Volume 1

Capitulo 12: Quebrado

Reuni todas as minhas forças e cambaleei até Kron. Senti meus ossos partirem, mordi minha língua de dor e puxei para longe. A figura negra e intimidadora se revelou como uma estátua. As pupilas de Kron estavam dilatadas e se mexendo loucamente, vidradas na estátua aterradora.

Balancei-o de um lado para o outro enquanto um barulho de goteiras macabras preenchia todo o ambiente. Tentei trazê-lo de volta à existência, mas nada funcionava. Bati em seu rosto, tentando trazer qualquer fio de sanidade à sua mente.

— Ai! Kenshu! — Seus olhos retornaram ao normal.

— Me-me desculpe por isso… e pelo que falei. Não sei o que deu em mim.

— Eu que preciso me desculpar. Sei que nunca falaria algo assim.

— Obrigado pela confiança. Agora, vamos sair desse lugar. Minhas mãos estão tremendo — falei, apoiando-me em Kron.

— Essa estátua, o que ela faz aqui? — Ele falou, olhando por cima do ombro.

— Talvez seja algo das grandes guerras, para estar em ruínas dessa forma.

Olhei melhor para as pedras, que pareciam brancas em um passado distante, agora sujas e corroídas. A estátua estava completamente manchada por um líquido negro que caía do teto.

Senti algo frio em meu pescoço, coloquei rapidamente a mão e pude sentir um líquido viscoso com coloração negra que evaporou em segundos. Kron me olhou confuso, e eu decidi apenas ignorar.

Em meu bolso, busquei o frasco de vidro com o líquido roxo e fedido. Estava meio cheio ou meio vazio. Irei me considerar um otimista e considerar meio cheio. Continuamos nosso caminho para o local do desabamento. Fiz uma prece em élfico para Bale não ter retornado.

— Essa guerra, qual era seu propósito? — disse Kron.

— Vencer.

— E valeu a pena?

— Claro, nós ganhamos a guerra… — olhei para as dog tags em meu braço.

— Bale me falou que ele estava do lado perdedor e todos perderam de alguma forma.

— A guerra tira muitas coisas… — Encarei minhas dog tags e sorri levemente.

— Entendo…

— Não precisa ficar triste. Um dia posso te contar minhas aventuras.

— Promete?

— De dedinho — Apertamos nossos dedos mindinhos como duas crianças. — Por que você entrou nesse lugar mesmo?

— Essa caverna… me lembrou a ruína onde eu morava com minha mãe.

— Entendo, mas seria bom não entrar em cavernas desconhecidas com estátuas macabras, ok?

— Sim! Mas… não era uma estátua — suas palavras apareceram junto à minha curiosidade.

— Então o que era? — o olhei confuso.

— Minha mãe estudava coisas assim, era uma tumba — um arrepio gélido percorreu minha espinha.

— Eu… prefiro não pensar mais sobre isso.

— Ok! Como você está se sentindo? — Kron encarou minhas pernas enquanto me dava apoio.

— Dói como se meu osso estivesse prestes a sair do lugar.

— Que bom, significa que você sente ele no lugar certo.

— Não me parece algo para se comemorar. Só espero que não infeccione.

— Seria fácil tratar, só arrancar o membro ruim e tudo ficaria novo.

Reuni todas as minhas forças e cambaleei até Kron, sentindo meus ossos partirem. Mordi minha língua de dor e a puxei para longe, enquanto a figura negra e intimidadora se revelava como uma estátua. As pupilas dilatadas de Kron se mexiam loucamente, fixas na estatua aterradora.

Balanceei-o de um lado para o outro, enquanto um barulho de goteiras macabras preenchia todo o ambiente. Tentei trazê-lo de volta à existência, mas percebi que nada funcionava. Bati em seu rosto, buscando trazer qualquer fio de sanidade à sua mente.

— Ai! Kenshu! — Seus olhos retornaram ao normal.

— Me-me desculpe por isso… e pelo que falei, não sei o que deu em mim.

— Eu que preciso me desculpar, sei que nunca falaria algo assim.

— Obrigado pela confiança, agora vamos sair desse lugar, minhas mãos estão tremendo — falei, apoiando-me em Kron.

— Essa estátua, o que ela faz aqui? — Ele falou, olhando por cima do ombro.

