Dançando com a Morte Brasileira

Autor(a): Dênis Vasconcelos


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 104: Ela deixou?

BAM-BAM-BA-...

Thales se manteve animado, o ritmo de seus socos era bem ritmado. Direita, esquerda, direita, esquerda, pedregulhos e poeira voando pelo ar... mas nada de esmeralda ou qualquer coisa de valor.

Já se sentia bem cansado, não tinha comido nada e passou bons minutos, depois da mulher deixá-lo lá, socando sem parar. Seus golpes iam ficando cada vez mais fracos, não por fraqueza, mas por não querer ver sua mão destruída. Seus socos na força atual já destruíam bem a parede, aumentando o espaço do seu quarto a cada golpe. Não via necessidade de se matar para isso.

Olhou para as mãos, sua respiração extremamente pesada. Queria descansar, o ralado da mão era intenso, o suor no corpo e no rosto mais ainda. A anomalia continuava executando o trabalho de limpeza em silêncio, só um leve som de gás de refrigerante no copo, quando uma pedra era engolida e vaporizada dentro do seu corpo gelatinoso.

— Só socar...? Não dormir...? — Olhou para o seu companheiro de cela. — Ei...?

Os olhos daquilo se direcionaram para o rosto do jovem.

— Você me entende?

A anomalia desviou o olhar, rastejando-se até um pedaço de calcário isolado.

— É só um teste, né? Amanhã ela vai dar parabéns e vamos sair?

Nenhuma resposta ou comportamento indicava que aquele ser o entendia, e muito menos ligava para ele. O olhar pessimista e triste era notório; mesmo sem expressões ou sobrancelhas, o olhar era para baixo, depressivo... Quanto tempo esperou lá embaixo?

Thales desviou o olhar, voltando para a parede, as rochas lhe esperando para serem trituradas.

— Ele tá fazendo a parte dele, tenho que continuar com a minha!

A ordem era socar a parede, não parar e achar a esmeralda. Mas não dizia que tinha que ser de mãos nuas. R-rasg! O jovem segurou as duas mangas de sua camisa, tornando-a uma regata colada e bem feia. Com as "pulseiras" de pano, passou duas vezes os dedos em frente, como um soco-inglês, porém não para maximizar os danos ao alvo, e sim para poupar a si.

Sniff...

Bam-Bam!

Respirou fundo e voltou a bater, animado, com vontade. Já... seu companheiro olhava-o de relance, sempre abaixando o olhar em seguida, trabalhando e trabalhando, sem vontade, sem desejo de ficar se alimentando com coisas tão ruins... coisas tão frias.


O tempo não parecia passar. Já era noite, mas lá dentro, como saberia? Mirlim já havia se entregado ao décimo quinto estágio do seu sono, de bruços sobre seu teclado em sua sala escura. Thales, por outro lado, continuava socando e socando. Já havia aumentado o tamanho do ex-retângulo em sete metros.

Parou.

Olhava para trás. Mãos na cintura, respirações profundas em meio à poeira sendo dissipada como um aspirador de pó ao corpo da anomalia. Foi então que notou que não eram só os dois lá embaixo. Havia outro... alguém?

A fiação e madeira de sustentação surgiam sozinhas. O jovem não entendia, mas como seu parceiro não demonstrava medo com aquilo, também não sentia. Era... magia? A fiação sendo continuada do nada, uma lâmpada surgindo como se fosse materializada naquele instante...

— Estranho — murmurou, entre arfadas fortes.

A luz, mesmo "mágica", era fraca como todo o túnel, o ambiente. Proposital? Muito cansado, decidiu que iria descansar, sentar um pouco. Caminhou até uma das madeiras no canto esquerdo e apoiou as costas, pernas esticadas ao chão.

Cabeça baixa, olhar direcionado às mãos.

— Eu consigo mesmo...? Harf... Arf... Sniff...

Seu nariz escorreu um pouco, mas puxou rapidamente. Ergueu a cabeça, seu cabelo baixinho tocou a madeira de tom bege-escuro. Boca levemente aberta, olheiras em meio ao suor. Não havia água, comida e nem banho.

— Tenho que levantar... — murmurou, seu corpo traindo sua afirmação.

Estava fraco, debilitado de fato. Foram horas sem parar. Poeira metálica, rochosa, inalada buscando por ar. Começava a se perguntar...

— Esse é realmente o meu lugar...? Não... Não!

Dobrou o corpo para frente, suas costas viraram um "C", as mãos no meio das pernas esticadas, os olhos cansados observando a falha do sistema nervoso mandando que as mesmas se fechassem e abrissem.

— Ela me escolheu. Deu dinheiro pros meus pais. Não posso ser ingrato. Uma oportunidade única! Disseram que muitos tentam entrar e eu fui chamado! Eu fui escolhido!

Paf!

Voltou o corpo para trás. Apoiado novamente... percebia que ter sentado foi o pior erro. O cansaço não era preguiça, havia a vontade de se reerguer, só não havia a... motivação necessária?

— Só um pouco... — piscou lentamente. — Continuo... de... pôs de... mm... temp...

Dormiu sentado... A anomalia o olhava e, vendo que teve a pior escolha possível, decidiu seguir as ordens de Mirlim... e deixá-lo dormir, descansar. O problema não era seu, o seu problema era o humano. Voltou à parede do lado direito e se acomodou na mesma reta de Thales, do outro lado.

Por não conseguir fechar os olhos — por esse direito ter sido retirado dele — os vaporizou, para que conseguisse dormir, descansar e parar de sentir o gosto horrível das variadas rochas, terras, areias... o rejeito, o entulho. Era pior que um porco recebendo a lavagem mais nojenta já misturada. Sua vida era ser uma ferramenta. Ou seria melhor a morte por ser uma anomalia horrenda?

Cliptsts...

O ar vibrou... Já era dia.

O ruído que um pequeno chaveiro fez ao abrir uma porta no fundo daquele sombrio túnel de terra e pilares de madeira acordou a gosma que vibrava de medo, criando novamente seus olhos amedrontados, visualizando com a luz fraca o túnel, com passos preguiçosos cada vez chegando mais perto.

No tempo em que Thales dormiu, seu corpo caiu para o lado, deitado. Não havia despertador e muito menos noção do tempo. A anomalia já estava completamente desperta, mantendo ao máximo seus olhos, assim como sua forma, mais estáveis, vendo Mirlim em pé, perante o jovem desacordado... com um balde metálico em mãos.

Splaashshhs...

A água foi despejada com agressividade no rosto do menino, que acordou desesperado, pensando estar se afogando. Entretanto... no reflexo de se levantar, PAH! avançou com um soco, na direção do que acreditou ser a anomalia o atacando... uma pena.

CRECK!

Sua mão nem chegou em Mirlim; o som do impacto que a mão da mulher deu na carne do garoto foi absurdo, o olhar de raiva que o encarava, mais ainda. Mirlim dobrou o braço do jovem e o quebrou ao meio, ainda o segurando, vendo-o iniciar um choro repleto de grunhidos.

— NUNCA LEVANTE A MÃO PRA UMA MULHER!

— AI-AI!!

Thales não entendia nada, só sentia uma dor incompreensível. Pelo espaço que as lágrimas deixavam em seus olhos, via Mirlim, e mesmo que estivesse agonizando de dor... viu seu erro.

— DESCULPA! DESCUL...!

Não adiantou.

