Ataque as Torres! Brasileira

Autor(a): K. Luz


Volume 1

Capítulo 9: Espadachim

O sol. Era ofuscante, se não cegante.

Karlos estava sentado em frente à parede em que havia testado a sua força. Não era o mais espesso muro composto pelos tijolos, porém o buraco gigante no seu meio provava algo incontestável: seu feito era desumano.

“O soquei por me sentir tão poderoso, mas não achei que era, realmente, tudo isso.” Ele pegou a espada e leu a palavra Moral gravada no cabo. “Seria algo aleatório? Essa definitivamente é espada de madeira que gosto de usar todo dia, só que essa Moral me faz ter o sentimento de que não é a minha. Moral, é? De que isso serve quando se tá na lama…”

Ouvindo as palavras que deixou escapar no fim da memória, Karlos abriu os olhos. Estava de volta ao inferno.

Seu rosto colado ao piso estava coberto de sangue, então apressou-se em sair dali. O monstro — o gigante — aproximou-se e levantou a clava, em seguida, acertou o chão com força o suficiente para causar um estrondo.

Ao levantar a arma, repetiu uma cena que lhe era familiar: não havia sangue na clava. Ao caçar onde verdadeiramente estava o rapaz, o viu longe com dificuldades para se manter em pé. As pernas dele estavam bambas, os braços e pescoço estavam relaxados. Ridículo, longe de ser uma postura para lutar.

Com os pés descalços, Karlos dava passos. O sangue que escorreu das suas mãos seguia pela espada e pingava pelo chão. Diferente de quando estava amedrontado — ou quando estava repleto de intenção assassina — nesse momento seguia com um semblante sereno, seja por tudo ter se esvaído com suas forças ou pelo “mudar” da sua mente. A cada passo, sua visão ficava mais desfocava, abandonando-o em uma ponte estreita sobre um abismo crescente.

O monstro se aproximou. O desafiante também. Ambos ficaram cara a cara, ou talvez…

“Cara à barriga…”, pensou Karlos, depois ele ergueu os olhos pesados e encarou a máscara do abominável. “Vamos… isso não é momento para piadas. Se quer viver… foque-se por completo na batalha.” Ele tomava uma postura com a espada à frente, preparando-se para uma troca de golpes doentia.

O portão que o monstro protegia estava levemente aberto, devido a isso uma corrente de ar com areia adentrou e passou pelos dois. O manto encardido e desgastado do rapaz balançou e expôs um corte em sua perna; a máscara do gigante teve metade jogada para o lado e expôs um sorriso bizarro com os dentes deformados.

A ventania passava. O combate… começou.

Dentro do abismo, Karlos tornava-se um borrão feroz enquanto — através dos ouvidos e nariz — definia a forma do oponente o atacando pela frente. Primeiro, o rapaz abaixou-se e saiu da rota da clava, depois subiu sua espada de madeira cheia de chamas. Ele acertou o vácuo, pois o monstro esquivou.

Não havia tempo para a surpresa das suas falhas, logo retomaram suas posturas.

Outra troca; novamente a clava passou reto — abalando o ar — e o jovem aproveitou a brecha para estocá-lo, movimento evitado pelo monstro ao dar um passo para o lado. Surpreso e decepcionado pela falha, o rapaz expirou densamente pela boca.

Nos embates seguintes, três coisas ficavam claras: a arma do gigante era inútil e suas investidas também não poderiam competir com a velocidade do rival, independente disso, era questão de tempo para o desgaste criar uma chance. A terceira coisa clara foi a mais demorada para Karlos perceber, porém o desvio da sua estocada provava que o oponente era habilidoso, habilidoso como um humano treinado — longe de ser desmiolado.

O rapaz arrastou a perna à frente e balançou a espada com o peso do corpo; mal poderia imaginar que iria parar subitamente. Ele congelou nessa posição no meio do golpe e mesmo que suas mãos tremessem pela força imposta para tentar mudar a situação, restava apenas a sensação da ponta da arma que foi agarrada. Sem uma lâmina para se preocupar, a palma robusta fechava-se ao redor da madeira.

“Assim… como eles…” Karlos firmou os pês no chão, preparando-se para a tempestade que viria para destrocá-lo.

Essa salada tá ótima. Me passa a vasilha. Ele via seus pais do outro lado de uma mesa. Era janta, então trocavam palavras com sorrisos no rosto enquanto iluminados pelo branco da lâmpada.

