Caçador Herdeiro Brasileira

Autor(a): Wesley Arruda

Revisão: Ângela Marta Emídio


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 20: Converso com um anjo marinho!

Sophia ficou de cara virada para mim a semana inteira. Nem a minha primeira caçada ao lado de Riku e Natsuno conseguiu amenizar o meu estresse e culpa. Estresse porque eu odiava ficar naquele clima com ela. Sophia simplesmente me ignorava. E me culpava por ter lhe deixado sozinha na praça da escola me esperando.

— Mas a culpa não foi sua, Dio — repetia Natsuno sempre. — Você foi cercado por vampiros!

Ainda assim eu me sentia mal. O que mais queria era ter saído com a Sophia, tinha certeza que a tarde no shopping seria top com ela. Eu estava gostando dela, e precisava saber se ela sentia o mesmo. No momento ela sentia raiva, isso era nítido.

— Tenta falar com ela de novo — motivava Jhou toda vez que esbarrávamos nela e em suas amigas.

— Tenho certeza que ela vai acabar te ouvindo — disse Pedro certa vez.

E foi necessário mais de uma semana para eu conseguir criar coragem e ir atrás da garota mais uma vez. No entanto, as coisas não saíram exatamente do jeito que eu queria. Você entenderá o que quero dizer.

 

Assim que cheguei na sala de aula, coloquei minha mochila na cadeira onde sempre me sentava e fiquei no final do corredor esperando por Sophia. Muitos alunos entravam em suas salas e nada da garota chegar. Até pensei que ela havia faltado, quando então apareceu com suas amigas, passando por mim de rosto virado indo em direção à nossa sala. Não perdi tempo e caminhei até ela:

— Sophia — tentei chamar sua atenção, novamente sendo ignorado. Como um bom soldado, eu não desisti: — Me ouve, por favor. Quero me desculpar com você.

Sem parar de andar, ela falou com voz ríspida:

— Por ter faltado ao nosso encontro? Péssima hora para se arrepender!

— Olha nos meus olhos, pelo menos — pedi, quase implorando; mas ela continuou andando sem sequer olhar na minha cara. Era difícil acompanhá-la. — Sophia — eu insisti. Tomei a sua frente e a encarei.

— Diogo, por que você não me deixa em paz? É o melhor que você faz!

— Porque eu gosto de você. — Minhas palavras saíram rápidas feito um sopro, em seguida meu coração disparou.

Sophia parou de andar. Pareceu surpresa. Seus lindos olhos castanhos recaíram sobre mim, fazendo com que o nervosismo dentro do meu peito só aumentasse. 

Comecei a suar frio e a tremer. Suas duas amigas trocaram um olhar e eu continuei, com a voz um tanto trêmula:

— Sabe, eu não sei explicar exatamente o que é esse sentimento, mas você não sai da minha cabeça desde a primeira vez que te vi. O meu coração fica maluco quando estou perto de você. Eu acho que... sei lá, mas eu acho que estou apaixonado.

A forma como ela me olhava fazia eu ter certeza de que ela sentia o mesmo por mim — e mais do que nunca eu senti vontade de beijá-la. O que me faltava era coragem.

— Mas então por que você fez aquilo? — perguntou ela com voz amolecida.

— Não posso dizer por enquanto — respondi, desviando o olhar —, mas ouça, eu não fiz por mal. Juro que tenho meus motivos, e fiquei bastante preocupado com você. — Tornei a olhá-la e uma coragem súbita tomou conta de mim, portanto decidi aproveitá-la, segurando a sua mão: — Sophia, você quer ser a minha namorada?

Essa pergunta foi como um golpe para ela, eu só não sabia se bom ou ruim. Sophia estava em completo choque. Perguntei-me o que se passava em sua cabeça. A minha estava a mil. Algumas pessoas à nossa volta ouviram tudo e também pareciam ansiosas. Sophia estava parecendo um pimentão. Ainda assim, eu podia ter certeza que estava mais nervoso do que ela, suando pra caramba.

— Entrem para a sala, AGORA!! — gritou a inspetora rabugenta, aparecendo no corredor feito um rato saindo do esgoto. Uma vontade súbita de dar-lhe uma rasteira tomou conta do meu corpo.

— É… — Sophia desviou o olhar. — Depois conversamos.

Ela recolheu sua mão da minha e, acompanhada por Ana e Jéssica, entrou na nossa sala. A única coisa que eu tive que fazer foi aceitar, entrando também.