Não adiantaria ter tempo de dizer mil palavras, mil perdões pelo seu reflexo, que poderia ter parecido uma intimidação para com uma mulher. Erguer a mão para uma mulher. Ameaçar agredir. PAH! Mirlim soltou o braço dele, empurrando-o no chão gelado, espirrando água para todos os lados... no tempo que erguia o pé.

PAH! PAH! PAH!

— EU MANDEI VOCÊ ACHAR A MINHA ESMERALDA! NÃO MANDEI?!

PAH! PAH!

Cada chute no corpo do jovem fraturava seus ossos, trincava suas costelas. Mal sabia, Mirlim nem mesmo estava o agredindo com uma força mínima; o mínimo já o mataria. Thales tentava se proteger, erguer as mãos, colocar as pernas na frente, mas só resultava em mais dor, mais agressões sem parar. Erguia o braço mole, o roxo mais escuro que a herança negra da pele escura.

— MANDEI DESCANSAR?!

PAH! PAH!

— RESPOOONDE!

Os gritos, a feição... Mirlim se assemelhava a um animal feroz, não parecia humana, suas atitudes não eram humanas. Suas palavras não eram humanas.

— NÃ...

PAH!

Thales levou um chute no rosto, seu maxilar estralou, uma concussão o atingia. Continuava não entendendo, e em seus ouvidos... Piiiiiii... um ruído incessante se iniciou, mas ainda assim, escutava bem no fundo, cada palavra dela.

— VOCÊ É MEU SERVO, MEU ESCRAVO! OBEDEÇA! ESSE É O SEU ÚNICO DIREITO AQUI, SEU INÚTIL!

A anomalia sentia dificuldades de manter o olhar na cena, mas tinha medo de que a fúria recaísse sobre ele caso o fizesse. Então, continuava olhando, olhando o humano ser humilhado e espancado. Mirlim segurou o braço quebrado. Crarck! Mais um estralo forte, doloroso, agonizante... Thales gemeu, fraco.

Mirlim voltou a força o osso para o lugar e, mesmo com o roxo profundo ainda no meio do braço, seu braço foi curado. Thales o sentia, mas também sentia toda a dor que ainda o rodeava. Olhou para Mirlim, o olhar dela exalava nojo, desprezo. Não era normal, não era o olhar de ver uma barata, de abrir uma panela e o arroz estar mofado. Era nojo... dele. Do jovem.

— Levanta agora e continue destruindo essas rochas.

Thales não esperou uma segunda voz. Ergueu-se com rapidez, embora cheio de dificuldade, dor e cansaço. BAM! Socou a parede, pedregulhos para todos os lados, poeira e o tremor voltando ao trabalho, assim como a anomalia que correu para limpar o local. Porém, assim que ergueu o punho esquerdo para continuar sua sequência, a voz da mulher encheu sua alma de temor:

— Mais forte.

BAAM!

— Mais forte.

BAAAM!

— MAIS FOOORTE! SEU INÚTIL!

BAAAAAM!

Mirlim avançou, se aproximou com um grito no fundo do seu ouvido esquerdo, e o jovem se lançou para frente, quase em um pulo para juntar o máximo de força e propulsão... Seus dedos... seus ossos queriam se partir. A dor que aqueles golpes o geravam era uma mistura da morte e do desejo de obtê-la.

Mesmo ainda estando com o "soco inglês" improvisado com suas mangas, que estavam encharcadas, e os socos molhados, no frio daquele lugar, com a fraqueza que a fome o gerava, só se intensificava.

Amedrontado, virou o rosto na direção dela, o olhar meio baixo, desesperado. Seus lábios se mexeram no início de uma súplica... que foi cortada:

— Tá doe...

Mirlim deu um passo, Pahf! o jovem caiu para trás de medo, se arrastando até o cantinho como um animal indefeso, olhando-a de braços cruzados, vendo-o de cima, o olhar de nojo... que o jovem começou a acreditar que vinha pelo seu tom de pele.

— Você ficou aqui um dia inteiro e só avançou esse seu quarto imundo, nojento, assim como você merece, por uns cinco metros? Acha que é o suficiente? Seu verme, paguei caro em um merda como você e quero meu dinheiro de volta! Acha que vale 20 mil?! Acha que um inútil como você vale isso?!

Thales tremia pelo frio, que foi reforçado pelo medo e fome; as palavras machucavam sua alma, sua existência. Poucas palavras como aquelas o fizeram começar a se sentir sujo, um inútil... um escravo, uma ferramenta.

— De-desculpa...

— Não aceito desculpas. Continue destruindo as rochas, sem pausa, sem descanso, sem pensar, sem acreditar que ainda manda nessa sua vida de merda. Você é minha propriedade, eu mando, você obedece calado, sem questionar.

— Tá-tá doendo muito...

— É pra doer. É pra dar seus socos mais fortes nessa merda. Quero entrar aqui e precisar andar por quilômetros até chegar onde estiver. Quero minhas joias e não importa se você morrer e eu precisar ir buscar outro membro da sua família para substituir você.

Os olhos do jovem se arregalaram, seus irmãozinhos vieram na mente.

— Você tem uma genética interessante, seus ir...

Thales se ergueu rapidamente.

BAAAAM! BAAM!

Continuando a "mineração" com o máximo de força que conseguia, que ainda restava. Seus olhos mostravam o desespero, a ânsia de conseguir se pagar, pagar para ela por ter sido comprado.

— Mais forte.

BAm!

Seu soco falhou, ele o segurou. Sua garra, sua vontade era presente, mas o sentimento e o medo dos ossos se quebrarem com mais um golpe daquele... era maior. Sentia as mãos pulsarem, via o seu sangue escorrer por baixo do tecido, pingando no chão.

Arfava, estava exausto, com o corpo meio dobrado para a frente, em direção ao chão. Mirlim continuava o olhando; com ele encostado, a mulher ficava maior, seus olhos brilhando em rosa-choque, querendo executá-lo por demonstrar tamanho desrespeito para com sua dona.

— Erga-se e volte a trabalhar.

Arf-hrf...

— Como consegue ser tão fraco? Olha o tamanho dos seus braços. Cadê a sua força? A cada soco, não abre nem 30 centímetros de caminho, seu inútil.

Thales girou o rosto, sua testa apoiada na terra da parede. Viu Mirlim, não sabia o que responder ou como agiria. Tudo gritava junto: seu irmão o substituiria se não aguentasse? Se morresse? Os agentes mentiram?

"Eu vendi a alma da minha família?"

O braço esquerdo soltou o direito, a mão de Mirlim foi indo até a parede, o indicador foi esticado, e a unha afiada... BRUUMM!! tocou na parede, causando uma explosão quase... muda.

Não foi magia, foi a mais pura força bruta, que arrombou naquele "quarto" a continuação do túnel. Mirlim alongou em 30 metros aquela parede, perfeitamente, no exato tamanho da inicial quando trouxe seu novo escravo para trabalhar.

Pahf!

Thales caiu assustado para frente, seu apoio sumiu de uma hora para outra. Olhou para frente, a madeira e a fiação criando lâmpadas sozinhas se estendia pelo cenário. Foi limpo, materiais fracos demais foram "reduzidos a nada", e o que era minimamente mais denso, a anomalia foi limpando assim como a poeira.

Ainda não compreendia, aquilo tudo era...

— Isso... é magia? — sussurrou, a voz mais fraca que o corpo.

— Não.

