Cheaters Brasileira

Autor(a): Kuma


Volume 1 – Arco 4

Capítulo 56: Herdeira da magia

 

Ao longe, um estranho pulso é sentido por aquele que anseia a mais pura energia...

PLAYER: [Kildery]

 

 

— Hã? Que que isso?! — Quando percebi, por um momento achei que entraria em colapso. Um surto de êxtase e inquietação.

Senti algo de longe, provavelmente fora da cidade se eu fosse considerar a distância, explodindo como um vulcão entrando em erupção. Não... estava mais para um banquete interminável! Fileiras e fileiras de comida deliciosa que resplandeciam como se fossem banhadas a ouro e sol. Ou seria um palácio de torta de creme?

Bah, isso não importa agora. Que maravilha! Uma energia que transbordava, que era tão forte e oscilante que eu conseguia sentir daqui e ter um gostinho do que seria minha próxima refeição. Uma cachoeira de saliva escorreu pelos meus lábios, meus olhos se projetaram para frente imaginando como seria a minha iguaria.

Sem perder mais tempo, me levantei e sai, farejando o rastro daquela energia impressionante como um lobo faminto atrás de sua próxima presa. Um homem que estava atrás de um balcão de madeira gritou para mim: — Ei, você não vai pagar, não?

Eu me virava e o encarava com uma ira sanguinolenta nos olhos, fazendo aquele pobre verme suar frio e engolir em seco várias vezes.

— Não me atrapalhe! Ou quer ser devorado?

 

 

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No salão central da ||TORRE DO MAGO SOLITÁRIO||, duas forças disputam o controle da batalha...

PLAYER: [Juno]

 

 

Incrível, para não dizer assustador. Não esperava ter herdado tanto da minha mamãe, pelo menos a ponto de rivalizar com o monstro que era o Oolong agora. Sentia cada poro meu espirrar magia e absorver em um ciclo infinito.

Foi como ela disse para mim:

Após os pilares ruírem, um grande nuvem de poeira se levantou no corredor. Esquivei das pedras como pude, mas muitas ainda me acertaram e acertaram com força. Fiquei encurralada, vi meu fim diversas vezes..., mas como naquele dia em que fui achada na floresta por Oolong, eu sobrevivi.

Eu me encontrei de pé sobre a figura da minha cópia soterrada sobre vários escombros, uma cachoeira escarlate descia da lateral de sua cabeça. Um de seus olhos havia sido esmagado completamente e um de suas narinas não corria ar, mas era canais para sangue e mais sangue que escorria.

Ela estava completamente derrotada. Eu sobrevivi aos seus ataques, sobrevivi ao desmoronamento. Eu sobrevivi e vou sobreviver quantas vezes eu precisar.

Não era mais aquela menina fraca que apenas corria e roubava e enganava. Não queria mais ser essa Juno que estava agora debaixo de mim, mas uma nova que renasceu para um novo propósito.

Você... deixou esse plano. Não esperava... por isso. — A voz dela estava tão fraca como se fosse desaparecer a qualquer momento.

— É você, com sua visão estática do mundo, que não consegue compreender, não é? — Eu fiz um aceno de cabeça, indicando que era uma pergunta que não precisava de uma resposta. Até porque ela era eu. E ela já sabia.

Minha cópia sorriu e seus lábios se moveram lentamente.

— Talvez... mas eu já esperava que um dia você se ligasse.

— E eu pensava que poderia ficar desse jeito para sempre. — Eu fiz uma pausa e então, como uma só voz, eu e ela dissemos: — E tudo mudou por causa daquela menina!

Não pude evitar de sorrir e então, a outra Juno cuspiu sangue e continuou, já com dificuldade de manter a voz firme: — Ago-gora... eu vou lhe ensinar... como acessar... esse poder oculto que está adormecido dentro... de você.

— Poder oculto? Como o poder da Alta Sacerdotisa? — perguntei, mas também já sabia a resposta.

— Si-sim... o que você... fará com isso... de agora em diante... isso é uma decisão só sua. Assim como o seu... futuro.

Como o nosso futuro — corrigi. A cópia ia se desfazendo lentamente e sumindo em um pó brilhante e verde que se unia aos poucos a mim. Ao meu corpo.