Dei uma rápida olhada em volta e pude notar que ainda não havia professor. Os alunos conversavam bastante entre si. Quando me sentei, ainda muito surpreso com o que acabara de acontecer, Natsuno logo perguntou, com um olhar ansioso:

— Cara, você tá suado. O que aconteceu?

— Depois eu explico — respondi, satisfeito com a minha atitude e ansioso para a hora do intervalo, para saber a resposta da garota. Era impossível controlar a tremedeira.

 

As aulas foram passando devagar e eu não conseguia me concentrar em nada por conta da angústia, e a todo momento me encontrava olhando para Sophia. Inúmeras vezes ela olhou de volta, mas quando nossos olhares se encontravam, virávamos nossos rostos de imediato, sem jeito. Era nítido que meu pedido de namoro a deixou surpresa. Eu, por outro lado, estava confiante. De algum modo sabia que Sophia sentia o mesmo que eu. Mas o constrangimento era visível entre nós dois. 

Natsuno percebia esses nossos olhares, o que me deixava ainda mais desconfortável. E ele, para completar, ria às escondidas da minha cara.

Finalmente terminou a primeira aula, e depois, a segunda.

Agora restava a terceira antes do intervalo.

O professor chegou na sala e encheu a lousa de lição, mas eu não conseguia me concentrar em nada. Ficava pensando o tempo todo na nossa próxima conversa, em como ela seria. Apesar de eu estar confiante, a expectativa desta conversa me deixava com calafrios. Seria meio que uma decisão na minha vida. Ou eu estava exagerando.

Enfim a hora do intervalo.

Eu me levantei com o coração acelerado, mas quando percebi, Sophia já havia saído da sala. Apressei meus passos para alcançá-la, empurrando vários alunos pelo corredor até chegar ao refeitório, sem esperar pelo Natsuno ou pelos outros. Aos poucos, o lugar foi enchendo. Eu não enxergava a Sophia em nenhum lugar. Andei pelo pátio inteiro até encontrar as duas amigas dela, que estavam sentadas em uma mesa com outras garotas:

— Vocês sabem onde está a Sophia? — perguntei.

— Não — responderam as duas juntas, me olhando indiferente, o que eu presumi que era mentira. Não queriam me contar. Pareciam ainda decepcionadas pelo fato de terem me ajudado e eu ter retribuído dando o “toco” na garota.

Continuei vagando pelo refeitório, mas nada. Então fui até a mesa onde estavam o Natsuno, o Riku, o Pedro e o Jhou.

— Não encontro a Sophia em canto algum — eu disse desapontado, me sentando e percebendo que Natsuno havia comprado o meu lanche.

— Você gosta mesmo dela, não é? — perguntou Pedro.

— Pra caramba — afirmei, respirando fundo. — A pedi em namoro hoje.

— E o que ela respondeu? — Natsuno pareceu surpreso.

— Ela não respondeu ainda. Por isso que eu tô procurando por ela; pra que possamos conversar.

— Então eu acho que o único lugar onde ela pode estar é o banheiro feminino — concluiu Pedro, com uma reflexão repentina.

— Deve ser mesmo — concordei,  um pouco confuso. — Poxa, mas por que ela está me evitando dessa forma? Não é exagero?

— Nem tente entender, amigo. — Jhou disse gargalhando com um enorme pedaço de sanduíche na boca. — As mulheres são muito complicadas.

— O grandão tem razão — disse Natsuno, com um risinho sarcástico no rosto. — E isso as torna irritantes. Não que eu ligue tanto. Elas são belas e maravilhosas… É, isso já basta.

Lanchamos até soar o sinal.

Eu me levantei e fui um dos últimos a subir para a sala, um pouco desanimado. Sophia já estava lá. Tinha um tom de tristeza no olhar quando passei por ela. Fiquei preocupado, mas como o professor já estava em seu lugar, fui obrigado a ir para o meu, junto à janela.

Caminhei lentamente até lá, sendo recebido por uma zoeira do Natsuno:

— Olha o sonhador aí.

Pedro e Jhou riram de mim.

— Quem não sonha não consegue o que quer — tentei um gancho, que sequer foi engraçado.

— Concordo — ainda disse o Jhou, pensativo.

Como sentia que a Sophia iria me evitar mais uma vez, decidi que não a deixaria escapar na hora da saída. Como Jhou dissera, as mulheres eram muito complicadas. Eu não conseguia entender o porquê de ela me evitar, pois sentia que ela também gostava de mim. Ou então eu estava enganado. Talvez ela não sentisse absolutamente nada, ou apenas uma pequena atração. De qualquer forma, eu precisava tirar isso a limpo.

