Caçador Herdeiro Brasileira

Autor(a): Wesley Arruda

Revisão: Ângela Marta Emídio


Volume 2 – Arco 5

Capítulo 60: Pedido de socorro

Nota do autor:

Fala, galera, tudo bem? Passando rapidamente para pedir desculpa pelo atraso no lançamento do capítulo. Essa semana estou reformando a casa, então ficou meio corrido para mim, principalmente porque trabalho de madrugada. Não estou prometendo, mas tentarei postar dois capítulos na próxima sexta-feira como compensação.

Falando em capítulos, estamos na reta final do arco inicial do volume 2 (arco este que vai até o capitulo 65). Vocês estão percebendo que as coisas estão um pouco paradas, né? Mas fiquem tranquilos que, a partir do próximo arco, o livro vai dar uma reviravolta. Tenho certeza que vocês vão gostar muito!

Bom, sem mais delongas, boa leitura!

Yago recebeu a bola perto da área, enganou o marcador ao fingir que iria correr para a esquerda e ajeitou o arremate. Chutou tão forte que o goleiro mal teve tempo de se mexer. A bola estufou a rede e o placar eletrônico mudou de três para quatro a zero.

O time de verde comemorou de forma tímida, até porque o jogo já estava decidido desde o primeiro tempo, e o árbitro deu o último apito da partida.

Meus amigos e eu havíamos assistido a tudo e estávamos impressionados com o poder de ataque do 2ºH, que fez três gols no primeiro tempo e não fez questão de fazer mais na segunda etapa. Quando decidiram atacar, fizeram o quarto, talvez só para mostrar aos futuros adversários, no caso o nosso time, que tinham técnica o suficiente para controlar uma equipe do 3º ano.

Mas eu não me deixei intimidar. 

— Ei, Yago, a gente se vê na final! — gritei de onde estava, após o anúncio do locutor de que o 2ºH enfrentaria o 1ºB na sexta-feira pela taça do torneio.

Não só Yago, como todos os demais jogadores de verde me encararam. Yago deu um sorriso e fez que sim com a cabeça. Seus companheiros fizeram o mesmo.

Eles foram chamados pelo treinador, ali mesmo no campo, diante de centenas de alunos que fizeram questão de ficar para assistirem ao espetáculo. Eu não tinha ideia de quais eram as palavras do treinador, mas, observando a confiança estampada no rosto de cada jogador do 2ºH e no grito que eles deram ao término do discurso, senti um misto de inveja e admiração. Eles agiam como verdadeiros campeões.

 

Cheguei em casa com a informação de que meu pai havia ligado. Sempre que Tony ligava, significava que algo ruim tinha acontecido. Mas não dessa vez. Descobri quando Sara concluiu o motivo da ligação:

— Ele alugou uma estação de esqui no Canadá e disse que você poderia chamar alguns amigos.

— Caramba, no Canadá? Aí sim! Ele disse quantos?

— Não. Mas pediu pra avisar que o aluguel é por conta da organização. O que significa que…

— Haverá outros caçadores lá — presumi, interessado na ideia de conhecer outros jovens iguais a mim.

— Isso. Então já sabe, né? Nada de chamar seus amigos normais que não fazem ideia que existem caçadores e vampiros.

Fiz minha rotina pós-escola (trocar de roupa e almoçar) e decidi dar uma volta no parque. Finalmente, depois de dias agitados, teria tempo para colocar os pensamentos em ordem.

Questionei-me sobre a origem da Pandora. Apesar de Riku ter dito que ela era um dos Dez Condenados da Natureza e Natsuno ter explicado que esses condenados são seres que vivem no Mundo Espiritual, eu não conseguia entender como ela nos encontrara no lugar certo e na hora certa. E se ela faz parte de um grupo de dez, onde estavam os outros nove? E o que eles eram, exatamente? Quais habilidades possuíam? Eu deduzi que dificilmente encontraria algum livro na biblioteca da escola que pudesse fornecer todos os detalhes.

Outra coisa que me preocupava era o desaparecimento do Léo, o menino-cachorro. Ele precisava de ajuda e Michael era a única pessoa que eu conhecia capaz de ajudá-lo. Léo, no entanto, sumiu sem deixar vestígios. Poderia estar assustado; não me conhecia o suficiente para achar que eu era confiável.

Pensei em Sophia — e no pai dela. Inclusive senti saudade ao lembrar-me da garota. E estava feliz por ter dado um passo importante para o início de uma possível relação, quando conversei com o futuro sogro — mesmo que fosse à maneira do Sandro, claro. A decisão do pai da garota era incerta, mas, considerando que eu havia sobrevivido, o futuro era promissor.