 

Então foi que eu entendi o que ela queria dizer. Até o fim, ela foi uma patife, como meu eu antigo teria sido. Eu ri comigo mesma quando lembrei, olhando para as minhas mãos espalmadas.

Eu nunca precisei aprender nada, no fim das contas. Esse poder sempre esteve dentro de mim, ao meu redor, em todos os lugares... e eu sempre soube como usá-lo. Foi isso que você me deixou de herança, mamãe.

Obrigada...

— Gwaaaaaaaaaaah! — Oolong rugiu, se esforçando para permanecer na minha frente. Pouco a pouco, ele ia sendo empurrado, dominado pela aura que me cercava como um monstro que acabara de acordar. — Por quê?! Por que estou perdendo para um fracote como você?!

— Ué... me diz você, ora. Você disse que eu nunca ganhava de você — respondi com deboche, dando de ombros. — Está com cara de quem não entendeu.

E ao longe, a Lelê ainda me assistia. Estava bastante ferida, mas ainda estava viva e sua cara... se não estivesse toda arrebentada, se fosse outra situação, eu até poderia me acabar de rir daquela cara de boba dela. Talvez fizesse isso em outra oportunidade.

Mas agora... eu tinha que lidar com esse canalha do Oolong.

Estendi a mão espalmada para ele e levantei a outra em frente ao rosto, me concentrando no que eu queria, então bradei: — |TRANSFERÊNCIA|! — E então a vassoura que sumiu na explosão de antes reapareceu na frente de Oolong e o acertou no peito, o lançando para longe.

Ele rolou várias vezes pelo espaço com uma pedra arremessada quicando em um lago, trombando com livros e pedras até parar em um pilar perdido no salão. Ao sair debaixo dos destroços, rugiu mais uma vez, sua energia roxa e opressora se expandindo ainda mais com sua fúria e queimando livros e dissolvendo pedras.

— Calma, calma, não precisa ficar bravinho, amore. — Montei em cima da vassoura e voei até onde ele estava. — Você só fica ai latindo como um cachorrinho abusado. Cão que ladra muito, não morde.

— Desça já aqui, sua mosquinha irritante! — grunhiu Oolong.

— Ou?

— Estava esperando que perguntasse. — De onde estava, sem nenhum tipo de aviso, ele saltou, levantando poeira e pedras, se lançando até onde eu estava. Muito rápido.

— Eita! Aaaargh! — Eu desviei rapidamente, mas ele ainda conseguiu agarrar uma mecha de cabelo meu e arrancar brutalmente. Quase tive o pescoço quebrado por aquele puxão violento. — Porra, porra, porra, porra, porra! Ai, ai, ai!

Só que mal tive tempo de me recuperar do puxão de cabelo e o maníaco já estava em cima de mim, tentando me agarrar. Se eu fosse pega ali, seria o meu fim.

— |TRANSFERÊNCIA| — gritei rapidamente e troquei de lugar com alguns detritos mais abaixo.

Oolong destroçou as pedras pesadas como se não passassem de pedrinhas de beira de estrada e eu rolei no chão, onde elas estavam mais cedo. A vassoura quicou no chão duas vezes e depois ficou em posição novamente para levantar voo.

— Mesmo eu tendo aumentado minha energia, eu não posso me descuidar perto desse cara — lembrei a mim mesma, ofegante, levantando do chão. — Está na hora de brincar um pouco.

Eu saltei em cima da vassoura e ela se atirou as céus. Me equilibrei perfeitamente, como se o próprio objeto magicamente segurasse meus tornozelos para eu não cair de cima dela. Dentro da minha bolsa, retirei aquelas bombinhas com formato de abóboras com rostos sorridentes e as despejei sobre Oolong mais abaixo.

— |ABRACABÓBORA|! — Não tinha pensado em um nome melhor para aquela habilidade, eu juro.

As bombinhas risonhas desceram sobre Oolong, que se protegeu com sua aura e os braços cruzados sobre a cabeça. Ao relarem no solo, todas explodiram em shows de luzes e fogo ainda maiores que quando eu estava lutando contra a minha cópia no corredor.

