Chamado da Evolução Brasileira

Autor(a): TheMultiverseOne


Uma Cidade Pacata – Olhos Voltados para Mim

Capítulo 150: Opressão

— Recapitulando — disse a mulher de longos cabelos negros, em tom ameaçador. — A invasão na sua escola foi produto de um bando de pirralhos motivados por um outro pirralho cabeludo a fazer um monte de bagunça e sem uma motivação clara?

Falar a verdade — ou parte dela — era a melhor estratégia para lidar com a situação. Para além disso, porém, havia mais uma coisa.

— É isso — respondeu, temeroso e alerta à dezena de armas apontadas em sua direção. — A gente não sabia de nada disso e nem tivemos participação na bagunça… ou melhor, no massacre.

Ser verdadeiro o permitiria não apenas se comunicar melhor, mas também era uma estratégia de confiança, já que talvez ela não o matasse caso as respostas fossem satisfatórias.

“Tomara que eu não tenha deixado nenhuma falha na minha versão da história, porque se ela questionar, aí…”

— Tem uma coisa que me deixou com dúvida nesse seu relato, moleque — afiou o olhar ao falar, dirigindo-se ao centro dele. — Você disse que venceu o Jacob Egan e fez isso sozinho… Sabe, as evidências dizem um tanto diferente!

O frio na espinha teve de ser escondido depressa. Em sua história, Ryan tentou ocultar o máximo de detalhes sobre outras pessoas, criando rotas autossuficientes.

— Encontramos digitais diferentes das suas em Jacob Egan, assim como material genético que não pertence a nenhum dos dois — apontou, com um leve sorriso. — Acho que somos amigos aqui, não? Vai! Não precisa esconder de mim!

“Ah, droga! Ela já sabia disso e só queria confirmar! É claro…! É de uma investigadora experiente que a gente tá falando aqui!”

O Savoia podia ser um bom negociador e um ainda melhor mentiroso, mas falhou de modo amargo em face do profissionalismo.

— Se me contar esses detalhes… — apontou a arma para ele. — Talvez eu não precise apertar esse gatilho!

O coração saltou pela boca, mas ainda havia uma escapatória.

— Eu não sei onde ele pode ter passado ou quem ele se envolveu antes de eu me encontrar com ele…

Os tremores deixaram difícil manter a postura calma. Agora, mais do que nunca, o raciocínio rápido se fez necessário, e ele chegou a uma conclusão.

— Jacob matou muita gente — falou, com certeza. — Foi ele quem matou aquele pessoal todo no térreo, eu tenho certeza disso… Aquele tipo de destruição só pode ter vindo dele!

Quisesse ou não, ele também alimentou o gatilho metafórico de dúvidas da questionadora.

— Ah, então você sabe como funciona o poder dele! Ótimo, ótimo! Então vamos conversar mais sobre isso!

A posição vantajosa o fez aliviar um pouco; desarmar a posição agressiva tornou-se prioridade, e jogar o jogo dela, a última opção.

— Então me fala, garoto! Como funciona o poder especial do Jacob Egan, e principalmente, como você venceu ele?

Bauer deixou cair a postura de “policial má”, guardando a arma e usando o braço em questão para apoiar a cabeça.

— Nós encontramos o cadáver queimado no meio dos escombros, com sinais de fraturas diversas e danos extensos em toda superfície do corpo… Como fez isso sozinho?

Em seu lado da mesa, ela o assistia com curiosidade, ao mesmo tempo que aparentava não vê-lo como uma ameaça.

“Eu acertei. Perto dela, aquele Menéndez vira um ninguém”, pensou, cauteloso. “Ela tá querendo me convencer a falar mais, me condicionando a ficar atento ao comportamento dela…”

… Porém, a julgar como não existiam outras alternativas, continuar respondendo com honestidade permaneceu como o único caminho.

— Eu não entendi ao certo, mas ele podia amplificar o som, seja ele de qualquer origem, condensar em uma forma física e usar como arma depois…

— Interessante. E depois? — manteve a curiosidade, inquisitiva.

— Eu me deparei com ele por acidente, mais ou menos… ouvi o barulho e fui procurar, e lá estava ele — confessou. — Eu tive que atrair ele até a biblioteca para dar um fim nisso.

— Huh… — suspirou, fingindo surpresa. — E qual foi o seu plano com isso?