Depois do que pareceu uma eternidade, bateu o sinal de ir embora.

Sophia foi a primeira a sair da sala, e sem perder tempo, fui atrás dela. Já no corredor, cheguei a vê-la descendo as escadas depressa. Esbarrando em muita gente, quase em desespero eu a segui. Estava alcançando-a, já no pátio, mas percebendo que eu estava próximo, ela apressou os passos. Saiu da escola muito rápido e entrou no carro que sempre a buscava.

— Sophia! — eu ainda gritei, mas o carro já havia partido. Fiquei lá parado na calçada, rindo à toa, ainda sem acreditar no que havia acontecido.

Muitos alunos passaram por mim e atravessaram a ruela que havia entre o prédio Martins e a praça frontal da escola, e um deles pôs sua mão sobre o meu ombro direito, dizendo:

— Você ainda tem bastante tempo para se resolver com ela, maninho. — Era o Natsuno, com um tom de voz amigável.

— Eu acho que tenho mesmo — concordei, observando o carro entrando na avenida e desaparecendo perante a frota de veículos barulhentos.

Caminhamos até a praça e esperamos pelos outros. Quando eles apareceram, Riku avisou com uma voz tão tranquila quanto seu rosto:

— Diogo e Natsuno, tenho planos fortes para a semana que vem.

— Planos fortes? — estranhou o garoto dos cabelos roxos.

— Explico depois — disse ele, antes de dar meia-volta e ir embora.

— Deve ser legal ser caçador — comentou Jhou, alegre.

— Você não sabe o quanto — ironizei, pensando no dia em que perdi meu encontro com a Sophia graças àqueles vampiros.

 

— Pensei que você não ia chegar mais!

Tio Michael desligou a televisão através do controle remoto e se levantou.  

— Aqui estou — disse eu, sorrindo, um pouco animado. — Vamos começar com os treinos?

— Lógico! Você teve uma semana de descanso, agora é hora de largar a preguiça e ficar menos inútil.

Ele pegou uma mochila que estava ao seu lado, se levantou e a colocou em suas costas. Percebi que estava pesada.

Minha barriga roncou.

— Mas primeiro eu vou almoçar — falei, colocando minha mão sobre meu estômago e caminhando em direção à cozinha.

— Não! — O grito do meu tio foi firme, e o olhei intrigado.

— Por quê?

— O treino será muito duro — disse ele, sério. — Se você comer agora… — Michael deu uma pequena pausa, me olhou nos olhos e falou sombriamente: — é capaz que não sobreviva.

Gelei com suas palavras. Ele caminhou até a porta da cozinha, calmo, como se o que acabara de dizer fosse uma coisa simples, e então me olhou por cima do ombro.

— E aí, vamos ou não?

 

O dia estava ensolarado, com poucas nuvens no céu e um clima ótimo. O calor reinava em Honorário havia dias, no entanto o ar não estava tão seco. Eu, particularmente, amava aquela época e torcia muito para demorar a chover ou fazer mais calor do que estava.

Claro que, antes que saíssemos, ainda troquei minhas vestimentas, deixando Michael irritado — vesti uma camiseta leve e coloquei um short. E lógico, não esqueci dos meus chinelos.

Tio Michael e eu já estávamos caminhando pela floresta por alguns minutos, em sentido nordeste desde que partimos, quando decidi perguntar:

— Por onde começaremos?

— Chegamos! — foi a resposta dele.

A princípio eu estranhei, mas depois olhei adiante dos troncos e avistei um riacho cuja água clara fluía suavemente. Conforme nos aproximamos, deu para ver que ao longo do rio, à direita, havia um penhasco por onde descia a queda d'água. Ou seja, era uma cachoeira.

— Top, hein — falei admirado. — Não imaginei um lugar tão bonito numa floresta como essa.

— Este aqui é o Rio de Água Pesada — apresentou meu tio, me conduzindo até a área aberta. A despeito da grama alta, a paisagem era bela e tranquilizadora. O rio traçava uma rota tortuosa até sumir perante árvores. O som da queda d’água fazia com que meu coração, outrora atordoado, ficasse calmo. — Um rio raro aqui na Terra, mas muito popular em Venandi. Não se engane com essa tranquilidade que está sentindo, pois esta é uma água traiçoeira e mortal. O primeiro passo do treinamento é você entrar nela.

— Entrar na água? Você deve estar brincando — caçoei.

— Quero que você fique em pé dentro do rio por alguns minutos — disse ele, me olhando com um sorriso desafiador no rosto. — Esse trecho é raso, então não precisa se preocupar. Tá olhando o quê?