Tinha que me certificar de que não usaria as |ABRACABÓBORAS| perto da Lelê.

Uma cortina de fumaça se formou no espaço abaixo e já deixei mais algumas bombinhas preparadas, mas Oolong reapareceu de um lugar inusitado; de um pedregulho enorme que flutuava a alguns metros de mim. Ele estava preso à rocha como um inseto rasteiro, esperando eu me descuidar. Merda!

— Te peguei!

— |VASSOURADABRA|! — As cerdas da vassoura se inflamaram como uma tocha viva e eu saltei dela, me pendurando nela enquanto ela se encarregava de fazer um giro acrobático no céu.

O fogo se espalhou e uma onda abrasante atingiu o corpo de Oolong em cheio que caiu fumegando lá embaixo, mergulhando com tudo no solo e abrindo um buraco. Eu subi na vassoura de novo, o coração galopando dentro do peito com o susto de quase ter sido pega de novo.

E para meu desespero, percebi que mesmo com a queda e o fogo, ele ainda estava vivo!

— Porra... esse cara é imortal? Sua energia, mesmo com os ataques, não diminuiu em nada! — grunhi, cerrando os punhos tão forte que senti as unhas penetrarem minhas mãos. — Ele não vai morrer com isso... a não ser que...

No peito. Uma marca de losango roxa em seu peito. Ali é onde vamos atingi-lo.

Letícia me indicou o lugar e eu conseguia ver claramente aquela marca que agora estava rachada em seu peito. Mas eu precisaria de um ataque muito poderoso para penetrar sua aura e atingir seu peito com força máxima. Esse ataque só poderia ser feito pela Lelê.

— Olha as coisas que você me faz fazer, Lelê — disse em um suspiro e então gritei em seguida: — |VASSOURADABRA|!

— Gwwaaah! Onde pensa que vai, ratinha? Pensa que vai fugir de mim depois de ter me humilhado dessa forma?

— Você me quer?! Então vem me pegar, lobo mau! |ABRACABÓBORA|! — Fui deixando aquele rastro de bombinhas de abóbora pelo caminho, mas ele tomava todas na fuça e continuava avançando!

Vez ou outra ele saltava do chão e tentava me pegar no ar, enquanto segurava mais e mais das minhas |ABRACABÓBORAS| sem sequer diminuir o ritmo. Esse cara realmente era um monstro! Mas não demorou para voltarmos aonde Letícia ainda estava deitada e onde eu podia curá-la.

Podíamos ganhar aquela batalha! Estava quase lá e aumentei a potência da vassoura ao aumentar minha aura. Oolong veio por cima e um salto ainda mais alto, sua aura contrastando com a minha e gerando um choque que o impulsionou para cima de novo e me desequilibrou.

— Caramba!

— Venha aqui! — Ele agarrou meu pulso ainda em queda e me puxou para baixo. Droga!

Nós dois estávamos em queda livre agora, a muito e muitos metros até o chão, uma queda que parecia não acabar, seu corpo me puxando para baixo como uma âncora pesada demais. A vassoura percebeu que eu não estava mais em cima dela e se atirou para baixo com a velocidade de uma flecha.

— |TRANSFERÊNCIA|! — Troquei a vassoura e Oolong de lugar e montei ligeiro, me recuperando rápido o suficiente para não me estatelar completamente no chão.

O solo e o céu se reduziram a meros borrões de cor quando rodopiei com a vassoura no ar, me agarrando a ela como se eu fosse me tornar um com o objeto. Essa foi por pouco!

— Sua diabinha esperta! — grunhiu Oolong com um risinho de canto de boca.

Ali estava a Lelê. Faltava poucos metros, uns 5 ou 6 metros, até ela que me encarava com olhos preocupados. Só que o maldito do Oolong era persistente e já estava quase me alcançando de novo.

No meio do caminho, a vassoura saiu de baixo de mim de repente e parou no ar enquanto fui tropeçando os últimos metros seguintes, quase mergulhando de cara naquele piso xadrez arruinado. O que aquela coisa estava pensando? Quebrou? Fez greve?

— Mas... que porra foi isso agora?! — Me virei e ela continuava parada. E, quando não entendi nada, ela se virou e deu meia volta. — O que você tá fazendo?!