As solas do rapaz eram arrastadas pelo concreto, manchando-o de vermelho. O abominável puxava a espada, mas recebia resistência da base firme do adversário. As suas palmas no cabo sangravam. 

Seja mais criativo! Se avançar sempre do mesmo jeito, é claro que vou acertar essa sua cabeça de idiota. No treino abaixo do sol, ele ouvia Diego dando-lhe sermão com seu tom humorado. Você larga sua espada muito fácil. Tenha determinação, determinação!

De lado para lado o monstro sacudia o jovem com a espada. O boneco estava longe de desistir e entedia isso pela condição desgastada dos membros. Diante da estranha convicção, ele forçou os músculos do braço e, lentamente, ergueu Karlos para o alto. No arquear do seu corpo, preparava-se para usá-lo contra o solo igual um porrete. 

Você está bem? Se foque em ter calma, estamos seguros e logo sairemos daqui. Ele via Dante ajudando — perto de uma tocha — certa moça instável com o despertar no lugar desconhecido.

“Eu também…” Karlos se tornou um borrão no descer do braço inimigo. As lembranças que via logo foram sobrepostas por sóis e, ele próprio, era alguém que as observava atentamente das trevas. “Eu também… quero ser assim!” 

O cabo da sua espada brilhou com a liberação intensa das chamas verdes. Por baixo dos seus dedos, a palavra “Moral” iluminou-se. Ao ranger os dentes, Karlos puxou sua espada e partiu os dedos do monstro, pousando no solo com os pés e com a katana de metal negro em mãos.

“Eu também quero ser assim!”

Fulminação, estava gravado na guarda, de onde mais transbordava o poder.

Marcado pelo corte com chamas, o ar recebia os dedos decepados rodeados de sangue preto. O gigante caiu de bunda no chão pela surpresa e dor que se espalhava pela sua mão, vendo à frente as costas do espadachim triunfante numa postura cansada.

Era o despertar.

Karlos se levantou e balançou a lâmina para limpar do sangue do metal negro. Depois virou-se com sua postura de luta para o inimigo, que se levantava — receoso.

Com sua visão de volta ao normal, as sobrancelhas do espadachim fechavam a expressão em mais seriedade e, quando seus olhos refletiram as chamas duma tocha, ele investiu.

“O que preciso pra ser um?!” Sua espada colidiu na clava de osso, estremecendo-a. Ameaçado, o monstro gritou e liberou a massa de intenção assassina — sua habilidade. Confrontando-a, lágrimas de sangue deslizaram do olhar obcecado do rapaz. “Vou precisar ajudar as pessoas?! Vou precisar rasgar a carne de ameaças?!”

Ganhando distância da clava, a katana adentrava na pele do abominável, que parou de gritar para ter mais foco no embate. As armas rebateram-se para o alto e logo os dois as forçaram em novas colisões estridentes. 

“Eu faço qualquer coisa, qualquer coisa! Mas me deixe pisar aí!!” O porrete sempre era deslizado pela espada e — nas brechas de tempos para ser recuado — ele cortava o peitoral do monstro. “Me deixe sair desse lugar escuro e continuar minha vida… com todos!”

Karlos prendeu a respiração e avançou; cortou o braço do monstro e as chamas explodiram causando rupturas pela carne próximas à abertura.

Na investida ele foi para atrás do gigante e já girava para golpear suas costas, mas foi atingido pelo braço ferido do abominável, membro que era girado numa tentativa de afugentar a ameaça. E se provou eficiente. O rapaz foi mandado para longe.

Karlos caiu de costas e rodou para ficar imediatamente de pé. Alerta, viu o inimigo pegar pela última vez no seu braço ferido: fora a falta dos dedos, a parte superior estava fumegante e liberando sangue preto. O resultado era que não podia mais sequer ser movido e, pela aberração, isso foi aceito. A partir dali o monstro o deixaria estirado e se focaria em empunhar a clava com o que restou.

O rapaz observou a postura do oponente: a arma estava para o lado.

Era a hora. Tinha que ir.

Com o centro de gravidade baixo, Karlos correu com todas suas forças e foi amassado no acerto do porrete, dobrado pela quebra dos seus ossos enquanto era carregado como um fantoche.

