Caçador Herdeiro Brasileira

Autor(a): Wesley Arruda

Revisão: Ângela Marta Emídio


Volume 2 – Arco 7

Capítulo 78: O Caçador Elemental do Vento e os vampiros supremos da morte

A criatura horrenda avançava em meio ao mar de prédios pela noite barulhenta de Honorário. Seus saltos eram anormais — nenhuma pessoa comum possuía tal agilidade. A distância entre alguns edifícios chegava a cinquenta metros, o que era equivalente a metade de um campo de futebol. E a altura era suficiente para que uma queda livre culminasse em uma morte instantânea. Ainda assim, a criatura estava em seus domínios, segura de si e ciente do que estava fazendo.

Caçador nenhum alcançaria um vampiro supremo naquela velocidade, exceto aquele; ao olhar para trás, a criatura espantou-se com a luz prateada que se aproximava, cintilante e carregando uma forte ventania consigo. Riku estava mais perto. E apesar das suas aterrissagens serem leves como uma pena, o poder que emanava de seu corpo era agressivo e imponente.

Poucos prédios separavam os dois agora. A perseguição, para desespero do vampiro, logo teria fim. 

— Não adianta correr, seu desgraçado, em poucos minutos você será apenas tripas e ossos! — gritou Riku, cujos olhos amarelos, estes terrivelmente selvagens e fixados em sua presa, indicavam que sua personalidade havia mudado.

Era a primeira vez que Riku cruzava com um vampiro supremo. Eles geralmente lideravam enxames mais poderosos e mais organizados, ocultos totalmente do radar dos caçadores ou das autoridades, e só apareciam em casos específicos. Riku ouviu dizer que eles evitavam até cometer assassinatos para não levantarem nenhum tipo de suspeita, tendo que recorrer a outros tipos de recursos para sobreviver. Mas aquele em especial possuía algo a mais: uma tatuagem. A mesma que Shaong Kabeiyama tinha. De um eclipse.

Riku não conseguia imaginar a sua tribo, que era repleta de clãs orgulhosos e preconceituosos em relação às outras raças, se juntando a vampiros nojentos. Impossível, a não ser que tivesse mais alguma coisa por trás. De repente, ocorreu-lhe que o vampiro poderia estar levando-o para uma armadilha. Talvez ele tivesse sido mandado pelo próprio Shaong Kabeiyama, o que faria sentido considerando que o responsável pela morte de seus pais era sujo e capaz de qualquer coisa.

Riku mataria quem aparecesse à sua frente.

Então avistou, de longe, o que poderia encerrar aquela fuga. Sua condição elemental aguçava seus sentidos, sobretudo a visão. E a alguns prédios adiante do vampiro havia uma torre de metal num terraço mais amplo que os demais, suportando uma enorme caixa d'água.

Esperou o momento certo. A Forma Elemental lhe permitia utilizar uma técnica especial de 3 estrelas que Riku ainda não dominava sem a transformação, um ataque poderoso que servia tanto para média quanto para curta distância. Concentrou-se rapidamente e gritou, desferindo um golpe com o punho:

— Rajada Potente!

O vampiro não precisou olhar para trás; ele sentiu uma espécie de tufão vindo em sua direção e, sem problemas, desviou para o lado. O golpe poderoso carregado de vento raspou o seu corpo e se chocou estrondosamente contra uma estrutura de metal bem à sua frente, que entortou e não aguentou o peso que suportava. A caixa d'água esmagaria o vampiro caso sua agilidade não fosse anormal. Ele rolou para o lado num susto e observou a explosão de água diante dos seus olhos, que encharcou vampiro e terraço juntos e depois escorreu para a beirada do prédio, desabando na direção das ruas lá embaixo.

— Uma distração — ganiu o vampiro para si. Levantou-se depressa e saiu fora daquele lugar. Aterrissou no terraço seguinte e arregalou os olhos ao observar Riku bem ao seu lado, a poucos metros.

— Rajada Potente!

Dessa vez não houve escapatória. Riku apunhalou a criatura com um forte tufão à queima-roupa e a fez cair de qualquer jeito no chão de concreto. Abriu um sorriso maligno ao observá-la caída.