Thales virou o rosto, olhando-a de baixo. Mirlim virou-se, indo embora.

— Durma, pare para descansar ou faça qualquer coisa que eu não lhe ordenei novamente, e vou quebrar seus ossos de tanto espancar um escravo desobediente como você... — Virou um olhar de canto, olhando-o — mais uma vez. Sua rebeldia o fará ficar sem comida hoje. Espero chegar aqui e vê-lo trabalhando amanhã. Chegar aqui e ver o seu quarto maior. Vê-lo dando socos mais fortes, mais destrutivos nessas rochas. Se quer se alimentar, obedeça. Até amanhã.

Virou-se novamente e continuou até o fim sem voltar-se para trás. Thales acatou sem pestanejar. Ainda arfava bastante, todo suado... sentindo sede.

"Não vou comer hoje?" pensou, com o corpo subindo e descendo com cada respiração.

A água que o acordou criava pequenas linhas sujas pela poeira e terra do chão do ambiente, mas, olhando aquilo, sabia que ou bebia, ou a exaustão o mataria logo, logo. Slic! curvou-se como um animal, lambeu a água suja do chão e engoliu.

Cof-cof!

Sua tosse chegou em Mirlim, que nem se importou em virar-se, pois tinha plena certeza do que estava acontecendo. Thales se levantou e caminhou por toda a extensão criada. A anomalia ainda finalizava a limpeza da área. Olhos entristecidos fixados em seus objetivos: pedras de calcário espalhadas mais adiante.

Chegou.

Suas mãos manchadas de sangue continuavam latejando. Cerrou o punho direito e nem pensou:

BAAM!

— Ai...

BAAM!

— Ai-ai...

BAM!

Cada golpe gerava uma careta, um gemido... mas continuava, mesmo chorando, mesmo com mais e mais sangue pingando e escorrendo de suas mãos. A anomalia via tudo, seus olhos nem se importavam mais só com seguir "cegamente" a ordem de limpeza. Observavam o humano, viam sua dor e compartilhavam dela.

Mesmo que a razão por estar lá fosse o motivo pelo qual o humano foi parar lá, seu ódio deu lugar à compaixão e empatia. Parou de julgar o jogador, que, assim como ele, foi obrigado a estar lá, e começou a julgar o jogo. Mirlim, que merecia seu ódio, não ele.

Rastejou-se em meio aos tremores, poeira subindo e pedregulhos voando, até o jovem chorando. Tocou a perna dele e Thales se assustou com aquele "líquido" gelatinoso, frio, molenga, subindo pela sua perna.

Os olhos se arregalaram, mas não via maldade, não via ameaça naquele ser.

— O... o que tá fazendo? — perguntou inocentemente, enquanto a anomalia enfim chegava no seu braço e cobria sua mão com a forma inteira dela.

A dor...?

Se aliviou.

O sangue sujando a mão foi drenado, evaporado. O gosto daquele sangue era como mel depois de comer quilos e quilos de cravo seco... sem beijinho. Não era maravilhoso, mas perto de comer só pedras e rejeitos, era um banquete. Uma troca. Tratava os ferimentos, da forma que dava e, mesmo que sem querer inicialmente, bebia do sangue escorrido anteriormente.

Era de fato... mágico. Geladinho, molenga, refrescante.

Penetrou a segunda mão no corpo do seu novo amigo. O sangue do braço foi ingerido, e os ferimentos e ralados foram sendo curados lentamente. Longe da perfeição que Mirlim fez ao voltar o osso do braço ao lugar, mas conseguia gerar mais resistência... ao menos, parecia.

Porém, nem tudo foi flores. Thales perdeu os tecidos em suas mãos. A anomalia se perdeu e evaporou-os para ingerir o sangue... O jovem nem se importou.

— Ao menos não comeu minhas mãos... — sussurrou, agradecido, e a anomalia voltou os olhos esbugalhados na direção dele. Não demonstrava a tristeza existencial de antes, só curiosidade e surpresa.

Blolp... Pla.

O ser saltou para o chão, voltando a trabalhar limpando o local. O jovem olhou suas mãos; os ralados pareciam ter desaparecido, como se sua pele tivesse se juntado, nem mesmo cicatrizado, só regenerado.

Cerrou as mãos.

Pareciam novas, sem dores, mas, de certa forma, pareciam mais fortes, como se todos os socos que deu tivessem o fortalecido de forma instantânea após o "repouso" adiantado pelo tratamento do amigo.

— Barril...

Olhou para a gosma rastejando.

— Obrigado!

Os olhos daquilo se voltaram para o lado do corpo, olhando para Thales de cantinho, antes de voltar para o objetivo à frente. Thales não ligou; um sorriso de rosto e boca fechada surgiu em seu rosto, levemente alegre e sem muita enrolação.

BAAAM! BAAAM!

Voltou a bater, voltou ao trabalho.

Mesmo com a cabeça cheia de coisas que mal sabia, acontecimentos que mal entendia, palavras que corroíam e ainda assim se mantinha em pé, seu rosto gentil continuava gentil — ao menos durante um período após a ajuda da anomalia.

O tempo ia passando. A fome ia se intensificando. O estômago roncava. Seus golpes se enfraqueciam... ao mesmo tempo que não. Ficava mais forte, uma força que aumentava gradativamente com seus golpes, mas, por não estar saudável e muito menos nutrido, pareciam socos fracos, ainda que fossem fracos caso comparados com Nino ou Nina, uma força que Thales jamais conseguiria alcançar.

Porém, ainda era um humano, e sua força, comparada com outros humanos normais e até mesmo exterminadores, era muito notória. Mirlim sabia disso, mas Mirlim não era uma mulher que se contentava com o pouco. Muito menos com a preguiça de seus subordinados... hilário, não?

O sono começava a bater mais forte que seus golpes, suas mãos voltavam a sangrar, mas seu estado de cansaço era tão alto que nem sentia. Suas mãos estavam dormentes, fechadas, calejadas da mesma forma de quando iniciou, batendo e batendo sem parar, como o pistão de um carro em alta velocidade.

Um operário de fábrica — pegue a peça, passe para o lado. Movimentos iguais, em busca de uma esmeralda gigante. A anomalia olhava-o naquele estado, via que não demoraria muito para o humano cair desacordado; não morto, mas morto de cansaço em um sono forte.

Dito e feito... Já era madrugada, aquele ser gigante, PAHF! despencou, erguendo poeira para todos os lados. O ser gelatinoso se assustou, tinha medo, não sabia as horas, Mirlim podia descer a qualquer momento.

Foi até ele, tentou sacudi-lo, mas não tinha força para isso. Tentou acordá-lo com seu corpo gelado, mas o corpo de Thales estava mais pesado. O jovem parecia morto, embora respirasse. O ambiente era um gelo, e a única coisa quente eram seus punhos novamente machucados.

O serzinho viu-se inútil, e então olhou para as mãos. Uma de cada lado do corpo. Viu o sangue e sentiu desejo. Mesmo sendo Errante, um serzinho fraco, aquilo era como carniça para um urubu. Comida fácil, um humano imenso desmaiado. Entre pela boca, o devore por dentro, fique mais forte... ache uma forma de sair dali.

Sua natureza gritava: "Vá! Vá!" Seus olhos mostravam o desejo. Aquele cheiro vivo de sangue fresco. Rastejou-se, saiu por cima do peito, e foi até o braço direito, cobrindo-o quase inteiro com seu corpo molenga, absorvendo apenas o sangue, enquanto tratava os ferimentos da mão, assim como mais cedo.

