Volume 1 – Arco 1
Capítulo 21: Frango
Instintivamente, Nino se afastou como um gato esquivando de uma cobra, em um movimento tão ágil que desafiava a própria natureza, com tamanha fluidez de velocidade, imerso em uma correnteza de rio. Recuou para trás, saindo da água em um salto rápido.
Fluosh!
Agora fora da água, ambos se moveram com mais velocidade.
A sucuri, que tinha cerca de 30 metros de comprimento, crescendo a cada dia mais após sua alimentação abundante recente, e uma altura que superava a de Marta, se aproximou com uma agilidade surpreendente.
Nino, com um movimento rápido, colocou a mão direita nas costas e a marca em seu pescoço foi revelada. Em seguida, uma espada começou a se formar em sua mão, seu poder escuro surgindo a toda velocidade, no tempo que gotejos de sangue se firmavam no leve desespero sentido.
Skrunch!
Desviando com destreza, saltou para a direita e, com um golpe preciso, atacou a anomalia. A espada cortou com precisão mortal, decapitando a criatura de forma limpa e rápida.
Pahf!
O golpe foi forte o suficiente para desequilibrá-lo, e Nino caiu no chão, sem perder a atenção no ser, mas... Observou o corpo da criatura se mover por alguns segundos, o sistema nervoso reagindo à morte, mas sem mais ameaças.
A anomalia não era capaz de se regenerar, não era uma classificação Ruína, como o Tibungue que o pequeno havia enfrentado e dilacerado no passado.
Marta se aproximou rapidamente, olhando preocupada para Nino, ainda no chão.
— Se machucou?
Nino olhou para ela, um pouco atordoado pela queda, mas logo desviou o olhar para a anomalia caída.
— Não... — respondeu, meio distraído. — O que é isso? É tipo aquele negócio que atacou a senhora?
— ...Sim e não. — Marta analisou a criatura, um tanto surpresa. — É uma anomalia, mas em termos de aparência, obviamente não é a mesma coisa. Me lembra uma sucuri. Nem sabia que tinha essa cobra em Minas. Será que ela que comeu todos os peixes? Não consegui pescar nada esses dias.
— Provavelmente — Nino respondeu com uma certeza casual, olhando aquele ser. Tinha a certeza em sua resposta.
Nina se aproximou então, e, com uma expressão séria, tocou o irmão com um dedo no ombro. O Primordial olhou para ela, e, ao perceber o olhar da irmã, deixou-se se misturar.
"Esconde a marca."
"Ah, esqueci."
Nino rapidamente cobriu a marca no pescoço, voltando a se concentrar na cena à frente.
Os dois olhavam, curiosos, a imensa cabeça da anomalia. Era algo bizarro, uma sucuri gigante com uma aparência distorcida, mas ainda assim, seus olhos estavam fixos no que poderia ser uma refeição incomum.
— Dá pra comer isso? — perguntou Nina, sua curiosidade natural falando mais alto.
— Será que não é venenoso? — Marta ponderou, olhando para o corpo com cautela. Não sabia exatamente o que era, mas a confiança no olhar de Nina não a deixou completamente desconfortável.
— Você disse estar economizando. Por que não vende a carne disso na cidade? Acho que daria um dinheiro legal! — sugeriu Nino, com uma expressão travessa, mas ao mesmo tempo prática.
Marta soltou uma risada irônica.
— Se eu tentar vender isso lá, vão me prender — respondeu, com um sorriso de escárnio, pensando na improbabilidade da ideia.
— Mas é carne, né? Vamos levar. Se tiver gosto ruim, a gente cospe fora — sugeriu o garoto, confiante. Ficou mais interessado no que a carne poderia oferecer do que em se preocupar com o que poderia ser perigoso.
Marta refletiu um momento, olhando a criatura com um sorriso meio sem graça.
"É isso ou não ter almoço... Não deve ser ruim. Pelo menos não é feia como aquele bicho de uma perna." pensou, analisando o novo bicho, então falou em um tom mais sério: — Tá bom, um pedaço grande é o bastante.
Nina observou, com um olhar esperto, enquanto Marta tomava as decisões.
— Vamos deixar o resto aqui? — perguntou, percebendo a impossibilidade de levar tudo.
