Volume 1

CAPÍTULO CINCO: Uma Lua Cheia, como uma Bola de Gude Afundando numa Garrafa de Refrigerante Ramune

Esta é a história de Kenta Yamazaki, um ex-nerdola em ascensão, enquanto ele se aproxima da maior encruzilhada de sua vida até agora.

Eu, o tal Kenta Yamazaki, me aproximei do Starbucks passo a passo, enquanto repassava mentalmente tudo o que Rei havia me dito.

Não consegui dormir nem um minuto na noite passada. Sabia que eu estava errado. Rei e Yuuko me deram tanto nas últimas três semanas. Todos eles deram… Mas, no final, eu joguei tudo de volta na cara deles.

Que idiota eu fui.

Não precisava que Yuuko me lembrasse do quão incrível Rei realmente era. Eu confiava nele? Absolutamente. Na verdade, não havia ninguém em minha vida em quem eu pudesse confiar mais. Mas eu ainda estava tão preso no meu complexo de nerdola, tão envenenado pelas coisas que Uemura vinha me dizendo… Eu me sentia um lixo e queria culpar alguém. Então tentei agir como se eu fosse a vítima, e Rei ainda teve que se desculpar… comigo.

"Se você conhecer eles bem, vai saber discernir se estão tentando te menosprezar ou só brincando de um jeito carinhoso."

Lembro do Rei me dizendo isso. Parecia algo tão básico. Mas eu havia esquecido. Minha identidade de nerd impopular e intimidado estava enraizada demais.

Tinha certeza de que, mesmo agora, Rei estava se culpando… Provavelmente pensando que falhou em conquistar minha confiança, como ele disse ontem na sala de aula. O que não era verdade! O Rei não fez nada de errado. Eu é que estava… sendo um mimado.

Rei conseguia fazer tudo. Provavelmente era por isso que ele se sentia tão responsável por mim. Devia achar que podia resolver qualquer problema de qualquer pessoa, desde que agisse a tempo. Caso contrário, ele se culpava. Sem dúvida, ele levou minhas palavras crueis a sério, mesmo que eu só as tenha dito num momento de frustração contra mim mesmo.

Depois do que eu fiz, sabia que não tinha como voltar para o lado do Rei.

Tudo o que eu podia fazer agora era tentar ao máximo mostrar o quanto eu tinha mudado. Honrar o esforço que Rei e seu grupo fizeram por mim nas últimas três semanas.

… Comecei a lembrar do meu primeiro encontro com o Rei.

Me peguei sorrindo.

Pensando agora, ele causou uma péssima primeira impressão, quando apareceu e começou a falar comigo pela porta. Levando uma garota fofa junto, agindo de forma tão superior. "Ah, quer que eu te ajude, pobre recluso perdido?" Ele era a personificação de tudo que eu odiava nos populares.

Achei que ele desistiria assim que fizesse seu discurso de "Olha só o cara incrível que eu sou". Mas aí ele arrombou minha janela e invadiu meu quarto. Que maluco. Totalmente exagerado.

Soltei uma risada baixa.

Tanta coisa aconteceu desde então.

Ainda me sentia estranho usando os óculos, as roupas e a mochila que Rei e Yuuko escolheram para mim. Como se fosse uma fantasia. Mas quando me olhei no espelho em casa, por um momento, consegui esquecer que não tinha mais amigos. Gostei do que vi.

A nova aparência não era só prova de que eu estava menos cafona e mais "popular". Também representava os momentos que compartilhei com Rei e seu grupo.

Para ser sincero, eu nem ligava mais para a Miki. E meu desejo de vingança, minha esperança de fazer Miki se arrepender do que fez… Esses sentimentos pareciam ter sumido. Como se tivessem sido levados por uma brisa forte, mas gentil, lançados num oceano distante.

"Se você dedicar tempo e esforço a algo que combina com você, os resultados virão."

Eu estava orgulhoso de mim agora. Orgulhoso do que conquistei nas últimas três semanas.

Hoje não era só sobre acertar minhas contas. Era sobre algo muito maior. Uma questão de orgulho.

…É, o Rei reviraria provavelmente os olhos pra isso.

Eu estava nervoso. Várias vezes tive vontade de virar e correr para casa. Mas continuei andando mesmo assim. O Rei sempre me elogiou por ser persistente, pelo menos.

Parecia que eu era realmente o "Senhor Coadjuvante da Silva Secundário", só um ponto engraçado na comédia de harém do Rei. Eu não tinha charme algum. Acho que sempre fui destinado a sumir do enredo. Na verdade, aquela discussão na sala de aula ontem… Aposto que era pra ser minha despedida.

Faz sentido. Ele podia ser rude ocasionalmente, e era sem dúvida um cínico e narcisista, mas nunca conheci ninguém com uma presença tão forte quanto a do Rei. Ele era forte, caloroso, engraçado e descolado. Cercado por um elenco de estrelas igualmente brilhantes… Yuuko, Uchida, Nanase, Aomi, Mizushino, Asano. Você tinha que ser especial para andar com o rei.

[TMAS: e mesmo assim ele te escolheu como amigo, o cara é realmente o melhor do mundo]

… Essas últimas três semanas… Cara, foram divertidas. Por um tempo, o Rei me convidou para sua história. Me mostrou um mundo que eu nem sabia ser possível. Mas desde o começo, tinha data de validade.

Apertei os dentes. Sentia que as lágrimas poderiam vir a qualquer momento se eu não me controlasse.

As coisas seriam diferentes daqui pra frente.

Eu tinha que fazer algo da minha vida sozinho.

Lembro do Rei dizendo…

"… Assuma a responsabilidade pela sua própria história e escreva-a como quiser."

Esta é a história de Kenta Yamazaki, um ex-nerd em ascensão, enquanto ele se aproxima do maior cruzamento de sua vida até agora.

 

 

Pude ver Miki, Ren e Hayato já parados em frente ao Starbucks.

Os três estavam olhando para o celular de Miki, rindo de algo.
Talvez ela estivesse revisando minhas mensagens no LINE e rindo de mim. Senti meu coração afundar.

[TMAS: Cara tem complexo de perseguição ⁄ Goki:depois do que ele passou eu até entendo]

Juntando coragem, me aproximei deles diretamente. Miki e Ren levantaram a cabeça e me olharam, mas não pareciam me reconhecer como a pessoa que estavam esperando. Viraram-se e continuaram a conversa.

Miki estava usando um traje gótica Lolita hoje.

"Desculpa, esperaram muito?"

Falei, tentando manter a voz firme. Minha garganta já estava seca. Mal podia esperar para ter um latte gelado nas mãos.

Os três se viraram para mim com irritação.

Por que esse cara está falando com a gente?
Que grosseria, interromper nossa conversa assim.
Que chato desagradável.

Era isso que seus olhos diziam. Eu sabia. Eu mesmo teria pensado isso três semanas atrás.

Então, os olhos de Miki se arregalaram.

"Hã... Kenta?"
"Ah... Já esqueceram como eu era? Ai..."

Era óbvio que minha transformação desequilibrou eles.

Quando perceberam que era realmente eu, Kenta, a atitude de Ren mudou completamente.

"Sério? É você, Kenta? Que é isso que você está vestindo? Tá fazendo aquele clichê de transformação do ensino médio? Tá um ano atrasado, sabia? Ah, cara, você é engraçado."

Eu tinha que admitir que Ren parecia bem descolado. Mesmo que o jeito como ele tentava me humilhar para se destacar fosse a personificação de tudo que eu odiava nos populares. Ele era mais um, assim como Uemura, que agia por pura insegurança. Meio triste.

Eu sabia disso, mas suas palavras ainda doíam. "Ah, não, não é bem assim..." Tentei rir, no início.

Então lembrei do Rei dizendo:

" É melhor rir de si e deixar os outros entrarem na brincadeira."

