Volume 1 – Arco 1
Capítulo 8: Os dois são um
Seu corpo congelou por um segundo, e o terror foi substituído por uma confusão profunda.
Diante dela estavam os gêmeos. Nina, de pé com apenas um aninho, foi quem espirrou. Ao seu lado, Nino sentado no chão. Ambos a olhavam com rostos apáticos, sem emoção alguma. Aquele mesmo olhar vazio que vira tantas vezes em Blacko. Mas não foi isso que a perturbou mais.
— Vo-vocês... A-a-aprenderam a andar?! — Sua voz tremia, mais pela admiração do que pelo medo. Nunca presenciara algo tão inusitado. O alívio tomou seu peito ao ver as crianças à sua frente, mas a dúvida ainda pairava.
Os dois entendiam o que ela dizia, mesmo tão jovens. Nina confirmou com um leve movimento de cabeça à pergunta da avó, sem expressão alguma. Nino, por outro lado, já havia voltado a olhar para o que o fizera sair de casa. Havia visto um gatinho laranja, que miou e chamou a atenção dos dois.
"Ela me respondeu?" Tudo era confuso; já não tinha idade para absorver tanta informação. — Nina... Você me entende?
Nina, com seus olhinhos quase brilhando em roxo, a encarava. Mais uma vez, confirmou com um leve movimento de cabeça. A cena, ao mesmo tempo que era fofa, era tenebrosa. Marta não sabia o que fazer.
Sabia o que Blacko era. Acreditava no que ele havia dito. E saber que aqueles dois à sua frente eram demônios — especialmente com as marcas ativas no pescoço de cada um — fazia o medo crescer dentro dela.
Medo de não conseguir mudá-los... medo de não torná-los... humanos.
— O-o que vocês estão fazendo? — Lutando contra o crescente pavor, começou a caminhar lentamente na direção deles, seus passos cautelosos, mas sem saber o que faria a seguir.
Foi então que Nina apontou para Nino.
Miau...
Marta olhou para o ponto que a menininha indicava e viu o gatinho, com uma coleira vermelha, ao lado de Nino.
— Q-que fofinho, mas já tem don...
Crunch...
O som de algo sendo esmagado cortou suas palavras.
A visão de Marta se embaçou por um instante, e seu corpo se enrijeceu. O terror tomou conta dela ao perceber que Nino, com sua mãozinha direita, havia esmagado a cabeça do gatinho sem qualquer remorso.
"E-e-ele não pode... Eu não posso... Eu não posso..." A cena se repetiu em sua mente. O caos noticiado naquele dia, o que o pai das crianças fizera, todo o terror veio à tona. "Não, não... Não... Preciso mudá-los, preciso controlá-los, preciso... preciso fazer com que não sigam o caminho do pai...!"
Sentiu as lágrimas se formando em seus olhos, mas se esforçou para manter a calma, tentando ao máximo conter o pranto. Nino olhou para ela. Aquele olhar frio... Não sentia nada. Não sentia-se triste ou magoado por tirar a vida daquele pequeno ser inocente. Sentia, na verdade... prazer.
Prazer em matar. Prazer em causar sofrimento. Mas... quando viu o sofrimento de Marta ao olhar aquilo, algo dentro dele... mudou.
Nino arregalou os olhos, sentindo que havia feito algo errado, mas sem saber o quê. Sabia que Marta ficou triste, mas não imaginava que o motivo fosse ele ter matado aquele animal.
Embora evoluíssem e crescessem mais rápido que os humanos, adquirissem conhecimentos e aprendessem com uma facilidade extraordinária, o sangue que fluía em suas veias ainda desejava a morte, a destruição, o caos... o sofrimento de tudo e todos.
A aniquilação de todas as raças que, perante seus olhares, fossem impuras. Como... humanos.
Mas, assim como o pai, havia uma exceção: tudo dependia de respeito. De um olhar que, apesar de tudo, enxergava algo diferente.
