Caçador Herdeiro Brasileira

Autor(a): Wesley Arruda

Revisão: Ângela Marta Emídio


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 18: Trio de caçadores formado! Riku, o terceiro membro?

O despertador tocou às seis em ponto, mas eu já estava acordado há muito tempo, pensando em como me explicaria para a Sophia. 

Nenhuma conclusão.

Fui incapaz de encontrar alguma desculpa que pudesse explicar a minha falta ao encontro. Eu não poderia simplesmente dizer a ela que fui atacado por vampiros no meio do caminho. Muito menos dizer que a minha mãe não me deixou sair de casa para voltar à noite — isso me deixaria muito constrangido. De uma maneira ou de outra, Sophia jamais tornaria a olhar na minha cara, pois quem gosta de levar toco em um encontro em pleno sábado à tarde? Mas aconteceu, e eu não pude evitar.

Em pouco tempo minha vida mostrava que não seria nada fácil dali em diante. Vampiros… Eles tinham que ficar longe de mim, já que eu era um caçador. Teoricamente. Algo em mim os atraía. Eu só não imaginava o quê. E nem queria.

Levantei e calcei os chinelos, me espreguiçando em seguida.

Depois de vestir o uniforme e escovar os dentes,  desci à cozinha para tomar café, em seguida, dirigi-me ao colégio Martins. Chegando lá, encontrei Natsuno, Jhou e Pedro. Os cumprimentei e depois subimos para a sala em meio à multidão de alunos uniformizados.

Sophia estava no canto do corredor com suas amigas e foi na direção delas que eu caminhei. Natsuno, Jhou e Pedro entraram na sala enquanto eu me aproximava da garota que estava a poucos metros da porta. Suas duas amigas olhavam para mim como se já soubessem do ocorrido, todas com ódio assassino no olhar. Sophia também percebeu minha presença, então caminhou em direção à porta, assim fugindo de mim.

— Sophia — eu ainda chamei, tentando alcançá-la. Ela me ignorou, caminhando a passos firmes.

Suas amigas, ainda me encarando com raiva, a acompanharam. Sophia, no entanto, parecia normal, como se não estivesse com rancor de mim. Mas as aparências enganam.

— Preciso falar com você — insisti.

Sophia entrou na sala e sentou-se em sua carteira. Eu, já sem nada mais a fazer, esgueirei-me até a minha com cara de missão fracassada. Natsuno logo perguntou, curioso:

— E aí, conseguiu se entender com ela?

— Não, cara. — Eu me sentei, tirando o material escolar da mochila e o colocando sobre a mesa. — Ela nem sequer olhou na minha cara.

— Por quê? — perguntou Pedro. — Aconteceu alguma coisa?

— Ih, é uma longa história. — Natsuno coçou a cabeça e deu um sorriso forçado.

Riku entrou na sala e passou por mim, dirigindo-me um olhar significativo, como se quisesse dizer alguma coisa. Ou poderia ser impressão minha.

Decidi me focar nas aulas.

 

Após as três primeiras aulas, tocou o sinal do intervalo.

Descemos.

Depois de comprarmos o lanche, nós quatro nos sentamos em uma mesa ao canto do refeitório, uma das únicas vazias. Só não esperávamos que o Riku também fosse se sentar. E ele disse:

— Quero fazer parte da equipe de vocês.

Tamanha foi a direta que Natsuno e eu trocamos um olhar impressionado, visto que, mesmo depois da última batalha, não imaginávamos algo do tipo.

— Mas Riku — disse Natsuno —, você é do clã... Medeiros. Ou estava mentindo? — estranhou.

— Já cuidei disso — disse ele, sem interesse.

— Já cuidou? Como?

— Pedi permissão ao Conselho dos Clãs Especiais para sair da minha tribo. Não sou igual aos meus parentes e aliados.

— O que você quer dizer? — perguntei.

— A única coisa que quero é caçar vampiros. — Riku olhou no fundo dos meus olhos com seu olhar tão sereno quanto sua feição, e por um momento eu lembrei da felicidade súbita que ele demonstrou durante a batalha de sábado. — Minha tribo tem uma ambição diferente, maligna. Eu não ligo para essa estupidez, e não gosto de seguir otários que sequer conseguem se auto liderar.

— E por que você decidiu se juntar justamente a nós? — Natsuno parecia mesmo não acreditar.

— Vocês são Heróis Herdeiros — disse Riku com um pouco de impaciência. — Os únicos que conheço por perto. A tendência é encontrarem vampiros cada vez mais fortes.

Eu não entendi muito o que ele queria dizer, mas percebi que Natsuno sim. Ele não me explicou, apenas deu de ombros e mordeu o seu sanduíche de atum.

Encarei Riku atentamente. Não imaginei que aquele momento chegaria tão rápido. Logo o Riku, que nos recusou quando lhe oferecemos amizade...

