Contra o Mundo Brasileira

Autor(a): Petter Royal


Volume I

Capítulo 16: Motim e desejo doentio (parte I)

Peppe estava na cabine, dormindo tranquilo, quando acordou de forma súbita com os barulhos do lado de fora.

Patf! Patf!

A porta caiu no chão, arrombada por cerca de cinco homens vestidos de uniforme. Três deles empunhavam armas do lado de fora, enquanto os outros dois invadiram o compartimento.

— Olha só, chefe! Tem uma mulher aqui, e eles não têm bracelete. Hehehe...

Pela malícia no olhar, as intenções daqueles homens eram as piores possíveis.

— Que porra é essa, caralho! — O rapaz pulou de uma das camas. — O que vocês querem, seus filhos da puta?

Eles não responderam. Houve apenas uma troca de olhares. Um deles, ao fundo, pareceu assentir.

Não demorou para os demais sorrirem e se virarem para os hóspedes na cabine.

Peppe viu os espadins em movimento. Eram dois. Os outros três marujos foram direto para a escrava.

— Que audácia!

Peppe desviou dos golpes com um pouco de dificuldade. Não eram rápidos, mas também não eram lentos demais. Agachou-se para evitar uma estocada e, em seguida, girou sobre si mesmo, aplicando uma série de movimentos estranhos que, por fim, derrubaram um dos atacantes.

Eles ficaram atordoados. Um segundo se passou, e o jovem à frente girou as pernas, escapando das espadas. No instante seguinte, as espadas caíram de suas mãos. E, antes que pudessem reagir, ambos estavam no chão.

— Toma!

Peppe os finalizou com um movimento chamado "queixada" (autoexplicativo), desmaiando os oponentes.

Logo em seguida, virou sua atenção para os outros três ao fundo. Eles também ficaram atordoados. Nunca tinham visto movimentos tão estranhos, mas ao mesmo tempo tão suaves e bonitos quanto aqueles.

Uma voadora derrubou um deles, enquanto os outros dois tentavam sacar as armas antes de sofrerem.

Não adiantou. Antes de cair no chão, ainda durante o salto, as pernas de Peppe se abriram e dois poderosos chutes derrubaram os oponentes.

"Caralho! Esse corpo é muito bom!", pensou Peppe, antes de se virar para ver Floquinho.

Por incrível que pudesse parecer, a criaturinha branca continuava em seu repouso, tranquila ao fundo. Ele ocupava sozinho uma das três camas do quarto, a que ficava mais longe da janela e do barulho de fora.

Apesar de ser o espírito da ganância, também era bem preguiçoso e dormia muito.

Peppe resolveu deixá-lo lá. Não era bom incomodar uma criatura mística que, supostamente sozinha, era portadora da sétima parte da maldade do mundo.

Foi então socorrer sua escrava.

— Sara, tudo bem?

Ela fez que sim, os olhos arregalados e cheios de lágrimas, a mão trêmula tapando a boca. Nem parecia que semanas antes estivera envolvida em um plano maléfico para assassinar o príncipe de uma nação.

— Olha, temos que descobrir que porra tá acontecendo. Tem muito barulho lá fora. E esses filhos da puta tentaram nos matar.

Ela assentiu, correndo para se trocar e pegar a besta e mais algumas aljavas.

Peppe apenas agarrou a própria espada e saiu correndo de pijamas e meia para o meio do caos.

— Esconda-se, mas me siga de perto. Vamos tentar evitar o confronto direto e descobrir o que caralhos tá rolando sem nos meter demais.

— E o Floquinho?

Peppe pensou um pouco.

— Melhor deixá-lo aí. Ele vai ficar bem.

Eles correram, evitando o combate e seguindo o fluxo do corredor até a cabine do capitão. Sara contorceu o rosto com algumas das cenas e gritos ao longo do caminho; Peppe também. Mas estavam em desvantagem numérica, e o rapaz não tinha certeza se conseguiria enfrentar mais de cinco oponentes simultaneamente. Não sem a ajuda do Gal Floquinho, pelo menos.

Mas o tempo era curto, e acordar um espírito ancestral apenas para bancar o herói não parecia um bom plano. Mesmo que o fizessem, ainda eram muitos oponentes e provavelmente não ajudaria muito.

"Preciso sair daqui e levar Sara comigo em segurança". Esse era o plano.

Ao chegar ao objetivo, acabaram ouvindo as conversas da tripulação com os amotinados e finalmente entenderam o que tinha acontecido.

Em resumo, era uma revolução. Aquele navio de passageiros tinha como objetivo a cidade de Gálica, no Império das Rosas. A viagem durava cerca de oito dias e ainda estavam no final do segundo dia.

Mal tinham cruzado as fronteiras.

O plano dos rebeldes amotinados, pelo que parecia, era dominar a tripulação monarquista e chegar até Gálica, depois fazer um desvio até os domínios de um dos nobres da região que os apoiava. Lá, conseguiriam armas e suprimentos.

— Você vai levar a gente até as rotas do noroeste, capitão! Ou todos vão virar picadinho, ração de peixe — disse o líder dos amotinados.