"... Mas você não está totalmente errado. Depois da rejeição da Miki, fiquei bem abalado. Nem consegui ir à escola por um tempo. Mas agora superei e estou tentando me enturmar mais, fazer amigos como os populares fazem. O que acha do meu visual novo?"

Mas a reação deles não foi a que eu esperava. Ren pareceu chocado. Seria porque eu estava imitando o Rei? Como estudávamos em escolas diferentes, ele não sabia que eu não tinha conseguido ir às aulas. Eu mesmo dei essa informação.

Foi então que Hayato falou, com um sorriso de deboche:

"Não conseguia ir pra escola? Só porque uma garota te rejeitou? Cara, que patético. Isso aqui não é um light novel, sabia? Não tem como um perdedor vergonhoso como você ficar popular na vida real. Né, Miki? Né, Ren?"

[TMAS: Cara fala isso dentro da novel, ctz que no anime vai falar “Isso aqui não é um anime”. | Mon: Imagina se fosse uma Light Novel… Imagina se fosse…]

Eu sabia que ele estava tentando me empurrar de volta para o fundo do poço. Graças ao Rei e à Yuuko, eu tinha começado a me aceitar ultimamente. Até conseguir projetar um pouco daquele "ar de gente descolada". Eles deviam ter notado. Eles eram obcecados por popularidade e hierarquia social. Por isso estavam tão perturbados.

Era triste que eles não soubessem que, às vezes, a vida realmente parece um light novel. Existe até um heroi Overpower na realidade mais irreal que os das histórias.

Quase pude ouvir o Rei dizendo:

"Isso mesmo. Esqueça os outros. Foque em se tornar alguém que você gostaria de ser se não fosse você."

"Eu sei, eu sei. Mas pensei: 'Não tem como ficar pior que isso. O que tenho a perder?' Então resolvi tentar."

Exato. Mesmo que o Rei, a Yuuko e o resto do Time Chitose tivessem tantos talentos naturais, eles ainda se esforçam todos os dias para manter seus próprios padrões altos. Eu não tinha nada de valor para começar, então que sorte a minha receber tanto elogio só por me arrumar um pouco?

Respirei fundo e tentei não falar muito rápido.

"Bom, em vez de ficarmos aqui fora, vamos sentar?"
"Sim. Na verdade, nunca vim aqui... Você já veio ao Starbucks, Kenta?"

Talvez fosse impressão minha, mas o tom de Miki parecia mais gentil do que eu lembrava.

"Ah, já vim uma vez, sim."

Grande, grande, grande. Não é 'ground'. Não é 'ground'. GRANDE!!!

N/T: Ele usa a palavra grande na versão em inglês, acho que copiando do espanhol, resolvi deixar assim, pois não tem boa tradução.

 

 

Pedi um latte gelado no Starbucks. Os outros três disseram querer o mesmo, então pedi para todos. Depois, guiei o grupo até a mesma mesa da foto do meu bloqueio de tela. Nos sentamos. Lembrar daquela fotografia me deixou um pouco mais relaxado.

Ren apoiou o braço no encosto da cadeira e cruzou as pernas de maneira afetada.

“Você não parece acostumado a vir num lugar desses, Kenta. Os frequentadores costumam personalizar seus pedidos, sabia?”

Sim, ele estava certo. Lembrei de como Rei e Yuuko adicionavam vários extras aos seus pedidos. Mas eu estava tão distraído que esqueci completamente disso.

Então por que você não personalizou seu pedido agora? A frase ficou na ponta da língua, mas engoli.

Quase pude ouvir o Rei dizendo:

"Rebaixar os outros não vai te elevar. Só vai te degradar até você descer ao nível deles."

“Bom, como eu disse, só vim aqui uma vez antes. Foi um ensaio, para praticar como seria convidar vocês hoje.”

Hayato soltou um riso de escárnio.

“Precisou de um ensaio? Ele é mesmo um fracassado, né, Ren? Que pena que não pudemos sair só com a Miki hoje, só nós três.”

“Para com isso, Hayato.”

[TMAS: Quem precisa de inimigos com amigos assim, pqp, até aqueles que ofendem os argentinos preferem os argentinos a isso]

Tudo que saía da boca deles era uma humilhação. Por que eu havia feito parte desse grupo? Essa reunião estava insuportável.

Mas a culpa era minha — eu já tinha passado tempo suficiente com eles para saber como eram. Queria um grupo de amigos fora da escola, um refúgio onde pudesse compartilhar meus interesses, e acabei me enfiando na lama com eles. Esperei demais, e me machuquei. Eu não conhecia eles de verdade. Nem um pouco.

Quase ouvi a voz do Rei:

“Agora, vamos tentar nos entender.”

“Então, como vocês estão? Andaram em algum evento recentemente?”

Mas Ren manteve o sorriso presunçoso.

“Sim. Desde que você saiu, a gente tem se reunido mais. Então, obrigado por isso.”

“Ah, que bom. Desculpe, não percebi que estava atrapalhando tanto. Ultimamente, tenho lido muitos romances populares e assistido filmes mainstreams. É mais interessante do que pensei. E comecei a malhar também.”

Hayato revirou os olhos e se juntou a Ren.

“Então agora você não só quer subir na hierarquia social, como também está virando as costas pra cultura otaku? Ridículo. Você nunca vai ser nada além de um perdedor. Acha que isso é uma daquelas histórias de transformação de light novel? Olha essas roupas e essa mochila. Alguém escolheu pra você, isso é óbvio.”

“Sim, meus novos amigos da escola me ajudaram a comprar.”
[Mon: Se fosse eu em vez do Kenta, já teria dito: “Foi um desprazer ser amigos de vocês, só vim pra me recordar das caras dos idiotas com eu convivi antes como um último adeus… Tchau!” ]

Hayato era ainda mais babaca do que eu lembrava.

Ele estava provavelmente com medo de sobrar entre Miki e Ren depois que eu saí do grupo. Então se esforçava para fazer parecer que os três tinham uma amizade incrível.

Miki me olhava de relance. “Kenta… pensei que você não tinha amigos bons na escola. Então fez novos amigos?”

… Esse jeito coquete dela era o que me fez ter expectativas erradas.

Mas acho que Miki só queria parecer uma garota fofa. Especialmente na frente do namorado, Ren. Se eu quisesse mesmo conquistá-la, deveria ter me esforçado mais.

Não é, Yuuko?

“Bom, muita coisa aconteceu. Eles não são exatamente amigos, são mais tipos… coaches de vida? Ou um rei. Ou um lord demoníaco louco. Mas são todos incríveis. Têm uma filosofia de vida ótima. Eles me influenciaram mais do que qualquer light novel que já li.”

“…Tem garotas no grupo?”

Miki tinha um olhar meio nostálgico. Mesmo depois de eu ter saído do grupo, ouvir que um velho "amigo" fez novos amigos não devia ser fácil.

“Algumas são. Os caras são super legais, e as garotas são encantadoras. E você…? Você e Ren continuam namorando?”

“Ah, sim…”

Miki desviou o olhar, hesitante. Talvez eu não devesse ter perguntado algo tão pessoal, mesmo tentando aquele papo de entendimento mútuo.

“…E você? Está afim de alguma dessas garotas?”

Agora era Miki fazendo perguntas pessoais. Acho que me tornei alguém que as pessoas querem saber sobre?

“Ah, não. Elas fizeram tanto por mim, e eu não pude retribuir. Não teria a pretensão de gostar de nenhuma delas sem antes me tornar alguém digno. Quer dizer, talvez um dia, quando eu estiver melhor.”

Foi estranho. Quando Miki perguntou, minha mente não foi para Uchida, como eu esperaria. Em vez disso, veio uma imagem: um lago tranquilo refletindo o pôr do sol, absorvendo os raios dourados e oferecendo um lugar caloroso para quem chegasse até ele. Pensei na garota que conheci recentemente, cujo nome era escrito com os kanjis de "noite" e "lago". Yuuko.

