Dançando com a Morte Brasileira

Autor(a): Dênis Vasconcelos


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 130: Katherine

Fevereiro de 1996.

Um hospital. Duas mulheres. Dois quartos. Duas macas. Duas crianças. Duas vidas. Dois choros. Dois alívios. No mesmo dia, ao mesmo tempo, Katherine e Alissa nasceram. Olhos azuis, cabelo branco puxando aos pais. Nenhum poder. Eram simples civis.

Humberto Kubitschek, pai de Alissa, era o presidente da república. Milton Kubitschek, seu irmão e vice-presidente, era o pai de Katherine... Nenhum foi ao nascimento de suas filhas, muito menos se importaram com aquilo. Não eram as primeiras, ao menos, eram as primeiras com as duas esposas atuais.

Duas mulheres que não se importavam com isso. Desde o início, era óbvio. Eles possuíam o dobro de suas idades. Realmente era amor? Era interesse por ambos os lados. O lado masculino trazia dinheiro, uma vida luxuosa e segura. O lado feminino trazia beleza, juventude e um corpo bonito para ter relações sexuais.

Mesmo que traições fossem frequentes, estava no contrato: precisavam seguir. Para o público, a primeira-dama precisava mostrar classe, respeito e obediência para com seu marido. Dar o ar conservador, trazer essa segurança para a população, essa farsa que adoravam consumir de quem não se importava com eles.

Humberto tomava mais cuidado que seu irmão. Não arriscava um escândalo que podia acabar com sua carreira política. Mas seu irmão era uma galinha, que vivia nos braços de uma mulher diferente todas as quintas. Isso o irritava, atrapalhava de certo modo as pesquisas que faziam nos laboratórios secretos de Brasília.

A infância de Alissa e Katherine foi solitária. Viviam na mesma casa, na mesma mansão, na realidade. Primas, melhores amigas que dividiam o mesmo quarto, mesmo sofá, mesmos brinquedos, televisões, babás... Suas mães, assim como os pais, não eram muito presentes.

Frequentemente, a mãe de Alissa viajava para a Itália, ou só ficava junto do presidente no Planalto. Já a mãe de Katherine, não havia a necessidade de tamanha responsabilidade. Dava para contar nos dedos os dias que passavam com as filhas em um mês, mas isso não era o que mais agravava na solidão. Suas mães não passavam na televisão, mas os pais, sim.

Eram idênticas, poderiam ser confundidas com gêmeas. Mesmos vestidos leves e claros, mesmo tamanho de cabelo e intensidade de olhos. Mas Alissa via o mundo de forma diferente de Katherine, mesmo em seus cinco anos de idade. Conseguia notar algo errado, conseguia perceber que seus pais não se importavam com elas, assim como suas mães.

Nem as babás. Só estavam lá pelo dinheiro. Alissa sabia, mesmo com uma incógnita enorme, ela sabia. Mas Katherine... não. Não era isso que parecia, não era isso que queria. Sempre que via seu pai, queria poder ir vê-lo, conversar com ele. Eram raras as vezes que ele aparecia lá pessoalmente, mas quando aparecia, sempre a tratava bem. Sempre tinha um sorriso no rosto, uma voz doce, um abraço aconchegante... que logo terminava, o corpo se virava e ele sumia por mais algumas semanas.

Voltava, fingia ser um pai novamente, e sumia... mas, para ela, aquilo se tornava quase um vício. Um desejo de poder ter mais tempo com o pai. Aqueles poucos segundos eram bons. As semanas sem vê-lo eram silenciosas. Não era essa a intenção de Milton, mas foi o que criou.

Magia. Poderes. Heróis. Constantemente, coisas assim passavam na televisão. As duas garotas, que sempre estavam juntas, assistiam vidradas com os olhinhos na TV gigante em comparação a elas, e sempre almejavam, fantasiavam:

— Vamos ser as maiores heroínas do mundo! — exclamou Alissa, erguendo os braços.

Uhum! — ronronou Katherine, afirmando com a cabeça e imitando-a com os braços.

Assistiam todos os dias um desenho que passava de manhãzinha. Não importava se o episódio do dia fosse repetido, assistiam e brincavam como se fosse um novo. Queriam saber magia para salvar as pessoas, assim como os heróis no desenho que viam fazia.