Pedro e Jhou não diziam nada — ou melhor, o Jhou devorava sua comida feito um urso faminto, então ele sequer parecia estar ouvindo a conversa.

— Quando vamos começar a caça? — decidi perguntar, olhando para ele e depois para o meu mais novo melhor amigo.

— Hoje mesmo — respondeu Riku, finalmente começando a comer. Ele disse de forma tão natural que era como se caçar vampiros fosse um hobby em vez de uma matança. Eu não me sentia preparado. Apesar de ter combatido alguns vampiros, foram eles quem me procuraram. Dessa vez seria diferente: eu iria atrás deles.

— Quando e por onde começamos? — Natsuno nem parecia surpreso. Muito pelo contrário: ele parecia habituado.

— Isso vocês deixam comigo — disse Riku finalizando a conversa. E um receio estranho tomou conta de mim.

 

— Sophia! — tentei mais uma vez, na hora de ir embora. E, de novo, ela me ignorou. E o pior: acelerou os passos para que eu não a seguisse. Fiquei parado no meio do corredor, constrangido.

— É, cara — disse Natsuno em tom zombeteiro, chegando ao meu lado com o grandalhão e o Pedro —, parece que a Sophia tá magoada com você, e pra caramba!

Não tive nada a fazer a não ser aceitar.

Suspirei.

 

— Que surpresa encontrar você aqui — disse eu, vendo a Zoe sentada no mesmo banco de sempre, após o almoço.

— Ah, olá, Diogo! — Ela mostrou-se feliz.

Nos cumprimentamos e sentei-me ao seu lado. Eu acabei me lembrando da nossa última conversa, quando ela admitiu estar gostando de mim. Isso fez com que eu me sentisse ainda mais tímido. 

— Você parece bem abatido — disse Zoe, me encarando com uma sobrancelha levantada. — O que aconteceu? Me conta.

— Você percebe tudo. — Eu forcei um sorriso. — Mas não aconteceu nada, são apenas... coisas da vida.

— Diogo, fala logo! — insistiu a garota, séria. — Não confia mais em mim?

— Não, não é isso.

— É o quê, então?

Eu não queria dizer nada à Zoe, pois se tratava do meu lance com a Sophia. Eu não queria deixá-la triste, pois gostava muito dela, então queria evitar falar sobre o que me deixava de cabeça cheia.

Ficamos alguns segundos sem falar nada, ambos olhando para a quadra vazia — coisa rara naquele horário, e talvez o motivo fosse o início da semana. Zoe quebrou o silêncio:

— Você gosta de outra pessoa, né?

Senti o coração batendo mais forte, e o olhar que a Zoe me direcionava provocava algo estranho dentro de mim. Eu queria me aproximar, chegar mais perto para abraçá-la, mas a Sophia também não saía da minha cabeça. Os pensamentos assemelhavam-se a um cabo de guerra — cada um puxava para um lado, e isso começava a me incomodar.

Virei o rosto para o lado, sem coragem de encará-la. A situação ficava cada vez mais complicada. 

— Diogo, olha nos meus olhos — pediu Zoe.

De uma forma hesitante, atendi o pedido. E o meu coração começou a bater mais forte, enquanto eu olhava aquele lindo olhar carinhoso, um brilho intenso cor de esmeralda capaz de encantar até mesmo um morto. Por um momento, pensei estar gostando da Zoe, mas, como da outra vez, eu pensei na Sophia.

— Você gosta de outra garota, não gosta? Pode me falar. Eu... entendo.

Se ela disfarçava a tristeza ou não, era difícil saber. A forma como a Zoe sorria demonstrava o quanto ela era compreensiva. Decidi dizer logo:

— Isso mesmo, Zoe. Eu acho que estou gostando de uma menina da minha sala.

Pensei que ela mudaria a expressão, mas Zoe continuava com aquele sorriso carinhoso. Um sorriso que me encantava.

— E aconteceu alguma coisa ruim entre vocês? Pois você parece bem pensativo.

— Bem, mais ou menos — eu disse. Queria poder contar sobre o encontro e sobre a cilada dos vampiros, mas não achei conveniente em um momento como aquele. — Deixa pra lá, Zoe. Eu prefiro deixar assim.

Por um momento, Zoe pareceu querer insistir, mas pensou melhor e aceitou. Ela ficou pensativa, voltando os olhos para a quadra, ficando calada por alguns minutos. Nesse meio tempo, muita coisa passou pela minha cabeça. Pensei em como era possível duas garotas lindas olharem para alguém como eu. Pensei em como eu seguiria minha vida com vampiros querendo me matar toda semana.

— Parece que eu cometi um erro quando decidi declarar o que eu sinto a você — disse ela de repente.

— Não fala assim, Zoe — falei com o coração afundando. — Não foi um erro...