“Você… já me esqueceu? Quando recebi sua mensagem depois de tanto tempo, fiquei animada pra te ver de novo…”

…Entendi.

Ela estava jogando o mesmo jogo de antes. Mas desta vez, estava claro pra mim. Ela fingia interesse em mim para provocar ciúmes no namorado, Ren. Para reforçar os sentimentos dele por ela.

Mas eu não guardava mais rancor. E meu desejo de fazê-la se arrepender também tinha sumido. Se ela não tivesse me rejeitado, nunca teria conhecido o Rei e os outros. Como poderia retribuí-los por isso?

Talvez eu pudesse ser útil fingindo ainda gostar dela, para alimentar o ciúme de Ren?

Acho que funcionaria. Mas não tinha certeza se conseguiria.

Bom, poderia tentar ser honesto e deixar claro que não estava interessado. Assim, eles também poderiam ser honestos entre si.

“Soaria mal dizer que esqueci você, mas acho que sim. Não sinto mais nada por você, Miki. Encontrei um caminho melhor sozinho.”

Silêncio.

Por algum motivo, os ombros de Miki tremiam. Opa. Falei algo errado?

Mas foi Ren quem falou em seguida.

“Você tá zoando? Foi pra isso que você nos chamou?”

“…Hã, sim?”

“Não sei quem te deu essa ideia, mas você marcou realmente com a gente só pra se vingar da Miki, mostrando seu visual novo e mentindo sobre amigos descolados? Sério?!”

Eu não entendia. Eu tinha realmente feito novos amigos. E chamei eles para mostrar como mudei. Mas por que Ren estava tão bravo?

“Ah, mas eu realmente fiz novos amigos. E juro que não queria vingança. Eu gostava da Miki antes, é verdade. Mas não sinto mais nada. Só queria esclarecer as coisas. Eu meio que desapareci do grupo sem me despedir.”

“Você é doente?! Qual o teu problema?! ‘Ah, agora conheço garotas mais gatas, então você não me interessa mais?!’ Sabe, eu até sentia pena de você, por isso fui legal! Para de bancar o superior! Você não mudou nada! Você ainda tá totalmente brisado!” Miki quebrou o silêncio e começou a gritar comigo.

Eu devia ter falado algo errado…

Fiquei chocado. Esperava uma conversa tranquila, me reconectar com todos e ir pra casa me sentindo bem. Achei que conseguiria, depois de todas as mudanças…

Rei e Yuuko pareciam achar que eu tinha mudado. Eu também achava. Mas aparentemente, para os outros, não…

“D-desculpa… Falei algo ofensivo? Eu sei que você não está interessada em mim, Miki. Sei que está namorando o Ren. Nunca nem tive uma namorada, então sei que vocês vivem num mundo totalmente diferente…”

“O quê? Cara, você tá me deixando puto! Tá insinuando que eu e o Ren ficamos juntos do nada? Que somos fáceis? Agora que você é um popular, vive num mundo diferente do nosso, é? Acha que um corte de cabelo e roupas mudam alguma coisa? Já que fomos amigos, vou te contar um segredo… Tem 100% de chance de que seus novos amigos estão te zoando! ‘Vamos dar um glow-up no otaku, vai ser hilário!’”

Ai. Queria negar, dizer que eles não eram assim. Mas eu não posso, não depois de eu mesmo acusar o Rei e a Yuuko de fazer exatamente isso, ontem na sala?

Fiquei em silêncio. E Hayato aproveitou.

“O Kenta não percebeu. Ele é burro. Otakus impopulares são brinquedos pros populares. Tipo, eles apostam pra ver quem se declara pra você como piada. Acha que são seus amigos? Aposto que ficavam rindo daqueles seus óculos horríveis. Sabe, igual à gente ria. A Miki mandava print de tudo que você falava pra ela em tempo real. A gente quase mijou de rir. O que foi mesmo?”

“Ah, acho que foi: ‘Antes de te conhecer, eu não sabia da beleza das garotas 3D…’ Ah, ah, e também: ‘Vou mudar para te tratar direito, Miki!’ E ainda: ‘Te vi nos meus sonhos de novo ontem, Miki…!’”

“Eca, que nojento! Virjão!”

Foi demais. Toda a dor daquela época voltou. Por que eles tinham que ser tão crueis? O que eu estava fazendo ali, tentando conversar? Onde estava o novo eu, o cara confiante das últimas três semanas? Nada do que eu dizia chegava neles. Isso era inútil.

Cara, é assim que eu devia ter parecido pro Rei e pra Yuuko no começo.

Por que eles se importaram comigo? Eu não teria.

Populares… eles são realmente diferentes.

Se eu continuasse, talvez um dia pudesse ser como eles.

Limpei a garganta, ainda seca.

“Ah-ha-ha… É, pensando agora, eu era bem vergonhoso. Desculpa, não quis incomodar ninguém. Me sinto um idiota, entendi tudo errado.”

“…Por que tá tentando rir disso?”

Ren franziu a testa.

“Você não está chateado? Não está com raiva? Se está, fala. Não pode fingir que o que dizemos não te afeta. Quando zoam com você, só consegue rir junto. Não importa o quanto mude por fora, por dentro ainda é um perdedor solitário e patético.”

Ren se inclinou para frente, trazendo o rosto perto do meu.

“Quer saber de uma coisa? Lembra quando mandou pra Miki algo tipo ‘Você estava fofa comendo sorvete hoje rs’ e ela respondeu ‘Ah, rs, aposto que pensou coisas indecentes!’? Pois é, a Miki estava no meu quarto quando mandou isso. E meus pais estavam viajando. Ninguém em casa. Entende o que tô dizendo?”

Ele se aproximou mais, o hálito quente dele entrava no meu ouvido:

“Rir da sua mensagem no LINE foi a melhor preliminar. Fizemos cinco vezes naquela noite. Valeu, Kenta. Te devo essa.”

Uma dor inundou meu peito.

Não aguentava. Via a cena inteira na minha cabeça. Minha mensagem foi um acessório na vida sexual deles?

[TMAS: cara tem fetish de corno, imagina ficar animado vendo um cara dando em cima de sua mina]

“Ren! Não conta isso pra ele!”

“Hee-hee, roubei a garota debaixo do seu nariz, né, Kenta? O clichê clássico! Talvez você descubra um novo gênero!”

Hee-hee-hee, ha-ha-ha.

Me senti sozinho na minha mente, sob um céu cinza-escuro, chovendo lama suja.

A água escura girava em meus pés, ameaçando me puxar para o desespero.

Não consigo, Rei. Não tem como consertar isso. Só quero correr pra casa. Me trancar no quarto, onde estou seguro, onde ninguém pode me machucar. Quero me enrolar nos lençois, um rato humano encharcado e imundo.

Eu realmente era só um fracassado covarde e solitário. Por isso tinha dito aquelas coisas horríveis para o Rei ontem. Eu não tinha mudado.

Engoli as lágrimas, tentando não chorar.

Não chore, não chore, não chore. Pelo menos não até acabar e você estar sozinho.

Sinto muito, Rei. Sinto muito, Yuuko. Falhei no teste final. Não vou me formar…

… Quase pude ouvir a voz do Rei.

“Ora, ora, você esqueceu a parte mais importante.”

Era como uma mensagem do céu.

A chuva suja parou, e o sol apareceu entre as nuvens pesadas.

“Responda, Kenta. E se for maldade mesmo?”

“Então… então eu esmago?”

“Exatamente.

Uma mão forte bateu nas minhas costas.

“Vim te dar apoio, Kenta. Como prometi.”

Me virei, e ele estava lá. Realmente lá. Era o rei.

Uma única lágrima escorreu pelo meu rosto.

Ah, droga. Depois de todo meu esforço pra não chorar…

 

 

 

 

“Hmm? Acho que reconheci essa voz na mesa atrás. Ei, Kenta. Podia ter me convidado se fosse vir ao Starbucks."

