Dançando com a Morte Brasileira

Autor(a): Dênis Vasconcelos


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 127: Bebê

Thales não conseguiu dormir.

Limpou a cama, colocou todos os lençóis e colchas para lavar e se deitou em novos, após um banho para tirar todo o suor do corpo. O cansaço era prazeroso. Fazia tempo que não sentia, mas a sensação do que viveu voltava na mente como se tivesse memória fotográfica. Como se estivesse em um simulador de lembranças.

Costas na cama, rosto ao teto. Olhos vidrados por toda a madrugada fresquinha. Não reparou quando a luz do sol começou a iluminar o quarto. Foram alguns minutos até reparar que o sol havia chegado.

Sem muito o que fazer ali parado, ergueu-se e foi para a escola mais cedo.

Chegou.

Passou pelo portão. Não havia muitos alunos chegando; as aulas começavam mais tarde, normalmente às 08:00 em ponto, dependendo do professor. Mas eram 06:52; os que iam nesse horário iam para aproveitar o campo ou os melhores livros com ensinamentos mágicos da biblioteca.

Nos corredores, poucos transitavam, e foi aí... que viu Nino desesperado. Thumf! Nino colidiu com o amigo, segurando os ombros dele com afobação. Quase chorava de medo. Vestia a fantasia de empregadinha. Thales, vendo seu amigo de meia-calça, achou engraçado, mas a feição dele mostrava terror. Nino murmurou... para que Alissa não escutasse:

— Eu te vi chegando e tive que fugir pra te avisar. Eu tô preso nesse lugar. Eu virei um escravo, Thales! Um escravo! Eu vou tentar fugir todos os dias, mas se eu não aparecer nenhum dia na sua casa, saiba que foi pego... Avisa a Nina. Avis-AAAAHHH!

Nino foi puxado pela gravidade. Rrrrrshh... dedos cravados no chão enquanto a força o arrastava de volta ao escritório da mulher.

— AVISA ELAAAAA! AVISAAAAAA! AAAAAAH! — berrou de medo e sumiu na dobra do corredor.

Thales ficou em choque, travado, com os olhos bem abertos por um momento.

"Escravo...? Ah, Alissa deve tá fazendo igual à Srta. Mirlim." pensou... mas não se deu por vencido. Foi até o escritório da mulher.

Toc, toc...

Bateu duas vezes, e Alissa abriu a porta. Thales ficou com medo, mesmo que a exterminadora não estivesse irritada ou ameaçadora. Atrás dela, conseguia ver Nino em um cantinho, pernas juntas ao peito, balançando como uma criança traumatizada... Thales manteve os olhos bem abertos.

— Tá fazendo o que aqui? As aulas de vocês só vão voltar segunda que vem. Avisei no grupo da sala, depois que removi todos os alunos rejeitados — comentou, olhando com dúvida para Thales.

— Quê?

Hãm? Não viu o grupo?

— Vi não...

— É pra focarem nos treinos individuais. Pode ir embora, ou treinar lá no campo, se preferir.

— Tá... Éé... O Nino pode vir...? — pediu, mas olhando para trás da mulher, Nino balançava a cabeça negando, desesperado. Thales olhou para Alissa; a mulher sorria em silêncio, olhos fechados... era a resposta.

Deu passos para trás, lentos, cautelosos... até que saiu de frente para a porta e correu por sua vida. A porta fechou. Alissa caminhou até sua poltrona, Nino quietinho para não levar mias nenhum cocão violento na mente. Tlec! escutou a ordem e prontamente foi buscar o café da mulher.


09:27.

Samanta viu a mensagem de Alissa na noite anterior e decidiu dormir mais um pouco. Demorou para pegar no sono; o rosto queimava de vergonha cada vez que lembrava do que fez horas atrás, além das conversas que teve e começou a ter com Nathaly pelo celular.

Mas, naquela manhã, finalmente sentiu vontade de fazer xixi. Entrou no banheiro e começou a ler na embalagem como fazia o teste de gravidez.

Hammm... Tá, entendi. Fazer xixi em um recipiente limpo e seco, mergulhar a ponta do absorvente do teste na urina por cinco segundos e aguardar alguns minutinhos, deixando o teste em um lugar seco e limpo...

Foi o que fez.


09:50.

Entrou no apartamento de Thales. O namorado estava sentado no sofá, jogando videogame, quando olhou para trás e viu Samanta. Pausou o jogo, ergueu-se com um sorrisão, muito feliz, e foi na direção dela, puxando o celular do bolso para mostrá-la uma coisa.