— Foi sim. Eu deveria ter esperado mais. Você ficou mais de uma semana sem vir ao parque por conta disso! Se já tinha medo de mim, agora que não vai querer mesmo se abrir! Eu só queria ter um amigo que me entendesse…

Zoe me olhou, e pela primeira vez eu encontrei um olhar triste vindo dela.

— Zoe…

— Eu não me importo que você esteja gostando de outra pessoa, eu só quero que você seja feliz e que não tenha medo de contar comigo. Eu estou aqui, Diogo. Quero a sua amizade.

Estremeci. A Zoe era uma pessoa boa, merecia alguém à altura. E além do mais, eu sequer conseguia entender os meus próprios sentimentos. Não sabia de quem gostava realmente. Talvez fosse dela. Ou não. Era difícil saber.

— Eu gosto de uma garota chamada Sophia — decidi dizer. — E nós tínhamos um encontro.

Eu tinha medo das mulheres, isso porque elas são imprevisíveis e possuem reações totalmente inesperadas. Fiquei com medo da Zoe ficar com raiva de mim e nunca mais olhar na minha cara, mas não. Ela apenas se mostrou atenciosa às minhas palavras, quieta como um anjo.

— Decidiu falar o nome dela? Isso já é um bom começo. Então, o que foi que aconteceu? Algo me diz que esse encontro não foi como deveria ser.

Cocei a cabeça sem jeito. Não imaginava que falaria sobre isso com alguém, muito menos com a Zoe, portanto não sabia se estava fazendo certo — embora ela fosse a única pessoa, além do Natsuno, com quem eu me sentia à vontade para falar sobre tudo.

— Na verdade não houve encontro — falei rindo. — Mas é sério, eu prefiro não falar sobre isso. Não é nada pessoal, Zoe. Eu espero... que você não fique chateada.

— Imagina — sorriu ela. — Você pelo menos foi honesto comigo. Isso já basta. Podemos continuar sendo amigos, certo?

— C-claro. Eu gosto muito de você. A sua amizade, eu não sei como, mas sinto que é verdadeira.

— Fico feliz por saber disso. 

Após isso, ficamos um bom tempo conversando sobre coisas aleatórias.

 

— E aí, Diogo.

Entrei na cozinha e lá estava o meu tio Michael montando seu prato de comida.

— Um pouco tarde pra almoçar, não acha? — perguntei, porque já passavam das três.

— Fiquei preocupado se você deixaria um pouco pra mim.

— Pra falar a verdade, eu também nem almocei ainda.

— Droga! Isso significa que terei que dividir minha comida?

— Claro.

— Tá, né, fazer o quê?

Óbvio que meu tio não se importava realmente com aquilo, ele apenas gostava do sarcasmo. Enquanto almoçávamos, perguntei:

— Conseguiu encontrar alguma casa?

— Ainda nada. Aqui nas redondezas havia três, me falaram, mas quando cheguei lá, duas já tinham sido alugadas e a outra não era, digamos, das melhores, se é que me entende.

— Vish — lamentei. — Queria que você morasse perto.

— É, dessa vez não vai rolar. Mas estarei sempre por aqui.

— E os nossos “treinos duros”, quando serão iniciados, tio?

Michael franziu o cenho e me lançou aquele olhar suspeito.

— Posso saber o motivo da pressa?

— Hoje começam as minhas caças — respondi empolgado, o que o surpreendeu de imediato. — Conheço dois amigos que também são caçadores, e decidimos montar um trio.

— Mas você não acha que ainda tá cedo, Diogo?

— Os dois já estão acostumados — expliquei. — E pertencem a clãs grandes. — Embora eu ainda não tivesse muita ideia de o quanto isso significava.

Michael deu de ombros.

— A partir da semana que vem já podemos treinar — disse ele. — Porém, os nossos treinos serão somente durante a tarde.

— Por mim tudo bem.

Depois que acabamos de comer, passamos o dia assistindo esporte, até dar cinco da tarde, quando decidi subir ao meu quarto. Chegando lá eu senti um arrepio diferente que eu conhecia muito bem. 

Dirigi-me à janela — que dava visão à floresta — e olhei para baixo, a orla do amontoado de árvores da floresta.

— Ei, Dio — gritou Natsuno —, você vem ou não?

Riku estava de braços cruzados encostado a uma árvore. Vestia um agasalho cinza cujo capuz era adornado por pelos brancos e fofos. Por dentro do agasalho, este aberto, uma camisa azul-céu e a corrente prateada com o pingente da inicial de seu clã: Medeiros.

Apesar do frio na barriga, eu sorri ansioso. Finalmente iria à minha primeira caça e esperava que tudo corresse bem. Eu ainda não tinha noção do fato, mas aquela seria a primeira missão de um trio que prometia fortes emoções, tanto boas quanto ruins.



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