Negou suas raízes. Negou matar Thales. Tratou as duas mãos e contentou-se em se alimentar com o que saiu naturalmente. Sentia preocupação pelo humano. Olhava-o e via-o de forma diferente; foi o único ser que olhou para ele em vida, sem hostilidade.

O único ser que o olhou com olhares bondosos, agradecidos. Nem mesmo sua raça já havia feito aquilo... mas, afinal, foi obrigado a despertar "mais sentimentos" e desses, humanos. Aquele ser conseguia ser mais humano que muita gente.

O sangue inibiu todo o gosto das rochas evaporadas antes e, então, decidiu que ficaria acordado, de vigia, enquanto Thales descansava, para tentar acordá-lo antes de Mirlim chegar lá embaixo. Era esse o seu plano. Rastejou-se até a entrada do quarto e ficou lá, olhando o corredor macabro, tentando captar a mínima vibração ou ruído que as portas acima faziam.

Cl...

Passou horas esperando, e o som da chave destrancando a porta chegou. Os olhos ficaram mais esbugalhados que o normal, e a anomalia se virou para rastejar o mais rápido possível até o humano... mas... era tarde.

Seus olhos, assim como o corpo... se paralisaram.

Diante de Thales caído, Mirlim o olhava de cima. Mas, antes de fazer qualquer coisa com o humano, virou o rosto lentamente na direção da anomalia. Havia visto as mãos limpas, havia notado o que aquilo estava fazendo.

O olhar severo afundava dentro do sistema invisível do corpo gelatinoso, causando dor no pequeno ser, que quase se derretia, morto, sem conseguir mexer-se. Só conseguia sentir dor. Era brutal, mas ainda assim sabia que era piedoso.

Thales, Nathaly, Louis, nem mesmo Alissa sabia da real grandeza do poder e força de Mirlim. Os únicos que sabiam eram as anomalias, que sentiam a presença de Alissa e Mirlim da natureza mais brutal e interna na alma possível.

Assim, aquela anomalia sabia que Mirlim não quis matá-lo, precisava dele vivo, mas, por um momento, olhando-a, uma lucidez destrinchou cada molécula do seu corpo líquido, uma dúvida, que não disse, só sentiu: "Minha real utilidade não é limpar o entulho."

PAH!-BAM!

Mirlim chutou Thales, fazendo-o voar contra a parede, colidindo com brutalidade. O menino acordou assustado, meio sem ar, vendo Mirlim avançando na direção dele... sem pena. Uma sequência de chutes, incontáveis, só sentia, não resistia, tinha medo de se defender, erguer o braço e tê-lo quebrado, ou pior, arrancado.

— FOI ISSO QUE EU MANDEI?!

PAH!

— SEU PEDAÇO DE MERDA! PREGUIÇOSO! INÚTIL!

PAH! PAH!

Os chutes continuavam fraturando internamente; alguns ossos lascavam, criando lâminas que cortavam a carne por dentro. Mas era insano: um chute destruía, e no tempo que o outro voltava, o osso se curava e logo era fraturado novamente pelo novo golpe.

Não era Thales se regenerando, era Mirlim brincando.

Sangue escorria do nariz e da boca, o corpo todo roxo, os chutes rasgaram, destruíram a camisa do jovem. Mirlim enfim parou os gritos e as agressões, abraçou o corpo novamente, olhar alto, enojado.

— Levante e volte a trabalhar, seu preguiçoso. Estrume.

Thales, todo quebrado, começou a se erguer, apoiando as mãos no chão. Baba escorria da boca, misturando-se ao sangue e pingando no solo. Era muito lento; sua lentidão a irritou.

PAH! BAM-PH!

Um chute vertical atingiu a barriga do humano, fazendo-o voar no teto, colidir e voltar ao chão, gemendo, sem ar.

— Mandei levantar e voltar a trabalhar. Vou precisar punir o meu escravo nojento mais uma vez?

Thales se ergueu novamente, mais rápido, quase vomitando... mas vomitando o quê? Não tinha nada dentro da sua barriga, vomitaria vento, no mínimo suas tripas e sangue. Tonto, BAAM! O som foi menor do que os golpes que Mirlim presenciou anteriormente, mas foi mais forte e mais produtivo.

Abriu um buraco relativamente grande, de dois metros; as rochas desciam como uma cascata de areia, reduzidas, arenosas, como se estivessem sendo trituradas em um processador ou liquidificador. O soco foi... fraco, mesmo que, para ele, tivesse sido forte.

BAAM!

Mirlim não disse mais nada, virou-se e foi embora. Passando ao lado da anomalia ainda ao lado da porta, que quase se petrificou com o passar, e o vento calmo que o corpo dela produziu, colidindo com sua massa.

Assim que ela saiu, ele rastejou rapidamente, cruzando os mais de 60 metros em poucos segundos, chegando até Thales, que mal se mantinha em pé, socando aquilo. Era um robô, uma máquina; só executava a ordem, não pensava, só reproduzia.

A fome era absurda, o corpo começava a mostrar isso, um emagrecimento forçado, embora houvesse muito mais músculos que gordura em tudo. Seus braços se erguiam, batiam e batiam. Seu corpo era bem corcunda. Seria ótimo se fosse um treino de boxe.

Os roncos eram cada vez mais fortes, o sono ainda era um peso muito presente, mesmo depois de conseguir dormir por cinco horas. O cansaço que ficou após o espancamento não era algo muito... legal.

Seu corpo cedeu, PAHF! Caiu para trás, mas as mãos... não pararam, continuavam dando socos para cima. O pobre menino nem mesmo estava consciente, mas mesmo assim continuava, pois não queria desistir e queria mostrar que podia.

A anomalia chegou na hora e aumentou sua forma para conseguir "engolir" Thales por inteiro, deixando apenas a cabeça para fora. Conseguiu, cobriu-o inteiro, e, no tempo em que tratava as feridas, viu Thales sair do transe, parando de socar o ar e descansando por um momento.

Respirando de forma mais calma, menos pesada. O roxo dos machucados foi retirado, aliviado. A pele sentia-se hidratada, fresca e calma, longe de tudo que estava acontecendo ali. Mas não mudava o fato da fome, desnutrição e sede. O jovem parecia que colapsaria a qualquer momento, e mesmo assim, seu rosto gentil se mantinha.

Mesmo no cansaço e na dor, aquele rosto agradecido olhava para a anomalia, que, com os olhos ainda maiores devido à proporção que deu ao corpo, olhando-o diretamente, não entendia como alguém "deixado" para morrer, sendo escravizado, poderia manter aquilo.

Sendo mais racional, conseguiu separar o sangue da blusa e não a vaporizou junto. Mesmo que aquilo estivesse uma junção de rasgados e trapos, ainda ajudava, mesmo que minimamente, no calor corporal de Thales.

Após tratá-lo, descobriu o jovem e diminuiu a massa corporal para como estava antes. Thales se ergueu, respirando levemente cansado, já que o efeito passou, embora o alívio no corpo inteiro se mantivesse.

— Obrigado... queria saber seu nome... mas como eu não sei, posso te chamar de Robson?

Mesmo se a anomalia falasse, com o choque que teve escutando aquele nome, ficaria em silêncio, com um olhar semicerrado. Mas, ainda assim, moveu a sua forma, como um sim de cabeça, e Thales sorriu com o rosto, antes de se levantar e olhar para o seu trabalho.