— Talvez seja algo das grandes guerras, para estar em ruínas dessa forma.

Olhei melhor para as pedras, que pareciam brancas em um passado distante, agora sujas e corroídas, a estátua completamente manchada por um líquido negro que caía do teto.

Senti algo frio em meu pescoço, coloquei rapidamente a mão e pude sentir um líquido viscoso com coloração negra que evaporou em segundos. Kron me olhou confuso e eu decidi apenas ignorar.

Em meu bolso, busquei o frasco de vidro com o líquido roxo e fedido, estava meio cheio ou meio vazio. Irei me considerar um otimista e considerar meio cheio. Continuamos nosso caminho para o local do desabamento, fiz uma prece em élfico para Bale não ter retornado.

— Essa guerra, qual era seu propósito? — disse Kron.

— Vencer.

— E valeu a pena?

— Claro, nós ganhamos a guerra… — olhei para as dog tags em meu braço.

— Bale me falou que ele estava do lado perdedor e todos perderam de alguma forma.

— A guerra tira muitas coisas… — Encarei minhas dog tags e sorri levemente.

— Entendo…

— Não precisa ficar triste, um dia posso te contar minhas aventuras.

— Promete?

— De dedinho — Apertamos nossos dedos mindinhos como duas crianças — por que você entrou nesse lugar mesmo?

— Essa caverna… me lembrou a ruína onde eu morava com minha mãe.

— Entendo, mas seria bom não entrar em cavernas desconhecidas com estátuas macabras, ok?

— Sim! Mas… não era uma estátua — suas palavras despertaram minha curiosidade.

— Então o que era? — o olhei confuso.

— Minha mãe estudava coisas assim, era uma tumba — um arrepio gélido percorreu minha espinha.

— Eu… prefiro não pensar mais sobre isso.

— Ok! Como você está se sentindo? — Kron encarou minhas pernas enquanto me dava apoio.

— Dói como se meu osso estivesse prestes a sair do lugar.

— Que bom, significa que você sente ele no lugar certo.

— Não me parece algo para se comemorar, só espero que não infeccione.

— Seria fácil tratar, só arrancar o membro ruim e tudo ficaria novo.

— Quem te ensinou essas coisas?

— Minha mãe, ela sempre me dava doces após arrancar meus dentes.

— Um costume meio exagerado para dentes de leite.

— Dentes de leite? — Quase tropecei quando ele me olhou confuso.

Ri em meus pensamentos, agradecendo pela pouca infância pacífica que tive antes de tudo. O cheiro de terra úmida encheu minha cabeça, pensamentos de como Bale ficaria raivoso quando chegasse e não estivéssemos lá, vieram à minha mente logo em seguida.

Me arrastei apressado, suor frio escorria pelo meu pescoço. Talvez ficar quieto e deixar Kron falar seria a melhor escolha. Bale não gostaria de ficar ouvindo minhas desculpas.

Nos aproximamos onde o cadáver do urso-coruja repousava. O suor escorria por meu rosto, a cada sombra que parecia mover, meu coração parecia parar. Suspirei aliviado quando não achei a alta sombra vermelha nas proximidades.

Me sentei no corpo do nosso inimigo derrotado, as penas me espetavam mesmo após sua morte. Achei que nunca lutaria contra um que não desaparece até morto.

— Ei Kron, você acha que consegue se transformar nesse aqui? — cocei meu queixo com curiosidade.

— Hmmm…Hmmmm! — Kron fechou os olhos e cerrou os dentes, soltando uma fumaça pela cabeça — Parece que não.

— Talvez seja muito forte para você — ideias de como essas transformações poderiam ser úteis surgiram em minha mente.

— Será que o Bale voltou e foi nos procurar?

— Caso eu tenha sorte, nem deve ter voltado — suspirei aliviado — Costumo deixar bilhetes nessa situação.

— Estou sem papel e carvão, mas poderíamos ter entalhado nas rochas, iguais aos antigos.

— Haha! Elfos das cavernas, seria algo bom de se imaginar.

— Minha Mãe falava que os elfos antigamente viviam na lua azul.

— Uma boa história, mas todos os antigos vieram do mundo das fadas.

— Sério!? Que incrível! Eu sempre quis ver uma fada — Seus olhos ofuscaram minha visão.

