Chamado da Evolução Brasileira

Autor(a): TheMultiverseOne


Uma Cidade Pacata – Olhos Voltados para Mim

Capítulo 151: Introspecção

— Vocês! — direcionou-se à dezena de sujeitos armados. — Metade vem comigo, e quanto à outra, tranquem a porta e vigiem por fora!

Os cinco homens mais próximos da grande porta metálica se agruparam em linha reta, sem questionar.

Séria, a agente Melissa sequer fez questão de esconder o desgosto ao encarar o rapaz caído nos olhos, brandindo os dentes antes de falar.

— Se chegar ao meu conhecimento que ele fugiu, vou fazer o que tiver ao meu alcance para executar cada um dos responsáveis por vigiar esse compartimento!

Os outros do lado de fora abriram a entrada fortemente selada com prontidão, levando à saída acelerada de todos, com exceção do cativo.

— Vamos logo, vocês!

Em um fluxo organizado, os poucos passos audíveis antes de se trancar o lugar soaram acelerados, o deixando para cogitar o motivo.

— … Ugh… Ela não é nem um pouco gentil…!

Sozinho, o Savoia só tinha a si mesmo para murmurar, ainda com os movimentos lentos e descontrolados pelo par de descargas elétricas.

— Mas, se ela saiu com tanta pressa, é porque deve ser algo bem importante.

Ele não sabia ao certo se precisava agradecer ou temer o alarme e as luzes vermelhas que agora tomavam o corredor, visíveis pelos breves instantes do caminho exposto.

“Por aquela cara de apreensão, não pode ser coisa boa…”

Trancar a entrada revelou o sistema de isolamento acústico perfeito usado para a sala, trancada a vácuo.

Ryan não podia ouvir o menor som advindo de fora, e a própria respiração soava alta demais ali dentro.

“Eles esperam que eu fique louco por aqui…” riu por dentro, azedo.

A essa altura, a intenção de sua captura já havia ficado mais que clara, e o quebrariam para conseguir.

“Mas eu não consigo fazer mais o que eles querem.”

Ryan olhou para a própria mão, comparando inconscientemente o escuro da pele com a brancura do chão.

“Não dá mais para ler as mentes das pessoas. Eu já tentei, muitas e muitas vezes nos últimos dias.”

Tentar focar gerava zero resultados e, sem as velhas imagens com as quais se acostumou ao longos dos anos, pensou estar perdido, à princípio.

“Eu preciso pensar em alguma maneira de descobrir mais sobre o Mark e a Lira, e o que fizeram com eles. A julgar pelo escopo dessa operação e o objetivo deles, eu duvido que estejam mortos…”

Porém, no momento, ele se via tomado pela tranquilidade de ter feito uma escolha.

“... Mas o tempo tá ficando curto, também… E é melhor começar a pensar no jeito mais rápido de fazer isso.”

No canto da cela havia uma câmera de segurança oculta por trás de pequenas grades, convidativa ao olhar.

— Hmm… considerando quem eles são e quanto investiram nisso aqui, certeza que aquilo ali grava áudio também — murmurou baixo.

Mas ele não se preocupou com trocar tempo com a lente e saltou para ficar de pé, escolhendo a cama para se acomodar.

— Mas eu não vou precisar me incomodar com isso.

Ryan se acomodou no colchão, tomou ar e fechou os olhos, focado na paisagem escura de sua própria mente.

… … …

“E aqui tô eu de novo…”

A parede escura em meio ao mar de sombras dançantes seguia infinita, pelo horizonte delimitado por sua construção.

“... Só que agora, por livre vontade.”

A extensão da superfície vítrea não detinha de um fim, e para todos os lados, apenas escuridão… Todos, exceto um.

“Esses sonhos estranhos sucessivos me fizeram aprender como chegar aqui. Eu lembro um pouco de cada um, e com os pedaços se costurando…”

Para cima.

“... Eu aprendi como que se chega aqui.”

Uma grande rachadura, quase invisível, cobria o “teto” da infinidade escura, revelando se tratar de algo mais similar a uma caixa. Dali, uma fina linha cortava o vidro, ramificada em várias direções.

“... E. se eu esperar um pouco…”

Os contornos da rachadura ficaram mais visíveis, até, ocasionalmente, alguns fulgores passarem por ela, indo e vindo, cada vez mais frequentes.