— Não temos onde guardar tanta carne. Olha o tamanho disso, essa cabeça nem passa na porta. Mas, não tem muito o que fazer. Hora ou outra, descobrirão isso aqui. Não houve barulho, então pelo menos temos tempo de almoçar em paz, eu imagino. Mas, se aquele homem ou alguém vier conversar comigo, se escondam e não façam barulho até que eu os libere a sair.
— Tá — respondeu Nino.
— Consegue trazer o pedaço de carne sem a ajuda de Nina? — perguntou com um sorriso suave.
— Consigo.
A avó então, com um aceno de cabeça, se virou para Nina.
— Me ajuda a preparar as coisas para o almoço?
— Sim.
— Ok, vamos. — Marta pegou seus equipamentos e se dirigiu ao pequeno morro, indo embora.
Nina, ao lado do irmão ainda sentado no chão, estendeu a mão.
— Levanta, bicho-preguiça. Borrou as calças, foi?
Nino segurou e se ergueu rapidamente.
— Só um susto. Nada demais.
A irmã o encarou por um momento, pensando na carta.
"Nha, depois eu converso do sangue..." — Beleza então. Te vejo lá em casa.
— Uhum.
A Primordial saiu atrás de Marta, que já caminhava pela ponte, e Nino ficou para trás, olhando a anomalia e refletindo sobre o que fazer com aquele ser.
— Será que boia? — murmurou bem baixinho, olhando para o corpo da criatura. — Se isso for encontrado em outro lugar, talvez ninguém desconfie de nós...
Colocou a mão no queixo, enquanto apoiava o cotovelo na mão esquerda, perdido em seus pensamentos.
— Nha, sei lá — pensou alto, enquanto olhava a carne com uma expressão indiferente.
Shkirrsh...
Sem perder tempo, criou uma lâmina de sangue e começou a cortar uma boa porção da carne.
— Se não caber na geladeira, eu como até que o que sobrar caiba — disse, pensando em como gerenciar a comida da maneira mais simples possível, embora na verdade pensasse apenas em sua barriga cheia.
Com uma agilidade impressionante, cortou uma grande rodela, retirou a pele grossa e, usando magia de água, limpou o que parecia sujo. Levantou a carne "pesada" em seus braços, sua expressão traiu a força aplicada, achando que, de fato, aquilo poderia dar trabalho.
— Nada demais.
Deu dois passos à frente, Blamplashs! e chutou o restante do corpo da anomalia em direção à água.
Mas... para sua surpresa, o que imaginava não aconteceu. O corpo não flutuou ou foi arrastado com facilidade pela água.
— É pesado demais? Harrff... — suspirou, visivelmente entediado, e se virou para ir embora. — Dizimar isso faria muito barulho, cortar em pedaços pequenos me dá preguiça. Tanto faz. Irão achar de qualquer forma.
Com essa conclusão, simplesmente seguiu seu caminho de volta, consciente de que logo alguém acabaria descobrindo a criatura na água. No fundo, já aceitava que não conseguiria esconder tudo para sempre.
Sua vontade de lutar pela sua liberdade gritava; não queria viver escondido e passando necessidades naquela casa para sempre, mas sabia que apenas ir peitar quem matou seu pai não era simples.
Quando chegou de volta, Nina terminava de preparar as coisas iniciais. Usando magia de fogo, acendeu a lenha sob um suporte improvisado que Marta havia montado para o disco de arado.
— Obrigada — Marta disse a Nina, e logo viram Nino chegando com a carne.
Creck!
Nino colocou a carne sobre a velha mesa de piquenique, mas a madeira não aguentou o peso e quebrou sob a carga.
— Eeeh... Desculpa? — disse o menino, olhando para a mesa quebrada com uma expressão de leve surpresa.
Marta o olhou, mas não o repreendeu. Apenas caminhou até lá, com um olhar admirado.
"Meu Deus, que negócio gigante..." pensou, e logo tentou pegar a carne, achando que seria leve, já que seu neto trouxe com tanta facilidade.
Assim que tentou apenas segurar, ficou surpresa com o quão pesada era.
— C-como você conseguiu trazer isso? — perguntou, sem ainda conseguir acreditar no quão fortes os dois eram.
— Sou forte — Nino respondeu com um sorriso enorme e um gesto de joinha, desbloqueando uma nova conquista, uma nova memória pessoal.
Marta riu, um pouco encantada com a brincadeira do neto.
— Já que o senhorzinho é tão forte, me ajude a cortar isso.
— Tá! — respondeu, pronto para ajudar.
