Volume 1

CAPÍTULO UM: Bad Boys Populares Se Dão Bem no Ensino Médio

Uma comitiva de estudantes em blazers descia pela calçada elevada que margeava o rio. Uma chuva de pétalas de cerejeira dançava no ar, pousando em seus cabelos e ombros. Sob os blazers, vestiam camisas brancas impecáveis com saias xadrez desproporcionalmente longas ou calças ainda folgadas, compradas para durarem. Sapatos sociais novos, ainda não amaciados pelo uso, ecoavam a cada passo.

Clunc, clunc, clunc.

Tsch, tsch, tsch.

O ritmo dos meus sapatos Stan Smith surrados e manchados destoava do som metálico dos sapatos novinhos em folha.

De repente, notei que meu cadarço estava desamarrado e me agachei para amarrar. Minha mochila, Gregory, já bastante usada, escorregou de lado, fazendo minha outra mochila de escola balançar no ombro.

Enquanto me abaixava, observei a cena ao meu redor, sentindo algo mexer dentro de mim. O sol suave da primavera. O murmúrio do riacho abaixo. Os calouros caminhando ao meu lado, indo para a escola cheios de expectativa entre colegas ainda desconhecidos. Que amizades inquebráveis se formariam? Quem acabaria namorando? Tudo ainda estava por vir.

"Saku Chitose da turma 5 é um cafajeste comedor de casadas."

Estudantes do ensino médio são o centro do universo. Você vê isso em toda a mídia também. Pense bem. Todo romance, mangá, série ou filme hoje em dia tem um adolescente como protagonista. Nunca é uma criança do fundamental, né? E só de vez em quando aparece um universitário ou adulto trabalhador. A própria palavra "juventude" é sinônimo de ensino médio. É como se, quando você cresce e vira adulto, fica com saudades daquela época e fica todo emocionado. Quer relembrar aqueles três anos levemente constrangedores, mas realmente preciosos.

[TMAS: É que depois do ensino médio a gente vira escravo da faculdade e do trabalho, ai não tem mais diversão. / Mon: Diz o universitário que está traduzindo uma LN por diversão…]

...Mas isso é tudo superficial.

A verdade é algo que todo mundo sabe. Se você tiver sorte, passa os dias zoando com os amigos, entrando em brigas bestas, depois dando risada e abraçando todo mundo. Você declara seus sentimentos para aquela garota que sempre admirou. Espera o treino do clube dela acabar e, no caminho de volta, param num banco de praça para conversar. Vão juntos ao festival de verão de yukata e assistem aos fogos de artifício. Andam de mãos dadas até um cantinho escondido do santuário e, quando ninguém está olhando, têm sua primeira... você sabe. Coisas assim. Mas só alguns privilegiados vivem esses momentos melosos e de tirar o fôlego. Só aqueles que conseguem escalar até o topo da hierarquia escolar e se tornam a elite, os poucos, os populares.

Existem os populares e os impopulares.

Sempre odiei essas definições, por mais comuns que sejam. Desde que esses termos surgiram, os estudantes só se importam com uma coisa:

Por favor, deixem eu ser popular. Ou pelo menos não ser um fracassado. Por favor.

A cerimônia de entrada para a qual os calouros se dirigiam era só o primeiro round da batalha. Quando voltassem por essa calçada mais tarde, já teriam uma boa noção do que os esperava. Saberiam quais colegas seriam a alma da turma e quais estavam destinados a passar três anos tentando se fundir às paredes. Se não estivessem nervosos agora, bom, então só podiam ser malucos.

"Saku Chitose da turma 5 é um cafajeste comedor de casadas."

Não acreditem no que a sociedade diz, calouros. Esqueçam quem é bonito ou feio. Esqueçam quem é "sociável" e quem é "antissocial". Mandem todo mundo à merda — e sejam apenas uma pedrinha que rola para onde bem entender. Depois de um ano batendo e colidindo uns com os outros, vocês vão se tornar pedras redondinhas e polidas mesmo.

Na minha posição de estudante do segundo ano, já marcado como "popular" por todos, me sentia mais do que qualificado para dar conselhos a esses novatos.

Clunc, clunc, clunc.

Tsch, tsch, tsch.

A brisa quente nas minhas bochechas dissipava os últimos vestígios do inverno deprimente da região de Hokuriku.

A primavera é a estação dos novos começos. O azul pastel do céu, os cabelos negros esvoaçantes e as saias balançando das garotas, o rosa envergonhado das bochechas — tudo falava de novos encontros, novas possibilidades românticas. Enquanto caminhava para a escola, tinha um passo leve, como um velho animado a caminho de seu banho público favorito, administrado por um velho amigo de infância.

"Saku Chitose da turma 5 é um cafajeste comedor de casadas."

Sabe, eu fico lendo e relendo esse post, mas parece que alguém tem uma implicância comigo. Usaram meu nome completo e tudo.

Soltei um sorriso torto ao olhar para a tela do meu celular. Nos últimos minutos, eu ficava pegando ele do bolso, olhava, guardava e fazia de novo.

No meu celular, estava aberto o site secreto de fofocas da escola.

É tipo um fórum anônimo, e cada escola tem sua própria seção onde qualquer um pode postar o que quiser. Tem muita coisa lá. Era super popular há uns dez anos, mas virou um "problema social" por causa do bullying virtual e começou a cair no esquecimento.

Bem, hoje em dia temos Twitter e LINE para desabafar. Mas essas plataformas têm riscos. Um passo em falso, e sua identidade pode ser descoberta num piscar de olhos. Então nós, a elite da Fuji, a melhor escola de Fukui, voltamos a usar os fóruns secretos para falar mal, criticar e zoar, e eles estão tendo um certo revival ultimamente.

"Ele é um bundão que não dá conta. KKKKK!"

"Pois é, ouvi dizer que ele broxou quando tava transando com aquela veterana. LOL"

Ei! Essa aí eu não vou deixar passar!

Meu ânimo caiu ao ler os comentários concordando com o post. Ser chamado de comedor, tudo bem, até assumo essa. Mas rumores sobre meu desempenho sexual? Isso pode afetar seriamente a autoestima de um garanhão como eu.

E mais uma coisa... Os outros alunos pelo menos ganhavam codinomes ou iniciais. Por que só eu tenho meu nome real exposto enquanto esses otários me esculacham? Ah, e meu nome surgiu nesse site logo depois da cerimônia de entrada do ano passado e nunca saiu do ranking anual de palavras-chave.

Quase todos os posts sobre mim eram difamações.

Por que não escrevem algo legal de vez em quando? Tipo: "O Chitose é um gostoso! Queria estar nos braços dele agora!"?

"Bom dia, Saku. Por que está parado aí?"

Alguém tocou meu ombro, e me virei para ver Yua Uchida, que ficou na minha turma no ano passado. Ela sorria, com uma expressão que lembrava um girassol radiante.

Seu cabelo longo estava puxado para um lado do ombro, balançando levemente com o vento. Quando sorria — o que era frequente —, seus olhos se apertavam de um jeito fofo que provavelmente poderia acabar com todas as guerras e trazer paz à humanidade. Ela não era exatamente a garota mais linda da escola, mas era o tipo de pessoa cujo nome surgia nas viagens escolares quando o assunto era "quem é gostosa e quem não é".

Na verdade, no começo, ela nem se destacava, mas foi desabrochando ao longo do ano, saindo da fase de colegial. No segundo semestre, naturalmente começou a se aproximar de nós, os populares.

"Bom dia, Yua. Olha isso."

Balancei meu celular no ar, e Yua se aproximou para ver a tela. Quando ela se inclinou, senti o cheiro do seu shampoo. Cheirava a algo natural.

"Ah, isso. Bom, não precisa se preocupar."

Yua sorriu, apertando os olhos, e me deu um tapinha nas costas, como se estivesse me tranquilizando.

"Desculpa? Mas essa é uma reação adequada? Parece que você está dizendo: 'Bom, não tem como negar, então supere.'"

"É exatamente o que estou dizendo. Olha, Saku. Você é gostoso, as garotas te amam, é óbvio que vai ter haters. É tudo inveja."

Pra ser sincero, eu concordava com a Yua. Era inútil até tentar descobrir quem estava escrevendo essas difamações online sobre mim. Podia ser o Zé Valentão, o cabeça-oca que arrumei briga logo antes das férias da primavera. Ou podia ser um cara aleatório com rancor de mim, alguém que nem passa pela minha cabeça.

