Volume 1

Capítulo 10: Estrelas de um Passado

Por mais que Ragna tenha gostado de ver um conflito relevante ao crescimento dos três dragões, ele ainda precisava zelar por sua posição de mestre. Ao final do treino de Haru e Grimm, ordenou que ambos se ajoelhassem e os repreendeu pela imprudência. Disse que, por mais que não percebessem, eram semelhantes. A comparação irritou profundamente os dois.

Ambos seguiram para seus dormitórios, irritados, culpando um ao outro por suas próprias atitudes. Se fossem solicitados, seriam capazes de enumerar facilmente tudo que os incomodava no outro. Por sorte, os dormitórios ficavam em direções opostas.

Haru se livrou da roupa de um dia desgastante e deixou que a água do chuveiro tentasse aliviar o desconforto muscular que sentia em cada fibra. Deixou os cabelos molhados e desarrumados, como de costume. Vestiu uma roupa confortável e se jogou na cama, agradecendo mais uma vez por ter a cama próxima à janela — de onde podia desabafar seus sentimentos às estrelas. Assim, adormeceu... e sonhou com o passado.


Dez anos antes

Quartel General de Flick

 

O corpo de Haru balançava — pela força, quase parecia um tremor violento. O beliche do quartel do distrito de Flick já era desconfortável o bastante; ele sentia a base de ferro pressionando suas costelas. Logo, a voz de Drake o alcançou:

— Acorda, Haru! — ele sussurrou, evitando se mover demais na cama de baixo.

Haru abriu um dos olhos e lançou um olhar sonolento para a porta do alojamento. Ainda não havia amanhecido. Gemeu em protesto e se virou de costas para Drake. Isso só encorajou o colega a insistir:

— Não foge! Você disse que ia me ajudar!

— A culpa é sua por rir no dia da apresentação — murmurou, bocejando.

— Ninguém mandou você dizer que o quepe do sargento parecia um ninho de teco-teco. Então a culpa é sua também — disse o rapaz de pele escura, quase rindo, dando um leve tapa nas costas de Haru. — Enquanto eu estiver de castigo, você também está…

— Tá bom, tá bom, já acordei! — Haru se sentou, balançando a cabeça como um vira-lata molhado, bagunçando ainda mais os cabelos negros. Cobriu os olhos com a mão e se espreguiçou. — Você vai me fazer virar um velho rabugento no futuro.

— Se for mais responsável do que já é, me dou por satisfeito — respondeu Drake, jogando o boné camuflado no rosto do amigo. — Te espero lá fora.

Após um longo suspiro, o Haru de dezoito anos pulou da cama. Acendeu o abajur e se encarou no espelho. Seus traços angulosos pareciam mais suaves naquela época, transmitindo leveza. Fazia sempre uma careta engraçada para si mesmo no espelho, como se não gostasse do que via — mas sempre ria do resultado.

Em poucos minutos, estava fardado e pronto para ajudar Drake. Haviam sido punidos com a tarefa de limpar o quartel antes do amanhecer. Haru, sentindo-se culpado, embora não arrependido, prometeu que dividiria o castigo com o amigo, revezando as tarefas ao longo da semana.

Drake era filho de um fazendeiro viúvo, no norte do distrito. Ele e Haru eram amigos desde a infância, desde o dia em que Lucille os apresentou. Desde então, tornaram-se cúmplices em tudo — inclusive na decisão de se alistarem juntos. Em Anfell, o serviço militar não era obrigatório, mas altamente recomendado para jovens das classes média e baixa, servindo quase como um "atestado de boa conduta".

Para os dois, no entanto, o alistamento era também uma maneira de economizar. Haru desconfiava que Drake fazia isso para aposentar o pai e talvez mudar-se para a cidade. Ambos sempre se importaram profundamente com suas famílias. Haru também tinha seus motivos, especialmente relacionados à saúde frágil de seu pai.

— Terminei os banheiros! — gritou Drake, despertando Haru de seus pensamentos. — Tô terminando o refeitório — respondeu ele, varrendo rapidamente os restos para a pá. — Vai pro pátio, já já tô lá.

— Ainda temos tempo. Fica tranquilo.

— As princesas ainda estão aqui? — A voz grossa de Shad interrompeu a conversa, ecoando pelos corredores. Ele observava a limpeza com desdém. Shad Gaspar fazia parte do mesmo grupo de alistamento, e, por ironia, foi designado para fiscalizar a punição dos dois. Haru não tinha nada contra o rapaz alto e musculoso, embora evitasse qualquer confronto com ele. Já vira os treinos de combate de Shad e não desejava nem ser seu parceiro, quanto mais seu inimigo.

— Não sei nem por que você continua com isso — disse Haru, jogando o lixo fora. — A punição acaba hoje, e a gente nem te dá trabalho.

— Como meu pai diz: "um segundo é suficiente pra tudo, até pra errar" — disse Shad, tirando o boné e observando os arredores.

— Ou rir de uma piada mal colocada, não é? — Haru o encarou com ironia, apoiando-se na vassoura. A luz do sol que começava a surgir iluminava o refeitório, e deixava claro o verdadeiro motivo da presença de Shad: ele também estava sendo punido.