— Não pensei que você fosse tão ingênuo a ponto de achar que teria chances de fugir de mim — disse com um divertimento diabólico.

Relutante, o vampiro se levantou. Encarava os olhos amarelos de Riku com receio. Rosnou, então sorriu.

— Vai ser um prazer fazer picadinho de um Caçador Elemental — rebateu enquanto lambia os lábios. — Você já enfrentou algum vampiro supremo antes, Riku? Não? E dois?

A pergunta fez Riku ficar atento. Poderia ser um blefe da criatura, o garoto tinha ciência. O vampiro, vendo-se num beco sem saída, possivelmente estava ganhando tempo até encontrar uma brecha para fugir.

Então Riku sentiu uma presença se aproximando, rápida e sutil. Vinha de trás. Pelo jeito suas suspeitas iniciais estavam certas: o vampiro estava montando uma cilada. Riku se virou no exato momento em que um sujeito aterrissou pesadamente na outra extremidade do terraço, feição esquelética que carregava um ar demoníaco e que tinha, em contraste com a pele muito pálida, grandes olhos vermelhos vidrados nele. Era mais um vampiro supremo.

— Esta será — continuou o primeiro — a primeira e última vez que você chegará a esta façanha. Pois desta noite, Caçador Elemental, você não passa!

O segundo vampiro era idêntico ao primeiro. A pequena diferença estava na camiseta que, apesar de ter a mesma cor escura e os mesmos símbolos azulados, não era regata. Ainda assim, foi possível ver parte de uma tatuagem no braço dele, um eclipse escapando por baixo da manga.

— Você parece surpreso — disse o novo vampiro. — Dizem que todos os caçadores ficam calados quando sabem que vão morrer.

— Eu lhe apresento o meu irmão Luy — disse o vampiro de regata, debochado.

Riku, que se posicionara de forma que ficasse de lado para os dois, soltou uma gargalhada.

— Luy? — ironizou. — Pelo jeito a mãe de vocês não tinha criatividade para escolher nomes.

— Os boatos sobre você parecem verdadeiros — disse Luy, ignorando a zombaria. — Um caçador frio e calculista que assume a personalidade do pai quando se depara com a nossa raça. A dor da perda foi tão catastrófica para chegar a esse ponto?

Riku fechou o sorriso subitamente e estreitou seus olhos sobre o vampiro.

— Vampiros bem informados, vocês. Trabalham pra quem, afinal?

— Ei, Lins, veja só — sorriu Luy. — Parece que toquei na ferida dele.

Lins, o vampiro de regata, soltou uma gargalhada forçada.

Riku vociferou:

— RESPONDAM!

O ar em torno do terraço ficou ainda mais agitado. Sua pele prateada emitia um brilho mais forte e a aura em volta de seu corpo ficou mais densa.

Nenhum vampiro respondeu. Eles se entreolhavam com expressões significativas. Estavam tramando algo.

Riku sacou sua Takohyusei, que de alguma forma retornara ao seu dedo em forma de anel. O movimento atraiu a atenção dos inimigos. Mas eles não pareciam assustados. Queriam a espada, foi isso que Lins exigiu quando imobilizou Kelan. 

— Já está escancarado que vocês querem a minha espada — disse Riku, abrindo novamente um sorriso maldoso. — Isso está me cheirando a ordens de alguém que se acha perigoso. Ou talvez seja coisa da… Eclipse do Caos?

Ele teve a confirmação que queria: assim que proferiu o nome da organização, os vampiros supremos trocaram um ligeiro e incômodo olhar.

— Você está em desvantagem, Riku — disse Luy abrindo os braços. — Nós podemos te matar aqui e agora, já fizemos isso milhares de vezes com outros caçadores. Mas veja bem: queremos te dar uma chance.

— Uma chance?

— Sua vida pela espada. Basta você nos entregá-la. Aí você sai vivo daqui como se nada tivesse acontecido.

— Eu nunca entregaria a minha Takohyusei à sua raça imunda! Vocês não têm dignidade para tocar numa dessas! Entenderam? Ou eu preciso desenhar pra vocês? Baratas malditas!