Peppe e Sara estavam esgueirando-se em um dos corredores laterais, bisbilhotando a cena pela janela. 

Reparando bem no lider do motim, o rapaz, que era o príncipe herdeiro de Tullis, percebeu que portava algo interessante. Um anel com um símbolo que não lhe era estranho. Parecia ser de alguma das casas nobres de Tullis, embora não conseguisse puxar da memória qual, afinal, o antigo príncipe não se importava com política interna (ou não teria sido assassinado). 

"Mas que caralho!", xingou internamente o rapaz, antes de se virar para Sara.

— O que fazemos? — Ela perguntou.

— Eles estão por trás disso! Precisamos sair dessa merda, antes que arranjemos mais problemas. É melhor irmos a pé até uma cidade qualquer. De lá, pegamos outro barco.

Ela concordou.

— Venha. Vamos ver se tem bote salva-vidas nessa porra.

Ele sinalizou para ela, pronto para dar meia-volta, quando sentiu um vulto passando bem perto de si.

— Caralho! — disse, aparando por reflexo dois fortes golpes metálicos na altura do pescoço.

A visão a seguir o surpreendeu.

Cabelos pretos como a noite, olhos azuis. Um rosto branco, pálido. Aquela era uma beleza de tirar o fôlego. Vendo-a assim, nem parecia que estava sofrendo uma tentativa de assassinato.

— Bom, muito bom! Own! Já consigo sentir...

Ela balbuciava algo estranho. Balançava as pernas como quem não se importava de estar em batalha.

— E-eu... Eu ia esperar você ir pegar o bote. Então iria apenas atingi-lo com minha lâmina à distância e cortar o bote em dois. Depois, tudo o que teria que fazer era acertar algo envenenado em você e ficaria tudo bem — ela explicou, impassível.

Peppe engoliu em seco. Aquele era mesmo um plano terrível.

— Mas não consigo resistir! Você... você... é tão! Ãn! Preciso daquilo de novo! Vamos! Venha! Venha!

Cada palavra que se seguiu vinha acompanhada de um golpe de adaga.

— Venha! Venha!

Shiiin! Shiiin!

— Venha!

A assassina era implacável. Apenas três golpes, e sangue já escorria por várias partes do corpo do rapaz.

Embora tivesse conseguido, por reflexo, desviar os golpes de suas partes vitais, ainda levou muitos cortes superficiais naquela troca.

E a assassina começava a ficar impaciente.

Ziiift!

Um projétil voou, transpassando o espaço entre a assassina e Peppe.

Era Sara, que mirava na inimiga com ferocidade e rapidez.

— Fique fora disso! — respondeu a assassina.

Em sequência, três dardos de ferro voaram para Sara. Um deles atingiu em cheio sua besta, partindo-a em dois.

O desespero tomou conta da garota. Ela não sabia o que fazer. Peppe estava encurralado, a assassina parecia disposta a continuar o serviço. Em breve, a tripulação de rebeldes perceberia o conflito e viria até ali. E Floquinho estava dormindo.

"É isso!", ela pensou. Em seguida, correu desesperada.

A assassina riu, atirando outro dardo ainda enquanto trocava golpes com o rapaz.

Por sorte, não acertou nenhuma parte vital de Sara, mas transpassou a lateral de sua coxa, causando muita dor e forçando-a a parar onde estava.

— Sua vagabunda! — Peppe xingou, tentando acertar a espada na cabeça da assassina.

Porém, não adiantava. Ela era muito ágil. Quando ele pensava em acertá-la com um golpe, três cortes já vinham em sua direção. Sua capoeira, dependente de giros e chutes amplos, era inútil naquele corredor apertado contra uma oponente que usava adagas curtas e golpes rápidos como picadas de cobra.

Ele sentia que qualquer "martelo" ou "armada" terminaria com ele perdendo uma perna.

E não era nada proficiente em esgrima. Embora seus reflexos sobre-humanos o ajudassem a não morrer, era apenas isso. Sua capacidade de ataque era baixa; não conseguia infligir dano à assassina.

Fugir também não parecia uma opção. Ela não parecia disposta a permitir.

— On?! Você ainda não aqueceu? Por que não revida? — Ela perguntou, atônita. — Cadê aquele aperto? Aquela mão quentinha no meu pescoço, me tirando o ar... Ãn!

Peppe não entendeu. Talvez porque estivesse inconsciente quando o espírito da ganância assumiu seu corpo na luta anterior.

— Vamos! Dê-me! Venha e me trata como uma vagabunda! Venha! Tira meu ar de novo — Ela pediu.

— Mas que cacete é isso, sua puta?!

— Isso, me trata como sua putinha, vem! Se você me apertar daquele jeito outra vez, eu vou ser a sua vagabunda.

"Que caralho! Eu vou morrer pra uma psicopata maluca, de novo..."

Peppe estava atônito. Nem os guardas do castelo haviam sido tão implacáveis com ele antes. E ainda assim, parecia que ela queria um romance!

Naquele momento, um arrependimento profundo tomou conta dele.

"Deveria ter acordado Floquinho", pensou.

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