— Não sei do que você está falando... — Shad limpou a garganta, tentando mudar de assunto. — Ambos sabemos que não sabe — replicou Haru, dando um leve tapa no ombro do colega. — Te vejo no pátio, amigo.

Gaspar era o único dos três com verdadeira vocação para seguir carreira militar. Para alcançar um cargo elevado, um histórico limpo era essencial. Haru e Drake jamais mencionaram que ele também havia rido da piada — por isso, sua supervisão era, no fundo, uma escolha pessoal. Apesar de não admitir, estava agradecido.

Pelo grupo, Shad era o mais reservado, denotando uma criação dura e uma vida sofrida. Ninguém se surpreenderia se ele dissesse que escolheu a carreira militar buscando independência.

— Haru! — Shad apressou o passo, encontrando o amigo no pátio. — O terceiro sargento Moss quer falar com a gente antes do almoço.

O olhar que Haru e Drake trocaram buscava uma resposta silenciosa. Shad apenas deu de ombros: também não fazia ideia do motivo.

A manhã seguiu com os exercícios rotineiros, inclusive a corrida ao redor do pátio do 35º quartel de Anfell. Os três sempre diminuíam o ritmo para que ninguém ficasse para trás. Tinham preparo atlético invejável, mas nunca se gabavam disso.

Antes do almoço, Moss os chamou para seu escritório pessoal e pediu que se sentassem.

— Imagino que estejam se perguntando por que os chamei aqui — começou ele, tirando o quepe e revelando os cabelos grisalhos. — Estou aqui para parabenizá-los.

— Parabenizar? — perguntou Drake, confuso.

— A humildade os precede — Moss sorriu largamente. — No dia da apresentação, achei que seriam problemáticos.

Apenas Shad engoliu em seco. Haru e Drake apenas assentiram, cientes da fama que cultivavam durante as aulas.

— Quem sugeriu seguir a rota próxima ao rio durante o treino externo? — Foi o Drake, senhor — respondeu Haru, enquanto o colega confirmava.

— Apenas busquei uma rota segura para todos, senhor — respondeu Drake, estalando discretamente os dedos, nervoso.

— Sabia que, minutos após cruzarmos para a outra margem, houve um deslizamento de terra onde passariam?

Drake suspeitava disso no dia. Nunca conhecera a mãe, mas dizia que herdara dela uma espécie de intuição. Sentia a chuva como um aviso, embora não soubesse como explicar isso aos amigos.

— Você salvou um batalhão inteiro, garoto. Orgulhe-se — disse Moss, apertando firmemente sua mão.

— E vocês dois… Suas notas também são motivo de orgulho.

Haru e Shad sorriram com tranquilidade. Estavam acostumados a broncas, então aquele elogio era surpreendente.

— Como eu disse no primeiro dia, o 35º batalhão reserva uma surpresa aos melhores alunos. Como esse caso é atípico, quero ouvir de vocês: quem acham que merece ser liberado primeiro?

— Como assim? — perguntou Shad, confuso.

— Um de vocês voltará para casa mais cedo — respondeu o sargento. — E quero ouvir os motivos.

Os três se entreolharam. Não precisaram de muitas palavras. Shad morava sozinho e queria estabilidade. Haru se preocupava com as feridas do pai, mas sua mãe sabia cuidar. Drake, porém, cuidava do pai quase cego, e sabia que não podia depender do tio por muito tempo.

— Drake — responderam Haru e Shad em uníssono.

Drake, surpreso, preparava-se para dizer que Haru merecia.

— Não cabe a nós julgar a vida pessoal dele — Shad disse, ajeitando-se na cadeira. — Mas sabemos o que ele faz pela família — completou Haru, sorrindo.

Moss observou-os em silêncio. Depois, tirou três envelopes da gaveta, junto de três cartas.

— Como eu disse: é uma situação atípica. — Ele sorriu, apoiando-se na mesa. — Não achei justo dispensar só um, mas queria ver como reagiriam.

Os três receberam os envelopes. Havia neles um valor extra, tirado do próprio bolso de Moss.

— Sei que cada um tem sua vida. Vão, antes que eu mude de ideia.

Após a continência final, os três atravessaram o pátio. Shad soltou seu tradicional uivo de vitória. Haru, com o envelope em mãos, apenas sorriu — e chorou pela primeira vez.

Queria aquele dinheiro não para si, mas para a mãe. Ela sempre sonhara em estudar advocacia, mas nunca pôde: faltava dinheiro e sobrava preconceito. O pai sempre a apoiou, mas ela deixara esse sonho de lado por anos.

Shad os convidou para uma bebida no distrito leste. Despediram-se como amigos, acima de tudo. Haru entrou na carruagem e deixou que uma lágrima escorresse.

Em sonho, revia o caminho até a antiga casa. No alto da colina, entre casas de pedra e telhas simples. Desceu da carruagem, pensou em visitar Lucille, mas lembrou que ela havia se mudado quatro anos antes. Subiu as escadas com a mala, ajeitou a blusa e ostentou o maior sorriso.

Abriu a porta devagar. Ouviu os passos dos pais vindo dos fundos da casa — provavelmente estavam na cozinha. Respirou fundo e gritou:

— Estou em casa!

— Haru!

Com a voz alegre dos pais chamando seu nome, o jovem despertou.

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