— Peta, olha! — mostrou. Era uma imagem do navegador, um bebezinho com fantasia de dinossauro verde. — Posso comprar pro nosso filho?! — A animação era contagiante. O sorriso, o olhar brilhando.

Samanta olhou, piscando duas vezes para a imagem.

— Fofo...

— Já pensei nos nomes!

— "Nomes"?

— Sim, se for dois ou três, já tenho os nomes! Quero ter 11 filhos! Um time de futebol!

— ONZE?! — arregalou os olhos, exclamando surpresa.

— É! — respondeu animado. — Tomara que venha três!

— Peto... Não sou de Taubaté.

— Que isso?!

Samanta não entendeu como ele não sabia o que era isso, mas ficou em silêncio.

— Podemos ter 11...?! Por favor... Por favorrrr... — implorava, segurando as mãos da menina, mas então sentiu algo que ela segurava.

Era o teste.

— Thales... eu não estou grávida. — Ergueu o teste. — Deu negativo.

O rosto do jovem ficou petrificado.

— Quê?

— Uma linha só significa que não estou grávida... Não sabia que queria tanto. Mas ter 11...? Cê tá maluco?

Thales viu o mundo desabar em sua frente. Já tinha todos os nomes do seu time de futebol, todos iniciando com a letra G: Gabriel, Gustavo, Guilherme, Gael, Giovanni, George, Gregório, Gaspar, Guto, Geraldo e Gilberto. Só esqueceu que poderiam nascer meninas também.

Todas as brincadeiras que idealizou. Todas as possibilidades. Como criaria. A primeira palavra dita pelas crianças sendo "papai" e ele zoando Samanta por isso. As fantasias de dinossaurinhos que usariam em casa. Os jogos que zerariam juntos... Tudo caiu. Tudo desabou em sua frente.

Horas de pesquisa. Horas colocando produtos de bebê e fantasias em carrinhos das lojas online para comprar... em vão. Pah... caiu de joelhos, sem forças, sem esperanças. Samanta viu e franziu o cenho, vendo tamanho drama.

— Vamos deixar isso pro futuro. Depois conversamos sobre filhos. Tenho vontade de ter, mas... ONNze? Um pouco de exagero, acha não?

Thales ergueu o rosto, bolsas de lágrimas formadas em seus olhos.

— Tenho que ir treinar. Recuperar o tempo que não treinei ontem. Mas você tá de castigo, ouviu? — disse com um tom mais forte.

Thales parou de chorar e escutou com mais seriedade.

— Tá de castigo. Não vamos fazer sexo por pelo menos uma semana. E quando formos fazer de novo, sempre será com preservativo. Ouviu, apressadinho? — brincou, um sorrisinho de canto traindo sua seriedade.

Thales aborreceu o olhar, olhando-a com preguiça.

— Ouviu?!

— Ouvi. Desculpa.

— Isso mesmo... Agora me dá um beijo.

Thales se levantou.

Mwah...

Um beijo lento, mas sem a intensidade ou o calor dos que fizeram na noite passada.

— Tchau. Depois nos falamos — disse ela, olhando-o com carinho.

— Tá bom. Bom treino.

— Obrigada.

Samanta saiu. Tlc... fechou a porta, e uma voz ecoou no ouvido de Thales:

— Sr. Thales, caso ela de fato tenha tomado a pílula ainda ontem, a probabilidade de estar grávida é menor que 5%. Porém, sua namorada fez o teste de gravidez hoje, o que não adianta de maneira nenhuma. Um dia após o sexo, o corpo ainda não produziu o hormônio hCG em quantidade detectável. Esse hormônio só começa a subir depois que o embrião se fixa no útero, o que leva uns 6 a 12 dias. Por isso, o teste no dia seguinte vai dar negativo mesmo que tenha ocorrido fecundação.

— Ela pode estar grávida, então? — Os olhos brilharam com a pergunta.

— Sim, Sr. Thales. Mas pense nela também. São jovens. Foque em suas carreiras; é o que ela quer no momento. Não obrigue ou tente forçá-la a querer ter uma responsabilidade tão grande agora. Ter um filho não é só amor e alegria. Ou as coisas que me perguntou e foi deduzindo sozinho nas pesquisas. Não é fácil, e atrapalharia suas vidas atuais.

Thales murchou... mas compreendeu.

— Você tá certo.

Voltou cabisbaixo até o sofá. Pegou o controle e retomou o jogo.


Samanta havia chamado o elevador. Demorou um pouco para chegar, mas chegou. Entrou, e quando a porta fechou, a porta do outro elevador se abriu... Nino saiu, cabisbaixo, braços soltos e moles ao vento. Viveu coisas horríveis lá dentro daquela sala.