Pense em qualquer artista famoso... um ator, músico, escritor, o que seja. Quanto mais popular eles ficam, mais haters acumulam ao mesmo tempo. Tem montes de idiotas por aí que querem derrubar pessoas bem-sucedidas e expor seus pontos fracos.

Na verdade, quando sua proporção de fãs para haters é meio a meio, é aí que você sabe que está indo bem. O que realmente me assustaria é não ser alvo de fofocas.

"Mas é loucura! Tipo, olha só: um cara supergato, estiloso, bom nos esportes, com notas excelentes, que se dá bem com todo mundo, supergentil, um líder nato — e ainda por cima com um senso de humor afiado e piadas sujas impecáveis. Eu sou ótimo. Por que me odeiam?"

"Se você realmente não consegue adivinhar, ficarei feliz em explicar. Mas tenho a impressão de que você já sabe."

 

 

Ao passar pelo portão da escola - já tão familiar - pegamos nossas cópias das listas de turmas que estavam sendo distribuídas. A partir do segundo ano, as turmas seriam divididas entre ciências exatas e humanas, e a lista mostrava essa divisão. Pessoalmente, eu preferia o sistema onde colavam as listas no mural - era mais emocionante de alguma forma - mas desse jeito fica mais fácil ver em qual turma todo mundo está, então faz mais sentido lógico.

Enquanto lia a lista, o rosto da Yua se iluminou.

"Sim! Estamos na mesma turma de novo. Mais um ano juntos!"

"Não somos só nós. A turma está basicamente igual ao ano passado."

"É, mas... você poderia pelo menos fingir que está animado por ficar na mesma turma que eu!"

Eu ri, ignorando o chilique da Yua, e examinei a lista com mais atenção. Além de mim e da Yua, todos os principais membros do grupo popular da Turma 5 do ano passado estavam reunidos novamente, tendo optado pelo curso de humanas.

Nossa escola tem a política de tentar manter os alunos juntos o máximo possível, mesmo quando precisam nos separar por áreas de estudo. Isso ajuda a reduzir o estresse de uma mudança abrupta de colegas e nos permite focar nos estudos em vez de ficar tentando fazer novos grupos de amigos o tempo todo. Você fica com sua turma, e as hierarquias sociais permanecem intactas. É uma política comum em escolas de alto nível focadas em vestibulares como a nossa. Então não foi exatamente uma surpresa.

Dito isso, além do nosso grupo original, havia vários desconhecidos de outras turmas misturados também. Um veterano uma vez me contou que tanto as turmas de humanas quanto as de exatas sempre acabam com essa mistura de alunos.

Apesar de tentarem evitar mudanças drásticas, como cada turma escolhe suas próprias matérias, há um limite do que o corpo docente pode fazer. Então alguns alunos acabam sem muitos amigos antigos em suas novas turmas, ou sem nenhum. Eles tentam resolver isso em parte juntando todos esses alunos - junto, é claro, com os encrenqueiros e os problemáticos. Depois tentam preencher as lacunas inserindo pequenos grupos de alunos populares que são bons em se dar bem com todo mundo.

Quero dizer, o corpo docente não admite isso, é claro. Mas todo mundo comenta como os segundos e terceiros anos definitivamente têm tanto "turmas dos populares" quanto "turmas dos solitários".

"E continuamos sendo a Turma 5 também. Poxa, eu até estava pensando que aqueles posts online sobre 'Saku Chitose da Turma 5' ficariam desatualizados. Mas por pelo menos mais um ano eles não precisarão de atualizações."

"Pois é. Aposto que esses anônimos ficarão felizes por não precisarem editar todas as mensagens para 'Saku Chitose da Turma 2' ou algo do tipo."

"Ei, de que lado você está mesmo?"

 

 

"E aí? Bom dia."

Levantei a mão num cumprimento casual ao abrir a porta da sala da Turma 5 do segundo ano, com uma voz animada e cheia de energia. Não fazia ideia de quem já estaria na sala, mas adaptei meu cumprimento para todas as possibilidades. Era definitivamente uma saudação para uma turma nova cheia de desconhecidos.

"Ei, Saku! Bom dia! Aaah, olá, Ucchi!"

Uma voz cortou o burburinho animado da sala, tão clara e marcante quanto um pássaro cantando na luz da manhã. A dona da voz era Yuuko Hiiragi, e embora seu cumprimento fosse descontraído e sem cerimônias, ela tinha a aparência de uma jovem elegante, a própria definição da princesa da turma.

Seu penteado devia ter levado três vezes mais tempo que o da Yua. Suas curvas estavam nos lugares certos; ela tinha aquele "corpo ideal" que fazia os caras olharem duas vezes. Você poderia colocá-la num grupo pop feminino com, tipo, vinte integrantes, e ela ainda se destacaria como uma das melhores. Todos bajulavam e mimavam Yuuko, e ela levava tudo naturalmente. Quase como se esperasse por isso. Tipo quando um bebê recém-nascido nem questiona se é fofo ou não. E ela era tão natural nisso que todo mundo aceitava de boa.

Às vezes, garotas perfeitas realmente existem — e não só como personagens principais de romances e mangás. Ela transcendia conceitos mesquinhos como ser metida ou arrogante e era aceita por todos.

Aliás, os alunos da escola basicamente já tinham decidido entre si que Yuuko e eu éramos o casal definitivo. Ou pelo menos, que ela era digna de ser a minha "primeira esposa".

[Mon: Por isso eu nunca fui de tentar ganhar popularidade, é muita máfia e fofoca envolvida, tenho paciência não.]

"Temos Yuuko, Kazuki, Kaito... Nossa, os principais estão todos aqui."

"Oi, Yuuko. Ei, vocês dois."

Yua e eu retribuímos o cumprimento de Yuuko e nos juntamos ao círculo onde ela e os outros estavam, enquanto eles naturalmente abriam espaço para nós.

"Eba! Estamos todos juntos de novo!"

Yuuko ergueu as duas mãos para um high five duplo comigo. Bati minhas mãos nas dela e depois entrelaçamos os dedos.

"Você também está feliz, Saku?"

"Claro. Se você e eu tivéssemos sido separados, Yuuko, eu teria que arrastar meu corpo desesperadamente pra escola todos os dias."

Yuuko sempre me tratou como o amigo engraçado. Ela não via problema em ser tão física comigo assim. Na verdade, ela provavelmente já tinha cumprimentado Kazuki e Kaito da mesma forma minutos antes.

Yuuko nunca sequer pensava em coisas como ser odiada ou considerada irritante pelos outros. Ela era muito carinhosa com todo mundo. E não agia assim só com a gente, os populares. Ela era assim até com os nerds. E, claro, eles interpretavam mal, achavam que tinham chance com ela e tentavam convidá-la para sair. Ela ficava com uma cara de ???. Já aconteceu tantas vezes que perdi as contas.

Por causa do jeito dela, ela sempre andava na linha tênue entre ser amada ou odiada por todos. Mas nunca ultrapassava esse limite. Yuuko era naturalmente doce e gentil, e tratava todo mundo igual, fossem populares ou esquisitos, meninos ou meninas. As pessoas adoravam isso nela. Por isso ela estava no topo da hierarquia, uma das garotas mais populares da escola.

Eu estava justamente refletindo sobre a popularidade de Yuuko quando Yua me lançou um olhar de desdém.

"Esse aqui estava se divertindo muito no caminho para a escola, espiando todas as calouras."

Yuuko também virou para me olhar, rapidamente enlaçando o braço de Yua e franzindo a testa.

"Eca, Saku, que assustador! Quando você já tem garotas lindas como a gente na sua turma!"

"...Vocês estão é com inveja porque não tiveram um gato como eu no ano acima esperando para avaliar a aparência de vocês no primeiro dia de aula. Não é, Yua?"

As duas adoráveis deram risadinhas e reviraram os olhos para mim. Estávamos nos divertindo — até que, de repente, alguém me acertou um golpe no abdômen. Ai.

"Foi mal, cara. Achei que você merecia uns socos."

O responsável era Kaito Asano, que me encarou com um sorriso provocador. Ele já era o astro do time de basquete e mal tinha começado o segundo ano. Era o típico atleta brincalhão, com um físico excelente e habilidades esportivas de primeira.

E era mais alto que eu. Só me restava torcer para que a calvície masculina o alcançasse no futuro.

[TMAS: Até o gostosão do segundo lugar consegue ter inveja, imagina quem não consegue ninguém]

"Tem que admitir que o timing foi bom. Ele teve que te cortar; essa pose de garanhão estava ficando cansativa pro seu 'harém'."