Mesmo que os gêmeos nunca tivessem dito uma única palavra até então, a consciência de ambos estava ali desde a primeira semana. Desde o primeiro dia... Desde a primeira noite, viam Marta os alimentando, fazendo brincadeirinhas, causando gargalhadas em suas boquinhas. E tudo isso... resultou em sentimentos criados por ela.
Não a olhavam querendo seu mal. Apenas o bem. Queriam protegê-la. Viam-na como um animal indefeso, uma mera humana "de merda", mas, ainda assim, não sentiam nojo dela. Apenas... respeito.
Nino matou o gato por alguns motivos, mas o principal não era o prazer. Era proteger Marta. O Primordial via as presas e garras do gato, que, embora minúsculas, ainda poderiam machucá-la. E tudo o que pudesse ferir Marta, Nino não queria perto dela.
O menininho a olhava, seus olhos tremendo, e uma lágrima escorreu. Ao dar seu primeiro passo, ergueu o braço para limpar o choro. Marta ficou sem reação, não entendia, mas ainda assim olhava para eles.
No movimento de erguer o braço, Nino tocou em Nina, e, ainda crianças, não controlavam bem seu sangue, o que resultava nos dois se misturarem constantemente.
Os dois são um.
Quando se misturavam, compartilhavam tudo: poderes adquiridos, experiências e memórias. Caso não estivessem juntos e apenas um sofresse ou presenciasse algo, no instante em que se misturassem, tudo era automaticamente transmitido ao outro.
Assim, quando Nino a tocou, seu sentimento de culpa e o medo de fazer a pessoa que queria proteger chorar foram transferidos para Nina, que começou a chorar imediatamente, sentindo e compartilhando a mesma dor. Caminharam com passinhos lentos até Marta, que ficou parada, sem reação.
— D-desculpa...
— D-d-desculpa...
Ambos disseram a primeira palavra de suas vidas naquele momento, abraçando as pernas da avó enquanto choravam por perdão. Mesmo que as mãos sujas de sangue manchassem sua roupa, Nino era inocente. Não sabia o mal que causou, e a avó não se importava com uma mera mancha em seu vestido.
Marta se ajoelhou imediatamente. As lágrimas não podiam mais ser contidas.
A confusão de ver dois pequenos de um ano andando, falando e reagindo como seres muito mais velhos era demais para sua cabeça. Ao mesmo tempo, o medo gritava: como esconderia tudo isso? Como os manteria seguros... seguros do sangue que fluía abundante em suas veias?
— Não pode fazer isso, é-é-é errado! — gaguejou, tentando ser firme, tentando ensiná-los que não poderiam ser como o pai.
— D-desculpa...
— Desculpa...
— Prometam para mim que não vão mais matar... Prometam que nunca mais farão isso...
— Pr-prometo... — gaguejou Nino, com os olhos fechados, mas ainda chorando.
— Prometo... — respondeu Nina, na mesma situação.
Passou algum tempo. Marta ficou abraçada a eles durante todo esse momento.
Os gêmeos já haviam parado de chorar, e Marta se ergueu, olhando para baixo, vendo os dois pitititicos observando-a com os olhinhos esbugalhados. Esticou as mãos para ambos, e os dois seguraram, voltando para dentro de casa.
Quando entraram, a avó lembrou que havia deixado o bolinho cair.
— O que é isso, vovó? — perguntou Nina, esticando o braço direito e apontando para o bolinho caído.
Marta congelou ao ser chamada de "vovó" pela primeira vez. Seu coração quase explodiu de emoção, com o amor que crescia dentro dela. Ainda assim, não entendia como conseguiam falar sendo tão novos.
"Como sabem essas palavras?" perguntou a si mesma. — É um bolinho que comprei para comemorar o aniversário de vocês.
Os gêmeos tinham uma peculiaridade: a linguagem universal. Entendiam tudo e sabiam falar tudo, mas ainda não compreendiam completamente o significado de tudo.
— O que é um bolinho?
— O que é aniversário?