Por fim, minhas duas maiores dúvidas: a motivação de Shin e seu pai quererem matar a garotinha do hospital e como o tempo havia entrado em paralisia na noite do crime. Quanto à garotinha, Hamano dissera que ela era uma mística que havia sofrido um acidente e estava em coma. Segundo ele, Tony acreditava que Lia era um risco para a tribo Minetsu e por isso Shin foi mandado para assassiná-la. Mas nada, até o momento, esclarecia o porquê de todas as pessoas que estavam no hospital, exceto por mim, Natsuno e Shin, ficaram paralisadas.

Fiquei vários minutos imaginando hipóteses; uma mais absurda que a outra, e só parei quando uma voz conhecida me tirou de meu devaneio:

— Oi — Zoe sorria ao meu lado.

Fui tomado pela mais profunda alegria.

— Zoe! Hoje mesmo estava pensando em você!

A garota se sentou e nós dois ficamos mudos por alguns instantes. Felizmente, encontrei um meio de puxar assunto, lembrando de algo que já pretendia fazer.

— Que tal a gente esquiar um pouco nas férias? Meu pai alugou uma estação de esqui e disse que posso chamar alguns amigos.

Zoe ergueu uma sobrancelha.

— Bem, digamos que eu não sei esquiar — disse rindo. — Você sabe?

— Nunca tentei. Mas não deve ser muito difícil. É só praticar um pouco, não?

— É, verdade. Na pior das hipóteses, caso você se acidente, o máximo que pode acontecer é você ficar coberto por neve.

Estremeci com a ideia. Não era fã do frio e muito menos de mergulhar no gelo. Nós dois rimos ao mesmo tempo.

— Dessa vez não vai dar — Zoe lamentou. — Vou passar as férias na casa da minha avó. Ela mora em Minas e está insistindo muito para que eu e a minha mãe vamos pra lá.

Apesar de triste pela ausência da amiga, eu compreendia. Minha avó também morava longe e eu estava morrendo de saudade.

Conversa vai e conversa vem, o assunto chegou na final do campeonato. Acho que me empolguei demais enquanto falava no assunto, pois Zoe sorria a todo momento, me observando com aqueles olhos chamativos. Pelo menos eu havia me distanciado das coisas que estavam me perturbando.

— Mas tem alguma coisa te incomodando? — percebeu ela, mesmo que eu tentasse disfarçar.

Não tinha jeito, a Zoe me conhecia muito bem. Respondi:

— Tem, sim. É sobre o Léo.

— Ele ainda está sumido?

Fiz que sim.

— Tenho medo de ele ter sido capturado, ou sei lá, morrido… Ele não tem culpa de se descontrolar. E do jeito que a cidade é, eu não duvido de mais nada.

— Ele vai aparecer quando você menos imaginar — disse a garota, a fim de me confortar. — Talvez ele só esteja com medo. Queria poder rastreá-lo pra você.

Eu quase sempre me esquecia da habilidade dela.

— Eu devia ter tirado uma foto dele — falei em tom de brincadeira, mas percebendo que teria sido uma boa ideia. — Torço pra você estar certa. O Léo é um bom menino. Não merece passar pelo que está passando.

***

Os Ninjas da Noite atacaram novamente.

Tudo parecia calmo no vilarejo, alegou o ferreiro Elivélton Queirós, um senhor até que muito bem conservado para sua idade avançada, mas repleto de hematomas e inchaços pelo corpo. Havia tomado uma surra. 

Morador de Firen há muitos anos, ele havia se mudado de um pequeno e isolado vilarejo para a cidade ainda na adolescência, quando seus pais viram uma grande oportunidade de trabalho, uma vez que faltava mão de obra na área metalúrgica. Aproveitando-se da tradição do clã, rapidamente os Queirós se especializaram na forja de espadas, tornando-se os responsáveis oficiais pela criação das diferentes armas brancas para os soldados do BFM (Base do Fogo Militar) e, posteriormente, para os agentes da organização Ko-Ketsu.

Seus pais se aposentaram e acharam por bem retornar ao pequeno vilarejo para terem mais tranquilidade. Já estavam velhos e cansados, tinham uma bela casa em Firen, cedida a eles por Tony Kido pelos seus trabalhos prestados, mas sentiam falta da família e, principalmente, do sossego que os pastos e plantações lhes forneciam. Elivélton, entretanto, já se habituara ao movimento e agitação da cidade que vira crescer. Fundou a loja de armas, que mais tarde se tornaria uma das mais relevantes de Venandi, e constituiu sua própria família, passando sua sabedoria e conhecimento para seus filhos, que manteriam o legado vivo.