Kazuki Mizushino sorriu como um tubarão. Como ele já era o astro do time de futebol mal tendo entrado no segundo ano? Ele sempre agia tão descolado, mas o cara sabia o que estava fazendo.

E, indiscutivelmente, era mais bonito que eu. Só me restava torcer por um ataque de diarreia explosiva no meio da aula no futuro dele.

"Saku, você parece um tanto irritado."

...Hmph. E ele sempre apontava o óbvio.

"Tudo bem. Só estava pensando como vocês dois são uns insetos chatos tentando se meter entre eu e meu harém. Três é pouco, cinco é multidão, sabem? E eu cortaria essa história de 'concubinas' a não ser que queiram ver seus nomes no site de fofocas da escola em breve."

Todos riram quando eu retruquei Kazuki, de olho em Yua.

Sorrindo, Kaito jogou o braço no meu ombro.

"Ah, Saku. Os fóruns te pegaram de novo?"

"Vão se foder. Por que você parece tão feliz com isso?"

"Por que não estaria? Um cafajeste como você, que deixa garotas chorando pela escola... Você precisa sofrer as consequências, ou o cosmos vai sair do equilíbrio!"

"Se eu estou lá com meu nome real, esse babaca também deveria estar. É aí que o universo está desbalanceado."

Mas Kazuki apenas sorriu maliciosamente. "Desculpa te decepcionar, mas eu nunca deixo garotas chorando. Eu simplesmente amo elas e as deixo querendo mais."

"Ah, me poupe."

Agora que eu tinha terminado minha discussão com Kaito e Kazuki, limpei a garganta para mudar de assunto.

"Enfim, parece que o Time Chitose está de volta aos negócios."

"Eu prefiro Os Anjos da Yuuko Hiiragi."

"Nah, Os Bombardeiros Dinamite do Kaito."

"Agência Criativa do Kazu."

"Quinteto da Yua."

"Bom, hora de encerrar! Muitas diferenças criativas!"

Compartilhamos um choque de mãos para selar o acordo.

 

 

"Bom dia!"

"Opa, bom dia!"

A porta da sala continuava se abrindo enquanto estávamos conversando e zoando, com alunos chegando cheios de energia e olhos brilhantes. Todos pareciam nervosos, entrando numa nova sala e num ambiente social desconhecido.

"Ei, é o Chitose. Deixou o cabelo crescer nas férias? Posso cortar pra você."

"Não, valeu. Com você, vai acabar cortando uma artéria sem querer."

Haru Aomi era a garota que ofereceu o corte. Ela estava na Turma 3 no ano passado.

Tinha membros longos e era armadora no time feminino de basquete. Não era exatamente alta, mas tinha um físico de modelo — não magra demais, só esguia e de ossos pequenos.

Diferente de Yua e Yuuko, ela não fazia muita questão do cabelo, mantendo-o num rabo de cavalo curto para não atrapalhar. Não tinha os "atributos" das outras duas, mas havia algo no seu rabo de cavalo balançando e no pescoço exposto que chamava atenção.

Foi quando Kaito se intrometeu na conversa:

"Ei! Você devia me cumprimentar primeiro. Nós dois somos do basquete."

"Ah, já cansei da sua cara. Você é muito entediante. Né, Nanase?"

"Eu também já enjoei do Kaito. Mas tô feliz que Chitose e Mizushino estão aqui. Finalmente umas gostosuras pra olhar!" Yuzuki Nanase apareceu por trás do ombro de Haru, com cabelos brilhantes até os ombros que lembravam comercial de shampoo.

Ela também era da Turma 3 no ano passado, armadora do time feminino de basquete. Ela e Haru eram melhores amigas, provavelmente conhecidas em toda a província. Mas principalmente por suas jogadas na quadra.

Se fizessem uma enquete sobre a garota mais popular do ano, o nome de Nanase certamente apareceria ao lado de Yuuko. Se Yuuko era o tipo de ídolo pop que misturava fofura com status, Nanase era mais como uma atriz. Podia alternar entre papéis fofos e de beleza absoluta, de amigável a distante, de corajosa a uma florzinha frágil que dava vontade de proteger.

Pessoalmente, eu tinha a impressão de que ela era mais calculista que a Yuuko. A Yuuko era alheia aos próprios encantos, mas Nanase irradiava uma aura de perfeição meticulosamente construída. Eu sentia que ela estava sempre pensando em como era percebida na escola. Eu sabia porque fazia o mesmo.

Ambas tinham corpos incríveis, mas enquanto Yuuko era macia como marshmallow nos lugares certos, Nanase era firme e tonificada.

...Não estava falando dos seios. Tira sua mente daí.

Nanase sorriu, se aproximando de mim:

"Bom, agora que os gostosos estão todos aqui... Hora de banquetear os olhos! Mostrem esses peitorais, meninos!"

Kazuki e eu imediatamente entramos no teatro, cobrindo os peitos com as mochilas e gritando:

"Nããão! Não objetifiquem nosso corpo!"

"Mulheres só querem uma coisa!"

Aí Haru entrou na brincadeira:

"Ah qualé, não sejam tímidos, meninos. Só deitem e contem as manchas no teto. Acaba rapidinho."

"Hmm... que ano vocês nasceram mesmo? Por que tão agindo como executivos de publicidade dos anos 50?"

 

 

Enquanto nós dois estávamos gritando e pulando, Yua entrou na brincadeira e virou a "plateia" do esquete cômico das duas garotas. Ela não fazia parte há tanto tempo do grupo dos populares, mas ninguém diria isso nos vendo agora.

"Ucchi!" Haru gritou animada. "Perfeito, faltava uma provocadora na Turma 3 do ano passado! Nanase sempre desiste quando eu entro no modo comédia. Você devia ser minha nova parceira de humor!"

"Ucchi, quando ela passar dos limites, você tem que esculachar ela sem dó. E eu também", acrescentou Nanase.

"...Hmm, ok. Mas vamos começar de novo? A gente nem se conhece direito, então devíamos nos apresentar primeiro, né gente?" Yua piscou, olhando entre Haru e Nanase. Ah, ela estava realmente perdida. Mas essas eram duas das garotas mais populares da escola - todo mundo conhecia seus nomes. É assim que funciona.

Mas a princesa natural, Yuuko, estava de boa na lagoa:

"Yuzuki, Haru, que maravilha estar na mesma turma que vocês este ano! Sempre quis ser amiga de vocês. Mas não esqueçam que eu e Saku somos o casal! E a Ucchi é tipo... a amante dele, ok? Mas tirando isso... irmãs!!!"

[Mon: Me lembrou aquele áudio “Eu sou o amigo, eu sou a esposa do amigo, eu sou a professora, eu sou a amante”.]

Assim como Yua, Yuuko nunca tinha interagido muito com Nanase e Haru antes. Do seu jeito descontraído e atrapalhado, ela estava marcando território. Era até fofo. Exceto pelo fato óbvio de que ela não fazia ideia do real significado da palavra "amante".

"Deixando isso de lado, é ótimo receber duas novas integrantes para o Time Chitose", eu disse.

Haru e Nanase não perderam o ritmo:

"Eu prefiro Os Desafiadores Perigosos da Aomi."

"Não, não, Os Cruzados da Lua da Yuzuki."

"Ah, eu sabia que seria assim."

Pois é, com certeza o nosso grupo acabaria reunindo os membros mais populares da nova turma.

Olhei ao redor para os outros alunos. Alguns eu reconhecia de vista. Vários pareciam estar tensos. Outros conversavam em voz alta, e alguns até olhavam para nosso grupo com inveja, talvez desejando se juntar a nós. Outros encaravam as carteiras ou o quadro-negro em silêncio. E havia outro grupo que claramente nos odiava.

Era uma reação compreensível. Lá estávamos nós, rindo e conversando alto, todos íntimos tão logo após a mudança de turma. Dava pra entender alguns olhares sujos.

Desculpa, mas a gente é assim.

Sei que eu tinha certa autoconsciência, e acho que Kazuki e Nanase também. Mas não é como se estivéssemos tentando nos exibir ou ostentar as novas adições ao nosso grupo. "Ei, pessoal, olhem pra gente! Somos tão populares!" Não, a gente só tava feliz por estar na mesma turma com os amigos de novo. Só colegas zoando.

Juro, era só isso que a gente tava fazendo.