— Hum?!

Ela se atirou para cima do monstro Oolong e o atingiu no rosto para deter seu avanço. A vassoura estava comprando tempo para que eu curasse a Lelê!

— Inferno! Saia do meu caminho, vassoura idiota! Morraaa! — rosnou Oolong enquanto dava tapas e socos explosivos no ar como se tentasse espantar um mosquito. A vassoura dava voltas e mais voltas rápidas ao redor dele, o atingindo no rosto, nos braços e no estômago sempre que podia.

— Lelê. Eu tô aqui! Eu vou te curar!

— Juno... que... poder é esse? — Ela não conseguia esconder a surpresa. Era até um pouco engraçado.

— Depois eu te conto os detalhes — disse, tocando seu peito. — |TRANSFERÊNCIA|!

Minha habilidade |TRANSFERÊNCIA| era meu maior dom, dado à mim pela deusa Princesa do Pensamento; uma habilidade especial e única, que apesar de simples, me entregava um vasta gama de possibilidades na batalha. E dentre dessas possibilidades, para nossa sorte, estava a de curar alguém. Tudo nesse mundo pode ser mudado, pode ser transferido de um lugar a outro.

A Impermanência... Esse era o nosso maior trunfo!

— O que está fazendo, Juno?

— Estou dando a você a chance de derrota-lo! Não estrague tudo, tá bom? — Respondi, apertando o rosto.

Nesse meio tempo, quando fechei os olhos e me concentrei para passar o máximo de energia possível para a Lelê, algo estranho me aconteceu. Quando dei por mim, estava diante de um abismo gélido, tão frio que vi minha própria respiração se condensar e os pelos do meu corpo arrepiarem. Onde eu estava? O que tinha acontecido para eu estar ali?

— Você está nos meus domínios... humana. — Uma voz imensa e grave retumbou, vinda da escuridão daquele abismo. Ouvir sua voz parecia para mim como ouvir o som de centenas, milhares de vozes gritando ao mesmo tempo. — Desapareça. Você... não é bem vinda aqui.

E então um par de olhos amarelos surgiram, brilhando desde o fundo do abismo enquanto uma atmosfera gélida se condensava ao meu redor, se esgueirando por cada fenda e canto daquele buraco profundo. A própria morte me abraçando, passando seu véu pelo meu corpo. Droga!

Quando abri os olhos, eu quis gritar, mas minha voz tinha emudecido. Estava me tremendo e suando frio. Se foi pela sensação arrepiante da morte me cercando ou por aqueles olhos que pareciam espiar minha alma, eu não sabia. Quando me encontrei de volta no mundo real, estava sentada, com Letícia parada ao meu lado, já de pé.

Seu poder havia voltado e eu pude me dar conta de que estava incrivelmente exausta, as pernas cedendo ao cansaço extremo. Ela tinha puxado mais energia de mim do que eu tinha calculado.

— Obrigado, Juno. — Letícia disse, olhando por cima do ombro. — Não vou desperdiçar essa energia, pode deixar.

Eu só consegui sorrir e depois mirei para Oolong, que ainda estava ocupado com a vassoura, mas por pouco tempo; ele agarrou a vassoura e, usando as duas mãos, partiu o cabo ao meio. O objeto caiu ao seus pés, despedaçado, sem vida.

— Vocês são tão irritantes e persistentes! Já está na hora de acabar logo com isso e pegar o tesouro que é meu por direito! — A energia roxa pulsou latente e sua aura inchou.

— Lapis Lazulli! — Ela invocou aquele arco de gelo. O arco estava bem maior que da última vez, seu gelo era tão puro e imaculado quanto qualquer geleira. As cerdas cristalinas saltavam e as inscrições talhadas no gelo pulsavam com uma luz azul fria. — Acho que eu e você concordamos em algo afinal. Mas não pense que agora vai ser como da última vez.

— Gwaaaahahaha! Cubinho de gelo insignificante! Vou me certificar de estilhaçar você e seu gelo ridículo e depois dar cabo dessa ladrazinha atrás de você! — Ele esticou os braços e uniu as mãos abertas, formando uma concha. Uma quantidade avassaladora de energia se acumulava ali.