— … Dá para fazer isso.

As águas negras abaixo se elevaram tal qual uma plataforma sólida sob os pés dele, levando-o em direção aos brilhos.

— O que vai ser dessa vez?

De mão direita espalmada, ele a aproximou o máximo possível da rachadura, a invadiu e esperou pacientemente pelo próximo fulgor.

— Peguei.

Pela próxima memória.

— Vamos ver, vamos ver…

A pequena esfera de luz, presa entre os dedos fechados, iluminou as trevas infinitas com seu brilho amarelado. Sem delongas, porém, ele a trouxe para a direção do peito e a pressionou contra si.

… … …

“Ah… esse dia.”

A cena era familiar demais e, de certa forma, até acolhedora em meio a tanto caos e loucuras.

Aquele era um fragmento de tempo perdido no passado e de qualidade irrecuperável, de dias os quais as coisas eram muito mais simples.

Na sala de aula quase vazia, havia uma pessoa: ele mesmo, embora não por muito tempo.

— Huh? Tá fazendo o que aqui sozinho, Ryan? Chega mais! Tem uma galera bem legal que vai querer te conhecer! Vai, sai dessa de ficar sendo solitário! Isso aí não vai impressionar ninguém.

As memórias daquele terrível dia — o dia onde sua vida mudou, virada ao avesso — voltaram, agora vividas na carne.

— E aí, Ashley — disse secamente, ciente de não fazer qualquer diferença. — Vamos ver de novo como eu vou acabar ferrando tudo.

Ryan se recostou na parede do fundo da sala para assistir, focado apropriadamente na cena ao centro.

[...]

— É isso mesmo que você ouviu!

O “sujeito de um olho só” caminhou calmamente até a janela, atento por um curto momento à mínima luz vermelha a surgir por baixo da porta.

— Vejo que já chamou os seus homens… Legal! A postura digna de um bom líder, jogando os seus subordinados na sarjeta!

A arma ainda tinha uma bala. Tenso, o agente impediu o dedo de alcançar o gatilho, ciente da ineficácia do ato.

— E por falar em subordinados…

Ele bateu duas palmas e, por um segundo, nada ocorreu. Os dedos de Elieser se fecharam de novo em expectativa e, enfim…

— Muito bom! — cumprimentou a nova presença. — Presumo que limpou uma boa parte deles?

“... Hein…?!” O homem de idade congelou, paralisado por puro terror, ao perceber de onde a presença veio.

A porta atrás dele estava aberta, escancarada sem o menor dos barulhos, e ele só a notou quando o som de seus passos ecoou pelas paredes.

— … Aaah… — deixou um suspiro de estarrecimento fugir por baixo da falsa expressão séria.

Uma adolescente entrou na sala, carregando dois agentes desmaiados, um em cada braço.

— Qual o motivo da surpresa? — perguntou o jovem. — Eu nunca disse que tinha entrado aqui sozinho!

Rapidamente veio a ele a compreensão do motivo de tamanha demora de seu pessoal em responder ao chamado; eles haviam sido massacrados pela simples garota.

Ela andou com os corpos até o meio da sala, jogando-os sobre o tapete e dirigindo-lhe uma encarada fria como o pior inverno ao terminar.

O brilho vermelho das irides e o semblante sem expressão garantiam o aspecto de um robô — uma máquina de matar em forma humana.

— Um trabalho incrível, como sempre!

Nenhuma palavra deixou sua boca e as microexpressões se mantiveram inalteradas. De imediato, ela andou até ele, ficando ao seu lado nas proximidades da grande janela.

— Era só isso o que eu precisava te dizer. Faça o que precisar com a informação, ou não! — sorriu. — Deixo isso como uma mensagem amistosa… Vamos conversar outra vez, sim?

— Ei…! — Elieser saltou da cadeira para tentar alcançá-lo.

— Quero ver se vai saber tomar a decisão certa…! Adeus!

O vidro se partiu quando os dois pularam de costas, iniciando queda livre.

— Haaaah?!

Vidraça abaixo, os dois sumiram sem deixar a menor das pistas.

— … Senhor…!

Três agentes armados entraram às pressas na sala, espalhados de forma estratégica, em imitação ao treinamento de rotina.

