançou a cabeça de forma viva, suas pernas tremelicando de leve, gracioso, como se de fato estivesse respirando. Nina, com a outra mão, acariciou seu rosto flamejante com a ponta do dedo, e o pássaro reagiu como um animal de verdade — se encolhendo docemente ao toque.

Toda a sala permaneceu em absoluto silêncio, vendo tudo com atenção e admiração. Então, Nina, sorrindo como uma artista de circo ao final de seu número, fez um leve movimento de mão...

Vup!

O passarinho de fogo transformou-se — com fluidez e graça — em uma rosa incandescente, cujas pétalas ondulavam em pequenos sopros dourados.

Com um gesto gentil, estendeu a rosa flamejante para Alissa.

— Pode segurar, professora... Não vai te machucar — disse, a voz tão tranquila quanto o controle que demonstrava.

Alissa recebeu a rosa incandescente — o calor era morno, reconfortante, como o brilho de um pôr do sol — e ergueu a mão para que todos vissem.

— Isto... — disse, com serenidade e um brilho sincero nos olhos — é um exemplo de controle excepcional.

Fez uma pausa.

A turma inteira observava, boquiaberta.

— Obrigada por ser minha voluntária hoje, Nina. Pode voltar ao seu lugar — disse bem admirada, assim como toda a sala, com o controle apresentado. "Um potencial absurdo... Acho que vou poder me 'aposentar'! Haha!" ria internamente, imaginando o dia que seria como Mirlim... Que tinha seus capach... Que tinha Alissa... para mandá-la fazer seus trabalhos de extermínio.

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