Conseguiu irritar os vampiros. Lins, o vampiro de regata, não se conteve e investiu com suas unhas enormes a fim de acertar Riku pelas costas. Rosnou enfurecido enquanto tentava rasgar o caçador ao meio de todo jeito, aquela era a sua chance, ele não podia errar…

Mas errou.

Riku sentiu sua presença antes do ataque e saltou por cima do vampiro como se o próprio vento o estivesse tirando do perigo. Aterrissou atrás de Lins e o acertou com uma forte joelhada nas costas. Lins se deslocou um pouco para frente e virou-se rapidamente com uma cotovelada. Riku se esquivou e desferiu um chute na direção do rosto do inimigo, que se abaixou com agilidade — e arregalou os olhos ao avistar um segundo chute rodeado de vento e aura prateada vindo na sua direção.

Entretanto, Riku não chegou a acertá-lo, pois viu-se obrigado a desviar depressa da investida do outro vampiro, e fez isso com um ágil salto-mortal para o lado, escapando por pouco de verdadeiras unhas assassinas.

Suspirou, admirado com a própria agilidade. Os irmãos vampiros ficaram lado a lado e o encararam com ameaçadores olhos escarlates. Pareciam duas estátuas de mármore de tão pálidos que eram.

— Você não é páreo para dois de nós — relembrou Luy. — Caçadores da sua idade possuem poder equivalente para combater no máximo vampiros evoluídos. Você pode ser um Caçador Elemental e se sobressair um pouco do padrão, mas está longe de ser capaz de enfrentar dois supremos de uma só vez. Aceite a sua derrota e entregue-nos a espada!

O rosto de Riku estava sombrio. Seus olhos amarelos transmitiam uma crueldade que os vampiros só enxergavam em caçadores veteranos e maldosos. Riku disse, alegre:

— Eu amo isso aqui: enfrentar desafios que me obrigam a ultrapassar os meus limites. VAI SER UM PRAZER ANIQUILAR VOCÊS!

Avançou na direção da dupla carregado de uma ventania agressiva. Os vampiros se dispersaram feito vultos, cada um para um canto. Riku conseguiu enxergar com clareza, como se eles estivessem em câmera lenta. Escolheu desviar na direção do vampiro de regata e atacou:

— Rajada Potente!

Uma onda de vento atingiu fortemente as costas da criatura, derrubando-a no chão, e no momento seguinte Riku estava pulando na direção dela com a Takohyusei erguida pronta para dar o golpe fatal. No último instante, foi impedido ao ser atingido pelo outro vampiro com um chute no peito, que o fez cair para o lado. Luy havia sido esperto e evitou a morte do irmão.

A partir daí iniciou-se uma sequência de golpes. Riku mal se levantou e viu-se obrigado a recuar ao ser coberto por uma enxurrada de ataques do vampiro, que variavam entre socos e unhadas. O vampiro supremo era rápido. Conseguiu acertar o caçador três vezes, porém era como se nada tivesse acontecido. Riku mantinha-se firme e com o mesmo sorriso diabólico.

— Esse é o seu máximo? — o caçador fez questão de dizer, enlouquecido pela adrenalina. — PATÉTICO!!

Os ataques ficaram mais intensos. Riku agora desviava de todos, já acostumado com o padrão da criatura. E sorria ao notar a fúria de seu inimigo, que não conseguia mais tocá-lo. Cego de ódio, Luy sequer percebeu que estava caindo em uma armadilha.

— Luy! — gritou seu irmão ao notar a pretensão de Riku, porém não foi ouvido. E observou quando Riku fez um movimento giratório ao desviar de mais uma investida e empurrou, com o ombro, e para fora do terraço, o vampiro supremo, que desabou rua abaixo. — LUY! NÃO!!

— AAAAHHHHH… — O grito do vampiro foi se distanciando até cessar abruptamente. Riku olhou para baixo e o viu estatelado no chão do beco, dentro de uma enorme poça de sangue. Assim que cuidasse do vampiro restante, desceria até lá para deperizá-lo.