Limpei rapidamente o rosto com a manga, apagando as lágrimas.

Não adianta, Rei.
O que você está fazendo aqui?
Por que apareceu do nada desse jeito épico?

Fiquei tão surpreso com a aparição repentina do Rei que não consegui falar. Tinha muita coisa acontecendo.

"Quem são esses? Não são seus amigos, né, Kenta? Parecem meio... patéticos?"

"E-esses são meus amigos antigos."

Foi tudo que consegui dizer. Até que me saí bem, considerando a situação.

"Heh. Sério? Nem parece. Você realmente subiu na vida."

O Rei estava estranho hoje. Parecia 50% mais confiante que o normal, como se estivesse usando seu status de popularidade como arma...

Mas meu antigo grupo parecia ainda mais chocado que eu. Na verdade, pareciam que iriam se desintegrar em qualquer instante. Miki tossiu e falou com voz tensa:

"Hã... Q-quem é você?"

"Eh, sou amigo do Kenta. Oi, amigos antigos. Meu nome é Saku Chitose. E aí?"

O Rei deu um sorriso deslumbrante, daqueles que derreteriam qualquer garota.

Ren apontou para mim de repente, provocado pelo jeito melado de Miki ou pela superioridade do Rei:

"T-tá, e daí? Esse cara é um otaku fracassado. Sabe quantos bonecos de anime ele tem? Só batia punheta pra personagens 2D até conhecer a Miki."

"Sim, sei que ele é otaku, obrigado. Na verdade, ele me mantém atualizado com os melhores light novels e animes em Blu-ray. E temos planos de ir ao Comiket de verão juntos. Vamos comprar mangás pornô até não caber mais."

N/T: Comiket é um local de venda de mangás pornôs, grande evento cheio de estandes e paródias.

A gente não combinou isso, Rei!
E quem te contou sobre doujinshis?! Por que está falando disso como se fosse algo normal, tipo férias na praia?!
O que você está fazendo, Rei?!

"Ouvi sua conversa agora. Kenta, você está secretamente tentando ser ator? Era um ensaio de roteiro?"

Agora eu estava totalmente perdido.

"Ator?"

Enquanto piscava confuso, o Rei pegou meu latte e deu um gole. "Hmm. Sem café extra dessa vez."

O Rei estava dominando completamente a situação. Nós éramos meros mortais diante dele. Miki olhava para ele com olhos de coração, mas eu nem sentia ciúmes. Ele era o Rei.

"Boa atuação, de qualquer forma. Ah, Ren, era? Você também foi bem. Sua tentativa de humilhar o Kenta pelo pedido no Starbucks... Você realmente entrou no papel do rival amoroso pomposo. Nota 10, Príncipe Jiro. Os perdedores devem adorar puxar seu saco."

Todos ficaram em silêncio enquanto o Rei continuava.

"Você também, Miki. O jeito que você meio que gosta do Kenta, mas virou a casaca quando ele mencionou outras garotas? Clássico. Pena que o Kenta não percebeu. Ele não tem muita experiência com garotas. Mas foi fofo como você tentou salvar as aparências. Se não fosse namorada do Ren, adoraria te ensinar umas coisas..."

O Rei parou, encarando Miki.

"Ah, a menos que esse negócio de vocês namorarem também fosse parte do roteiro? Nesse caso, posso te fazer minha?"

O Rei afastou a franja de Miki e tocou seu queixo. De repente, ele emanava uma sensualidade que até eu, sendo homem, conseguia sentir. Ren só ficou sentado enquanto o Rei cantava sua namorada.

Se o Rei estivesse falando sério, eu tinha entendido tudo errado. Agora via porque Miki e Ren tinham ficado bravos. Mesmo tarde, eu sentia remorso por como lidava com tudo.

"Uh, bem, p-podemos trocar LINE..." Miki corou e gaguejou.

Não, não caia nessa!

"... Brincadeira. Odeio garotas como você, que ficam pulando de um cara pro outro. Mesmo que seja só o personagem que você está interpretando."

O Rei virou as costas para Miki e focou em Hayato.

"Mas o Oscar vai para o Hayato aqui. Tentando bancar o durão no seu grupinho otaku de quatro pessoas. Você nem chega a ser um coadjuvante. É mais um figurante. Sabe? Você se odeia, então gasta toda sua energia atacando os outros. Interpretou o vilão covarde tão bem que quase acreditei. Roubou a cena."

Mãe, pai, tem um demônio dentro do corpo desse estudante.

[TMAS:O cara quando quer simplesmente é incrível. | Mon: Simplesmente chegou massacrando geral! Minha lenda kakakak]

"Foi uma ótima leitura, mas a melhor parte foi quando esse cara deu detalhes constrangedores sobre sua vida sexual... Pfffft."

O Rei começou a rir.

"Ok, fala a verdade, isso tudo foi uma metalinguagem sobre clichês otaku, né? Todos os arquétipos padrão estavam lá. Mas precisam manter o pé no chão; o vilão não pode soltar uma mentira tão óbvia. O público não compra. Mas foi engraçado, né? Ha-ha-ha!"

"Uh, Rei? Que mentira óbvia?" Eu tinha me acalmado o suficiente para falar.

"A parte sobre os pais dele estarem viajando. E quem faz cinco vezes na primeira noite? Ha-ha-ha. Seu soldadinho fica de pé fácil, hein? Rezou muito num santuário da saúde? E coitada da Miki. Ela é tipo um castelo que você fica saqueando, né? Ah, deve ser porque você não tem muita munição. Mais um lápis, né? Fino, durável, não precisa apontar? Ha-ha, vocês são umas crianças."

[TMAS: O cara humilha os desgraçados de um jeito lindo]

Não estava entendendo tudo, mas Miki e Ren ficaram vermelhos. O Rei tinha acertado em cheio.

"Se vocês tivessem realmente cruzado essa linha, essa memória seria especial. Guardariam só pra vocês. Talvez contassem pros amigos mais próximos. Mas soltar todos os detalhes assim? Ninguém faz isso. Então eu chamo de lorota. Uma historinha inventada por dois virgens. Era pra ser uma paródia daqueles filmes de adolescência? Ha-ha-ha!"

Mamãe, papai, o lorde demoníaco está prestes a dominar o mundo...

O sangue drenou do rosto de Miki e Ren. Hayato olhava para a mesa como se quisesse que o chão o engolisse.

"Certo, Ren, Miki, Hayato. O que têm a dizer? Dei minha crítica ao 'ensaio'; alguma objeção?"

Agora eu entendia.

O Rei estava aqui o tempo todo, observando. Quando viu que eu estava afundando, ele interveio para me salvar.

Mesmo depois de tudo que eu disse ontem...

… Quão burro você é, Rei?

Sim, eu havia entendido. O Rei era burro pra caramba. E mole demais. Ele veio me ajudar por ordem do professor, tentou me transformar como num clichê de light novel, e eu, como um cachorro que morde a mão que o alimenta, ataquei ele. E mesmo assim, ele estava aqui, me defendendo.

Só podia ser burro.

Mas era o Saku Chitose.

Eu me arrepiei.

O Rei deve ter vivido a vida toda assim...

Ele era diferente. Que jeito ridículo de viver. Eu só tinha visto a superfície do ser humano complexo que era Saku Chitose.

"Toda a existência de vocês gira em torno de esmagar os outros!!!"

Minhas palavras voltaram à mente. Ele só vivia sua vida, mas tinha que aguentar tanto ódio. Mesmo assim, nunca parava.

Ele podia simplesmente ignorar quem estava abaixo dele. Seria mais fácil. Mas ele não fazia isso. Ele defendia todo mundo. Quantas pessoas ele já ajudou, só para depois esfaquearem ele pelas costas como eu fiz?