A amizade era incrível. Não se desgrudavam um único minuto... ou quase. Quando Milton ia, às vezes Humberto aparecia com ele por lá, mas Alissa não gostava de chegar perto do pai. O sorriso era falso demais para conseguir forçar um semelhante. Seu pai a achava estranha, não reclamava, era bom. Podia enfim parar de perder tempo indo até lá.

Era sempre igual. Milton virava as costas e saía sem se importar um único segundo com a voz de choro da filha chamando-o. Os braços estendidos pedindo por colo, pedindo por atenção. Alissa sempre a abraçava após, de longe, vê-los irem embora. Mas a menina chorava por bons minutos, e Alissa a abraçava por mais ainda.

Anomalias. Pessoas morrendo. Pessoas que sabiam magia morrendo tentando proteger seus familiares e amigos. Louis surgiu. Entrou na política e mudou o funcionamento do Brasil. Os laboratórios secretos desde sempre estudavam aquelas coisas, mas, quando Louis surgiu, trazendo a proposta de uma organização para combater aquele mal, Humberto conseguiu de fato o que queria.

Louis achou que os pensamentos estavam alinhados para a salvação da nação, de vidas, mas era somente ele, naquela mesa enorme cheia de pessoas importantes, que realmente queria aquilo.

Uma peça bondosa em um jogo de mestres maus.

A Associação de Exterminadores de Anomalias foi criada.

Um respiro de paz surgiu.

O Primeiro Esquadrão Oficial foi criado. Pessoas os veneravam como se fossem anjos, como se Deus tivesse mandado-os para salvar pessoas que precisavam, pessoas que buscavam a luz. Um sucesso... para o governo de Humberto. Reeleição foi unânime, o homem mais "poderoso" do Brasil continuava ocupando o posto mais importante.

As mortes por incidentes de Anomalias diminuíram gradativamente após a criação da ADEDA. Pelo mundo, essa notícia foi espalhada. Pelo mundo, outras organizações foram feitas e, para treino, mandavam pessoas habilidosas com magia para estudar diretamente com Louis e seu esquadrão, na ADEDA paulista.

Mas... junto com a diminuição de mortes, também surgiam cada vez mais anomalias fortes. No início, Louis catalogou apenas Errante e Massacre. Futuramente, subclasses e também as classificações Ruína e Calamidade surgiriam... Estranho. O medo das pessoas diminuía, mas ameaças maiores surgiam e as deixavam com as preocupações de antes novamente.


Janeiro de 2004.

Uma baguncinha acontecia no outro lado do universo. Um ser atravessava centenas de portais, passando por centenas e centenas de mundos após ser exilado de um... Mas onde cairia já estava escrito, já estava na rota, era destinado, e um ser sabia que, se tocasse aquele outro ser... morreria.

BUUMM!!!

No instante em que Blacko chocou contra o chão naquela pequena cidadezinha de Minas Gerais, abrindo um buraco e se enterrando putasso, Alice e Marta correram assustadas na direção do barulho em seu quintal. Mas, em Brasília, enquanto Alissa e Katherine assistiam a mais um episódio do desenho favorito... despertaram o poder de um Semi-Deus.

Não era como Mirlim, que nasceu com o poder de um Semi-Deus Natural. Não foi forjada, apenas nasceu. Katherine e Alissa foram criadas. O ser não podia arriscar tudo tocando ele mesmo em Blacko, mas outro ser... quem poderia saber?

O mundo mudou. Regras foram alteradas. Blacko se tornou um celular. Mais especificamente, uma bateria que não possuía carregador, não havia como recompor a energia gasta. Quanto mais poder, magia, quanto mais se esforçasse... mais fraco ficaria.

E olha só... neste mundo, só existia a raça mais patética que conhecia... Aquilo era uma tortura calculada para o ser que viveu torturando outras raças? Não. Aquilo era o parquinho de diversões que sempre quis. Mas, ao erguer seu rosto irritado, e seus olhos caírem nas íris roxas daquela humana... seu coração parou, quando enxergou outro ser, no semblante sereno e curioso, que contrastava com o da mulher maligna que tentava descobrir o que era amor.