Lins não conteve a fúria dentro de si; aproveitou que Riku estava de costas e avançou em sua direção com a boca escancarada. Seus dentes pontiagudos cravariam o pescoço do caçador antes que ele pudesse reagir. Ele pagaria por ter matado Luy!

Riku se virou e desferiu um golpe reto com a espada. A lâmina perfurou o pescoço grosso da criatura e ali ele ficou sufocando e jorrando sangue pela garganta. Seus olhos arregalados pareciam querer fazer o que sua boca não conseguia: gritar. Lins encarava um Riku sorridente com súplica e pavor, totalmente sem força para se safar. Como era possível um garoto derrotar dois vampiros supremos juntos?

— O meu maior desejo é extinguir a sua raça nojenta — sussurrou o caçador. Seu rosto brilhava feito neon prata.

Quando o vampiro parou de se debater e seus olhos perderam o brilho da vida, Riku o chutou para o terraço e sentiu-se satisfeito com a visão que teve da lâmina de sua Takohyusei totalmente ensanguentada. O corpo pesado da criatura mal caiu no chão e foi mutilado por cinco golpes de espada no peito. Virou pó, deixando no chão apenas o sangue da garganta perfurada para comprovar que ele um dia existiu.

Riku guardou a espada e olhou para as próprias mãos, cheio de si. Era a primeira vez que lutava na Forma Elemental. Ainda assim, por mais que seu poder tivesse elevado bastante, a transformação não estava completa — e Riku tinha ciência de que precisava completá-la caso quisesse confrontar o assassino de seus pais.

***

— Você tem certeza que ele veio nessa direção? — questionou Natsuno.

— Já é a quarta vez que você me pergunta isso — respondeu Kelan, impaciente. — O Riku veio nessa direção! Agora, se ele desviou a rota, aí já não é comigo!

— Não é possível que eles tenham entrado em algum prédio. O que você acha, Dio?

A verdade era que eu ainda pensava nos corpos que encontramos mais cedo; na quantidade deles. Não havia outra metade nos andares de cima do prédio, como Riku havia dito. Estavam todos no térreo. E a julgar pela descrição que a Kelan fez do vampiro — ela citou despretensiosamente a tatuagem de um eclipse — eu só conseguia imaginar que fomos atraídos para alguma cilada.

Antes que eu pudesse responder o Natsuno, chegamos num local no mínimo suspeito.

— Parece que eles passaram por aqui — falei observando a bagunça. O terraço estava todo revirado. Um enorme recipiente de metal estava caído num canto. Percebi que era uma caixa d'água pela quantidade de água que empoçava o chão e escorria pelas extremidades do prédio. E a julgar pela estrutura de metal entortada, tive certeza de que a queda foi causada por alguém.

— Nada discretos, aqueles dois — ironizou Natsuno.

Kelan olhava para a rua lá embaixo.

— Tenho dó de quem estava passando pela calçada na hora da queda d'água — disse ao retornar. — Mas cadê eles?

— Não devem estar muito longe — falei. — Temos que continuar procurando.

Fui tomado por uma sensação tão forte que fez meu coração acelerar. Kelan e Natsuno pareceram sentir o mesmo, visto que nos entreolhamos ao mesmo tempo com a mesma expressão de aflição. Era como se alguém estivesse se aproximando, muito rápido, dezenas de presenças assim como no meu… pesadelo?

Gritei alarmado:

— Vamos sair daqui!

Tarde demais; antes que pudéssemos nos mover, fomos envolvidos por uma explosão de vultos que invadiram o terraço e se espalharam ao nosso redor. Eu nunca tinha visto aquilo antes. E nem havia como escapar.

Tudo, de repente, ficou quieto. O amontoado de homens mascarados nos fritavam com verdadeiros olhos pretos, armados com espadas, kunais e mais um monte de armas brancas que eu não sabia o nome, trajados com roupas orientais negras, todos em silêncio absoluto feito estátuas.

— Hoje é o meu dia — murmurou Kelan, que sacara sua espada de esgrima da cintura.

— Se esses forem quem eu tô pensando, Dio, então lascou — disse Natsuno apavorado. — Será que são eles mesmos?

Parecia que sim. Estávamos cercados pelos tão falados Ninjas da Noite.



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