Por mais que ainda me sobrasse poder mágico para ajudar a Lelê, eu não conseguia mais fazer nada. Ela estava por conta própria agora.

Letícia também carregava uma flecha de gelo enorme, uma quantidade imensa de magia se acumulando na ponta do projétil, tanto que tive que me esforçar para me arrastar para longe dela antes que eu acabasse congelada pela força excedente de seu ataque.

Era como uma bolha de gelo se formando ao seu redor, à medida que aquela flecha azul como a cor do céu aumentava de tamanho mais e mais.

— Pensa que esse dardozinho vai conseguir me acertar, cubinho de gelo?! — zombava Oolong, juntando as mãos e seu punho irradiando tanto brilho roxo que era quase impossível olhar para ele diretamente. — Como punição pela arrogância, você e sua amiga morrem agora, forasteira!

— Não subestime a Juno! E muito menos a mim — Letícia respondeu em um tom calmo e afiado. — Quando estiver morrendo, irei contar um segredinho sobre mim...

— Guarde seus segredos para contar à sua amiga quando estiver no outro mundo! Tomeee! — Ele disparou em uma corrida para desferir novamente aquele soco canhão da última vez!

Mas com uma diferença. Em vez de descarregar todo ataque em um golpe corpo-a-corpo, ele parou no meio do caminho e disparou uma rajada de energia pura em forma de um feixe de luz na direção dela.

No entanto, ela sequer se mexeu do lugar. O ataque se aproximava rápido, deixando um rastro de cinzas por onde passava, então por que ela não se mexia? Por quê?! Por quê?!

— Lelê! Se mova logo, ou vai ser acertada!

Em resposta ao meu grito, ela apenas virou a cabeça para trás e, me olhando de soslaio, esboçou um sorriso. Não de tristeza, mas de confiança. E nada precisou sair de seus lábios para entender o que ela queria que eu fizesse.

Não seria ela a derrotar Oolong, mas eu. Ela seria apenas a arma, o meio pelo qual eu faria isso. E entendi o que planejava, como se apenas uma troca de olhares fosse suficiente para transmitir a mensagem.

Entendi... entendi o que você quis dizer, Lelê! Entendi tudo!

— Vamos lá então! — Fiz um esforço para levar e juntei as mãos, focando nos pedaços da vassoura atrás de Oolong. Eu só tinha energia o suficiente para três habilidades, então eu tinha que fazer valer a pena! — |TRANSFERÊNCIA|!

Troquei a Lelê com um dos pedaços da vassoura atrás dele e apanhei o objeto rapidamente assim que ele veio para o seu lugar. Tinha que ser rápida ou seria eu quem acabaria morta.

Saí da frente do ataque de Oolong por muito pouco, sumindo um pedaço da barra da minha calça e uma mecha do meu cabelo no processo, engolidas pelo feixe de energia roxa. A sensação foi assustadora e meu coração ameaçava pular garganta afora; como se tivesse desviado de uma baforada de um dragão à queima roupa.

O ataque engoliu o chão, os objetos, até mesmo o ar e o espaço pareceram se reduzir a nada quando a rajada de Oolong passou e explodiu no horizonte.

No entanto, ele gargalhou como se esperasse que eu fizesse isso, e eu podia ver em sua expressão maliciosa, preparando outro ataque para responder à nossa manobra. Ele já sabia do nosso plano?!

— Fim de jogo! — Ele se virou e, pelo outro punho, disparou uma rajada pelo outro punho, agora ainda mais próximo de Letícia do que antes.

Mas de novo ela permaneceu parada, apenas carregando seu ataque. O feixe de luz cada vez mais próximo. Com outro sorriso no canto da boca, ela rebateu: — Sim... fim de jogo para você, Oolong!

— Hum?!

— Agora, Juno! — Esse era o sinal. — |MISSÍL CRISÁLIDA|!

— |TRANSFERÊNCIA|! — Minha voz saiu rouca com a exaustão. Mas consegui usar a habilidade.

Antes disso, sem que ele reparasse, arremessei o pedaço da vassoura que eu tinha conseguido recuperar como se fosse acertá-lo no dorso, bem aonde estava sua marca de losango.