Os olhos de Alissa cintilaram. Um azul forte, poderoso, por parte... assustador. As babás que cuidavam das duas olharam na sala, quando viram os móveis e objetos flutuando ao redor das duas garotas. Katherine olhava para suas mãos, tentando entender o que era aquela sensação correndo por dentro do seu corpo.

Desesperadas, ligaram imediatamente para os pais das crianças, e foi aí... que a amizade pura das duas menininhas começaria a colapsar.

Humberto e Milton chegaram pouco tempo depois, junto de cientistas e seguranças... com um caminhão da Limpeza, que dentro tinha uma anomalia para testar as meninas. Alissa e Katherine foram colocadas na rua, próximo do veículo. A anomalia era uma Ruína 1. O teste era simples: use o que desenvolveram naquilo.

Quando Katherine esticou os braços... nada aconteceu. Por parte, houve uma decepção visível no rosto de seu pai, e a menina ficou com medo, pois, pela primeira vez, ele passou mais que os minutinhos de sempre próxima dela. Forçou mais as mãos. O rostinho forçado, dentes quase rangendo. Não sabia o que fazia. Era tudo novo... mas o que fazia não podia ser visto, era sentido.

Seu pai tocou sua mão, abaixando-a e olhando-a com aquele rosto de decepção. Os olhos dela molharam, sentia vontade de chorar, mas foi quando escutou um grito de um dos cientistas. A anomalia estava com alguns chips e tecnologias para ser estudada, quando Katherine esticou os braços, uma fraqueza fora do normal foi apresentada em todos os aspectos daquele ser.

Não eram encontrados resquícios de magia. A couraça ficou menos resistente. O sangue fluía com lentidão. Um cansaço era aplicado naquele ser. O cientista conseguiu os dados: aquela menina era capaz de anular magia de anomalias.

O pai olhou-a... diferente.

A menina ficou feliz. Ele sentia orgulho dela?

Vez de Alissa.

CRAAASSH!!

O caminhão colapsou. A anomalia virou um papel em meio aos eletrônicos e metais. Todos se assustaram. A criança só havia fechado a mão. Alissa não mostrava uma reação assustada, curiosa ou... ou... nada. Era como se soubesse tudo que podia fazer, e sabia.

A inteligência de como aquilo funcionava, cada poder que possuía, cada forma de usar aquilo. Sabia o que Katherine conseguia fazer, já havia adentrado a mente da garota e explorado por tudo que aquele poder era capaz. Sabia. Sabia que podia controlar pessoas. Sabia. As babás estavam paralisadas lá dentro. Medo? Não. Teste. Alissa testava o que era possível. Apagou das memórias dela sua existência. Depois voltou. Colocou que ela já era adulta. Depois alterou. Não conseguia ler ou ver memórias, mas conseguia forçar coisas referentes a ela de surgirem ou sumirem.

Apagou-se da memória de um dos cientistas assustados. O pavor dele sumiu, sua expressão corporal ficou neutra. A menina não existia na sua visão. Ela era invisível. Trouxe-se de volta na mente dele. O pavor voltou, o suor frio, o silêncio torturante de todos que não sabiam como reagir àquela menina.

— P-p-precisamos fazer testes! — exclamou Humberto.

— Não — respondeu Alissa, em um tom quase adulto.

O silêncio retornou, todos olhando-a parada, encarando o papel metálico sujo de sangue com um olhar de cima, quase sombrio. Aquela palavra "testes", vinda da boca de seu pai, era óbvio para ela que não era algo bom. Mas então, ouviu:

— "Testes"? O que é isso? — Katherine perguntou, cheia de dúvidas, olhando para o pai, em pé ao seu lado.

Milton se agachou para responder... foi a primeira vez que fez aquilo, a primeira vez que se aproximou tanto da filha.

— É algo pra saber como funcionam os seus poderes, minha menininha — respondeu tranquilo, embora ainda assustado.

— Vo-você vai estar lá comigo? — perguntou, com a voz quase manhosa.

Uhum. Do seu lado — respondeu com um sorriso, passando os dedos pelo cabelo longo dela.