E mesmo assim, ele continuava ajudando. Talvez fosse pelas "aparências", como ele disse. Talvez por erros do passado. Talvez porque tinha uma moral forte. Eu não sabia.

Só sabia que eu não tinha nem um pouco da bondade que ele tinha.

"Olha. O Saku fez tudo isso querendo te ajudar. Ele ficou do seu lado até agora, não ficou? Não consegue ver isso?"

Você estava certa, Yuuko.

Minha visão ficou embaçada pelas lágrimas.

É por isso que ele é o melhor. Ninguém chega perto.
Ele é imbatível.

Sim, ele era o cara mais burro e mais incrível que eu conhecia.

"Qual o seu problema?"

"Hmm?"

"Quem te deu o direito de se intrometer na nossa conversa?! Quem você pensa que é?!"

Ren bateu os punhos na mesa e se levantou. Ele tinha perdido a cabeça. Sabia que o Rei estava num nível social muito acima, mas estava tão furioso que não ligava mais.

"Hmm, sou Saku Chitose. O cara mais popular da minha escola. Pode me chamar de Rei. Muitos chamam."

O Rei deu um sorriso sarcástico.

"Tá querendo brigar, é?!"

"Hmm, pelo que lembro, foram vocês que começaram a provocar meu amigo aqui."

O Rei encarou Ren.

Ouvir ele me chamar de amigo fez as lágrimas voltarem. Talvez fosse só pela situação, mas o Rei ainda me considerava um amigo...!

"Não se intrometa! Isso é entre o nosso grupo, então vá embora!"

"É da minha vida. Sou amigo dele. Vocês são só ex-amigos."

"Ch! Você provavelmente só se divertiu dando um glow-up num otaku impopular! Todos os populares são iguais! Agem como se fossem populares desse passe livre pra humilhar os outros! Caçam a gente por esporte!"

"Fala você. O que estão fazendo aqui é humilhar alguém menos popular no seu grupinho otaku. Nossa, que homenzarrão você é, hein?"

Ren parecia pronto para socar o Rei, que só sorria calmamente.

"Cala a boca!! Todos os populares são uns lixos superficiais! Só ficam rindo de coisas idiotas na sala, achando que todo mundo tá olhando, imaginando como são legais! Vão todos pro inferno!"

"Então você está dizendo que otakus são pessoas profundas e cultas que escondem sua verdadeira natureza na escola? Bom, isso vale pra nós também. Na sala, mostramos nosso lado divertido. Enquanto vocês ficam no quarto destilando ódio na internet, nós estamos praticando esportes, suando, ajudando amigos ou conversando com garotas no telefone até tarde, sendo um ombro pra elas."

O Rei tomou outro gole do meu latte.

"O que você espera que a gente converse na sala? Política? Atualidades? Você julga as pessoas pelo que falam com os amigos entre as aulas? Se nós somos superficiais, o que isso faz de você? Você basicamente não existe."

Isso me lembrou das conversas que tínhamos no começo. Uma pontada de arrependimento apertou meu peito.

"Vocês deviam conversar com os impopulares também, não só com seus amigos populares! Se acha tão bonzinho, mas só é assim com outros populares!"

"Deixa eu te perguntar. Você já tentou conhecer populares ou foi gentil com algum? Quer que as pessoas sejam legais com você—comece sendo legal também. Não, você só espera cortesias que nunca pensaria em retribuir. Somos seus colegas, não sua mãe. Não somos a Madre Teresa."

Todos os ataques de Ren ricocheteavam no Rei e voltavam pra ele. Como bumerangues verbais.

"Acorda. Rastejar no chão, cuspindo nos populares—você é tão ruim quanto os populares que olham com desdém pra baixo. Dois lados da mesma moeda."

Ren percebeu que não era páreo para o Rei. Agora estava na defensiva.

"B-bom, de qualquer forma, um ninguém depressivo como o Kenta nunca vai ser popular. Mesmo se ele se matar, otakus nunca viram populares. Não acontece. Não sei o que você planejava com ele, mas posso garantir que o Kenta não confia nem gosta de gente como você. Ele só está indo na onda, se preparando pro momento em que vocês virarem as costas. Ele odeia você por isso!"
[Mon: Como diria o Grande Sol… “Gaguejou, perdeu no argumento!”]

Ren olhou pra mim, com um sorriso de escárnio.

"As pessoas não mudam! As pessoas não podem mudar! E ver você tentando tanto... É patético!!!"

Eu pisquei. Ele estava certo. Eu provei isso ontem, com meu surto. Não tinha direito de continuar aproveitando a ajuda do Rei.

O Rei suspirou, sem olhar para mim. Em vez disso, deu um passo na direção de Ren...

"Você está me irritando de verdade, sabia?"

Outro passo. E então...

BAM!!!

O Rei esmurrou a parede atrás da cabeça de Ren, encurralando-o, cara a cara. Os funcionários e clientes do Starbucks congelaram e olharam para gente.

Mas o Rei ignorou todos. Ele encarou Ren, que virou o rosto, fazendo careta.

Eu nunca havia visto Saku Chitose com raiva. Até agora.

"Certo, escuta aqui, seu lixo miserável. O Kenta olhou para si e deu passos para se tornar a pessoa que quer ser. Sim, ele ainda tem um longo caminho pela frente, e algumas pessoas podem ter problemas com sua nova persona. Mas ele continua seguindo em frente. Ele prometeu para si mesmo que nunca voltaria atrás, não importa o quão difícil seja ou quantas vezes ele cair."

SLAM!

O Rei bateu na parede do outro lado da cabeça de Ren.

"O Kenta está alcançando a lua. Aquela distante, brilhante, bela representação de tudo que ele quer conquistar. Você tem ideia de como é difícil tomar essa decisão e seguir com ela? Não tem respeito?"

Então o Rei agarrou Ren pela gola da camisa.

"Alguém como você, que nunca tenta melhorar, só comendo e respirando, preso na sua vidinha triste enquanto ataca quem está se esforçando..."

O Rei estava gritando agora.

"Você não tem direito de rir de alguém como o Kenta!!!"

...Eu não consegui segurar.

...As lágrimas caíram, e os soluços vieram.

O Rei estava bravo. O Rei estava gritando. Por mim.

Ele sempre foi tão descontraído, tão tranquilo. Mas por mim, ele estava mostrando suas verdadeiras emoções pela primeira vez.

Nunca fui tão encorajado na vida.

Era o presente final do Rei pra mim, antes de seguirmos caminhos separados.

Continue! Não pare! Não olhe pra trás!
Suas escolhas são boas! Sua motivação é sólida!
Vamos lá, tente me alcançar! Você consegue! Um dia!

Era isso que as ações do Rei diziam.

Eu tinha que honrar esse gesto. Não podia mais vacilar. Tinha que levar a mensagem dele a sério.

Queria lembrar desse momento para sempre.

Tentei gravar a imagem do Rei me defendendo na mente. Para sempre tê-la comigo.

E então...

"Ai, Saku! Queria que você usasse esse movimento sexy de bater na parede comigo, hee-hee-hee!"

[TMAS: Moleque metendo o murro na parede com ódio e a garota querendo levar uma dessa, eu hein]

Uma garota apareceu do nada, olhando para o Rei. Ela usava um vestido deslumbrante, que mostrava seus ombros, costas e um bom decote. Parecia uma modelo. Seu sorriso, como sempre, era radiante.

O Rei se virou e, por um momento, ficou com os olhos arregalados e a boca aberta. Parecia um idiota. Com certeza isso não constava em seus planos.

"...Yuuko? O que...? O que você está fazendo aqui?"

"—Hmm? Claro que eu viria! Estava preocupada com você e o Kenta-cchi, então tinha que ver o que estava rolando! Não é justo me deixar de fora, meninos!" Yuuko se virou para os funcionários e clientes que ainda nos observavam. "—Desculpem o barulho! Tá tudo sob controle!"