Eu o encarava com o cenho franzido.

— Se eu soubesse que teria que entrar na água teria trazido uma sunga — resmunguei.

— Sem reclamações, por gentileza.

Tirei meus chinelos. Pisar descalço na grama cuja altura chegava aos joelhos me provocava medo de afundar o pé em algum formigueiro escondido. Tio Michael não tirou seus olhos impacientes de mim. A margem, pelo menos, era de areia úmida. A água cristalina permitia avistar o fundo do rio que, como meu tio mencionara, não era fundo. Pisei com o pé direito, sentindo o líquido gelado envolver metade da minha perna, depois pisei com o esquerdo.

— AAAHH!!! — gritei. Caí para frente e só não imergi o rosto na água porque consegui utilizar as mãos para evitar. A pressão do rio era anormal.

— Levante-se, Diogo! — ordenou meu tio.

Tentei ficar de pé, mas novamente eu caí, dessa vez ficando de lado, como se algo estivesse me puxando para baixo. Com bastante esforço, consegui ficar agachado.

— É muito difícil — eu disse confuso, encarando Michael com horror.

Ele parecia estar se divertindo.

— E você pensou que o nosso treinamento seria fácil? — replicou, rindo da minha cara.

Mesmo agachado, tornei a cair na água. Aquele rio não era comum, eu tinha certeza, visto que a água parecia mais pesada, mais viva

Eu me esforcei ao máximo e, agachado, consegui dar alguns passos para o meio do fluxo, que era poucos centímetros mais fundo. Quando fiz menção de me levantar de novo, caí mais uma vez.

— Meu Deus — reclamou tio Michael para si próprio. — Haja paciência…

Mesmo eu me esforçando, o máximo que conseguia era ficar agachado e parado, com a água quase chegando aos joelhos. Para mim já era um bom começo, mas o objetivo era ficar de pé. Novamente eu tentei me levantar, ainda sem sucesso. Parecia que a água me puxava, literalmente. A essa altura eu já estava completamente molhado.

Tentei várias e várias vezes. Parecia impossível. Além de pesado, o rio era gelado. Eu começava a sentir frio.

Michael permaneceu na margem me observando de longe, se divertindo a cada desequilíbrio meu. Se ele pensava que eu iria desistir, estava muito enganado.

Suspirei, ao cair pela quadragésima vez.

— Diogo! — gritou ele, com um olhar feroz fixado em mim. — Por que você pretende ficar mais forte? Eu preciso de um motivo.

Imediatamente eu respondi, alto, focado em tentar me levantar:

— Quero alcançar o Natsuno e o Riku. Preciso ficar mais forte que eles, só que para isso preciso treinar pra caramba!

Desabei de novo.

— E por que você acha que foi escolhido como o Herói Herdeiro do seu clã?

— Para protegê-lo!

No momento em que olhei para Michael, seu olhar castanho faiscou num tom esverdeado por um instante. Ele continuou:

— E você acha que o renomado e poderoso clã Kido precisa de um herói fraco igual você? — Tais palavras soaram desprezíveis e frias como o gelo.

— Eu não sou fraco!

A explosão de raiva teve uma consequência surpreendente: consegui ficar de pé por impulso e uma felicidade me cobriu.

— Isso aí — sorriu Michael.

— Consegui? — perguntei surpreso. — Tio, eu consegui!

A distração fez com que eu caísse de mal jeito no rio e afundasse. Senti o corpo inteiro ser coberto pela água espessa e comecei a ser carregado para uma região funda e densa.  Engasguei com a quantidade de água que acabei engolindo e perdi totalmente as forças. Tudo se tornou turvo e mudo.

Eu não conseguia responder e, aos poucos, estava perdendo os sentidos. Eu não podia me levantar e fiquei em completo desespero debaixo d’água, tentando nadar de maneira inútil, envolvido na mais completa escuridão.

De tanto me debater, acabei desistindo. Não tinha mais forças, mais ânimo, mais esperanças... Era impossível se mover devido à pressão do rio. Bastava aceitar a morte.

De repente, uma imagem apareceu diante de mim e iluminando aquela escuridão tenebrosa. Parecia o holograma de uma bela garota. E ela tinha asas! 

Eu fiquei mais encantado do que assustado, observando aquelas enormes asas brancas jogadas para trás, repleta de penas fofas e brilhantes.

A presença da garota acalmou meu coração.