Os olhos da menina brilharam, Alissa olhou de canto.

— Não vamos ir — resmungou.

Katherine olhou-a.

— Por quê?! — exclamou, um tanto incomodada.

— Não sei. Mas não quero ir.

— Mas eu quero!

Alissa caminhou até ela e segurou as mãos da prima, puxando-a na direção da mansão.

— Vamo ir assistir desenho — ordenou.

— Não! — Katherine se soltou, meio brava. — Eu quero ir! — Foi na direção do pai.

Alissa não sabia o que fazer. Nem sabia o que queria de fato. A dúvida do que aquilo significava. Sabia que não era algo bom, mas não sabia o que era esse "não era algo bom". Ficou olhando sua melhor amiga, olhando-a brava... sem palavras.

— Filha, você vem? — chamou Humberto. Era a primeira vez que se referia a Alissa como "filha".

Alissa olhou no rosto dele e virou-se de costas, saindo de lá. Foram sete anos juntas. Inseparáveis... bem, nem tanto. Katherine foi com o pai. Pôde ir em seu colo no trajeto. Estava feliz, finalmente seu pai a olhava, passava mais tempo com ela... Tempo?

Aiiiirgh!

Os dias iam passando.

Os testes conseguiam coletar material genético, mas nada além disso. A menina sentia dor, muita dor. O que recebia? Promessas vazias: "Filha, traz a Alissa amanhã que o papai promete que vai morar com você lá...", "Minha menininha, você é forte. Aguenta mais um pouquinho e eu te dou colo depois, tá?", "Só mais um pouco, não precisa chorar... eu prometo." "Prometo. Prometo. Prometo..."

Passava mais tempo com o pai. Ele do outro lado da maca, enjaulada por vidros blindados, vendo-a lá dentro sofrendo por longos minutos, enquanto a alimentava com promessas de que iria ser um pai presente, um pai de verdade.

Alissa. Alissa. Alissa. Traz a Alissa. Alissa. Sua cabeça começou a funcionar de maneira diferente da de uma criança normal. Ele era o seu pai. O SEU... SEU PAI. Por que, então, o nome que mais saía da boca dele era "Alissa"? Por que ele pedia tanto que ela levasse Alissa, se Alissa nem por perto dele ficava?

Ciúmes.

Uma raiva foi sendo instalada. A dor mudava o funcionamento de sua mente. Testes e mais testes assim — era apenas uma criança de sete anos. Era a sua filha. Por que machucá-la assim? Sabia o que fazia, havia notado a falta que ela fazia, o desejo de ter um pai como via no desenho, o pai da heroína sempre ao lado dela, mesmo que não tivesse poder como ela.

A reação era sempre mais dolorosa. Todos os dias, Katherine não conseguia levar Alissa. O que fazia seu pai olhá-la com um rosto meio aborrecido. O que o fazia tratá-la de forma mais seca que no dia anterior, cada dia se afastando um pouquinho mais, e a cada dia fazendo com que ela quisesse se entregar mais para não perdê-lo, como a mãe que nem em casa vivia mais.

O que a fazia se machucar mais em testes que não traziam resultado algum, para tentar agradá-lo. Mas seu pai não se contentava, e o nome de Alissa era jogado novamente, com mais promessas. Katherine continuou nutrindo raiva, nutrindo ódio por Alissa, como se a culpa de sua dor, como se a culpa do pai não estar tão próximo, fosse da prima que só não queria ir fazer os testes.

Ainda assistia aos desenhos com Alissa. Mas os testes começavam no mesmo horário. Alissa sempre a via sair, sempre dava tchau, estando nem na metade do episódio do dia. Sempre escutava o chamado com um sorriso, e via o rosto bravo quando recusava.

Não era Katherine mais. Não era sua prima. Sua melhor amiga. Uma parte dela sabia disso. Mas nunca quis acreditar nessa parte "mentirosa".

Para conseguirem, de fato, excelência nos testes, iriam ter que matá-la e estudá-la com o corpo morto. Os testes nela ainda viva só eram capazes de mostrar do que o poder era capaz — na absoluta teoria científica. Logo, queriam saber mais sobre Alissa, o que era aquilo, como ela fez aquilo... mas tinham medo de tentar levá-la à força, e a menina acabar matando alguém em um descontrole ou por querer mesmo.