Mas considerando quantas pessoas não conseguem aproveitar o ensino médio como nós, talvez não seja surpresa que sempre me pintem como o popular insuportável sem noção e me difamem online pelo nome real.

Os impopulares, os perdedores e os otakus nos estereotipam tanto quanto qualquer um. "Os populares são todos assim; deviam ser mais assado; são só estilo sem conteúdo; são uns babacas que se acham melhores."

Acho que por isso os professores tentam manter os populares juntos. Macaco no seu galho, sabe? Deixar os alunos com quem têm maior probabilidade de se darem bem. E preencher as lacunas com os que não se encaixam com ninguém. Talvez até aprendam algo conosco. Talvez nossa "descoladeza" alise algumas de suas arestas excêntricas. E todos podem relaxar e focar nos estudos, sem conflitos na hierarquia.

Enfim, o status quo me serve muito bem, Saku Chitose.

"Melhor morrer do que viver uma vida sem beleza" - essa é minha filosofia. E por beleza, quero dizer uma vida onde sou descolado, atraente e cercado de garotas me mimando.

 

 

"Muito bem, sentem-se todos."

De repente, uma voz desanimada e levemente irritada ecoou da frente da sala. Não era exatamente a atitude fresca que se espera no primeiro dia de aula, não é mesmo?

Assim que perceberam que o professor da nossa turma tinha entrado, todos correram para seus lugares. Ele nem precisava ter dito nada - talvez o cara estivesse só economizando energia. Enfim, somos uma das melhores escolas da província, então não levamos tanto tempo para nos acalmar e prestar atenção, diferente de algumas escolas.

"Sou Kuranosuke Iwanami, professor da Turma 5 do segundo ano. Vamos direto ao ponto e passar mais um ano juntos, beleza?"

Ele tinha aquele cabelo desgrenhado de quem acabou de acordar, claramente sem ter se incomodado em pentear ou passar gel, além de uma barba por fazer. Também vestia um terno surrado e um par velho de sandálias de palha.

Esse sujeito, que parecia um artista excêntrico que se isolou em seu ofício e virou as costas para o mundo humano, também foi nosso professor no ano passado. Sua especialidade era língua japonesa.

Era meio desleixado, mas era um professor muito querido. Todas as turmas dele tinham as melhores notas. Numa escola como a nossa, cheia de professores excelentes, sua atitude relaxada e "tanto faz" para com as aulas conquistava os alunos. Até o chamávamos de Kura.

"Aeee véi! Ficamos com o Kura de novo! Eu tava torcendo pra isso!"

Como estávamos sentados em ordem alfabética por sobrenome, Haru estava na carteira ao lado da minha. Agora ela sorria para mim. Eu sentia um cheiro doce - provavelmente algum perfume corporal que ela passou depois do treino matinal. Por algum motivo, isso me deixou inquieto.

"É, vocês tiveram a Srta. Misaki ano passado, né? Nossa, ela é chata. Toda vez que me vê no corredor, manda eu apertar a gravata. Ela é gostosa, mas tem um olhar de desprezo."

"Muitos caras gostam dela e desse olhar. Você não, Chitose?"

"Hmm... Naum, não curto esse tipo. Muitos feromônios. Muito rígida. Prefiro mulheres descontraídas como você, Haru. É fácil conversar."

"...O quê? Espero que não esteja tentando me cantar logo no começo do semestre. Por favor não faça isso; é zoado."

"Eca. Foi mal. Eu me confundi e pensei que estava falando com uma garota agora há pouco."

"É, errou feio. Me encontra atrás do prédio antigo depois da aula."

"Dou pontos pela escolha requintada de local, Milady. O padrão pra brigas improvisadas costuma ser o banheiro masculino."

Conheci Haru ano passado através do Kaito. Ela tinha essa vibe refrescantemente esportiva. E era fácil de lidar. Dava pra tratar ela como um dos caras. Uma verdadeira "parça".

"Sabe, acho a Srta. Misaki uma boa professora, na verdade. Muitos alunos gostam dela. Mas você tem razão sobre ela ser meio rígida. Já o Kura parece super descontraído."

"Sim, ele é tão relaxado quanto sua gravata folgada."

"Tô vendo, tô vendo. Cara, odeio gravata apertada, especialmente depois de suar no treino."

Haru mexeu no colarinho da camisa, abanando para entrar ar. Que garota atrevida. Mas fazia isso com tanta inocência. Disse que ela era uma "parça", mas isso não significava que não tinha apelo feminino. Na verdade, até era meio distrativo.

"Você poderia usar um laço no pescoço em vez de gravata. É menos apertado."

"Querido, você realmente me vê com um laço?"

"Hmm..."

"Eu sei da minha reputação, mas não gosto quando apontam, saca?"

"...Ok, prefiro você de gravata, Haru. Beleza?"

"Ah, Chitose, a luz está refletindo no seu cabelo como uma auréola. Como uma cesta de basquete, tão tentadora..."

"Não enterra em mim!"

Deixando a Srta. Misaki de lado, o corpo docente da escola Fuji era bem tranquilo para uma escola de elite. Podíamos alisar ou cachear o cabelo, experimentar penteados diferentes e personalizar nossos uniformes dentro de certos limites. Até podíamos checar o celular na aula, desde que discretamente. Muitos professores, incluindo o Kura, também permitiam tirar fotos do quadro para consultar depois.

[Mon: Caraca, isso é bem raro no Japão akakak só em LN mesmo…]

Você tem que ser bem inteligente pra entrar nessa escola. Os professores não querem que a gente tenha colapsos mentais e fique neurótico com vestibulares, acho que é por isso dão tanto espaço.

"Certo, precisamos eleger o presidente e vice-presidente de turma, e definir a ordem das carteiras. Bem, Sr. Chitose, pode assumir? E tenta fazer isso não ser um saco, Saku."

[Mon: saco Saku Akkaakakak]

Eu estava tão distraído pensando no contraste entre o estilo esportivo e a feminilidade da Haru que mal notei o Kura chamando meu nome. Claro que fui eu que ele chamou para o trabalho braçal. Como sempre.

Haru cutucou meu cotovelo. "Chitose, você foi nomeado. E ganhou até uma piada zoada de tiozão com seu nome."

"Tá bom, tá bom."

Aprendi no ano passado que não adiantava tentar escapar dos pedidos do Kura.

Além disso, o velho Kura nunca dava mais tarefas ou trabalhos do que alguém podia lidar. Mas ele oscilava entre "Eles fariam isso fácil" e "Isso seria um desafio". Dessa vez, eu caía na primeira categoria. Qualquer reclamação seria respondida com um "Só vai" relaxado do Kura.

Ainda assim, não era do feitio do Kura ser tão relaxado no primeiro dia, diante de alunos que nem conhecia. Bom, não vou ficar aqui pensando muito nisso.

Fui até a mesa do professor e limpei a garganta.

"Uh... Então... Acho que todo mundo do segundo ano já sabe meu nome, mas se alguém não souber..."

Comecei arrogante, ajustando as lapelas do blazer com estilo. Então acenei com a cabeça.

"Sou a empregada pessoal do Sr. Iwanami, aparentemente. Meu nome é Saku Chitose. Talvez me conheçam de certos sites como um cafajeste e/ou um babaca."

Todos sorriram, primeiro as garotas, depois os caras. A reação mostrou que todos leram as bobagens no site secreto.

"Tch."

"...Patético."

Olhando melhor, vi que alguns sorrisos eram sarcásticos. Provavelmente os mesmos alunos que tinham me olhado torto antes.

Mas como era o primeiro dia, decidi tentar apaziguá-los. Olhei para o Kazuki.

"Certo, então fechem os olhos. Agora, a pessoa ou pessoas que escreveram essas calúnias sobre mim online podem levantar a mão?"

...

"Tá bom, tá bom, entendi. Podem abrir os olhos. Kazuki, vamos ter que resolver isso como homens depois."

"Foi mal. Foi só uma brincadeira. Tava tentando animar minha mãe doente."

"O quê? Mostra uma comédia romântica pra ela, então! Aliás, vi sua mãe de bicicleta outro dia  por falar nela, ela é muito gostosa - e não parecia nem um pouco doente!"

"Olha, Saku... Digo, Saku De Fossé..."

N/T: Essa piada é impossível de traduzir, então tive que dar uma improvisada, ela é totalmente aleatória no inglês

"Da onde veio esse apelido francês esquisito?!"

"Tch, tch , minha mãe que deu o apelido?"