— Eu pensei em deixá-lo sem oxigênio e criar uma batalha de resistência… cheguei a trocar alguns golpes, mas nada grande… ele deve ter se fraturado em outros conflitos… Alguém deve ter tentado a sorte… e falhado.

— Entendi.

O rapaz se desarmou com a confirmação, deixando um leve suspiro de alívio fugir pela boca, e quando o último ar saiu, houve a reação.

— É melhor começar a falar a verdade, seu pirralho.

Melissa puxou uma pequena pistola de choque dentre as vestes formais, sequer dando tempo de reagir.

— URGH…! — Ryan caiu da cadeira, surpreso pela dolorosa onda de espasmos.

— Que coisa, viu! Criando historinhas em torno das evidências, tangenciando fatos e só falando as coisas que te convém…! — riu, erguida da cadeira. — Eu vi as gravações, moleque! Sei mais que ninguém que tá mentindo.

Ela sozinha se colocou frente a ele, separados por menos de um metro; perante o tempo todo, o dedo não deixou o gatilho, armado no próximo choque.

— Pirralho maldito… me dando trabalho que eu não gosto…! — grunhiu. — Antes fosse eu na sua captura… Iam receber só o seu corpo!

A inexperiência abriu uma porta inesperada, ao fim do argumento, usada prontamente quando recuperou a noção plena de si.

— Foi você, né…? Quem pegou eles…

— Haah?!

Outro choque, mais intenso, cursou sem deixar rastros pela carne. Dessa vez, ele o tomou com preparo, sem dar um piu.

— Tá afim de morrer tanto assim? — ajoelhou, apontando os eletrodos direto em sua bochecha. — Não adianta mentir, pirralho… só vai ficar pior se fizer.

— Agente Bauer, as ordens…! — exclamou um dos atiradores. — Nós temos ordens de não tocar no sujei…!

Antes de poder terminar, a lâmpada no corredor do lado de fora mudou para vermelho vibrante, visível pelas barras na porta reforçada.

O sistema de áudio se ativou abruptamente, ecoando um som agudo pelos corredores, deixando no fim um aviso.

— Aviso a todos os agentes em atividade: Código 47! Código 47! Iniciar protocolos de segurança A-21, A-22 e A-23!

— Huh?!

A agente se afastou aos poucos, mantendo o foco do choque no jovem caído, em preparo para eventualidades.

Passo por passo, ela se aproximou da porta, insatisfeita e irritada com um dia que prometia tanto, afinal…

“Uma invasão?! Logo agora?!

[...]

— Sim, a situação se encontra sob controle — falou o homem de meia-idade, coçando a barba. — As equipes receberam o equipamento necessário e a operação está nos devidos conformes. Irei mandar mais pessoal para a realização da limpeza nesse exato momento.

A resposta dada pelo outro lado foi pouco relevante. A central demandou explicações, as quais ele forneceu com prontidão, limpando os incômodos do caminho.

Agora, bastava esperar pela notícia do sucesso.

— “A situação se encontra sob controle”...? Eu já ouvi várias boas mentiras, mas essa chegou em níveis espetaculares!

A súbita adição da voz subiu os níveis de alerta em centenas de vezes. No interior do escritório no vigésimo andar, não deveria ter outro além dele.

— Quem está aí? — perguntou, com o máximo de esforço para ocultar a profunda apreensão.

— Ah, peço perdão! Vou me fazer visível para que conversemos melhor… que incivilizado da minha parte!

“Mas o quê…!”

A forma de um rapaz se materializou do nada, no tempo de um piscar de olhos.

— Agora ficou um pouco melhor, não? Podemos nos conversar, ao invés de eu só espiar!

O sorriso falso e o olho esquerdo coberto por cabelo evocaram as piores características do semblante pálido e ameaçador de um jeito frio.

— A quanto tempo já está por aqui…?

Grazianni o fitou com afiação, dedos cruzados a frente da boca, servindo de apoio; durante momento algum ele piscou, atento a uma possível nova mudança de local.

— Ah, você é tão sisudo…! Cheio de si e de suas próprias regras e prioridades, tão fechado ao lado de fora e às novas perspectivas!

Responda a pergunta — insistiu, com foco extra na figura do adolescente.

Ele desceu do gabinete metálico o qual usava como apoio, bem do lado da grande janela com vista para os grandes prédios.