Pôs a mão direita na barriga, o cansaço voltava como um pesadelo, suas pálpebras ameaçavam fechar. As vistas ficavam mais acinzentadas, porém, BAMM! BAAM! Ignorou tudo, e voltou ao trabalho. Seus socos trituravam distâncias ainda maiores agora, e mesmo morto de cansaço, conseguiu ver que ficava mais forte.

Horas se passaram; a resistência adquirida na mão já havia sido ultrapassada, a dor e o sangue eram presentes, mas a constante sensação de desmaio, devido à fome e fraqueza, inibia essa dor que, a cada dia, diminuía ao golpear a parede.

O sono chegou novamente, e assim como no dia passado, PAHF! Robson viu seu amigo caindo como um guerreiro ao ter uma espada penetrada na armadura. Tentou acordá-lo novamente, mas não conseguia, tratou os ferimentos e tentou, mais um dia, ser um cão de guarda.

Olhando-o com um olhar preocupado, virou-se e começou a rastejar em direção à porta, que a cada dia ficava mais longe, porém... o ar mudou. Vibrou como se curvasse perante um Semi-Deus Natural. Robson travou de medo e virou os olhos, passando pelo corpo até as costas, onde viu Mirlim em pé, diante de Thales desacordado.

Um pesadelo.

Não esperou a manhã seguinte chegar. Veio ainda na madrugada, em silêncio, mais rápida que um teletransporte, por um momento, com mais ódio e raiva do que Blacko sentia diariamente em sua vida.

BAM! PUMM-P-BAM!

Thales foi golpeado tão forte que o corpo colidiu e quicou da parede ao chão, até parar na parede oposta. Abriu a boca buscando ar, arregalou os olhos em busca de esperança, mas o que achou foi Mirlim, mais uma vez, indo educá-lo.

Robson não podia fazer nada. Desta vez, não pagou, não sentiu dor, só observou Thales agonizando de dor, tendo os ossos quebrados e reposicionados, quebrados e consertados inúmeras vezes, por minutos e minutos, sem parar.

Não foi obrigado a ver, assistia por vontade própria, assistia tentando criar coragem para, mesmo que inutilmente, tentar intervir, mas não podia, e sabia muito bem. Sua inteligência, principalmente nutrida com sangue humano diariamente, se assemelhava à de uma criança de cinco anos. Não podia fazer nada, ao menos não agora. Só aguardava ela acabar e sair para ir curar as feridas.

Mirlim acabou.

Thales estava caído, com tantos machucados e sangue pelo corpo que parecia morto. Pequenos tremores de frio e fome eram notórios; seus olhos estavam inchados, nem uma fresta era possível ver aberta.

— Você só tem mais uma chance. Se eu vier aqui amanhã e vê-lo fazendo qualquer coisa que não seja destruir essa parede, eu mato você e o substituo com a sua raça. Pego irmão por irmão, até que todos quebrem, mas eu vou ter minha joia. Não quero desculpas, levante e volte a trabalhar.

Thales apoiou os braços; sua boca era uma cachoeira calma de baba e sangue, o peso da sua cabeça era maior do que quando erguia o fusca para consertar um vazamento. Levantou relativamente rápido, de forma robótica, pois sabia que a demora seria um preço mais alto que a dor de forçar naquele momento.

Seu corpo bambeou e quase caiu sem equilíbrio, quando jogou o corpo para frente em um soco.

BAAM!

Muito mais baixo e fraco do que todos que ela já presenciara, mas... aquele soco abriu um buraco, um rombo de 10 metros, de pura poeira de rocha triturada escorrendo da cratera criada.

O jovem, ainda tonto, BAAM! golpeou com a esquerda, do lado do buraco, abrindo um buraco relativamente maior, com o mesmo efeito das rochas trituradas pelo atrito intenso gerado.

Mirlim ficou observando... algo que deixou a anomalia ansiosa, pois sabia que Thales iria cair a qualquer momento com a quantidade de feridas. BAAM! O menino golpeou novamente, agora à direita do buraco principal. O buraco aberto foi cerca de 30 centímetros mais profundo que o primeiro.

"Tem mais força com o braço direito." Virou-se, deixando o jovem bambeando lá, golpeando no automático. "Normal, difícil achar um canhoto." Caminhou tranquilamente, os braços cruzados, mas os desfez por um momento para retirar o pirulito da boca e notar que já estava no fim.

Tudo demorou longos segundos, uma caminhada por longos metros bem demorada, que Robson só aguardava ela sair de visão para agir. Foi o que fez. Mirlim sumiu no túnel, e Robson correu até o lugar onde Mirlim dera um banho no servo dias atrás. Conseguiu absorver a água da terra ainda úmida e manteve em seu corpo, sem vaporizá-la.

PAHF!

O som que esperava veio: Thales caiu. Robson acelerou e chegou até lá, engoliu o rosto do jovem e limpou todo o suor, sujeira e sangue, tentando tratar o inchaço e os machucados o mais rápido possível para sair de cima, pois não queria matá-lo sem ar.

Não daria tempo, mas com duas rodadas, dando um tempo para respirar, conseguiu. Logo, despejou a água na boca do humano, que engoliu de forma instintiva, ganhando assim energia para abrir os olhos e ver a cena estranha... Da sua visão, aquilo parecia uma mamada, ou que Robson estava mijando em sua boca.

Ignorou.

"Ninguém tá vendo..."

Robson acabou e aumentou a massa para cobri-lo e tratar todo o corpo.

— Eeeh... Conta pra ninguém isso aqui, não, tá...? — brincou. Olhos bem abertos, olhando para uma das lâmpadas, enquanto seu rosto mantinha uma calma e inércia estranha, um rosto inexpressivo que expressava muita coisa.

Robson não entendeu.

Após tratá-lo, saiu e foi vaporizar toda a poeira das rochas, e da mesma forma, assim que saiu de Thales, Thales sentiu o peso, o cansaço, a fome, tudo de uma vez, e em mais um dia... BAAM! BAAM! passou socando pedra.

Horas se passaram.

O cansaço acumulado dos dias se juntou, mas as palavras ditas pela mulher não saíam de sua cabeça.

— Não posso parar — murmurava para si, na tentativa de se manter de pé, acordado. — Não posso. Não posso. Não posso.

Robson via o estado do amigo, um robô travado em dizer duas palavras e socar sem parar.

Entretanto, aquilo funcionou. Thales não caiu, dormiu ou parou. A resistência adquirida foi ultrapassada. O sangue e o rasgado nos punhos já estavam lá, 24 horas já haviam se passado e ele nem fazia ideia.

Robson começou a notar o tempo, a espera. Olhava para trás, vendo bem pequena já, a porta do corredor assustador. Nada. Mirlim não foi até lá. Nem mesmo iria. Thales foi deixado à mercê da sua própria força e resistência para se manter de pé até o momento em que a mulher decidisse descer lá.

Horas passavam... Thales não parava. BAAM! BAAM! caminhava lateralmente, abrindo os buracos da extensão de toda a parede para ir até o fundo e repetir tudo mais uma vez. Robson ia limpando e sempre olhando para trás. Não falava, mas seus olhos gritavam: "CADÊ ELA?!"

48 horas de espera.