"É, sua mãe deu é outra coisa!"

A tensão na sala se dissipou, e agora todos sorriam.

Foi calculado, sim, mas não estava tentando me destacar. Só queria me dar bem com todos e ter um bom ensino médio. Pra isso, precisava dificultar que estragassem a diversão com apelidos e negatividade.

Até os dissidentes haviam se acalmado, embora ainda apertassem os lábios.

"Enfim, brincadeiras à parte, vamos todos nos dar bem e fazer novos amigos este ano, ok? Então, para presidente e vice, alguém tem indicações?"

Kaito falou imediatamente. "Depois dessa introdução, ninguém vai querer assumir! Vai que é tua, Saku. Você foi presidente ano passado."

Nanase e Haru apoiaram.

"Eh, claro. Ele não pode ser pior que os outros."

"Cara, é só um título."

E... Isso foi decidido em dez segundos.

É, mas eu já tava esperando isso depois de preparar o clima. Ainda assim, não era um resultado ruim pra mim.

Minhas desculpas aos alunos idealistas que planejavam virar presidente e mudar tudo este ano. Se alguém se candidatasse, eu cederia. Mas teria que avisar...

Mudança não é bem-vinda no segundo ano. Ser presidente não dá muito trabalho, mas você tem que lidar com os haters, como aqueles de antes. E precisa considerar não só os populares, mas também os perdedores e solitários. Sim, você precisa tomar decisões astutas e executá-las, para o bem de todos.

"Mais indicações? Não? Ok. Então eu assumo. A partir de hoje, declaro vocês todos meus servos."

Coloquei uma mão no quadril e fiz uma pose arrogante cômica.

"Tá se achando demais para um capacho do Professor", gracejou Haru.

"Oh, peço desculpas! Espero servi-los da melhor forma!"

Várias garotas riram. "Muito engraçado!", uma disse.

"Ok, agora para vice-presidente. Indicações?"

Isso seria resolvido em cinco segundos; eu sabia.

"Eu, eu, eu! Se o Saku vai ser presidente, eu tenho que ser vice!!!"

Como esperado, antes mesmo de terminar, Yuuko já tava com a mão levantada. Nenhuma surpresa.

"Er, pelo que lembro, a vice-presidente ano passado enroscou muito e passou todo o trabalho pro presidente. Se não me engano, ela era bem parecida com... você."

"Relaxa, relaxa! Eu cuidava muito bem do coelho e do jabuti da turma no fundamental! Eu consigo!"

"...Com licença, não sou um animal de estimação de turma."

Ninguém se opôs à Yuuko como vice.

"Obrigada, gente! Sou sua nova vice-presidente, Yuuko Hiiragi!"

Acenando, ela veio até a mesa sem nem verificar se a turma aprovava. Era assim que ela era. Me impressionava como podia ser tão descontraída sem precisar planejar. Diferente de mim.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

"Certo, agora vamos decidir os lugares. Alguma sugestão?"

Do meu lado, Yuuko ergueu a mão de novo, animada.

"Todos deveriam poder sentar com a pessoa que estão afim!"

"Não, obrigado! Nunca vou conseguir estudar cercado por um harém de gostosas."

Éhh, Yuuko? Essa é uma turma cheia de populares, lembra? (E alguns solitários.) Melhor não forçar todo mundo a se expor assim tão cedo.

"Devíamos decidir no braço de ferro. Quem ganhar escolhe seu lugar."

"Kaito, por favor. Os adultos estão conversando."

"Devíamos sentar por ordem de notas do ano passado."

"Kazuki, por favor. Acho que sua contribuição pra essa discussão deveria ser o silêncio. Mas já que mencionou... Vamos falar das SUAS notas ano passado..."

"Quero sentar no fundo pra poder cochilar durante a aula!"

"Admiro sua honestidade, Haru. Mas acho que seu lugar deveria ser bem debaixo do nariz do professor."

"Gosto dessa lógica. Me coloca no fundo também."

"Se for pelo número de defeitos de personalidade, você e Kazuki deveriam sentar primeiro, Nanase!"

"Devíamos só sortear pra ser justo."

"Opa opa, Yua... Não estrague a diversão com lógica."

"Espera, por que EU estou levando bronca?"

Soltei um suspiro exagerado antes de olhar pela turma. Então sugeri a opção mais óbvia:

"Ok, crianças. Como não chegamos a um consenso, vou exercer minha autoridade presidencial. Olhando para vocês todos sentados tão animados e cheios de energia, penso: 'Ah, como é refrescante, como combina com o novo ano letivo essa disposição!' Então proponho o status quo da ordem alfabética. O que dizem?"

Esperei alguns segundos e, como não houve oposição, continuei:

"Quem tiver algum problema, pode falar comigo. Problemas podem incluir mas não se limitam a: 'Não enxergo o quadro porque minha visão é ruim', 'A cabeça grande do Kaito tá bloqueando minha vista', 'Kazuki fica me encarando e isso me deixa desconfortável', e assim por diante. Vamos resolver caso a caso. Ok?"

Eu estava bem ciente de que só os populares estavam contribuindo para a discussão até agora. Os outros provavelmente estavam com medo de falar.

Aqueles que acabassem na frente por ordem alfabética poderiam ter suas queixas, mas também era mais fácil ver o quadro de lá. Não valeria a pena reclamar com o presidente. E como eu escolhi a ordem alfabética, ninguém poderia me acusar de favorecer os populares. Meu plano foi calculado para evitar conflitos na turma.

"Certo, parece que todos concordam. Então vamos manter essa disposição no segundo ano. Estou ansioso para servi-los como presidente."

"Nossa, que final sem graça. O que aconteceu com o humor?"

"...Ah, também vou considerar mudanças de lugar se a visão do Kura atrapalhar seus estudos, ha-ha-ha!"

 

 

Como era o primeiro dia de aula, com a cerimônia de abertura e tudo mais, não tivemos outras aulas além dessa primeira. Metade dos alunos foi para os clubes esportivos, a outra metade foi para casa. Kaito, Haru e Yuuko tinham tênis; Yua tinha ensaio da banda - todos meus amigos tinham atividades. Eu era o único com uma tarde completamente livre pela frente.

Comprei uma lata de café na máquina automática e subi para o telhado da escola, com meus chinelos fazendo barulho nos degraus. De longe, ouvia os trompetes da banda, os gritos do time de futebol aquecendo com corridas, o quicar das bolas de basquete e o rangido dos tênis no ginásio. O som surdo das bolas de beisebol batendo nas luvas. Ouvindo distraidamente esses sons típicos do pós-aula, fui tomado por uma melancolia.

Abri a porta do telhado e me deparei com as grades altas cercando um quadrado de céu azul. O azul era tão intenso que quase parecia opressivo, tão vasto que me fazia sentir sufocado. Pequenas nuvens cinzentas, mais leves que algodão, flutuavam logo acima das grades. Ao me aproximar, vi um rosto familiar que preferia não ter encontrado.

"Ah, olá, olá."

Kura estava encostado no reservatório de água, fumando um cigarro com ar satisfeito.

"Achei que era proibido fumar dentro do campus?"

Subi a pequena escada e sentei ao lado de Kura.

"Só mais uma regra idiota do conselho educacional para manter as aparências. Enquanto eu não soprar fumaça nos alunos, quem se importa?"

"E eu não sou aluno não?"

"Você é esperto o suficiente para escolher entre me dedurar para os outros professores ou ter a chave reserva do telhado. Isso é você."

"Bem, obrigado pelo elogio."

Como a maioria das escolas no Japão, a nossa desaprovava que os alunos ficassem indo e vindo do telhado livremente. Era essencialmente proibido. Mas às vezes dava para conseguir permissão do Kura, o Guardião da Chave, para almoçar aqui com os amigos. Só que era preciso pedir antes, e como dava trabalho, a maioria nem se incomodava.

Eu, porém? Bem, Kura me nomeou "Fiscal da Limpeza do Telhado", um cargo totalmente inventado, então posso vir aqui quando quiser, sem pedir permissão. Bem conveniente.

"Você não tem vergonha de ser fumante nos dias de hoje? A sociedade está tentando extinguir sua espécie, sabia."

"Eh, as pessoas só querem um bode expiatório fácil."

"Desenvolva."

Abri minha lata de café, pensando amargamente no site de fofocas da escola.