A |TRANSFERÊNCIA| trocou o pedaço de pau que eu foquei com o |MISSÍL CRISÁLIDA| da Lelê em um instante! Em um piscar de olhos, para a surpresa de Oolong, o ataque da arqueira havia sumido da sua vista, dando lugar à um pedaço de vassoura quebrada que foi engolida pela rajada de luz roxa.

— QUÊ?!

— E aqui vai meu segredo, mercenariozinho: Eu nunca erro o meu alvo!

E, colado ao seu peito, a enorme flecha mágica de gelo e energia latente se abriu em uma megaexplosão de gelo que fez o corpo possuído e feral de Oolong sumiu em um clarão de luz ciano que me cegou temporariamente.

— GWAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAHHH!!

Várias e várias estacas e agulhas de gelo se formaram e quebraram logo em seguida em um chuva de lascas que se estendeu pelo que consegui observar serem quilômetros. A explosão foi tamanha que derrubou pilares e pedras e abalou o céu postiço sobre nossas cabeças. A pressão do impacto me lançou a muitos metros para longe até eu ser freada por um pedregulho enorme no caminho.

A energia roxa de Oolong se dissipou antes que Letícia fosse atingida e, sem sair do lugar, suas pernas cederam e seu arco de gelo se desfez enquanto caia de cara no chão.

Quando os flashs insistentes de luz e cegueira momentânea passaram, eu consegui perceber o que tinha sobrado daquela batalha; uma cratera imensa mergulhada em névoa, ou fumaça, sei lá, com um rastro de estacas de gelo cristalinas mais atrás, formando um campo frígido que brilhava até o horizonte. Uma verdadeira floresta congelada.

E a Lelê que estava no chão, aparentemente inconsciente.

— Lelê! Ai, ai! — Mordi o lábio quando senti todo o corpo doer.

Com muita dificuldade, cambaleei até ela e me abaixei para sacudir seu corpo. Estava zonza e enjoada. Tinha usado muito da minha magia, mais do que usei em muitos anos.

— Lelê! Acorda Lelê! Você não pode ter morrido! — Minha voz já dava espaço para o choro.

— E eu não morri, sua anta — ela respondeu, para o meu alivio. Sua voz estava áspera e abafada pelo chão. — Só quero descansar um pouco. Umas... três horinhas só...

— Deixei para dormir na sua cama, sua preguiçosa! — Eu disse com uma risada. Risadas essas que se transformaram em lágrimas.

Letícia ergueu a cabeça e se levantou devagar, grunhido de dor. Ela devia estar tão ou mais machucada que eu, mas ainda assim estava preocupada comigo e com meu choro.

— Ei, ei! Eu tô bem, tá? Tô viva! Só tô cansada e com dor no corpo todo — disse ela segurando meus ombros quando se sentou de frente para mim.

— E-eu sei... snif!

— Então por que está chorando? Vamos... nós vencemos.

Não adiantava; eu não conseguia parar. Meu rosto estava lavado com minhas lágrimas quando olhei para a Lelê, um sorriso de orelha a orelha no rosto. Não lágrimas de tristeza, mas de alegria! Pura alegria quando eu disse:

— Porque você está viva. Eu estou muito feliz por isso! — Só me lembro de conseguir abraça-la o mais forte que consegui, tanto que quase a derrubei no chão de novo.

— Juno... — Letícia suspirou e então respondeu ao abraço, seus braços finos se enroscando no meu corpo dolorido. — Sim, nós conseguimos, Juno. Juntas, nós conseguimos!

Mas ainda não tinha acabado ali; por mais que eu não aguentasse sequer dar um passo e muito menos ela, por mais que nós duas pudéssemos desmaiar ali mesmo, completamente esgotadas, nós duas sabíamos muito bem quando nos entreolhamos...

Ainda tinha uma última coisa que restava fazer.

 

 

 

NOTAS: Olá pessoal! Espero que tenham gostado até aqui. Só passando para avisar que esse é o antepenúltimo capítulo antes do fim do volume 1(UFA, FINALMENTE!). E o penúltimo e último capítulo serão postados juntos nessa próxima semana.
É isso, meus lindos. Até os próximos capítulos! <3



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