A forma como olhavam para elas, aquele olhar parecia ter tendências assassinas.

Foi então que, no final de 2004, decidiram encerrar os testes com Katherine, para não prejudicarem mais a cabeça da criança. Ha... que piada. E decidiram mandá-las para a ADEDA, para se tornarem exterminadoras.

Tinham oito anos. Katherine conversou com Alissa. Parecia seu pai. Promessas vazias de que as duas realizariam o sonho de serem as maiores heroínas do mundo. Alissa acreditou. Calava a boca da parte do seu ser que dizia coisas lógicas da menina na sua frente. Queria acreditar que ainda era a prima que conhecia.

O abandono veio. Milton não mandou uma carta. Uma mensagem. Mandou alguém dizer algo. Nada. Era como se ela não existisse mais, depois que foi deixado claro que falhou em todos os testes naquele laboratório, onde só sentia dor e solidão, mesmo com tantos homens adultos de jaleco, fingindo se importar com tudo que sofria lá dentro.

Foram enviadas para São Paulo.

Morariam juntas, mesmo apartamento... bom, durou uma semana... Pelo menos uma.

Chegaram na escola pela primeira vez. Louis já havia sido avisado do poder de Katherine, achou muito bom, importante. Queria ter aquilo no seu esquadrão. Na teoria, aumentariam incrivelmente a taxa de sucesso em missões, garantindo que nenhum dos exterminadores sofresse ou se machucasse... de fato era verdade.

Escutou também o relato visto pelo poder de Alissa. Achou exagerado, mas decidiu acreditar. A primeira aula do dia chegou. Sentadas na classe, tendo mais de 70% de pessoas acima de 18 anos, Louis entrou, e foi a primeira vez que Katherine o viu.

Se vestia como seu pai. Caminhava como seu pai. Olhava como seu pai. Falava como seu pai. Era educado... como o seu pai, mas era um tanto mais jovem. Se encantou. Louis deu sua aula inicial, explicando como as coisas funcionavam para que as duas pudessem entender de boa... o que só piorou a situação.

Sua atenção ia exclusivamente para as duas. Sua voz doce entrava nos ouvidos da menina, que recebia seus olhos atenciosos para qualquer dúvida que pudessem ter, e fazia-a olhá-lo como se fosse o seu pai. Mas era mais que isso, um desejo de ficar mais perto dele. Era como o seu pai, mas se mostrava muito mais próximo que seu pai.

Os testes classificatórios aconteceram. Katherine era incapaz de vencer qualquer classificação. Louis notou que ela poderia ser usada apenas como uma ferramenta. Não havia condições de deixá-la lutar, principalmente sozinha.

Já Alissa recusou-se a participar daquilo, mas, quando Louis pediu no meio do campo... PAAH! Todas as pessoas presentes naquela arquibancada, todas as pessoas que estavam naquele lugar, e não só lá, como também quem assistia pela televisão, curiosas para ver a filha do presidente, caíram ajoelhadas, machucando os joelhos a ponto de ficarem roxos por dias.

Alissa não disse mais nada, somente continuou ao lado de Katherine, que, além dela, foi a única que não caiu ajoelhada. Não porque anulou o poder, mas porque Alissa não quis machucá-la como fez com os outros.

Não era necessário mais nada para saber que aquela garota era muito forte. Aquilo atiçou a curiosidade de Louis, o que destruiu ainda mais a mente de Katherine, ao ver que Louis agora também, assim como o seu pai, não tirava o nome da menina da boca.

Começou a ir para a escola sem Alissa, sempre tentando ficar próxima de Louis, sempre mais e mais próxima, oferecendo ajuda para segurar coisas, buscar coisas, só queria se mostrar prestativa para com ele, assim como sempre fazia no laboratório com o seu pai. Queria ao máximo receber atenção, querendo ao máximo fazê-lo se orgulhar e olhar para ela.

Alissa chegou ao escritório de Louis. Katherine olhou para ela, sem entender. Louis se levantou de frente para o computador e foi até ela, passando e, meio que, ignorando Katherine.

— Aliss...