— Senhor…! — chamou o primeiro a entrar. — O que aconteceu aqui?! … Senhor…!

Mas as palavras faltaram para Grazianni, que sequer os olhou de volta, fixo no mistério em altitude.

[...]

— Perímetro limpo à esquerda — falou pelo comunicador oculto pelas vestes formais. — Nenhum traço de invasor nos primeiros três andares da edificação, tampouco no subsolo; câmbio, desligo.

A agente novata no ramo guardou a pistola com praticidade no oculto coldre à lateral da calça social, sua tremenda agilidade ao fazê-lo se tornando motivo de atenção pelo agente mais velho.

— Também não encontraram nenhum traço dos invasores nos demais andares, embora nas proximidades da sala do administrador, as coisas tenham ficado feias.

De certo modo, citar os eventos do dia costumava servir de forma suficiente para começar uma conversa.

— Sério? De quantos estamos falando? — inquiriu ela, expressando deter de conhecimento o bastante.

— Foram sete — afirmou. — Três estavam nas proximidades do elevador, fazendo a guarda, enquanto os demais se posicionavam mais próximos da sala de Grazianni. Todos foram mortos sem deixar traços de quem pôde ter sido o responsável.

Porém, por mais sombrias que fossem as circunstâncias, Gordon optou por não deixar de fazer a pergunta desejada.

— Não leve isso pelo pior lado, por favor, mas eu tenho te observado um bocado desde o início de seu trabalho aqui, e devo dizer que o seu manejo é notável para alguém que acabou de entrar no ramo!

Por um segundo, os dois se entreolharam e Robinson aparentou confusão, ao deixar a cabeça cair para a esquerda de um jeito um tanto engraçado.

— Eh? Manejo? — questionou, soando inocente. — Manejo de quê?

— De basicamente todos os sistemas aqui dentro — respondeu, seguro do que dizia. — É quase como se você conhecesse como o processo inteiro funciona aqui dentro…

Os dois trocaram novamente alguns segundos de olhares silenciosos, até que…

— Ah, por favor…! Não pense que estou te julgando como uma espiã ou algo do tipo! É só que você me lembra bastante a agente que ficou sob a minha tutela inicialmente, embora eu deva admitir que bem mais polida… Foi só uma observação.

— Tudo bem, eu não imaginei isso! — Ela mesma tratou de apagar o pavio da situação com um doce riso. — E aliás, acha que se eu fosse uma espiã ou uma traidora, a CIA já não teria me descoberto? Não tem nada que dá para esconder daqui!

Ver que ela tomou o comentário pelo melhor lado trouxe alívio ao agente Walker, unido a ela na caminhada rumo ao elevador para os andares acima.

— Bem, acho que isso só pode ser verdade! — tentou aliviar ainda mais o clima pesado. — E bem que você veio aqui graças a uma recomendação direta…

Lembrar o motivo da chegada de Robinson trouxe certo desgosto ao semblante do forte homem, deixando-se tomar por ares mais sombrios e frios, ao relembrar o dia da missão de captura.

— Como está indo o processo de testes com o [Ilusionista]?

Para ele, foi uma pergunta difícil, pois graças ao rapaz de capacidades ilusórias e atitude pouco humilde, uma vida importante foi perdida na operação.

Ele sentia jamais ser capaz de perdoar alguém tão convicto e conivente com sua própria capacidade de gerar a morte e se orgulhar dele; tal foi a ideia elaborada de Mark Menotte.

E a resposta recebida foi uma cuja qual, em verdade, ele não gostou de receber.

— Ele continua no coma induzido. Tive de pedir uma autorização especial para que o mantivessem em vida pelo maior tempo possível, sob as mesmas condições da [Lírio Rosa] — mencionou. — Ele é um sujeito arredio e bastante relutante ao contato, mas um objeto de valor imensurável para as pesquisas, de qualquer forma.

Ao chegarem em frente à grande porta metálica, o aspecto relutante do homem vivido foi de encontro direto com a jovial certeza da moça.

— A mais recente descoberta sobre ele é que, aparentemente, o moleque tem uma relação acoplamento-tensão muito mais próxima do ideal teórico do que a maioria dos seres humanos… Sabe o que isso quer dizer?