— Quem sabe um dia.

— Achei uma saída — A voz de Bale soou como uma brisa macabra.

— Você deveria avisar quando está chegando.

— Venha, Temos que escalar um pouco — Ele me ignorou friamente.

— Ei, qual seu problema comigo? — Cerrei meus punhos.

— Ande ou vai ficar aí — Bale falou, coletando algumas penas do urso coruja.

— Nós somos soldados, deveríamos saber trabalhar em equipe — Falei forçando um sorriso.

— Eu nunca trabalharia com você em condições normais.

— Mas…

Bale começou a marchar, liderando o caminho. Mordi minha língua até sangue escorrer. Kron ofereceu apoio para me levar, tantas humilhações em tão pouco tempo.

Pendurei minha raiva por enquanto, tentando não começar uma briga em território hostil. A dor me ajudou a esquecer isso, a cada vez que eu pisava, sentia meus ossos se mexerem.

A paisagem logo mudou. Em vez de rochas sujas de barro nojento, agora vimos restos de ruínas cobertos pelo mesmo barro. Pareciam ter sido escavadas recentemente. Ao final da ravina, avistamos uma escada artificial com grandes degraus.

Eu juro que, caso eu sobreviva, nunca mais vou beber. Nos aproximamos das enormes escadas de terra batida. Kron e eu subimos com dificuldade, degrau após degrau. Contudo, na última subida, algo me fez suar frio: uma figura humanoide, velha e seca, enrolada em trapos sujos de terra, nos observava lá de baixo. Ela carregava apenas uma adaga com um brilho roxo.

Encarei a criatura por alguns segundos, até que Kron me puxou para cima. Virei, incapaz de gritar. Ambos se olharam confusos, e como num reflexo, apontei para onde a figura estava. Apenas um amontoado de barro descansava ali. Bale murmurou algo ao subir até o topo, enquanto Kron me erguia até o último degrau. Seu corpo pequeno o fazia parecer fraco, mas agora eu conseguia notar sua verdadeira força.

Finalmente retornamos à paisagem verde, escondida pela escuridão da noite, selvagem e bela. Kron se abaixou, encarando algo no chão. Ele olhou para os lados e apontou.

— Pegadas pequenas, seguindo para lá.

— Ótimo, vamos para o outro lado — Falei com dificuldade para permanecer em pé.

— São de Pesadelo?

— Não sei, mas parece estar sozinho.

— Eu vou à frente.

— Ao menos podemos ter certeza de que algo irá pular em nossas gargantas — Encostei-me numa árvore próxima.

Kron me levou pelo caminho. Bale já havia sumido há tempos, mas parecia que Kron ainda o seguia com os olhos, talvez por alguma magia sanguínea, como minha armadura.

O tempo passou, e Kron continuava acompanhando as pegadas. Mesmo que eu não enxergasse nada ali, continuei tentando achar. Nunca imaginei que técnicas de rastreio fossem tão úteis.

— Talvez pudesse rastrear melhor transformado em cachorro ou algo do tipo.

— Tem razão, mas acho que acabamos de chegar ao final — Os olhos de Kron saíram do chão e foram quase até o céu.

Em nossa frente, uma enorme montanha se erguia, e uma pequena construção de madeira era visível. Bale surgiu das sombras com seu olhar rígido e frio, segurando uma pequena placa de metal.

— O que é… — Fui ignorado.

— Vamos subir a montanha para termos uma visão melhor.

— Mas o Kenshu continua debilitado.

— Que novidade — Bale sussurrou.

— Eu estou bem, consigo aguentar uma subidinha.

— Certo… Eu vou te ajudar, para ser mais rápido.

Com nossa rota traçada, iniciamos a subida pelo caminho natural da montanha. Esse lugar não parecia ser muito movimentado, mas havia a construção no começo. Imaginei se essa Ordem do Sol sabia dessa ravina, ou mesmo das vilas próximas.

Mesmo durante a guerra, eu nunca havia sentido tal dor. Meus ossos pareciam se mover, e meus músculos ameaçavam se romper. Mesmo com a ajuda de Kron, o terreno difícil apenas piorava tudo.