"Bem, é verdade que o fumo passivo afeta a saúde dos outros. E se alguém disser que não gosta do cheiro, não tenho como argumentar contra isso. O que não suporto são os babacas cheios de moralismo. Só querem jogar lama nos outros. É assim em qualquer lugar da sociedade, da escola ao trabalho. É como um julgamento de bruxas moderno. Vão queimá-lo na fogueira não importa o que diga."

Kura soltava palavras ácidas enquanto continuava a soprar anéis de fumaça com tranquilidade.

"É, são os que jogam lama sem parar para pensar se estão certos ou errados que eu não aguento. Se vocês, crianças, virarem adultos assim, terei falhado em meu dever de moldar mentes jovens."

"Concordo plenamente. Me arruma um?"

Estendi a mão para pegar um cigarro - brincando, é claro. Kura deu um tapa leve nela.

"Não exagere, garoto. Se eu acabar desempregado na rua, a culpa é sua."

"Você é um excelente exemplo de por que não devemos confiar em adultos, Kura."

"Ah, vai enfiar a cabeça no decote da Hiiragi ou da Nanase como um bom adolescente tarado, não é?"

"Ora ora, que linguagem imprópria para um educador, mesmo de brincadeira."

Tomei um gole delicado do meu café.

"...Então, o que você quer, professor?"

Quando a aula acabou, Kura tinha me dito para encontrá-lo no "lugar de sempre".

"Você é o presidente de turma, certo?"

Kura tirou um maço amassado de Lucky Strike do bolso do paletó e acendeu seu segundo cigarro seguido.

"Ah, opa, acabei de perceber que estou atrasado para o treino..."

Sentindo o perigo no ar, tentei me levantar para dar no pé. Mas Kura me agarrou pelo ombro e me puxou de volta. Ele era magro feito um palito, mas tinha força suficiente. Me sentei obedientemente.

"Olha, Chitose... Você não acha melhor que a turma fique toda unida? Ninguém deixado para trás, e tudo mais?"

"Ah sim, dependendo dos encantos do professor da turma, acho que é o melhor caminho..."

Eu tinha notado uma carteira vazia no fundo da sala. Imaginei que o aluno estivesse doente, mas parece que não era o caso.

"Faltou um aluno hoje, no primeiro dia da Turma 5 do segundo ano, certo? O nome dele é Kenta Yamazaki. Ano passado, ele estava na Turma 1 do primeiro ano. Não era um aluno exemplar, mas tirava notas decentes e tinha alguns amigos. Mas no terceiro semestre, começou a faltar e depois simplesmente desapareceu."

Nunca tinha ouvido esse nome antes. Alunos que desapareciam eram meio raros na nossa escola. A frequência era geralmente bem alta.

Não sei como é em outras escolas, mas a maioria dos alunos da Fuji planeja ir para a faculdade. É por isso que fazem o vestibular para a Fuji, já que é uma escola preparatória. Nossos alunos são em sua maioria inteligentes. E sim, tem alguns babacas que escrevem merdas sobre os outros em sites de fofoca, e às vezes competem entre si por notas (o estresse pode ficar feio), mas basicamente bullying não é um problema aqui.

Às vezes, alunos que só passaram raspando no vestibular acabam desistindo porque não conseguem acompanhar, mas esse não parecia ser o caso.

Eu encolhi os ombros. "Então por que ele parou de vir?"

"O professor da turma dele visitou a casa da família várias vezes, mas não conseguiu falar diretamente com o Yamazaki. Perguntar aos amigos também não ajudou; eles não eram tão próximos. Só saíam juntos por interesses em comum."

"Entendi. Então agora você pode mostrar suas habilidades como educador."

"Bom, essa é toda a informação que tenho agora. Os interesses em questão, a propósito, são animes e light novels. Coisa geek, sabe."

"Er, isso é legal e tudo, mas acho que estamos falando de coisas diferentes. Conversa é jogar pro outro pegar, sabe."

Kura fingiu não me ouvir. Soltei um suspiro exagerado. Então continuei, um pouco mais sério que antes.

"Tá bom, vou perguntar... Por que você está falando comigo sobre isso?"

"Você é o presidente de turma, Chitose. Presidente é uma posição de responsabilidade, com dever de cuidar dos colegas..."

"Eita. Mas é só simbólico, não é?"

"Achei que você fosse meu capacho, Chitose."

"Ah, vai se foder."

Kura me pegou. Acho que ele me fez presidente de turma de propósito só para me enfiar nesse problema logo depois. Não havia limite para o que ele poderia me fazer, usando o argumento do "presidente de turma" como alavanca.

"Só os jovens sabem pelo que outros jovens passam na escola. Assim como só adultos sabem o que outros adultos enfrentam. Você tem ideia de por que um partidão como eu ainda está solteiro depois dos trinta, hmm? Sabe por que tenho que gastar a maior parte do meu salário miserável de professor no bar de strip 'Não Me Faça Tirar a roupa’? Sabe?"

"Ok, agora sei que você é um fracasso completo como homem, não só como professor! ...Tch. Então você quer que eu convença esse tal de Kenta Yamazaki a voltar para a escola, certo? Por que não pediu para a Yuuko?"

"Hiiragi não tem a sutileza necessária para algo assim. Ela iria entrar de cabeça sem saber dos detalhes e acabaria afastando o garoto ainda mais. Você é melhor em analisar a situação e agir de acordo."

"Em outras palavras, você sabe que nem tenho a opção de dizer não, né?"

"Então aqui está um problema que um jovem com suas habilidades resolveria facilmente, mas você vai virar as costas? Achei que você pudesse fazer muito mais, Chitose. O super-herói de todo mundo."

Kura me deu um sorriso cheio de intenção.

Tch. Esse velho barbudo era tão enjoado de lidar.

Qual é aquele ditado? Não persiga o que foge de você; não rejeite o que vem até você. Eu normalmente não saía do meu caminho para ajudar os outros, mas numa situação como essa, em que fui especificamente solicitado, me peguei querendo fazer um bom trabalho. Entrar lá, resolver o problema com elegância e ganhar crédito por um trabalho bem feito.

Afinal, tenho aparências para manter. Se quero que minha vida continue tranquila, preciso ser o Saku Chitose que todos acreditam que eu sou.

"Você vai deixar eu lidar com isso do meu jeito, certo? E quero uma compensação adequada pelo meu trabalho."

"Ah é? Quer que eu te leve para o bar de strip também?"

"Não precisa. Conheço várias garotas bonitas que 'tiram a roupa' de graça."

"...Conhece alguém que goste de homens mais velhos?"

"Você é muito nojento..."

 

 

Me vi de novo no caminho do aterro do rio, aquele mesmo da manhã. Mas desta vez, caminhava na direção oposta.

Há vários caminhos para chegar à escola, mas gosto deste à beira do rio. O leito tem uns vinte metros de largura, ladeado por casas antigas e novas de ambos os lados. Admiro a simetria dos postes de eletricidade alinhados com seus cabos esticados entre eles. E ainda tem a vista das montanhas ao fundo. Sem carros também, então é um bom lugar para um passeio descontraído. Muitos gatos de rua também, se esticando ao sol e bocejando sem preocupações.

Conforme os estudantes indo para casa ficavam cada vez mais raros, avistei alguém sentado perto da comporta. Caminhando com passos cuidadosos e silenciosos, desci a pequena ladeira de acesso. Não queria perturbar sua paz. Ela irradiava uma aura de tranquilidade.

Falei, esperando que minha voz fosse tão suave quanto o murmúrio da água do rio:

"Ei, Asuka."

Ela ergueu o rosto do livro que lia e fixou os olhos em mim. Então, a veterana Asuka Nishino respondeu com uma voz tão despreocupada quanto uma brisa de primavera:

"Ah, é você. Tive a sensação de que te veria hoje."

O sol do final da tarde fazia seus finos cabelos quase brilharem, e seus olhos se estreitaram em um sorriso, fazendo a pequena pinta sob seu olho esquerdo se elevar. Aquela expressão me cativou enquanto ela erguia a mão em cumprimento.

Ela tinha curvas mas era delicada, e usava a gravata bem ajustada ao colarinho. Sua saia estava naquela zona modesta entre curta e longa. Sua beleza discreta e suave me atingiu de repente naquele momento.

"O que está lendo?", perguntei.

"É 'A Dama Fantasma' de Cornell Woolrich."

"'A noite era jovem, e ele também. Mas a noite era doce, e ele era amargo.' É a nova edição, não é? Gosto mais dessa abertura do que qualquer coisa em outros romances que li."

"...Claro que você leu. Nossa, você é irritante."