Um choro involuntário brotou dos olhos de Marta. A emoção a envolvia de tal forma que as vozes em seus ouvidos pareciam ecoar no fundo de sua alma. Não conseguiu responder de imediato, mas quando Nino olhou para cima e viu seu rosto com uma lágrima escorrendo, ficou mal, acreditando que a magoara novamente.
— Desculpa... — disse ele, baixando a cabeça, quase em choro.
— Não, não... Nino, Nino, não é isso! — respondeu rapidamente, e sua voz transbordava carinho.
Puxou os dois com uma força calculada pelos braços, erguendo-os em seu colo, Punff... e se sentou no sofá.
— Não estou triste!
— M-mas... Por que está chorando? — Nino questionou, olhando-a cabisbaixo.
— Estou feliz... feliz por escutar vocês falando... — O olhar da vovó exalava amor e ternura.
— Isso faz chorar?
Marta abriu um sorriso meigo em meio às lágrimas.
— Me fez.
— Vovó?
Feliz, a vovó virou o rosto para Nina.
— Oi, Nina?
— Bolinho é de comer?
— Sim, é um docinho. Prometo que vou comprar outro... o que caiu vai para o lixo.
— Hum?
— Hãm?
Tanto Nina quanto Nino se encheram de dúvidas, produzindo o questionamento em uníssono, inclinando suas cabecinhas enquanto olhavam para ela de lado.
— Por que, vovó?
— Porque ele ficou no chão muito tempo, está sujo.
Nina virou o rosto para o bolinho e, com a mão esquerda, ergueu um dedo. De repente, água surgiu por baixo do doce, erguendo-o e levando-o até ela.
— Não é só limpar?
Marta ficou sem reação, observando aquilo em silêncio.
"Meu Deus..."
A magia de água envolveu completamente o alimento, e Nina removeu todas as impurezas, limpando-o sem molhá-lo. A cena era quase surreal — faltava apenas sair fumaça da cabeça da vovó, que tentava compreender como a Primordial havia purificado o bolinho sem que uma única gota de água o tocasse, eliminando todo vestígio acumulado do chão.
— Pronto!
— Como... Como sabe fa-fazer isso?
— O quê?
— Magia.
— Você não sabe?
— Você não sabe?
Ambos falaram juntos, perfeitamente sincronizados.
Enquanto Marta lançava um olhar rápido para os dois, inclinaram a cabeça para a direita, com os olhinhos bem abertos mais uma vez. Apesar da fofura da cena, aquela reação era inconfundível: assemelhava-se à primeira reação de Blacko ao ver Alice.
Era uma peculiaridade herdada — Blacko inclinava a cabeça sempre que algo despertava sua curiosidade, e os gêmeos faziam o mesmo.
— N-não sei...
Os dois piscaram duas vezes, visivelmente confusos. Marta sentiu-se ainda mais perdida, tentando encontrar uma forma de lidar com aquilo.
"Melhor fingir normalidade..." pensou. — Ééé... Sabem fazer fogo?
Confirmaram com a cabeça ao mesmo tempo, em uma reação perfeitamente espelhada.
"Meu Deus do céu, não tô entendendo nada..." pensou, observando-os, cujos olhinhos estavam mais curiosos do que nunca.
Nino ergueu um dedo, e uma pequena chama brilhou, mas logo foi substituída por magia escura, contra sua vontade. Ainda sem controle sobre seus poderes, usá-lo resultou em uma mescla: Fogo e Escura. Uma chama roxa, tingida de preto, surgiu no ar, dançando e distorcendo o ar ao redor.
Marta sentiu um calafrio. Aquela cor... aquele poder... era único — o mesmo que já vira Blacko usar.
— Não, não, não! Não precisa! — Balançou a cabeça freneticamente, tentando evitar que o poder se manifestasse ainda mais.
Parou e os observou. Ambos piscaram uma vez, em perfeita sincronia, encarando-a em silêncio.
— Vamos fazer como eu sempre fiz!
Piscaram novamente... Mas confirmaram com a cabeça, com a mesma naturalidade atual.