Ela acenou tranquilizadora, e a tensão começou a se dissipar. Aos poucos, todos voltaram ao que estavam fazendo.

O Rei e Ren pareciam ter baixado a guarda. Na verdade, o Rei deu um tapinha no ombro de Ren antes de se afastar. Rapidamente, sua compostura habitual voltou. Nas últimas semanas, eu nunca havia visto o Rei perder a calma. Deve ser um evento raríssimo.

Então Yuuko se virou para mim. "Kenta-cchi, seus cachos são tão fofos!" Ela afundou os dedos no meu cabelo e o bagunçou. Miki, Hayato e Ren só ficaram parados, estupefatos. Além de tudo, a aparição bombástica de Yuuko e sua intimidade comigo os deixaram completamente chocados.

"Bom, agora que todos disseram o que queriam, vamos deixar isso para trás e começar de novo amanhã? ...Kenta-cchi, tem mais algo a dizer?"

Yuuko olhou para mim, sorridente. Ela realmente sabia aliviar o clima.

Eu olhei para o Rei.

Ele respirou fundo, como se estivesse se preparando para falar.

"Essa é a sua história, não é, Kenta? Sua história de autossuperação. E nós somos seus coadjuvantes, o cara e a garota fofos que aparecem quando você precisa de ajuda. Mas essa é a cena final. Então o herói faz um monólogo de encerramento."

Eu sabia o que precisava dizer.

Eu me perdi por um momento, mas venci essa luta contra meu eu antigo e saí vitorioso.

Como o Rei disse:

"O Kenta está alcançando a lua. Aquela distante, brilhante, bela representação de tudo que ele quer conquistar."

Fechei os olhos por um segundo, imaginando aquela luz no céu noturno. Havia uma figura diante dela, em silhueta. A figura do rei.

Era meu jeito de lembrar de tudo que aconteceu—e do meu adeus.

Abri os olhos, olhei para meus antigos amigos e sorri.

"—Eu... vou alcançar a lua. Não vou mais olhar para trás."

 

 

"Certo, chega dessa história paralela de Kenta Yamazaki, o ex-nerd em ascensão, enquanto ele se aproximava do maior cruzamento de sua vida até agora."

"Agora, voltemos à história principal. A comédia romântica de harém estrelada por Saku Chitose, o popular extraordinário."

"Por que você veio?" Kenta fungou. "Você mentiu."

"Não estava planejando vir. Mas nunca disse que não viria. Lembra que eu falei que daria tudo certo? Claro que daria, porque você tem Saku Chitose no seu time."

"De novo isso…?"

Agora que estávamos longe do estresse da situação, Kenta nem tentava mais esconder as lágrimas. Elas escorriam livremente. Com muito ranho.

"Pode parar de chorar? O bullying deles te afetou tanto assim?"

"Não são lágrimas de tristeza. É porque vocês dois vieram me salvar, mesmo depois de todas as coisas horríveis que eu disse ontem. Estou tão feliz. Por isso estou chorando."

"Você já se desculpou por ontem. Olha, vamos só bater aqui e superar isso."

"É assim que os populares lidam com as coisas. Eu não sei fazer isso."

Depois que saímos do Starbucks, decidimos levar Yuuko para casa. Estávamos passando pelos mesmos campos de arroz que eu atravessei ontem.

Kenta não parava de choramingar e fungar.

"Kenta-cchi, chega. Que nojo! Vamos, limpa essas lágrimas."

Yuuko ofereceu um lenço a Kenta. "Obrigado", ele resmungou, enxugando os olhos e assoando o nariz com barulho.

A roupa de Yuuko era muito mais ousada do que a que ela usou quando fomos às compras com Kenta. Seus ombros estavam totalmente à mostra, assim como metade das costas. Dava até para ver um pouco do decote. O vestido era de tricô rosa e colava nos contornos do corpo dela. Suas coxas pareciam cheias e deliciosas.

A roupa certamente funcionou para deixar Ren e companhia em estado de choque. Aquele vestido era claramente a arma secreta de Yuuko, sua Excalibur pessoal.

Sexcalibur. Heh.

[TMAS: Clara referência a abertura de shimoneta ]

Yuuko observou Kenta assoando o nariz no seu lenço.

"Éh, pode ficar."

"Imaginei."

Kenta engoliu um pouco da água mineral que compramos no shopping e pareceu finalmente se acalmar. Então murmurou algo. Parecia "Isso é o melhor... Né?" Depois continuou: "Quer dizer, eu sei que a responsabilidade por tudo isso era minha, apesar de tudo que vocês fizeram por mim. Mas, pensando bem... será que não exageramos um pouco?"

"Hmm, bom, sim. Em light novels e anime, as coisas costumam esquentar no confronto final. Muitas palavras duras, esse tipo de coisa. Mas no fim, a história sempre termina com os mocinhos perdoando os vilões, né? Tipo, é o final padrão, feliz."

"É... Nossa, Rei, fiquei realmente chocado quando você apareceu e enlouqueceu com o Ren. Acho que fui meio inútil, né?"

"Heh. Nem fala." Coloquei uma mão no quadril e mostrei a língua. "Hmm, mas ainda acho que não exageramos. Só paguei na mesma moeda por terem sido uns babacas com você hoje. Na minha opinião, apenas revidamos no mesmo nível."

Eu estava falando sério.

"Sim, eu realmente não ligo se os sentimentos deles foram machucados. Se ajudar um amigo não significa acertar as contas com quem o feriu, então o que seria justiça?"

Yuuko cutucou minha barriga.

"Hee-hee, você perdeu a pose por uma vez, Saku!"

"Não perdi. Eu estava atuando. Sempre sou descolado."

Para ser honesto, não esperava que Yuuko aparecesse naquela hora.

"Pra ser sincera, fiquei esperando a chance de entrar. Mas acreditei em você, Saku. Então decidi esperar até você falar tudo. Nossa, eu estava tão brava! Queria que todo mundo tivesse se entendido no final... Mas eles estavam sendo super crueis com meu amigo. Claro que eu ficaria do lado do Kenta-cchi! Acho justo ficar brava por um bom amigo quando ele está sendo injustiçado!"

"Ah... Vocês..."

"Mas se ainda se sente mal com o resultado, sei como melhorar isso. Só lembre que caras assim machucam os outros indiscriminadamente e nunca se arrependem. E eles nunca enfrentam os fortes. Só os que acham que não vão revidar. Eles esquecem que algumas pessoas jogam a merda de volta — problema deles!"

Chutei uma pedrinha no caminho.

"Não é melhor lembrar gente assim como é ser aquele que recebe as palavras duras e a violência? Acho que no fim foi um favor pra eles. Não foi planejado, mas pensando bem, fizemos um serviço hoje."

"—Mas... agora tem mais gente por aí que vai te odiar, Rei. Tudo por minha causa..."

Eu ri, vendo Kenta caminhar com os ombros caídos.

"Ainda não te contei minha filosofia, né? É o que está por trás da minha estética de cara descolado. 'A morte é melhor que uma vida sem beleza.' Esse é o código pelo qual vivo, e é o que faz alguns me chamarem de narcisista. Mas não vou mudar, não importa a pressão. Porque o que mais temo é olhar no espelho e não gostar do cara que vejo."

Algo mexeu dentro da minha alma. Parecia antigo — e meio familiar.

"—Eu quero ser belo. Como a lua que vi naquele dia. Como uma bola de gude presa numa garrafa de refrigerante Ramune. Aquela do livro que li uma vez."

Kenta refletia sobre minhas palavras com cuidado.

Olhei para ele e dei um sorriso significativo.

"E com 'belo', quero dizer descolado, atraente e com um monte de garotas correndo atrás de mim. Entendeu?"

"Rei... Eu estava começando a me inspirar, mas agora você estragou tudo..."

 

Chegamos na casa da Yuuko.

Já não parecia mais primavera, mas o verão de verdade ainda demoraria. Era o fim de abril. A estranha transição entre as estações refletia o sentimento inquieto entre nós três.