Vez ou outra, o velho ferreiro retornava ao pequeno vilarejo que viveu na infância para descansar por alguns dias, visitar os parentes e amigos e cuidar da saúde de seus pais, mesmo que fosse preciso atravessar o país inteiro para isso. Ele não se importava. Não havia dinheiro que pagasse a felicidade que sentia ao rever seus velhos.

Tony conhecia a história dele e a de sua família. O ferreiro era um grande amigo pessoal, conselheiro da juventude e criador de inúmeras espadas que ele usou no decorrer de sua jornada. A aparição dele na organização clamando por ajuda o comoveu imediatamente. Elivélton estava machucado e indignado. Tropeçava em suas palavras ao narrar o que vivenciou duas noites atrás. Chorou em momentos críticos da história, revoltado com a covardia dos inimigos.

Os Ninjas da Noite atacaram novamente.

Eles invadiram o vilarejo na calada da noite sem que alguém os visse, pois os aldeões costumam dormir cedo para acordar antes do nascer do sol a fim de cuidar da terra. Porém, quando tentaram entrar na pequena igreja católica no intuito de roubar o tesouro do clã Queirós, foram vistos por uma mulher. Eles tentaram silenciá-la imediatamente, mas não deu tempo; ela gritou e alertou todos os homens do vilarejo.

Nenhum dos homens da vila deu conta da gangue de ninjas habilidosos e astutos. Apesar de estarem em desvantagem numérica, os ninjas não tiveram problemas em derrotar os valentes do vilarejo. Faltou, para os aldeões, treinamento específico em batalha. Nem mesmo Elivélton soube como enfrentá-los. O resultado foi inevitável: o tesouro foi roubado e o vilarejo saqueado e incendiado. Os Ninjas da Noite arruinaram a terra natal dos pais do velho Ferreiro, que até tentou lutar, mas que infelizmente não teve êxito.

— Todos estão desorientados! — concluiu com os olhos enrugados cheios de lágrimas. — Ninguém esperava por um baque desses. Aqueles malditos ninjas… Eles… — o velho tinha dificuldade em falar. — Eles arruinaram tudo!

Tony levantou-se da cadeira, tomado por um grande senso de justiça, deu a volta na mesa e pôs a mão sobre o ombro do amigo, cujos punhos estavam cerrados de raiva e tristeza.

— Isso será resolvido — garantiu, sentindo a garganta ficar seca, aflito pelo sofrimento do ferreiro. — Vou falar com o tesoureiro da organização e solicitar uma quantia suficiente para arcar com todos os prejuízos. Tente ficar tranquilo. Mandarei, também, uma equipe de reparos para o vilarejo agora mesmo, e já estou preparando uma equipe para rastrear os Ninjas da Noite, pois não é de hoje que estão causando problemas em Venandi. Recebemos a aprovação do Conselho para agir. Eu só lamento pelo tesouro do seu clã…

Elivélton estava sem palavras. Sabia que podia recorrer ao caçador, mas jamais imaginou que ele se disporia a fazer tanto. O tesouro dificilmente seria recuperado, mas o mais importante era que sua família e os demais aldeões estavam bem e teriam seu lar restaurado.

— Obrigado, Tony. Você sempre foi um homem justo, mesmo quando ainda era um garoto. Serei eternamente grato.

Tony deu um pequeno sorriso. Elivélton havia se acalmado. Ficou feliz por poder ajudar um amigo.

— E quanto ao tesouro? — A dúvida, de repente, surgiu em sua cabeça. — O que era tão importante que faria os ninjas invadirem um vilarejo tão humilde e isolado?

O ferreiro ficou sério. Agora estava preocupado, pensando novamente no assunto que o atormentou durante toda a viagem de volta a Firen.

— Eles roubaram as instruções que o Guardião do Sétimo Caçador Lendário, Guardião este que pertenceu ao nosso clã, deixou para as gerações que viriam depois dele. São conhecimentos que adquiriu enquanto Sacerdote Divino e que foram aprimorados ao acompanhar o Sétimo Lendário em muitas e muitas missões.

Tony arregalou os olhos. Já tinha ouvido falar sobre este tesouro, que tinha o poder de aprimorar espadas.

— Não vai me dizer que esse tesouro, ou melhor, esses tesouros são as…

— Isso mesmo — confirmou Elivélton Queirós, de olhar rígido e preocupado. — Os Ninjas da Noite roubaram as Tábuas do Guardião.