Começou a cortar pedaços da carne, enquanto Nina ajudava Marta a temperá-los, usando uma mesa de pedra que sua neta criara para substituir a mesa quebrada.
Quando terminaram de cortar a carne e guardar o que foi possível na geladeira, Nina se sentou ao lado de Nino na mesinha de piquenique reformulada. Marta, distante, Fricicscics... fritava a carne no disco de arado, o cheiro delicioso começando a se espalhar pelo ar.
— Sei que não teve outra opção, mas precisamos treinar para evitar usar o sangue. Esse é o único pedido do nosso pai.
Nino a olhou, o semblante sério e desanimado. Não queria mais pensar sobre o assunto, mas não conseguia evitar o peso da responsabilidade.
— Harff... Tá. Prometo que vou tentar não usar mais.
Nina o observou por um momento, tentando entender se ele realmente estava levando a sério ou se aquilo era só mais uma promessa vazia. Suspirou, querendo acreditar que seu irmão tentaria de fato, e nesse momento, os dois se viraram para Marta, ao escutá-la gritar alegremente:
— GENTE!! Já está pronto.
Levantaram rapidamente e correram até a vovó. Sentados à mesa de piquenique, o cheiro da carne frita sob a pedra preenchia o ar e fazia a barriga de ambos, Rrrromm! roncar de fome.
— Esqueci dos talheres. Nino, me ajuda a buscar?
Nino virou-se rapidamente para ela, com uma expressão emburrada.
— Ajuda pra iss... Ai, ai, ai! — Marta o puxou pela orelha direita, beliscando levemente enquanto o guiava para dentro da casa.
— O que foi? — Nino perguntou, desconcertado.
— O que seu pai disse na carta? — murmurou, com uma expressão um tanto séria.
Nino abaixou um pouco a cabeça, incomodado com a lembrança.
— Nada de mais.
Marta, no entanto, não ficou convencida.
— ...Ele pediu desculpa?
— Sim.
O olhar da vovó ficou pensativo, lembrava da reação de Blacko, como entregou a carta, como agiu diferente quando os dois nasceram. Mas, ao ver a expressão desconfortável de Nino, não queria forçar mais a conversa, apenas queria o necessário.
— Você acreditou? — perguntou, com uma voz suave, mas profunda.
Nino olhou para ela por um momento, ainda com o rosto fechado.
— Não.
— Harff... — a avó suspirou, colocando a mão na cabeça dele e bagunçando os cabelos. Nino sentiu o gesto, mas permaneceu em silêncio. — Pode ter certeza de que ele foi sincero em suas palavras — disse, com um tom grave.
Nino ergueu o olhar, encarando-a diretamente. Aquela resposta não o convenceu, mas sabia que Marta só queria protegê-los.
— Eu queria saber mais sobre ele... — disse, em voz baixa.
Marta hesitou por um momento, ponderando suas palavras.
— Quanto menos você souber, melhor. E quanto menos você se parecer com ele, melhor — falou, com uma leve firmeza na voz. — É para o seu bem.
Nino continuou a olhando, agora um pouco surpreso, mas acabou aceitando o conselho. Sentia a verdade na voz dela, sentia que a vovó apenas queria protegê-lo, embora tivesse uma curiosidade insaciável sobre o pai que nunca conheceu de verdade.
Marta retirou a mão da cabeça dele, colocando-a no ombro, em um gesto de carinho.
— Pegue os garfos, vou levar os pratos.
O neto, com um leve sorriso de gratidão pelo gesto, reprimindo o lado negativo ao assunto, abaixou a cabeça e obedeceu.
— Sim, senhora.
Quando voltaram para o quintal, cada um pegou um pedaço de carne. Nino olhou para a carne com uma expressão de leve desconfiança, mas Marta foi a primeira a quebrar o silêncio.
— Bom... olhando assim, não parece ser venenoso — comentou, ainda um pouco receosa, mas confiando na decisão de Nino de trazê-la.
Nino olhou para Nina, que o observava atentamente, depois para vovó. Todos se sincronizaram, a carne erguida pelo garfo na frente de suas bocas. Sem mais delongas...
— Aaahnhami!
Experimentaram o sabor ao mesmo tempo.
— Parece frango — disse Marta, com um sorriso satisfeito.
Nina olhou para Nino.
— É gostoso!
Nino sorriu de volta.
— Também achei.
Marta se levantou, satisfeita com o resultado.
— Vou fritar mais. Vocês querem?
— Sim!
— Sim!