Marta se levantou, deixando os gêmeos no sofá. Pegou o bolinho, ainda levitando com a ajuda da magia de Nina, e foi até a cozinha. Tentou acender o número em forma de vela com um isqueiro, mas ele não queria pegar.
Rsk-rsk!
— Funciona, anda logo! — falou quase em tom de brincadeira, tentando disfarçar o nervosismo.
De repente, a ponta do número começou a queimar, mas não pelo isqueiro. Foi Nina que o acendeu, com um leve gesto.
Marta olhou para trás e viu os dois em pé, olhando para cima, em seu rosto, com seus rostinhos que começaram a ser tipicamente curiosos, o que, em sua visão, era maravilhoso. Podiam ser tudo... menos o que Blacko era.
— Pra que isso, vovó?
— É um rit... "Não, melhor não... essa palavra não..." Temendo que os gêmeos ficassem curiosos demais ou que a palavra fosse um gatilho, trocou rapidamente suas palavras. — É assim que comemoramos aniversários. Um bolinho com uma vela, que indica quantos anos tem o aniversariante. Acendemos, e ele sopra.
Os dois abriram a boca amplamente, enquanto inclinavam a cabeça para trás, dizendo:
— Aaaaaaah!
— Aaaaaaah!
— Temos um ano?
— Temos um ano?
Marta abriu um sorriso discreto, escondendo os dentes. Seus olhos, por trás dos óculos, quase se fecharam com as contrações do rosto, refletindo a ternura diante do que presenciara.
— Uhum.
— Aaaaaaah!
— Aaaaaaah!
Reagiram da mesma forma, com a mesma empolgação.
— Vem cá...
Marta foi até a mesa e se sentou.
Com os dois ao seu lado, ergueu-os em seu colo, colocando-os em pé para que pudessem olhar para o bolinho aceso. O número não queimava; Nina, com seu poder, manteve a chama acesa de uma forma diferente, sem deixar que o fogo se espalhasse. Com medo de machucá-la, evitou a propagação de seu poder perto de Marta.
— Funciona assim: antes de assoprarem, façam um pedido, mentalm...
— Que a vovó viva para sempre! Fuuuuu!
— Que a vovó viva para sempre! Fuuuuu!
Marta foi cortada, mas por um gesto fofo, um pedido tão simples e puro.
O fogo se apagou, e seu olhar amoleceu com a graça das palavras ditas.
— Huhum... Hora de provar!
Com uma faca que havia deixado na mesa mais cedo, cortou o pequeno bolinho em dois. Era um simples bolinho de cenoura, porque tinha receio de dar algo excessivamente doce para bebês. Mas o bolinho foi coberto com uma calda de chocolate e um pouco de granulado.
Entregou as partes para ambos, que olharam o doce e, depois, voltaram o olhar para Marta, em uma busca por mais explicações.
— ...O que foi? Não querem comer?
— Você não disse que podíamos comer — respondeu Nina.
— ..."Provar" é comer, experimentar algo pela primeira vez.
Os dois a observaram em silêncio por um instante, tentando compreender a nova palavra que a vovó usara.
— Aaaaaaah!
— Aaaaaaah!
Marta não conseguiu segurar uma risadinha ao ver a reação deles, tão genuína e espontânea.
— Podem comer!
Após receberem a alegre permissão, Nhami-Nhami-Nhami-Nhami-Nhami-Nhami! debulharam o bolinho, fazendo pequenos sons de satisfação enquanto mastigavam.
— Gostaram?
Os dois não responderam com palavras. Apenas continuaram a mastigar, mas afirmaram com a cabeça, com um sorriso no rosto que não poderia ser mais sincero.
Marta olhou para os dois, com os olhos marejados, quase chorando. Sentiu uma onda de emoção tomar conta de seu coração.
— Feliz aniversário... — ela disse, com a voz embargada. — Meus pequenos.
Apertou-os um pouco mais contra seu peito, sorrindo através das novas lágrimas. Era o primeiro aniversário deles, e ela sabia que seria inesquecível. A emoção de ter aqueles pequenos em sua vida, Seus Pequenos, era mais do que poderia expressar.