48 horas do jovem socando sem parar. As mãos tão sujas de sangue que pareciam estar em carne viva. Robson se desesperava, queria tratá-lo logo, mas tinha medo de Mirlim estar de olho e esperar exatamente o momento em que parassem para surgir e executá-los.

BAAAM!

Seu corpo vibrou, se assustou com o som mais alto que os contínuos anteriores. Olhou para Thales, vendo-o afastar o braço esquerdo para trás.

— Não posso...

BAAM!

Mais horas se passaram, sempre que se via à ponto de desmaiar, falava mais alto, dava um grito para acordar, um soco mais forte para a dor passar o cansaço, o sono... e a fome. BAAM! Foi quando, de repente, Plak o som seco de algo sendo colocado no chão de calcário da área em que estavam ecoou.

Olharam.

Mirlim havia surgido, no chão, quatro pães de sal, recheados com três ovos em cada. Porém, espatifados no solo. Na mão da jovem, uma garrafinha de água, que ela abriu lentamente e virou sobre os pães.

Shipsrcss...

Thales engoliu em seco, não havia quase nada de água para produzir uma saliva decente em seu corpo. A garrafinha foi esvaziada, parte absorvida pelos pães, e parte no chão em poças um tanto empoeiradas.

Shic-shirks...

Mirlim pisou sobre e misturou, fazendo uma lavagem no chão. Ao acabar, olhou com soberba para o rapaz e disse, de forma fria:

— Come.

Pahf!

O jovem se jogou ajoelhado, nem mesmo erguia com as mãos aquilo, comia com o rosto atolado. Mirlim observava com nojo, mas mantinha o olhar severo, sem desvio algum. Não passou de dois minutos, Thales limpou o chão, bebendo também toda a água suja e, mesmo morto, ainda assim aquilo lhe deu energia.

Ainda curvado, ajoelhado como um servo ao seu rei, disse em tom baixo, antes de se erguer e voltar ao trabalho:

— Obrigado.

BAAM!

Desta vez, Mirlim não disse nada e nem mesmo observou. Robson olhava na direção dos dois, e nem notou quando ela sumiu da sua visão. Olhou para trás e viu ela no início, bem minúscula ao longe, do corredor assustador. Quando ela sumiu, rastejou até Thales, que, pela primeira vez... não caiu, e sim deitou por vontade própria.

Foi tratado, e então entendeu como "funcionava".

Depois de voltar ao trabalho, passou dois meses fazendo a mesma coisa, sem dormir um único dia, só socando e socando até o limite, que aumentava a cada dia consecutivo. A cada dia, mesmo não seguidos, que Mirlim levava comida, parava para ser tratado e voltava ao trabalho.

BAAAM! BAAAM!

Sem ser espancado.

64 dias após chegar em Salvador, seus músculos não aumentaram... mas endureceram como as próprias rochas que destruía. Em mais um dia, quando não sabia se era madrugada, dia ou noite... Mirlim surgiu ao seu lado, segurando o soco que disparou na direção da parede.

O quarto já era quilométrico. Quatro quilômetros de uma mineração ilegal.

Thales levou um susto; por um momento achou que iria ser espancado pela primeira vez em tanto tempo, mas não foi isso. Mirlim o soltou, o olhar ainda era frio, carregado de maldade e vilania.

— Me siga.

Saiu andando, e Thales não hesitou em seguir a ordem. Caminhando ao lado da sua treinadora, sentia-se acuado para falar algo, mas decidiu criar coragem para quebrar o silêncio com um tira-dúvidas:

— Ond...

PHAAAAAAAANNNNNNFU!-BAM!

Do mais absoluto nada, seu corpo foi atingido pelo invisível, algo que fez seu corpo parar no ar como se fosse uma parede. Um efeito como um elevador subindo, mas de lado, em uma velocidade absurda, que o arrastou "voando" por toda a extensão, ganhando velocidade a cada segundo até chegar ao fim e o jovem afundar com o corpo na parede ao lado da entrada do túnel assustador.

Mirlim não foi arrastada; ia andando tranquilamente. Robson se assustou quando viu o amigo sair voando a milhão dali, mas... no tempo que nem mais conseguia vê-lo no fim do quarto, viu o olhar de canto de Mirlim para ele, e instantaneamente foi para um cantinho ficar parado, sem fazer nada, até uma segunda ordem.

Thales não sentiu dor, saiu do buraco tranquilamente, e viu Mirlim surgir do nada ao seu lado, passando pela entrada do túnel. Seguiu-a e nem notou uma pequena coisa: não encolheu o corpo, Rrrrrriss! Foi andando e alargando o túnel com o formato do seu corpo, sem sentir dor nem dificuldade naquilo.

Enfim, chegaram na porta.

Um silêncio gritante no ar.

Thales passou e ficou paradinho esperando-a abrir a segunda; quando o fez, o menino levou o braço direito ao rosto. A luz do sol que entrou naquele quartinho quase o cegou. Um stun doloroso começou a lacrimejar; não vendo nada, e mesmo com grunhidos, Mirlim não se importou com ele e saiu, seguindo até a sala.

"O sol era tão forte assim?" se questionou, procurando por apoio, e, devido à distração do incômodo da luz, Crash! Nem notou que, ao tocar na parede, quebrou um pouco do tijolo, sujando o chão com a tinta seca.

Saiu da sala, os olhos fechadinhos, os braços procurando uma forma de diminuir o brilho. Não fechou a porta da salinha, mas não tinha problema; o corredor estava trancado. Seguiu de memória pelo corredor até a sala da Mirlim, beeem lentamente.

Mirlim já se encontrava sentada em frente ao computador; à sua frente, um homem velho, de pele clara, cabelo branco, embora o grande bigode ainda tivesse uma presente cor preta. Usava um avental branco, por cima da sua roupa de trabalho de cor laranja. Thales chegou e a luz do escritório, embora mais forte que as lâmpadas do subsolo, ainda era menor que a do sol.

Conseguiu abrir os olhos e viu o homem na sala. Não entendeu, mas caminhou até lá. Porém, no filtro, ao seu lado direito, havia um copo de vidro no chão. Educado, abaixou para recolhê-lo. Crec! Seu dedo encostou no vidro, e devido à força aplicada, aquilo estilhaçou imediatamente.

Ficou com um semblante assustado.

"Vou ser punido!"

Ergueu o rosto na direção de Mirlim, mas ela nem parecia ligar para a sua existência. Trerrerrrererrerleclec! Só digitava freneticamente as teclas do teclado, ignorando os dois em sua sala.

— Desculpa...

Silêncio.

Tl-crc...

Tentou pegar os cacos maiores, mas os tocava e os estilhaçava em pedaços cada vez menores.

Ergueu-se com vergonha.

A mulher continuava digitando em uma velocidade anormal, e o velho olhava para o menino, que chegava cada vez mais próximo, com uma cara de não saber o que fazer. Frsh-sh. Thales limpou as mãos na bermuda e estendeu para o velho, que olhou assustado.

"Vai quebrar minha mão se eu estender..." Cumprimentou com um aceno de cabeça e um sorriso meio nervoso. Thales retribuiu e recolheu a mão, no mesmo momento em que Mirlim dizia:

— Vai passar um tempo com este homem. Sandro, esse é Thales; e Thales, esse é Sandro. Agora saiam daqui, estou ocupada — disse tudo de forma preguiçosa, arrastada, o pirulito se movendo nos lábios lentamente, mas a velocidade dos dedos discando traía completamente sua preguiça de rosto e espírito.

Pl-lra!