A previsão acabava. O verdadeiro recuava, ileso. As sombras dos dois se enfrentando e seus resultados sumiram, cancelados em sua mente.

“Entendo… Você já percebeu como cancelar minha defesa.” Ele se movimentava pelos lados e o monstro se virava, adequando-se no centro do círculo em que ficou preso. “Era tudo uma questão de eu me posicionar contra os seus ataques de cima e então usar sua própria força para dispensá-los pelas laterais com a minha lâmina posicionada diagonalmente.”

Karlos tentou investir outra vez, mas recuou ao notar que seria pego pelo balanço.

“Mesmo com a diferença gritante de força, meu porte físico e a resistência bizarra desse metal aguentam o tranco. Mas esse é o limite e você percebeu… que não posso anular os seus golpes laterais se faltar ângulo. Ou seja: preparo.”

Suas pupilas afundaram-se e ele avançou novamente, dessa vez com o centro de gravidade mais alto. O monstro balançou a clava e, com um aumento súbito de força, alcançou o rapaz.

O ar espalhou-se forte pela sala, nada mudou. Karlos saltou por cima da arma em passagem.

Ele pousou e restabeleceu o equilíbrio, depois, imediatamente se aproximou. Seus pés deslizaram no abrir da postura; entortou o torso para trás, preparando-se para um corte poderoso com a katana.

“Você é costumado com a batalha?” Seu vulto sombrio passou abrindo o monstro desde cima. “Compartilhe um pouco comigo.”

No fim, um estouro de chamas.

Com a carne transpassada, o rapaz parou por um momento e respirou, mas a pobre pausa foi curta, interrompida por um barulho que o fez recuar com calafrios percorrendo-o por inteiro.

Seus saltos foram rápidos e o coloram a metros de distância. 

“Entendo…”

Via que o braço do monstro estava no chão, decepado. Bastante sangue escorria da carne escura; no chão a poça crescia. Apesar de tudo, o gigante continuava de pé com a clava empunhada firmemente na mão restante.

“Conseguiu sobreviver usando o braço ruim como escudo e minimizou o dano no centro do peitoral, mas…” Karlos cancelou sua postura e ficou reto, sem mais intenções de lutar. “Esse é o fim. Vai morrer pela hemorragia. Só tenho que esperar e impedir que alguém chegue perto de você nesse meio tempo.”

Ele virou-se e tomou seu rumo.

“Essa é a minha vitória, monstro.”

Os passos soavam, indiferentes ao derrotado.

Cortada, metade da máscara do monstro caiu. Sua boca estava fechada e o olhar lançado à frente fitava o motivo da sua desgraça, alguém que o abandonava. Vapor começava a sair da sua pele, e a própria, avermelhava-se.

O sangue preto jorrava do que sobrava do membro decepado. Jorrava forte… Jorrava. Parou. Ruídos soavam da carne se apertando. Bastante vapor saia pela pele.

As íris amarelas rodeadas de negro afiaram-se na esclera rubra e refletiam a imagem do rapaz próximo aos destroços no corredor.

“Pelo jeito não será necessário eu conter o pessoal”, pensou Karlos ao ver os destroços tampando tudo. “Vou ter que evitar ele sem usar o corredor… Não deve ser problema com minha velocidade e os ferimentos dele. Já me acostumei com seu ritmo, então se vier…”

Isolado ali, tudo ao redor estava claro.

“Estou impressionado… por estar tão calmo. O que aconteceu comigo? Adrenalina? Eu… jamais devo esquecer essa sensação”, apertou a mão no cabo. “Huh?” Aliviou o aperto. “Já não faz tempo que o som de sangramento parou?”

Ele olhou de relance para o monstro e tomou um susto.

“A pele dele tá vermelha?...  Como?!” Pôs-se em posição de combate.

Do outro lado, o abominável arqueava o braço.

“Tch! Vai arremessar o osso?! Dessa distância?! Sei que é bom de mira, mas não me subestime, posso reagir! Definitivamente posso!”

O monstro girou o braço e o que aconteceu estava longe de ser um arremesso, mas um ataque contra o piso.

A clava passou quebrando o chão como se fosse manteiga e, em sua ponta, eram carregados pedaços das rochas. O gigante gritou; as que ficaram até o fim do balanço queimaram em vermelho e voaram, voaram até Karlos.



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