— Não muito — afirmou, livre. — Desde um pouco antes do começo da ligação… Não faz meu exato interesse interferir em como você está indo agora… Quer que eu explique o motivo?

O único olho azul o penetrou o fundo da alma; o brilho malevolente refletiu a pouca luz interior, e a acumulou em si.

— Sabe que não pode lidar com isso — riu um pouco. — Pode se enganar o quanto quiser, tomar as decisões que bem te forem convenientes, mas no final, você entende que esse é um jogo imbatível.

O rapaz sem nome tomou três passos para a direita, parando ao encontrar a borda de uma pequena mesa de cedro, cujos dedos deslizou sobre a lisa superfície.

— Eu sei mais sobre o seu processo de seleção como administrador do que imagina, Elieser Grazianni.

A menção do nome verdadeiro foi seguida pelo clique da pistola carregada, apontada com intenção para a figura incômoda.

— Você fala demais — afirmou o investigador.

— Ah, por favor!

Em resposta e como forma de pura zombaria, o jovem de franja negra abriu os braços e se enlargueceu, fazendo-se de alvo proposital.

— Vamos, Grazianni! Atire! — zombou, sarcástico. — Você sabe bem que isso não vai funcionar… Sabe, foi a mesma linha de pensamento que os seus homens tiveram nos andares de baixo! É incrível como uma arma na mão limita o raciocínio de alguém!

— Você…! — reagiu com raiva.

— … Elas destroem toda a potencialidade e pensamento livre…! — interrompeu, retomando o domínio de fala. — Aliás, eu gostaria muito de entender… Qual a graça de uma ferramenta que só serve para abrir buracos na carne de alguém?!

O homem mais velho pressionou um botão na parte de baixo de sua mesa e logo ao fazê-lo, um par de atiradores de elite invadiram a sala de trabalho.

— Isso é verdadeiramente patético…!

TRA-TRA-TRA! — tiros incontáveis voaram por todas as direções, impossíveis de desviar de forma plena.

— Neutralizem o alvo! — gritou, também atirando com a própria arma. — Executem no local!

— … Como eu disse, que mentalidade limitada…

As luzes piscaram e no breve milissegundo de desatenção, ele mudou de localização para detrás dos atiradores, sem o menor dano advindo dos projéteis.

— URGH!

— KAAAKH!

Os dois homens com pico de treinamento tático caíram como pequenos mosquitos, impossibilitados de respirar pelos grandes cortes em suas gargantas.

— É por isso que eu sou a favor de um combate mais visceral…! Essas ferramentas que automatizam a morte…

Calado! — atirou mais duas vezes, em vão.

— … só tiram a graça real de se tirar uma vida com classe…!

A gota de sangue escorreu da ponta do estilete escolar, direto na nuca do agente experiente. Separados pela altura de um braço, retaliação poderia ser a morte.

— … O que você quer…?

— Eu? Nada demais! Será que não podemos ter só uma conversa amigável, de adulto para jovem? Uma troca valiosa de experiências entre as gerações?

Grazianni não se atreveu a mover um músculo, a imensa pressão o impedindo de respirar direito.

Entregue, ele só podia olhar fixamente para um ponto aleatório, e jogar suas cartas do melhor modo possível.

— Mas, bem… você está certo, eu não vim aqui só para jogar conversa fora, por mais que muito me interesse ouvir sobre as frustrações de um sujeito de meia-idade… Heh! A quem eu estou tentando enganar?!

Ele chegou mais perto, até o sopro de sua respiração poder ser sentido na ponta do ouvido.

— O motivo de eu ter vindo aqui passa longe de ser a discussão de nossos esforços ou sobre qual lado é o mais preparado; na verdade, se tiver que dizer, estou te ajudando bastante ao dizer isso.

— … E por que não vai direto ao ponto com essa grande revelação?

A atuação e a vontade de desperdiçar tempo desse indivíduo o irritavam; era como se ele não tivesse nada a perder, o que, em retrospecto, não passava da verdade.

— E que graça teria nisso? — riu, gargalhando por um breve momento. — Se bem que você alertou seus homens, não? Huh… Parece que eu vou estar em maus bocados…!

O senso terrível de humor foi de imediato trocado pela injeção de seriedade, quando ele abriu a boca e, quase em silêncio, suspirou:

— Existe um impostor entre os seus números, Elieser Grazianni… um que não vai poupar esforços para ver esse castelinho de areia ruir!



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