O topo parecia longe, e a cada passo eu sentia que ele ficava ainda mais distante. Várias vezes perdi a conta do tempo que estávamos subindo, até que algo me trouxe de volta ao mundo: algumas pedras desceram rolando do caminho mais acima.

Expandi meu senso de alerta e saquei meu machado. Bale também sacou uma espada curta e fixou seu olhar, buscando pelo que poderia ter causado isso. Minutos se passaram e nada pulou em nós. Continuamos com as armas em mãos e voltamos a subir com cautela.

— Bem, sem inimigos por enquanto.

— Ei, Kron, achei isso na ravina.

— Nossa, está muito sujo.

— Reconhece o símbolo?

— Parece com o da Ordem do Sol Sagrado.

— Isso é mágico?

— Não.

— Vale alguma coisa?

— Talvez.

— Então por que está com isso?

— Souvenir.

— Você fica levando coisas inúteis?

— Claro, você é mais uma.

— Que tipo de soldado indisciplinado você é? Se fosse no meu esquadrão, seria chicoteado.

— Esse é o problema de vocês.

— Me diga, você lutou na Batalha do Mar Congelado?

— Sim.

— Então deve saber que só conseguimos derrotar esses bárbaros com trabalho em equipe.

— Bárbaros...

— Pessoal, se acalmem, por favor.

— Nós tínhamos nomes, antes desse apelido.

— O quê?

— Nosso povo se chama Auralianos.

— Vocês começaram essa guerra!

— Nossas crianças aprenderam a lutar, seus velhos a compraram.

— Fui enganado por uma mentira, típico.

— Eu cumpri ordens! Como um soldado!

— Vá, Kenshu, mate o inimigo — Uma voz familiar sussurrou em meu ouvido.

— Todos daqui eram cachorros descartáveis.

— Se me odeia tanto, por que salvou minha vida tantas vezes?

— Pelo Kron — Bale virou as costas para mim.

Um ataque... tudo que eu precisava para matar meu inimigo. Não é limpo, mas não se ganha guerras jogando limpo. Segurei meu machado com firmeza, suor frio escorreu do meu pescoço. Eu estava pronto para saltar nele, mesmo sem conseguir sentir minhas pernas direito. Porém, eu vi Kron tampando as orelhas, sussurrando algo para si. Eu não consigo. Guardei meu machado e andei cabisbaixo. Conseguia enxergar minha respiração congelada. Mesmo o brilho acolhedor de Kron havia sumido, engolido pela aura de desespero dessa floresta. Mesmo um Pesadelo teria sido congelado até a morte se estivesse aqui.

Expandi minha aura buscando algum calor reconfortante, mesmo que pouco. Pude sentir ela me envolvendo, apenas uma magia. Esfreguei minhas mãos várias vezes para espantar a dormência, até que meus olhos cansados se depararam com o que parecia um acampamento improvisado.

Nos aproximamos com cautela, e Bale já avançou mais à frente para assegurar o caminho, ou talvez só não quisesse olhar na minha cara. Kron farejou o lugar e não encontrou nenhum sinal de quem poderia estar aqui, exceto um buraco escondido por um pano, tão pequeno que nem mesmo Kron caberia.

— O que poderia se esconder em um lugar assim? — perguntei

— Um rato, um gato, uma raposa, um... — Kron acresentou

— Chega. — Falei cansado

— Corvos! — Bale berrou

— Eu falei... — fui interrompido por uma visao horrivel.

Uma nuvem pairava solitária no céu, movendo-se como um pássaro fixado em suas presas. Um barulho de corvos rasgou o silêncio macabro da floresta, ecoando no ar frio da noite algo que parecia vir de todos os lados.

Bale se jogou à nossa frente, e logo atrás dele uma nuvem de dezenas de corvos se agitava com fome, olhos famintos virados em nossa direção. Engoli seco quando a nuvem que estava pairando no horizonte mergulhou em nossa direção. Pouco a pouco, a nuvem se revelou como um bando ainda maior de corvos, todos pingando líquido escuro e tingidos com uma luz verde.

Ambas as nuvens se juntaram em um amalgamado bizarro de corvos, formando uma versão maior, coberta por ossos tortos, formando uma armadura macabra. Runas verdes coloriram a noite escura. Quando seu olhar encontrou o meu, pude sentir a verdadeira sensação de ser a presa da noite.



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