Colocou a senha numérica e entrou no apartamento do amigo.

— Esq...

Thales olhou; não era Samanta.

— Fugiu?

— Consegui... — murmurou, quase incrédulo. Foi até a geladeira antes de seguir até o sofá. Pegou uma latinha de refrigerante de limão. Pla... fechou a porta, Tscqui! abriu a latinha. — Glub... — e deu um gole generoso.

— Qual é a da fantasia?

Paf...

Nino deixou-se cair sentado no sofá, colocando a latinha na mesa e pegando o segundo controle que estava do lado.

— Uma forma de tortura psicológica — murmurou e fechou os olhos, o rosto tremendo. — Bora jogar. Coloca o jogo lá.

— Beleza — respondeu e foi trocar de jogo.

Trocou, iniciou, e os dois foram jogando tranquilos... em silêncio. Mas Thales sentiu-se na obrigação de revelar e revelou para o melhor amigo:

— Mano... eu e a Samanta estamos namorando — disse meio tímido; esperava que Nino iria zoar como sempre zoava tudo... mas o menino nem respondeu. Nem mesmo olhou para Thales, que sentiu-se meio incomodado e pausou o jogo, olhando o amigo.

Hãm? Pausou por quê? — olhou para Thales.

— Nem um parabéns?

— Ué? Como assim?

Thales balançou a cabeça, incrédulo com a atitude do amigo... mas Nino então disse:

— Cara... acho que só você e ela não sabiam que namoravam... Tipo, toda a sala... Não tô falando só do nosso esquadrão, tô falando da sala inteira. Todos sabiam que vocês namoravam. Pelo visto, só você e ela que não. Sério, os olhares de vocês no meio da sala eram tipo... Você: "quero comer você agora..." E ela: "agora? Aihmn...". Você: "isso, tira a roupa agora..." Ela: "tem muita gente aqui...". Você: "não ligo, obedeça." Ela...

Enquanto Nino o zoava, Thales ficou absurdamente vermelho.

— Ué...? Cê não era preto?

Riram juntos com a pergunta zombeteira.

— Tô falando sério mesmo. Fico feliz que esteja feliz, mas é que eu imaginava que estavam juntos há mais de dois anos e que apenas não haviam dito o óbvio — revelou, olhando o amigo ainda dando risadinhas da pergunta passada.

— Não... pedi ela em namoro ontem, e ela aceitou.

Aaah. Muito foda — Nino sorriu com sinceridade, vendo o olhar alegre do amigo.

— Mas e você?

Hãm?

— Você fala de mim, mas os olhares que Nathaly manda pra você são bem intensos também. Estão juntos? — perguntou com ânimo.

— Não.

— Nada...? Nem ficando?

— Não.

— Ela é bonita, pô, por que não tenta um namoro?

Nino abaixou o olhar.

— Olho pra ela igual olho pra você...

— Oooxii! Lá ele! Sô espada, pô! — Thales afastou o corpo um pouco para o lado oposto.

Nino assumiu um semblante entediado, virando o rosto para ele bem lentamente.

— Que isso, branquelo, querendo traçar o cu do negão? — brincou, segurando o riso.

— Deixa de ser um animal! Digo no sentido de a ver como minha irmã. Olho para ela assim, não a vejo como minha namorada, sei lá. A vejo da forma que olho para você, ou como olho para Nina, apenas como uma irmã, nada mais que isso.

Nino esticou a mão, buscando a latinha para dar mais um gole.

— Entendi — respondeu o amigo.

Parou com a latinha nos lábios, olhou de canto para Thales e perguntou, antes de beber um pouco:

— E aí...? Perdeu o cabaço? Glub-Glub...

Começou a beber.

— Perdi e acabei gozando dentr... — respondeu com uma sinceridade e inocência tão fortes que Nino não aguentou.

Pffft! — cuspiu o refrigerante todo, rindo igual um idiota, dobrando o corpo sobre a mesa, o que fez Thales também começar a gargalhar igual um doido, com o braço próximo da boca, tentando esconder o rubor de vergonha, enquanto os olhares risonhos se encontravam.

Apoie a Novel Mania

Chega de anúncios irritantes, agora a Novel Mania será mantida exclusivamente pelos leitores, ou seja, sem anúncios ou assinaturas pagas. Para continuarmos online e sem interrupções, precisamos do seu apoio! Sua contribuição nos ajuda a manter a qualidade e incentivar a equipe a continuar trazendos mais conteúdos.

Novas traduções

Novels originais

Experiência sem anúncios

Doar agora