— Eu tenho uma vaga ideia… — rebateu ele, focado no número vermelho em exposição à lateral da porta, descendente. — Mas, explique.

O elevador fazia sua descida lenta do oitavo andar, dirigindo-se direto ao segundo piso, no qual se encontravam.

— Em suma, a eficiência da contração muscular dele é muito maior pois os sarcômeros são dispostos em um paralelismo essencialmente perfeito. Isso o permite gerar forças explosivas sucessivas, comparáveis ou até maiores do que as de um atleta treinado.

— Isso explica aqueles pulos monstruosos… — bufou, contorcendo o rosto.

Ao chegar do elevador, ambos entraram e o décimo andar foi prontamente selecionado pela moça.

— E não é só por isso! — citou, cheia de interesse. — Os níveis basais de glicogênio muscular e creatina também são ao menos o triplo do padrão! Se aquele rapaz competisse em alto rendimento, geraria recordes impossíveis de serem batidos.

Os dois saíram, dando de cara com um andar repleto de outros agentes, em alvoroço. Logo à frente, havia um corpo caído, morto com um único golpe sangrante na nuca.

— E é por isso que é tão importante que continuemos a pesquisar. Se encontrarmos uma origem ou um mecanismo replicativo, poderemos fazer algo a respeito, desde inibir a replicar.

“Huh… Não sei se gosto desse tipo de conversa…” Gordon manteve para si, embora estivesse expresso em seu rosto. “Já ouvi essa história antes e não gostei nem um pouco.”

A grande altura o garantia vantagem de localização em meio às treze pessoas no local, onde a cabeleira negra, presa em um rabo de cavalo, saltou aos olhos com facilidade.

— Melissa… É dela que eu falava mais cedo.

De longe, visíveis irritação e impaciência coloriam o cenho da pálida mulher de braços cruzados, o levando a temporariamente reconsiderar a aproximação.

— Ah… não pode ser tão ruim assim! — tentou se encorajar. — Vocês duas já conversaram?

— Não — Robinson negou com prontidão. — Eu só a vi passando umas duas vezes, mas zero contato. Ela até olhou para mim, mas parecia estar com bastante pressa.

— Tch… Essa Melissa… — levou a mão ao rosto, decepcionado. — Sempre tão orgulhosa…

Como alguém experiente, ele compreendia o quão difícil lidar com esse lado da investigadora poderia ser; Melissa gostava de se sentir maior e, portanto, costumava esperar que os outros viessem a ela primeiro.

— Vamos, eu vou conversar com ela — deu um passo a frente. — Posso aproveitar e te apresentar. Sinto que ela teria coisas a aprender com você.

— Oh, por favor…! Sou só a novata da firma! — Robinson riu, tímida. — Mas tudo bem! Vamos lá, até porque eu também gostaria de tentar descobrir como exatamente aconteceu.

Os dois trocaram acenos de cabeça e o caminho até Melissa, curto na prática, se esticou na mente dela.

“Nota para si mesma: aja de um jeito um pouco mais estúpido. Você é só a carne nova da firma, Hannah.”

Sob disfarce, Hannah Savoia correu a visão pelo perímetro de agentes, deixando o mínimo de suspeita quanto a estar encarando alguém, sem olhar demais…

“É, eu estava certa… Eu sabia que ia ser ela.”

— Olá, Agente Bauer! — disse Gordon, em profissionalismo. — Quero te apresentar uma possível futura colega… Essa é a Agente Robinson.

A encarada dos olhos pretos, inspecionando de cima a baixo, disse o necessário: Melissa a analisava e para muito além de meramente a aparência.

— Ah, a recomendada pelo presidente! — acenou com a cabeça, esboçando um leve sorriso de canto, ainda de braços cruzados. — Fiquei sabendo de ti, sim!

— Obrigada! Também ouvi bastante de você, Agente Bauer! — cumprimentou com um pouco de cortesia. “Essa mulher…”

— Hmm… não tem muito para falar de mim além de coisas boas… E aliás…

“Ela vai ser a minha inimiga natural aqui dentro.”

— Não acha que é um bocadinho suspeito, Robbie? — A encarou de canto, aplicando foco no apelido criado depressa. — Essas circunstâncias… Não é tudo… alinhado demais, eu diria?

“Ela vai ser problema… Muito problema.”



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