***

Apesar de faltar dois dias para a final do campeonato de futebol, o colégio Martins estava agitado com o entusiasmo dos alunos que só tocavam no assunto do jogo. A sala do Yago havia sido campeã no ano anterior, o que a tornava favorita a vencer segundo os “especialistas de futebol”. Eu não me importava. Tinha confiança em meus companheiros e isso era o suficiente. Já havíamos provado, inclusive, que poderíamos bater de frente com qualquer equipe da escola. O placar de três a três quando nossa equipe enfrentou a equipe do Yago era um belo exemplo. Sem falar que havíamos superado várias outras equipes fortes para chegar na final.

— A senhorita Abigail tá pirando com toda essa euforia — comentou Natsuno dando uma risada maldosa e em seguida mordendo sua esfiha.

— E ela parece sentir raiva de nós — Pedro inseriu —, como se tivéssemos alguma culpa. A propósito, como vocês se sentem com todos esses olhares? Eu me sinto um pouco desconfortável.

Ele se referia aos alunos das mesas ao redor que não tiravam os olhos de nós. Olhavam e cochichavam sem ao menos disfarçar. Eu também estava incomodado, ao contrário de Jhou e Natsuno, que davam sorrisos teatrais na direção da plateia. Riku não dizia absolutamente nada.

Natsuno nos convidou para almoçarmos na Lanchonete Lendária, tudo por sua conta, alegando que havia ganhado dinheiro do pai por bom comportamento na escola, coisa que não acontecia desde a quinta série. Jhou jamais recusaria comida de graça. Eu, que não tinha nenhum compromisso marcado, também iria. Pedro precisava concluir a leitura de um livro para devolver na biblioteca, então não podia ir, e Riku parecia estar de mau humor para aceitar.

Então, fomos em três.

***

Yago Cordeiro e alguns amigos de sua sala riam e andavam pelas ruas do bairro da escola. O time do 2ºH treinava no Miniestádio nas últimas aulas das quartas-feiras. Naquele treino, em especial, o treinador reunira os jogadores para motivá-los e passar algumas estratégias para o jogo de sexta.

Os garotos foram entrando em ruas diferentes rumo às suas respectivas casas, até que Yago, enfim, ficou sozinho. Não queria dizer a ninguém, mas ele estava nervoso como nunca. Tinham vencido o campeonato de futebol no ano anterior, e este já era um motivo para ficarem mais confiantes. A realidade, no entanto, era outra. Ele temia enfrentar Diogo e sua equipe. O 1ºB mostrou-se um time forte e capaz de superar todas as dificuldades. Era o tipo de oponente que não se pode subestimar, e Yago reconhecia que o coração do time era seu amigo Diogo.

De repente, ele ouviu alguém gritando de dor:

— AAAAAAHHHH!!!

Saiu em disparada na direção do grito, que veio da rua adjacente. Alguém gritava por socorro, reforçando que ele estava indo na direção certa. Yago estava pronto para sacar sua Takohyusei e lutar caso fosse necessário.

Quando pensou que encontraria um vampiro, apesar de improvável por ser dia, surpreendeu-se: um garoto esquisito mordia a bunda de um homem.

— O que você pensa que está fazendo? — exclamou perplexo.

O garoto, que Diogo tanto procurou por dias, largou o pobre rapaz e rosnou na direção do caçador. Yago recuou ao observar os dentes afiados e a baba gosmenta. Léo tinha um olhar verde e selvagem. Suas roupas estavam imundas e cheias de rasgos. Ele avançou feito um animal.

Yago sacou seu sabre de esgrima. Não tinha outra escolha a não ser se defender. O garoto-cachorro parecia enlouquecido. Saltou num ímpeto impressionante e viu, com seus olhos furiosos, a lâmina fina do caçador indo em sua direção, num golpe mortal…

— Punho de Fogo!

Um flash alaranjado atingiu somente a espada, desarmando Yago e o deixando vulnerável. O caçador observou, desesperado, o garoto selvagem a poucos centímetros de seu corpo, sendo imobilizado por braços negros que o agarraram por trás com firmeza e o fizeram se debater de fúria.

— Consegui! — comemorou Jhou, fazendo com que Yago soltasse um suspiro profundo. Não entendeu o que havia acontecido, mas sua vida, pelo menos, estava a salvo. — Diogo? Natsuno? — estranhou, quando os dois se aproximaram. Assim como ele, a dupla suava e ofegava.

— Maninho — disse Natsuno entre uma arfada e outra —, essa foi por pouco. É esse o pirralho?

— Ele mesmo — Diogo disse olhando para um Léo que tentava se desvencilhar dos braços do grandalhão. — Graças a Deus te encontrei, Léo.

Mais confuso que Yago, só o rapaz que levara a mordida na bunda. Ele encarou todos os garotos presentes e pensou estar enlouquecendo. Foi Yago quem pediu:

— Alguém pode me explicar o que está acontecendo aqui?



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