Sandro colou as mãos nas costas do garoto e foi o empurrando para saírem de lá o mais rápido possível após a ordem da mesma, tendo cuidado para manobrá-lo pelas portas, sem destruí-las.

Os olhos de Thales já haviam se adaptado melhor ao sol, o que pesava mesmo naquele momento eram dois meses sem dormir e um pouco de fome, pois fazia um pouco mais de um dia que não comia.

O velho arrastou o jovem para fora da escola, e enquanto era só empurrado, decidiu perguntar o que estava acontecendo:

— Ela me vendeu?

— Quê!? — Sandro fez um semblante confuso, no tempo que o guiava pela Av. Simon Bolívar, ao sair da escola, indo em direção à sua pizzaria, que era basicamente vizinha da ADEDA Baiana.

— Por que ela me deixou com você? Ela me jogou fora? — Um pouco de desespero foi passado pelo seu tom, tentando olhar o velho, bem mais baixo que ele, enquanto o empurrava.

— Se acalme, home. Ela me pediu para te ensinar a fazer pizza. Vai passar um tempo comigo aprendendo e depois vai voltar.

— ...O que é pizza?

...Mmm... Tu vai ver. "O que é pizza? Como assim não sabe o que é pizza?" pensou, uma careta meio confusa estampada. Aquilo soou como uma afronta ao pizzaiolo.

Chegaram em poucos minutos; a pizzaria ficava na esquina entre a avenida e a R. Melvin Jones. Sandro entrou com o rapaz pelo portão de grade preta, e logo fechou, pois o estabelecimento foi alugado por Mirlim, e ficaria fechado por alguns dias, antes de voltar ao funcionamento.

Passaram por cadeiras e mesas de madeira, seguindo até a cozinha, mais ao fundo. Thales parecia uma montanha de pernas; o mínimo encostar dos seus braços na parede ou móveis os danificava, amassava para que o mais denso passasse, ou retirava a pintura, mas o jovem não fazia por mal e muito menos sentia.

O lugar não estava vazio, mesmo que tivesse sido alugado para que o pizzaiolo tivesse tempo integral para depositar em Thales; outros funcionários continuavam trabalhando para vendas em delivery. Uma coisa que deixou Thales acuado: todos eram brancos, e todos viram aquele gigante surgir na cozinha.

Os olhares surpresos, meio confusos de como alguém poderia ter tanto músculo, na cabeça do menino se tornavam olhares preconceituosos, talvez desprezo. A reação imediata foi abaixar o rosto, sentindo que não deveria olhá-los diretamente. Seu movimento foi quase um cumprimento, e todos repetiram, com sorrisos receptivos... que Thales não viu.

A mesa de Sandro já havia sido preparada ao lado da que Thales trabalharia, sendo ensinado dia após dia. Sandro não notou como o rapaz se sentia, só se dirigiu até a mesa e colocou alguns ingredientes ao lado, para suas explicações.

— Thales, vem cá.

Com um pequeno susto, caminhou e ficou ao lado do novo treinador.

— Você perguntou o que é pizza... Hoje vamos fazer e você vai ver, mas é bom uma pequena explicação. Pizza é basicamente uma massa de pão aberta, coberta com molho de tomate, queijo e o que mais você quiser colocar por cima — dizia gesticulando com as mãos e desviando o olhar para pensar — calabresa, frango, cogumelo, tanto faz. Aí você joga isso no forno e pronto, fez uma pizza.

Thales concordava com pequenos movimentos de cabeça, filtrando e tentando guardar as informações.

— Essa comida nasceu em Nápoles, na Itália, há uns 200, talvez 300 anos. O povo era muito pobre e a falta de dinheiro os fazia buscar por comidas baratas, rápidas para poderem voltar a trabalhar e que matasse a fome. Daí começaram a colocar molho de tomate e queijo em cima de massa de pão, assavam no forno e comiam.

Rrronm...

A barriga do rapaz roncou, e Sandro olhou-a por um momento antes de voltar à história:

— Em resumo... as pessoas de outros lugares que visitavam Nápoles começaram a experimentar a famosa pizza e gostaram muito. Logo, o mundo decidiu que também queria ter em seus países. Aí hoje existe pizza em todo canto do mundo, diferentes, exóticas, mas sempre com o mesmo princípio: massa de pão com molho de tomate e queijo... tirando as doces, aí não dá, né?

O jovem concordou, mesmo sem entender nada.

— Deixei aqui — olhou para a mesa — a massa em alguns estágios já pré-feitos, para eu fazer primeiro com você me olhando e depois vou querer que você faça da forma que se lembrar e como absorveu a aula. Mas vou estar olhando para tirar dúvidas e guiá-lo sempre que errar algo.

Puxou uma tigela de vidro vazia e se preparou com uma pequena alongada de braços, que mesmo bem esticados ao ar, mal ganhavam em altura com Thales.

— Para a pizza que vamos fazer, vou pegar 250 gramas de farinha de trigo, que já deixei separados para nós. — Fuus despejou subindo uma leve fumaça — Uma colher de chá de sal, duas colheres de chá de açúcar, 125 ml de água — Dludludu... a água desceu fazendo pirraça em se misturar com tudo —, duas colheres de óleo vegetal e uma colher de chá de fermento biológico seco.

Puxou uma colher de pau e começou a mexer.

— Primeiro fazemos com uma colher.

Passou cerca de dois minutos, quando parou de mexer, deixando-a sovando por cinco minutos, enquanto dizia mais um pouco de histórias sobre pizza, como a origem da pizza de Margherita. Pegou uma tábua de madeira e espalhou um pouco de farinha de trigo sobre.

— Agora amassamos com as mãos durante uns cinco... seis minutinhos.

Passou o tempo.

Colocou a massa redondinha na tigela, deu duas pinceladas em cada uma com óleo e tampou com um pano.

— Essa massa não precisa esperar descansar, mas eu gosto assim. Depois de guardar, esperamos cerca de 20 minutos, mas eu já deixei uma massa pronta no estágio seguinte.

Pegou uma tigela guardada abaixo da mesa e abriu, colocando a massa sobre a mesa com um pouco de farinha de trigo espalhada. Pegou um rolo e abriu a massa com agilidade, precisão e cuidado. Era uma arte preparar aquilo, e seus movimentos e falas sempre se remetiam a isso.

Não usou molde ou referência, ia girando a pizza enquanto amassava as dobras com perfeição. Pegou o molho de tomate caseiro que preparou e espalhou com uma colher bailarina, dançando suavemente em ondas naquele quadro saboroso.

Não poupou no queijo, e muito menos nas calabresas, que voavam, caindo em seus devidos lugares uma a uma. A cebola veio logo após, uma chuva de um ingrediente que dividia dois lados de gostos pessoais.

...Nem narrava mais, só trabalhava com atenção.

Pegou a pá de pizza; com um movimento rápido, a pizza subiu a bordo e logo chegou ao seu destino quentinho, o forno queimando com outras pizzas ao lado. Rusp! Sandro pegou uma já pronta e levou, colocando-a na mesa para mostrar como ficava após pronta.

O queijo borbulhava, a fumaça era hipnotizante. O cheiro entrava no nariz do menino e sacudia sua barriga vazia... Que dózinha, teria que aguardar mais um tempinho. Levou a pizza até outro funcionário. Pápápá-pá! Que picotou-a rapidamente para mandar os pedaços únicos que foram pedidos no aplicativo por pessoas diferentes.