— NÃO!

Katherine se colocou na frente dele, empurrando-o para trás, tentando ao máximo não deixá-lo se aproximar da prima.

— Quê? — balbuciou ele, confuso.

— SAI DAQUI! SAI DAQUI! — gritou ela, ainda o empurrando, mas agora olhava para trás, nos olhos de Alissa, que não conseguia entender. — SAI DE PERTO DELE!

Alissa não falava nada, só olhava.

— Katherine, você tá bem? — perguntou Louis. — É a sua prima. Ela também vai entrar no esquadrão.

— EU NÃO QUERO ELA! EU ODEIO ELA! ODEIO!

Gritava a ponto de chorar. Alissa continuava travada, sem conseguir engolir aquilo. Louis olhou a menina, meio paralisada, e olhou novamente para Katherine. Não sabia o que fazer, e só escutou alguns passos baixos sumindo. Alissa não estava mais lá.

Louis se agachou na frente da menina, não conseguia entender aquela reação. Thumf ela o abraçou. Louis a abraçou com o semblante perdido no meio do mar, sem mapa ou vento nas velas.

"O que foi isso?" pensou ele.

Missões de extermínio foram realizadas com o auxílio do poder de Katherine. Percebeu que, de fato, não poderia deixá-la de fora, mas outra coisa acontecia ao mesmo tempo. Alissa não frequentava tanto as aulas, e começaram a surgir muitos vídeos dela brincando e exterminando anomalias sozinha, sem nem se mexer, somente olhando na direção, brincando com aqueles corpos, quase rindo de diversão, fazendo anomalias se suicidarem com os próprios poderes.

Sem a autorização de Louis, criou o Segundo Esquadrão Oficial, onde atuava sozinha. Louis não interveio. Queria ela no esquadrão dele, mas só de tocar no nome dela, Katherine surtava, e aquilo era muito chato. Criou o sobretudo prateado de Alissa e ficou por isso... até que começou a receber muitos relatórios da Limpeza dizendo que muitas das anomalias que Alissa estava matando eram Calamidades.

Uma nova classificação teve que surgir. Era desrespeitoso Alissa ser chamada de classe A, sendo que ninguém no mundo conseguia nem pensar em derrotá-la. Menos Mirlim, com preparo, mas essa aí só dormia; Alissa nem sabia que essa garota existia ainda. Não saía da sala dos professores, hibernava 27 dias por mês, garota bizarra.

O corte de cabelo curto veio junto com a criação do segundo esquadrão, além da mudança de apartamento, ficando sozinha, longe de Katherine. Usou uma faca. Seu estado de espírito estava destruído, chorava quando voltou para casa, notando como sua "melhor amiga" a olhava. Rasgou o cabelo na altura do ombro; depois disso, nunca mais deixou crescer mais do que esse ponto.

Mas, por parte, tudo parecia flores.

Alissa, sozinha, fazia mais que todos os integrantes do esquadrão, se se dividissem por aí. Além disso, as missões com Katherine eram quase instantâneas. Lâminas, mesmo sem magia, conseguiam cortar carcaça de Ruínas quando a garota usava o poder. Era absurdo. Mas o medo de ser trocada e abandonada sempre aumentava, quando Alissa passava na televisão, sendo assediada por paparazzis e repórteres de longe, filmando e, às vezes, de perto, com ela visivelmente irritada com aquilo.

Katherine não via isso. Só via que os holofotes eram dela. Ela era a mais forte. Louis iria trocá-la por Alissa. Louis preferia Alissa. Alissa. Alissa... Louis a permitia ficar por perto; era melhor do que vê-la chorando e ele precisando cuidar de uma criança. Estava lá para proteger pessoas, não ser uma babá. Mas isso foi sua ruína.

Ela o abraçou enquanto Louis lia alguns papéis em pé. Ele se moveu, tentando se desvencilhar de forma não agressiva. Estava ocupado, deixe-o trabalhar. Mas então... ela encheu os olhos de lágrimas e ia começar a chorar... quando Louis se agachou e a abraçou, tentando conter aquele drama... péssimo erro.