Agora que tínhamos passado pelo primeiro mês do segundo ano do ensino médio, com todos os seus novos encontros, o que viria a seguir?

Lembrei do que Kura disse:

"Se perder e pegar o caminho mais longo é onde está o verdadeiro tempero da vida."

Ele estava certo. Seria uma pena deixar esse desvio chegar ao fim sem perceber o que ganhei com ele.

Consegui me tornar uma bússola, algo que o Kenta pudesse usar para navegar? Eu seria uma luz para ele se perdesse novamente no escuro, mostrando o caminho certo?

"Acho que o desvio termina aqui."

Me virei para o Kenta.

"...Hã?"

"Essas últimas três semanas. Você tapou o buraco no seu barco, certo? Não está mais afundando sozinho no oceano. Agora chegamos ao fim do nosso acordo."

"Eu... eu entendo. Sempre soube que isso viria, e depois do que eu disse ontem, pensei que estava preparado... Mas essas últimas três semanas foram incríveis. É difícil acreditar que acabou. Desculpa."

"Mesmo assim, tínhamos um acordo."

Yuuko olhou para mim, e eu pude ver que ela queria dizer algo. Balancei a cabeça.

Há um limite para o peso que podemos carregar. Se eu assumisse a responsabilidade de cuidar de todos que conheço na vida, acabaria deixando algo importante para trás.

De repente, escureceu, sem que nenhum de nós percebesse.

Quando olhei para cima, vi a lua brilhando intensamente sobre nós.

As coisas sempre mudam antes que você perceba. Pessoas. Cidades. Estações.

Por isso, temos que seguir em frente. Se pararmos por muito tempo, o tempo nos ultrapassará.

"O desvio termina aqui", repeti para mim mesmo mais uma vez.

"...Eu entendo. Acho que... decidimos isso desde o começo, não foi?"

Kenta olhou para o céu, como se estivesse se lembrando de algo.

"Sabe, no dia em que você quebrou minha janela e invadiu meu quarto... foi como se você tivesse quebrado uma gaiola de vidro onde eu estava preso... Foi como se você tivesse me trazido algo precioso, algo que eu tinha desistido de procurar há muito tempo—algo que eu nem lembrava mais como era..."

Kenta colocou uma mão no peito, sorrindo com amargura.

"Nossa, o que é que eu estou falando?" Ele riu. "Mas, a partir de amanhã, sei que tenho que começar a escrever minha própria história. Você me trouxe até aqui, Rei, Yuuko, todos vocês. Mas não posso mais depender de vocês. Só tenho um último pedido, porém. Quando nos vermos na escola... vocês poderiam me ignorar? Se mantivéssemos qualquer nível de amizade, acho que só iria alimentar falsas esperanças..."

Kenta engoliu em seco. "Mas...", ele hesitou novamente, antes de respirar fundo e continuar. "Preciso superar minhas fraquezas e encontrar minha própria força. Até o dia em que eu puder estar no mesmo nível que pessoas como vocês. Quando esse dia chegar... tudo bem se eu pedir de novo? Para sermos amigos, quero dizer..."

Seus olhos se encheram de lágrimas novamente. Tsc, depois de todo aquele esforço para limpar o rosto.

"Essas últimas três semanas... eu nunca vou esquecer. Não vou esquecer as coisas que você me ensinou, Rei, o jeito que você me repreendeu pelos meus erros. Os conselhos que você me deu, Yuuko, e todos os seus sorrisos... Não vou esquecer de nada, nem no dia da minha morte!"

Kenta respirou fundo.

"Obrigado a vocês dois... Muito, muito obrigado!!!"

Então ele se curvou profundamente diante de nós.

Naquele momento, ele deixou de ser um menino e se tornou um homem.

Um homem que se mantinha ereto e orgulhoso.

Olhei fixamente para o Kenta, absorvendo sua imagem. Depois, me virei para a Yuuko ao meu lado e falei em voz baixa:

"Querida, esse homem bateu a cabeça? Ele está falando coisas muito estranhas."

"Ah, meu Deus! A culpa é sua, querido, por ser tão enigmático! O coitado entendeu tudo errado!"

"É essa mentalidade de light novel que ele tem. Tudo tem que ser tão dramático e sentimental."

"Ora, ora, meu bem..."

Kenta ergueu a cabeça e nos olhou confuso, enxugando as lágrimas com as costas da mão.

"Olha aqui, Kenta-cchi. Quando o Saku disse que acabou, ele quis dizer essa relação estranha de professor-aluno, mestre-discípulo, rei-súdito, lord demoníaco-subordinado, entendeu?!"

"...O quê?"

"A partir de amanhã, vamos ser amigos de verdade! É isso que ele quer dizer! Depois de tudo que passamos juntos, não podemos simplesmente voltar a ser estranhos, não é?"

"...Hã?"

"Sinceramente, estou chocada que você achou que poderíamos descartar nossa amizade tão fácil! E depois que eu até usei esse vestido coçando que odeio só para te ajudar! Hmph!"

[TMAS: A mulher usa roupas provocativas pra dar moral pro cara, quero uma dessas pra mim]

Ah, por favor. Você sabe que ama seu vestido Sexcalibur, Yuuko.

"M-mas... tem certeza?!"

"Claro! Somos amigos, não somos? Mas não é como se eu estivesse te oferecendo uma iniciação oficial no 'Anjos da Yuuko Hiiragi' ou algo do tipo..."

"É 'Time Chitose'."

"... Como eu disse, não estou te convidando para os 'Anjos da Yuuko Hiiragi', mas vamos conversar na sala, Kenta-cchi! Queremos saber tudo sobre sua nova vida! E vamos almoçar juntos às vezes! Ah, e quando arrumar seu quarto, me convide! Podemos jogar videogame juntos. Ah, mas nada de gracinhas, ok?"

Yuuko piscou para ele no seu vestido provocante. Nada de gracinhas, claro, Yuuko.

"Afinal, fizemos muito por você, agora é sua vez de nos retribuir! Com amizade, ok? Você não pode simplesmente nos abandonar agora!"

Finalmente, decidi falar também:

"Sabe, Kenta, você nunca nos pediu para sermos seus amigos de verdade. Você só decidiu agir como o mártir oprimido. Certo? Senhor Coadjuvante da Silva Secundário?"

"Rei... você me enganou de propósito, não foi? Sabia que eu ia entender errado! Por isso ficou todo solene e sério..."

"Qual é, cara. Não posso deixar minha comédia romântica terminar sem uma pegadinha."

"É a primeira vez desde que nos conhecemos que eu realmente tenho vontade de te socar!"

"Ouça, Kenta. Não dê um soco sem estar preparado para levar um de volta. Você tem que saber no que está se metendo."

"Cala a boca, Rei! Chega! Já entendi!"
[Mon: Tu ru ru ruuuuu… Kenta acaba de se juntar a “Team Chitose” party! Duvido alguém pegar essa referência kk]

 

 

 

Depois de levar a Yuuko para casa e me despedir do Kenta, segui para casa pelo caminho habitual à beira do rio.

Caminhava cansado, ouvindo o leve murmúrio do rio, sentindo o cheiro da vegetação fresca, banhado pelo luar.

Luzes suaves emanavam das casas à margem. O cheiro de algo gostoso cozinhando. O barulho de água respingando vindo de uma janela no andar de cima — alguém tomando um banho quente. Mas seria uma colegial fofa? Uma dona de casa MILF? Ou um velho com barriga de chope?

Às vezes, eu esperava um pouco. Às vezes, me decepcionava. Às vezes, apenas passava sem pensar em nada.

Mas, por algum motivo, ela sempre estava aqui quando eu realmente queria vê-la.

"—...Ei, Asuka."

"—Ah, oi. Não esperava te encontrar hoje."