— Sua vez... meu jovem — disse com calma, deixando na bancada do menino todos os ingredientes que usou, com uma tigela limpa para preparar.

Thales olhou tudo aquilo e suspirou para relaxar.

"Eu consigo."

Levou a mão até a farinha de trigo. PUFF! Foi imediato. Sua mão fechou ao redor do saco e estourou-o ao apertar com muita força. Uma cortina de fumaça subiu na cozinha, tosses para todos os lados foram escutadas, enquanto exaustores sugavam aquilo.

O jovem ficou envergonhado. Olhos gigantes, em silêncio, imóvel diante dos olhares de todos os lados. Olhou para Sandro, que não estava bravo, só indicava com a cabeça para continuar, e foi o que o menino fez.

Ficou um pouco de farinha no saco, bem no fundinho. Despejou na tigela e foi pegar o potinho com sal. Trc! Fechou a mão com força demais... quebrou. Trik! O açúcar teve o mesmo destino. Tracrlk... ao afastar a mão, tocou na tigela principal e a fragmentou.

Seus olhos agora disputavam com os de Sandro, que não conseguia acreditar no que via. O pizzaiolo assumiu, tirou a destruição e colocou uma massa no segundo estágio, pronta apenas para ser amassada e deixada descansar.

— Tente ser suave. Com calma. Manso. Amasse a massa como se fosse uma massagem. Algo delicado, que não deve ser quebrado.

Thales o olhava, com o olhar envergonhado, rosto baixo. Afirmou com um movimento curto e levou as mãos à massa.

RRRRMN!

Empurrou como foi ordenado... mas o menino não conseguia controlar a força. Amassou a massa na mesa de inox, dobrando o equipamento de Sandro, que observava em choque, com uma lembrança de mais cedo brotando em sua mente.

[ Diante da mesa de Mirlim, escutava-a dizer sobre o trabalho de professor:

— Mande o valor de todos os equipamentos que forem destruídos, será reembolsado, não se preocupe com isso — disse em um tom frio, sem olhá-lo. Continuava no computador, tinha coisas mais importantes que dar uma mínima e respeitosa atenção ao homem, que aguardava Thales vencer o stun do sol e entrar na sala. ]

"Agora eu entendi..."

Thales travou mais uma vez. Todos o olhavam, de fato... assustados. O menino se sentia oprimido, com medo de uma retaliação, com medo do que Mirlim diria, com vergonha e com um sentimento de que...

— Se-senhor, eu juro que eu pag...

— Jovem... não se preocupe.

Thales parou, olhando-o. O homem não demonstrava raiva, só um olhar compreensivo.

— Vamos tentar novamente. Vou pedir a alguém para trazer uma mesa nova, um pouco mais resistente, e vamos continuar. Não se preocupe, só quero que me prometa que um dia vai conseguir fazer uma pizza exatamente como eu ensinar.

Thales afirmou com a cabeça.

— Seja suaaave... Caaallmo... Não precisa ter pressa. Para fazer uma pizza, não precisa de força, precisa de jeito, técnica. Calcule o apertar. Sinta a massa como se fosse parte de você. Não a maltrate; cuide e a deixe descansar. Vem... tente na minha mesa enquanto meus filhos trocam a sua.

Dois homens na cozinha se olharam e foram até lá. Pegaram a mesa quebrada ao meio e saíram do ambiente, no tempo que o pai colocava uma nova massa na mesa e abria espaço para Thales tentar. Thales olhou para o pizzaiolo.

— Pode ir. Com calma, com carinho — disse, voz suave.

Thales levou as mãos bem lentamente, e seus dedos tocaram a massa... calmos, embora não macios. Apertou para começar a amassar; entretanto, a massa foi cuspida de entre seus dedos rígidos como pedra. Foi apertada tão forte que esfarelou de imediato, mesmo estando úmida no ponto correto.

Com uma única fechada de mãos, destruiu uma pizza, pois aquela massa, se fosse usada para uma pizza de fato, ficaria dura demais no resultado final. Sandro não interferiu, deixou Thales continuar amassando aquilo, que nem conseguia se colar mais.

Quando os dedos tocavam a mesa, ainda a amassava, arredava o metal para baixo, da exata forma dos dedos do garoto. Já sabendo que seria difícil, excluiu a possibilidade do menino conseguir fazer uma pizza ainda naquele dia. Pegou então mais massa e colocou lá, deixando-o amassar, deixando-o aprender qual era a força que devia aplicar ali para fazer acontecer.

Após uma pausa, Sandro deu uma pizza para o jovem se alimentar. A barriga roncava e roncava, e, quando perguntado, Thales disse que não sabia quanto tempo fazia desde sua última refeição. A imagem de Mirlim na cabeça de Sandro se distorcia, e logo deu comida ao jovem, que... amassou-a também.

Sandro precisou alimentá-lo na boca, e foi o que fez.

A noite chegou; o dia se baseou em amassar e amassar massa de pizza... Que o pizzaiolo aproveitou e fez biscoitos, que, mesmo duros, o profissional conseguiu diminuir essa característica e deixá-los bem crocantes.

Levou Thales até um quarto improvisado no restaurante. Um pequeno cômodo, com duas camas de solteiro juntas, pois não sabia que o menino era tão grande, com colchões, um travesseiro, uma manta com pelinho e uma coberta mais pesada.

Era um paraíso diante do seu quarto na escola... e mesmo assim, recusou. Ao ser apresentado ao lugar, agradeceu, mas chegou em frente à cama e se deitou no chão, nem mesmo apoiando as costas na madeira do corpo do móvel.

— Thales... deite na cama, menino. Vai ficar doente.

— ...Ela deixou?

"Quê?" Ficou em choque. Via o menino com uma olheira forte, olhando-o entre piscadas cansadas, naquele chão frio. Um menino inocente, que mais parecia uma esponja, absorvendo tudo ao redor, sendo moldado agora, aos 18 anos.

— Como assim? A... A Srta. Mirlim não deixa você dormir na cama?

— ...Nem sei quanto tempo faz desde a última vez que eu dormi.

O choque ligava o pavor; deu alguns passos até o menino:

— Deite na cama. Não se preocupe. Você tá na minha responsabilidade! Eu permito que deite na cama!

Thales o olhou e desviou o olhar, antes de fechá-lo, dizendo suas últimas palavras antes de selar as pálpebras, rendendo-se ao cansaço do sono:

— Se o senhor não sabia... ela não deixou.

— Thales...? Thales?

Ajoelhou e tocou o jovem; o corpo estava quente, respiração notória. Tentou balançá-lo, acordá-lo. Nada. Pegou então os cobertores e o cobriu no chão. Olhava-o dormir antes de se virar, apagar as luzes e... Vrr... seu celular recebeu uma ligação.

— Número desconhecido? — Colocou no ouvido e atendeu. — Alô?

— Apenas o ensine a fazer pizza. Ouse contar a alguém o que escutou e irá deixar de ser alguém. Desde já, aguardo o meu escravo em minha sala. Tenha uma boa noite, Sr. Sandro.

A ligação foi encerrada, mas o homem quase se mijou inteiro.

A voz de Mirlim era notória; não havia efeito na voz, não precisava de nada para despertar pavor em qualquer um. Sandro olhou novamente para o "quarto" de Thales e voltou-se para ir onde dormiria, já que ficou com medo de sair do seu ambiente de trabalho.

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