Conseguiu impedir o choro, de fato. Mas criou um gatilho. Quando queria atenção, ameaçava gritar... chorar. Cada vez isso foi ficando pior e pior. Pedia colo, abraço... se negasse? Buuuá-Buuuá! O problema? A obsessão não parava de crescer.

Quando ia ao banheiro, era comum escutar conversas de mulheres. Nessa época, crianças eram a minoria na escola. Era repleta de adultos e adolescentes treinando e aprendendo para disputarem nos eventos prometidos por Louis, onde os esquadrões escolhidos pelos professores se enfrentariam em uma competição para descobrirem quem faria parte dos próximos esquadrões oficiais.

E lá, costumava escutar garotas falando dos namorados, dos caras que gostavam, e até um pouco de sexo. Não entendia, e também não chegou a pesquisar na época, mas, pelo que escutava, despertava uma curiosidade para fazer isso com Louis. As meninas diziam que era bom, riam. O que era isso? Era bom mesmo?

Cada vez que Alissa era prestigiada, cada vez que Alissa era a dita "Pilar da Humanidade", Katherine agia de forma mais agressiva, tentando chamar a atenção de Louis para que o homem não tivesse possibilidades de pensar em Alissa. Sua cabeça doente, sua cabeça moldada em traumas e dor.

Cada vez mais, uma dependência suicida foi aumentada. Ameaças. Formas de obter o que queria. Formas de... receber o olhar do "pai". Seu pai era o vice-presidente do Brasil. Mesmo sem magia, era um dos superiores de Louis. Uma ordem de prisão e Louis teria que acatar ou virar um criminoso internacional, banhando tudo que construiu em merda, vergonha e desgraça.

Esse receio foi usado pela menina, principalmente depois que tentou se suicidar, e os médicos e enfermeiras perguntaram o que havia acontecido. Perguntaram se o homem havia tocado nela... se tinha a obrigado a fazer algo.

Não tinha feito nada. Sempre negava os desejos dela e tentava contornar essa situação.

Louis não sabia o que aconteceu no passado dela. Mas sabia que, se não entregasse o que ela pedia, o pai da garota não acreditaria nele quando dissesse que não fez o que ela alegou que ele fez.

Um refém que entregava as munições para o sequestrador.

Ameaçava contar ao pai que foi agredida e abusada sexualmente, e para não contar...? Pedia sexo. Ao se ver obrigado, entregou a arma junto da munição. Agora, de fato, se ela quisesse mentir e destruir a vida dele, conseguiria. Foi preso em uma jaula por medo da garota se matar de verdade na próxima vez.

Com medo... de que, na próxima tentativa, ela realmente conseguisse morrer.


23:06.

— Papai...

Louis estava deitado de lado. Roupas leves. Abraçava Katherine na cama, também com roupas leves, mas com as costas apoiadas no peito dele. As coxas da mulher estavam grudentas de esperma.

O olhar dele era vazio. Não conseguia dormir. Mais uma insônia. Um desejo excessivo de encher a cara de cerveja e desmaiar em algum lugar para enfim conseguir descansar um pouco.

Katherine dava pequenos tremeliques pelo corpo. Os olhos fechados, se movendo por baixo das pálpebras. Louis achou que ela ainda estava acordada e ergueu a mão que a abraçava para cariciar o rosto. Achou que aquele chamado sussurrado era para ele, mas antes de tocar a pele, percebeu que ela estava dormindo.

Abaixou a mão e seu olhar e semblante continuaram direcionados — sobre a cabeça dela — para o nada adiante. Estava cansado. Cansado de tudo aquilo. Desesperado. Não sabia mais se aquelas vozes e pensamentos eram realmente dele, se aqueles desejos eram dele. O desejo de: 

"Vou colocar alguém no meu lugar e enfiar uma bala na minha cabeça..."

Apoie a Novel Mania

Chega de anúncios irritantes, agora a Novel Mania será mantida exclusivamente pelos leitores, ou seja, sem anúncios ou assinaturas pagas. Para continuarmos online e sem interrupções, precisamos do seu apoio! Sua contribuição nos ajuda a manter a qualidade e incentivar a equipe a continuar trazendos mais conteúdos.

Novas traduções

Novels originais

Experiência sem anúncios

Doar agora