Conheci Asuka em setembro do ano passado. Tinha deixado o time de beisebol nas férias de verão e voltava para casa pelo aterro, sem saber o que fazer comigo mesmo.

"Ei! Ele está fugindo!"

"Vamos pegá-lo!"

Tsch, tsch, tsch. Clunc, clunc, clunc.

Um pouco à frente, vi um grupo de crianças brincando e se divertindo. Pareciam estar brincando de samurai. Os três corriam a toda velocidade com "espadas" - galhos que pegaram em algum lugar - perseguindo um quarto menino. O fugitivo também tinha um galho-espada, mas não parecia estar disposto a usá-lo. Devia ser o mais fraco do grupo.

Observei por um tempo, até que o garoto sendo perseguido escorregou e caiu no rio. A correnteza era fraca ali, sem risco de afogamento. Mas o aterro era íngreme, e uma criança daquele tamanho teria dificuldade para sair sozinha.

"Perdedor!"

"Eca! Você está todo coberto de lama e sujeira do rio! Fica longe da gente na volta pra casa, entendeu?"

Os três "amigos" zombavam dele enquanto olhavam de cima do aterro. Nenhum parecia disposto a ajudá-lo.

Havia outros estudantes voltando para casa, mas todos ignoravam a cena de propósito. Alguns até aceleraram o passo para passar logo.

Provavelmente era só brincadeira entre amigos e não bullying de verdade. Mas pensei que o mínimo que poderia fazer era tirar o garoto choroso do rio, emprestar uma toalha, dar uma leve bronca nos amigos e dizer para pegarem mais leve da próxima.

Agora que tinha visto, não podia simplesmente ignorar e seguir em frente. Seria covarde.

Justo quando ia me intrometer...

"Ei, gente, deixa eu brincar também!"

Com um respingo, uma garota adolescente apareceu, descendo a colina direto para o rio.

Pisquei, tentando processar a nova situação. Fiquei parado de boca aberta, encarando-a.

Ignorando os garotos boquiabertos, ela começou a jogar água no menino caído, de forma brincalhona. Reconheci imediatamente seu uniforme escolar. Ela era da nossa escola.

"Ei, vamos! Revida!"

Os estudantes que antes ignoravam a cena agora pararam para observar a garota com expressões de nojo. Alguns sussurravam e sorriam maliciosamente. Não ouvia o que diziam, mas era óbvio que comentavam sobre como ela devia ser maluca.

Mentiria se dissesse que não pensei o mesmo. Era definitivamente uma cena muito estranha e ilógica. O rio não era sujo ou fedido, mas também não era exatamente um lugar para se brincar. Quem entra sabe que vai ficar coberto de lama.

Mas a garota não parecia se importar com o estado do uniforme ou os olhares. Continuou jogando água o garoto.

Seu sorriso era tão radiante que logo o menino pareceu esquecer a estranheza e começou a revidar.

"Venham brincar também, vocês!"

Ela chamou os outros três garotos que ainda estavam no aterro. No início, pareceram confusos, mas o entusiasmo dela pareceu contagiá-los. Trocaram olhares, deram de ombros e se jogaram ladeira abaixo no rio.

"Ei, moça, você é muito doida."

"É guerra! É guerra !"

"Hee-hee! Nunca vão me vencer! Tenho anos de experiência nisso! Ei! Baixinho! Por que está vindo por trás? Jogo sujo! E logo depois que te ajudei!"

"Você não me ajudou. Só começou a me atacar."

Agora o garoto intimidado se unia aos supostos amigos contra a garota.

"Não deixem ela fugir!"

"Peguem ela!"

Trum, trum, trum. Splash, splash, splash.

Começaram uma brincadeira de pega-pega, ali mesmo no rio. Era o mesmo jogo de antes, mas agora, em vez de gritos, todos riam juntos.

...Mas o que que estava acontecendo?

Depois de brincarem bastante no rio, todos subiram o barranco.

Foi quando finalmente me aproximei e ofereci minha toalha. Os quatro garotos a compartilharam, enxugando os rostos um por um. Então disseram "Você é muito esquisita, sabia?" e saíram correndo juntos, ombro a ombro, camisetas molhadas coladas nas costas.

A garota os viu ir, então lentamente se virou para mim. Seu blazer, cabelo, rosto - tudo estava encharcado. Sua blusa estava transparente, mostrando a camiseta por baixo. Mas não dava para apreciar a sensualidade naquela situação. Verifiquei o brasão de seu blazer e vi que estava no segundo ano.

"Encantado pela dama do lago? Ou melhor, do rio."

"Ah, não. Só estava pensando que você parece o fantasma de alguém que se afogou no mar."

"Sério?"

Mas a garota riu alto, divertida.

"Ah, cara, preciso mandar limpar esse uniforme. Ei, você - tem roupas de educação física aí na mochila? Não tive aula hoje."

Ela piscou para mim enquanto tentava em vão secar o cabelo com minha toalha, já completamente encharcada depois que os quatro garotos a usaram.

"Tenho, mas estão bem suadas. Não cheiram tão bem."

Estendi minha bolsa esportiva, e ela enfiou o rosto lá dentro, cheirando.

"Nossa, que fedor! Parece pano de prato que usaram para limpar leite derramado numa escola primária."

"Ei, não é tão ruim assim. Quer que eu te jogue de volta no rio?"

"Só estava brincando. Na verdade cheira bem, como amaciante. Posso pegar emprestado? Juro que lavo e devolvo. Só vou voltar pra escola, trocar e ir pra casa. Se andar ao anoitecer pingando e cheia de lama assim, vão chamar o padre."

Mas ela mesma não parecia muito preocupada por estar molhada e suja.

"Claro, mas posso fazer uma pergunta?"

"Siiim?"

"Por que você fez isso? Uma pessoa normal teria tirado o garoto do rio e dado uma bronca nos amigos. Quer dizer, eu mesmo estava prestes a fazer isso antes de você aparecer."

Ela esfregou o queixo. "Hmm", disse pensativa. Parecia ter agido por instinto, sem pensar muito antes.

"Bem, estava pensando como seria ruim aquele garoto ser o único a voltar pra casa molhado e sujo. Se todos entrassem e se sujassem juntos, estariam no mesmo barco e poderiam voltar como amigos. Na minha opinião, isso é bem melhor."

"Sim, mas você acabou molhada e suja também. Nem estava envolvida até se meter no meio. E todas as crianças estavam rindo de você."

Ela sorriu, olhando nos meus olhos. Por alguma razão estranha, tive a impressão de que ela via direto na minha mente.

"Não sei por que algo assim deveria me incomodar, mas beleza..."

Seu sorriso gentil virou um desafio.

"Se me importasse com o que pensam, não teria me jogado no rio em primeiro lugar, né? Bom, só achei que parecia divertido... Então o que você está dizendo agora é, tipo, irrelevante."

Não sabia como responder.

A maioria das pessoas considera a percepção alheia antes de fazer, bem, qualquer coisa.

Quer dizer, eu planejava ajudar o garoto, mas de um jeito que me fizesse parecer um herói. Aí as pessoas diriam "Nossa, que cara legal." Caso contrário, provavelmente não teria feito.

Mas essa garota maluca estava aqui dizendo que fez porque "parecia divertido".

Era quase como se ela se aceitasse. Como se estivesse exatamente onde devia no mundo, e só precisasse responder a si mesma. E sendo ela mesma, resolveu a situação de um jeito que beneficiaria muito mais o garoto do que o que eu planejava.

"Posso fazer mais uma?"

"Claro."

Ela torcia a toalha, completamente indiferente ao que eu pudesse dizer.

"Qual seu nome?"

"Asuka Nishino. Escreve Asuka com os kanjis de 'amanhã' e 'brisa'."

Silhuetada contra o sol poente vermelho, a garota me deu um sorriso suave.

Naquele momento, ela parecia tão bonita. O cabelo molhado colado no rosto? Bonito. A mancha de lama no nariz? Bonito. Ela tinha tirado os sapatos e meias, e eu via seus dedos descalços. Eles também eram bonitos.

Uma brisa suave do final do verão passou por nós dois.

Depois disso, eu ficaria de olho nela na escola - e no caminho de casa.

Amanhã. Brisa.

O nome combinava com ela. Essa garota que vivia livre, por suas próprias regras. Combinava perfeitamente.

 

 

"Então fui eleito presidente de turma de novo, e o Kura não perdeu tempo me colocando pra resolver um problema pra ele."