Ela parecia estar dormindo ou meditando, o que eu achei bem esquisito. Sua pele macia possuía um tom bronzeado e brilhantes cabelos dourados e cacheados desciam por suas costas. Uma mecha era jogada da testa para trás, deixando a garota muito mais elegante e bonita. Ela era pouca coisa mais alta que eu, e seu corpo bem definido trajava um vestido tomara que caia rosa-choque que chegava aos joelhos, e estava seco! 

Quem quer que fosse, parecia não sentir a pressão da água pesada do rio, apenas flutuava, um fantasma que não se molhava.

“Quem é você?” era o que eu queria perguntar. Mas apenas pensei.

A garota — que parecia um anjo — abriu seus olhos suavemente, feito um bebê despertando de um sono matinal. Eles eram verdes e brilhavam com intensidade diante da escuridão. Repousaram sobre mim e ela respondeu com voz rouca e ecoante:

— Seu anjo da guarda.

“Um anjo que lê mentes” pensei. Tudo normal.

Apertei os olhos para ter certeza que não estava sonhando e senti o coração acelerar novamente, o que meio que denunciava que tudo aquilo era real. Eu estava morrendo afogado, delirando por conta da ausência dos sentidos e sem qualquer tipo de raciocínio decente.

Comecei a ver imagens. A primeira vez que encarei a casa que iria morar, desapontado por ter deixado a vida que tanto curtia para trás. Em seguida, eu estava de frente com a Sophia, sendo instruído de como chegar à sala de aula, depois apareceu o Natsuno, quem me apresentou Pedro e Jhou. O parque também era uma recordação, onde conheci o Riku — com seu rosto desinteressado — e a linda e carinhosa Zoe.

No começo eu me sentia sozinho, sem ter alguém para desabafar ou conversar, mas com o passar do tempo fui fazendo grandes amizades, até perceber que eu estava feliz. No entanto, estava prestes a morrer…

“Diogo, sai daí, por favor! era a voz da Sophia. Apesar de soar ao meu ouvido, parecia tão distante.

“Sophia?” perguntei abrindo os olhos rapidamente. A única coisa que vi, no entanto, foi água e escuridão; a garota das enormes asas não estava mais lá.

“Cara, não acredito que você vai morrer desse jeito! agora era a voz do Natsuno.

“É assim que você deseja deixar de ser um aprendiz?” dessa vez era o Riku quem falava, em um tom arrogante.

“Natsuno? Riku?...”

“Diogo, não morra!” foi a vez de uma Zoe desesperada.

“Zoe…”

“Honre o nosso clã disse a voz do meu pai, firme.Diogo Kido, esse é o seu nome!”

“Pai…”

“Você é um Herói Herdeiro, maninho!” bradou Natsuno. “Precisa demonstrar o porquê foi escolhido!”

“Herói Herdeiro…” repeti. Eu ainda flutuava na escuridão, quase inconsciente e sentindo a pressão da água aumentar, até que uma última voz, a voz do tio Michael, soou na minha mente:

“E você acha que o renomado e poderoso clã Kido precisa de um herói fraco igual você?”

— Eu não sou fraco!

Despertei irritado. Uma energia começou a percorrer minhas veias de maneira rápida e meu sangue pareceu se agitar. Tudo estava quente. Era como se a pressão da água tivesse se extinguido e meu corpo tomado por um poder calorento.

 — HÁÁÁÁ!!! — berrei com os olhos queimando. Eu me senti forte e potente, então olhei para cima, confiante. Toquei os pés no fundo do rio para pegar impulso e dei um salto incrível, indo em direção à superfície em grande velocidade feito um míssil de submarino! 

Saí do rio num pulo.

Enquanto estava no ar, olhei para baixo e vi um Michael totalmente incrédulo — ele estava na água, provavelmente prestes a mergulhar para tentar me salvar. Meu coração acelerado e o meu corpo aquecido por dentro resultava em um bem-estar surpreendente. Eu me sentia enérgico, capaz de derrotar cem vampiros de uma só vez.

Aterrissei no rio, na ponta dos pés e afundando só um pouco, enfim conseguindo me equilibrar.

— Consegui ficar de pé! — comemorei empolgado, mas dessa vez atento para não desabar igual da última vez. A água chegava aos meus calcanhares, gelada, pesada, mas nada me derrubaria.

— Diogo, você está em pé…

— É, eu sei! E nem adianta me zoar, dizendo que finalmente! — Eu ri, mas o meu tio mantinha-se quieto de uma forma que começava a me assustar. — Tio?

— Você está em pé…, mas está na parte funda do rio.



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