"—Que estranho. Eu tinha certeza que te encontraria." Fiz uma pausa. "—E você não consegue pensar num apelido melhor que 'ei'? Odeio dividir nome com os outros. Se estiver a fim de melhorar."

"—Hmm? Que preocupação mais esquisita."

 

 

Contei à Asuka tudo o que aconteceu nesse abril, da forma mais resumida possível. Ela acenou com a cabeça, ouvindo atentamente, fazendo expressões satisfeitas de surpresa e diversão enquanto eu falava.

"Acho que é uma ótima história. Tem inocência, desenvolvimento de personagem, é inspirador. Como ver um grupo de meninos soltando balões de luz em uma noite de verão."

Senti minhas bochechas esquentarem enquanto olhava para o céu noturno.

"O que você teria feito no meu lugar?"

"Hmm. Mas eu não sou você. Sou eu mesma. Provavelmente teria tentado conversar com o Kenta e depois ido com ele falar com a Miki, os três juntos. O incidente com a Miki foi o começo de tudo. Se resolvêssemos isso, tudo estaria resolvido."

"Essa é a diferença entre nós, Asuka. Pensei que, se focasse em mudar o resultado do que aconteceu, chegaríamos à raiz do problema naturalmente."

Asuka me deu um sorriso compreensivo.

"Acho que meu jeito teria funcionado, mas teria deixado o Kenta preso àquele incidente, e não sei no que daria. Mas o que você fez, libertou o Kenta."

"... Você está pensando demais. Só fiz do meu jeito porque é o único que conheço. Não consigo abordar essas coisas diretamente."

Por que eu sempre me sentia como uma criancinha de novo quando estava com essa garota?

"Mas você meio que gosta desse seu lado, né?"

"...Hmm. Acho que sim."

De repente, Asuka esticou a mão e afastou minha franja, olhando nos meus olhos. Eu congelei, mesmo que o toque de seus dedos finos e quentes me fizesse cócegas.

"Você mudou um pouco. Seu parque mental agora está cheio de crianças brincando com fogos de artifício."

N/T: Está se referindo àqueles fogos de artifício que brincam com a mão, não os explosivos

Os olhos da Asuka estavam cheios de uma cor profunda e rica.

"Eu? Nem pensar. Sou o mesmo de sempre. Só um cara bancando o herói, acho."

"Hm, sempre tentando parecer tão descolado. Mas tudo bem. Faça seu papel de herói. Prometo que não vou invadir seu palco como vilã."

Ela me deu um sorriso provocante. Mas, ao mesmo tempo, senti que ela conseguia me ver direito. Ela se inclinou, trazendo os lábios perto do meu ouvido.

"Você é tão complicado. Age como se nada te afetasse, como se fosse tão frio, mas, na verdade, é muito gentil. Sempre ajudando os outros. Só é duro consigo mesmo."

Desviei o olhar, querendo escapar. Então forcei um sorriso despreocupado, tentando afastar meus próprios pensamentos incômodos.

"Não, gentileza de verdade é pular num rio lamacento para salvar um garoto de ser intimidado pelos colegas."

Asuka inclinou a cabeça para o lado.

"Olha só, você me colocou num pedestal. Como a Yuuko e o Kenta fizeram com você. Mas eu sou só eu. Asuka Nishino."

Ouvi um peixe saltando no rio. Um pequeno ploc.

"Não consigo carregar o peso dos outros como você. Não sou tão boa quanto você. Só ajudo quem realmente quero e faço o que posso, nada mais. Falando nisso, depois disso vou para casa, comer o omurice que minha mãe fez e ler um pouco de A Porta para o Verão do Heinlein antes de apagar."

"Nossa, que existência despreocupada e fácil."

Ela me lembrava um pouco o Kura.

Como o Kura disse... Ninguém tem uma bússola moral completamente justa. Temos que decidir por nós mesmos, o que moralidade significa. É só isso.

Mas algumas pessoas nem checam sua bússola. Quase como se verificar isso roubasse a alegria do mundo ao redor.

Olhei nos olhos da Asuka. Como seria o mundo dela?

"A propósito, como você gosta do seu omurice? Gosta quando a omelete é colocado por cima e depois aberto para o ovo escorrer? Gosta com queijo? Que molho prefere? Ketchup? Molho demi-glace? Molho branco? Eu gosto de uma omelete bem fina e justa em volta do arroz, cheio de ketchup. Do jeito que a gente comia quando era criança, sabe?"

Parecia que, no momento, o mundo dela girava em torno do jantar. Ketchup vermelho, gema amarela, salsa-verde no lado. Como um semáforo. Aqui estava eu, pensando que estávamos tendo uma discussão filosófica, enquanto ela só pensava com o estômago.

"Tem planos para a Golden Week?"

N/T: Feriadão prolongado japonês, muitos feriados em sequência.

"Hmm, não. Nenhum. Não gosto de fazer planos com antecedência. Acho mais divertido decidir na hora o que fazer quando acordo. Odeio me prender a algo e perder algo mais divertido que apareça depois. Então, tem algum encontro marcado? Pode me contar, sou sua 'onee-san'."

Asuka prendeu o cabelo revolto atrás da orelha e sorriu para mim, os olhos fixos nos meus.

"Estava pensando em convidar uma garota mais velha para sair. Mas ela acabou de destruir meus planos. Vou ficar embaixo da sua janela amanhã de manhã para te acordar, Asuka. Vou fazer alongamento lá."

"Ooh, parece divertido. Aí, quando esquentar, podemos pular no rio. Ficar todos sujos e molhados. Depois posso vestir suas roupas de educação física fedorentas e ir para casa."

"Elas não fedem. Quer pular no rio agora?"

Ela sorriu, como se lembrasse daquele dia. "Seria legal, não seria?"

Antes que eu pudesse perguntar o que ela queria dizer, ela balançou a cabeça. "Esquece."

"... Mas é melhor assim. É melhor nos encontrarmos aqui, aleatoriamente, na beira do rio. Assim, eu posso sempre ser a garota mais velha descolada, e você pode ser o garoto adorável com quem eu gosto de brincar."

"Você acha que nos aproximar mais estragaria nossa relação?"

"Pode ser."

Parecia que eu estava sempre perseguindo uma versão etérea dela.

Com medo de que ela desaparecesse na escuridão diante de mim, eu disse "boa noite".

 

 

 

 

De volta em casa, saí para a varanda, como naquela noite um mês atrás.

Tínhamos outra lua cheia no céu, um círculo perfeito, como se desenhado com um compasso. A lua havia completado uma órbita inteira ao redor da Terra desde o dia em que Kura me fez aquele pedido.

As cerejeiras já tinham perdido suas flores há tempos, e as árvores agora estavam viçosas e verdes. Os novos alunos andavam com um passo mais leve a caminho da escola. Kenta saiu do seu quarto. E eu agora usava mangas curtas sempre que ficava à toa em casa.

A noite ao meu redor era indistinta e envolvida por um nevoeiro.

Em algum lugar distante, um jovem saltava em direção ao céu. Em outro, uma garota subia em sua carruagem.

Mastigando os restos de um pesadelo interrompido, o espírito baku rechonchudo, devorador de sonhos ruins, sorriu.

Eu teria bons sonhos esta noite.

Tirei o celular do bolso e, por impulso, abri o site secreto de fofocas da escola. Tinha uma nova postagem que me mencionava. Um sorriso se espalhou pelo meu rosto.

"SAKU CHITOSE DA TURMA CINCO É O REI!!!"

Idiota. Eu disse pra ele ficar longe das redes sociais.

 

 

— Moonlak: Capítulo muito foda para fechar o volume de vez :D! E foi bom ter tido uma visão da perspectiva do Kenta também… Espero, leitorada, que vocês tenham apreciado mais esse capítulo! E não se esqueçam, para sempre receberem as atualizações antes de todo mundo, Você precisa entrar na Moonlight Scan: https://discord.gg/hhGjsubuKd

 

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