Eu tinha me jogado no chão ao lado da Asuka e agora contava a ela sobre Kenta Yamazaki.

"Você é perfeitamente imperfeito, como sempre. Que nem um parque impecável onde é proibido soltar fogos."

"Que comparação esquisita. Bom, todo mundo prefere um parque arrumadinho, não é?"

"Mas o parque também proíbe jogar bola e passear com cachorros. Nem tem brinquedos, caso as crianças se machuquem. Aí não tem criança. Só adultos carrancudos lendo livros como estátuas."

"...É, parece super chato."

"Então mude as regras se acha isso. Aí o parque bonito vira um lugar divertido pra brincar."

"É difícil mudar regras depois que foram estabelecidas."

"É? Só tem que arrancar as placas proibindo as coisas. Pronto, resolvido."

"Vivemos numa sociedade cheia de processos. Se acontecer algo, você vai ter um problema nas mãos."

Asuka fechou o livro e guardou na mochila. Então se levantou com um "Hup!" antes de observar o rio por alguns instantes. Depois se virou para mim.

"Pergunta. Se a garota mais próxima de você na turma e eu estivéssemos nos afogando – tipo, no oceano ou num lago grande - qual de nós você salvaria? Você ganha um caiaque nesse cenário. Um vermelho-vivo. Mas o caiaque só cabe duas pessoas."

"A segunda pessoa poderia só se segurar atrás do caiaque."

"Não, não, a água tá infestada de piranhas e crocodilos." Asuka balançou o dedo na minha cara como se estivesse repreendendo uma criança.

"Não sei se conseguiria remar em águas tão perigosas."

Asuka continuou como se eu não tivesse dito nada.

"Eu te salvaria. Sem dúvida. Mesmo se fosse entre o meu cara favorito da turma e você. Gosto mais de você, sabe."

[TMAS: acho que ela tem algum interesse nele]

"Então o que acontece com o Cara Favorito da Sua Turma?"

Joguei a pergunta de volta pra ela, meu coração batendo forte de repente. Ainda assim, sabia que ela não usava a palavra no sentido romântico.

[TMAS: Não acho mais]

"Vou rezar por sua alma. Rezar para as piranhas e crocodilos comerem ele rápido. Deve doer muito ser devorado aos poucos por piranhas, não acha?"

Asuka juntou as mãos em prece, os olhos perdidos como se visse a cena se desenrolar em sua mente.

"Mas se fosse entre você e um gato, eu salvaria o bichano, claro!"

"Eu seguro o gato. Juro. Me deixa entrar no caiaque!"

"...Aposto que você não salvaria ninguém. Só remaria sozinho pra longe."

Asuka agachou na minha frente, abraçando os joelhos e me encarando.

"Não, eu cederia o caiaque pra vocês dois. Eu nadaria e torceria pra dar certo. Essa é a escolha mais bonita. É no que eu gostaria de acreditar."

"Ah, tá. Você estaria gritando 'Não deixa as piranhas me pegarem!'"

"Não, eu aceitaria meu destino. Enquanto os peixinhos mordiscavam meus dedões e orelhas."

"Nossa, indo direto nos lugares mais dolorosos, hein?"

O comentário dela me machucou um pouco, então eu só tentava disfarçar rindo. Muitas vezes tinha a impressão de que ela não fazia nenhum esforço pra se filtrar perto de mim e só dizia o que queria.

"...Sim, esse é o Saku Chitose."

Tá vendo?

Asuka pegou a mochila do chão e a colocou no ombro. Eu queria continuar conversando, mas parece que ela já tinha terminado.

"Então por que você trouxe essa situação do caiaque?"

"Não tem motivo real. Só veio à mente. Se você insiste em ser o herói, tudo bem. Vá dormir com os peixinhos. Mas se voltar... teremos um duelo."

"Você lutaria com um homem cheio de piranhas penduradas no corpo? Talvez eu seja só uma isca especialmente saborosa."

 

 

 

Naquela noite, eu estava deitado na cama rolando a tela do celular.

Desde o primeiro ano, participava de vários grupos de amigos no LINE, mas hoje tinha uma enxurrada de mensagens das garotas da nova turma com quem troquei contato.

Fui respondendo uma a uma, cansado dos mesmos chats entediantes. Enviei respostas básicas. Me esforcei um pouco mais com as garotas que queria conhecer melhor. Era como escolher legumes no mercado - pegando os mais apetitosos e deixando os outros de lado.

Manter relacionamentos quando você é popular pode ser complicado. Precisa saber traçar os limites. Os outros se aproximam livremente, seja porque gostam de você ou te odeiam, e você tem que decidir como e quando cortar o laço. Às vezes cai numa armadilha. É como andar num campo minado. Nunca pode baixar a guarda.

E uma vez que você coloca a máscara de "bonzinho", precisa usá-la até a formatura.

Cerca de trinta minutos depois, terminei de responder as mensagens. Finalmente pude abrir as dos meus amigos de verdade.

A primeira era do Kaito:

Mestre dos Peitos Saku, tenho uma pergunta. Que tamanho de sutiã você diria que nossa rainha do basquete Yuzuki Nanase usa?

"Hmm. Diria que está chegando no copo C."

Espera, qual era o tamanho da Yuuko mesmo?

"Baseado nas minhas estimativas, copo D."

Obrigado, Mestre!!!

Kaito era tão besta. E respondia rápido. Rápido demais.

A mensagem do Kazuki era simples:

O que vamos almoçar amanhã?

"Comida da cantina, acho. Vamos chamar Nanase e Haru?"

A mensagem da Yuuko estava cheia de emojis:

Querido! (um monte de corações rosa) Vamos nos esforçar como presidente e vice da turma! (um monte de carinhas com olhos de estrela)

(um monte de joinhas) (um monte de corações vermelhos)

A mensagem da Nanase era... interessante. Muito interessante:

Estava esperando te conhecer melhor, Chitose. Ansiosa para conversar com você.

"Eu também estava esperando te conhecer, Nanase. Vamos bater papo quando quiser."

Por algum motivo, a mensagem da Haru era só uma foto super aproximada de um cachorro-quente no espeto:

HOT DOG DO CARAMBA! Tô torrando de animação pro novo ano com você!

"Não pode mandar uma selfie fofa como uma garota normal?"

Certo, chega disso.

Deixando o celular na mesa de cabeceira, saí para a varanda. A lua estava um círculo perfeito no céu, como se tivesse sido desenhada com compasso.

O ar ainda estava bem quente apesar da hora avançada, com cheiro de primavera. Eu me sentia inquieto. Por algum motivo, desde criança sempre achei que lua cheia anuncia a chegada de algo novo.

Era noite no interior. Todas as pessoas que você veria andando por aí já estariam na cama agora. Nenhum carro passando também. Afinal, já eram dez horas. Metade da cidade provavelmente já tava dormindo. Os outros deviam estar se preparando para dormir. Enquanto ficava ali naquele vácuo de tempo vazio, pensamentos estranhos vieram à mente.

Eu realmente existia nessa cidade? E se eu fosse um personagem num lugar fictício, apenas desempenhando o papel que foi escrito pra mim? E se eu estourasse e desaparecesse amanhã, como uma bolha? Deixaria alguma marca duradoura em alguém? O que restaria da minha dor, tristeza, solidão? Será que importaria?

[TMAS: o garoto já sabe que tá na matrix / Mon: Azul ou vermelha? Faça sua escolha!]

Esta cidadezinha patética, esta escolinha patética... e todas as crianças populares patéticas dentro dela. E se estivéssemos todos só correndo em círculos dentro de um terrário de vidro, sem saída?

Estiquei uma mão em direção à lua, quase tentando medir quão longe estava dela.

E pensei em Kenta Yamazaki.

O que está passando pela sua cabeça agora, cara?

Se você está olhando para a lua agora, é a mesma que eu vejo ou uma completamente diferente?

Voltei para o quarto, peguei o celular e selecionei um nome da lista de contatos. Então fiz uma ligação.

 

 

Nota dos Tradutores/Revisores:

-Moonlakgil: BOM MEUS CAROS LEITORES, MAIS UMA OBRA FRESQUINHA DA MOONLIGHT PRA VOCÊS, EU SOU A MON, SUA REVISORA E ESPERO… Ah calma, tava capslock… Agora sim, cof cof, espero de verdade que vocês apreciem essa nova tradução da nossa scan! E falando em Scan, por que não entrar não é mesmo? Discutir sobre a obra e ver as outras coisas que traduzimos também?!

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