Ataque as Torres! Brasileira

Autor(a): K. Luz


Volume 1

Capítulo 7: Obsessão

Andar pela escadaria era solitário. As tochas eram ineficientes em cobrir as extensões do lugar, mostrando apenas um segmento de paredes e teto liso. Aprisionados, os passos ecoavam, intensos.

“Esse lugar é grande.” Karlos caminhava sem temor, sem pressa. “Essa falta de mudança na aparência faz parecer que estou andando em círculos, mas as salas que vi me fazem ter a certeza que não.”

Olhando adiante, ele notou uma porta.

“Outra?” Perto dela, pegou na maçaneta. “Madeira velha como as outras… Esse lugar foi abandonado?”

Adentrou no local.

Dentro da sala haviam algumas caixas e, quando Karlos entrou, uma tocha se acendeu. Com sua espada de madeira, ele forçou o abrir das tampas de algumas, espalhando uma poeira que o fez tossir. Ao verificar o interior delas, confirmou que guardavam sacolas de cereais e pequenos barris com água.

“Igual as outras salas… fede.” Pegou uma porção em sua mão e deixou deslizar de volta para o barril. “É como se o lugar estivesse preparado para que nós vivêssemos nele por alguns dias… não, meses. Pelo menos, seria assim no caso disso tudo não estar estragado.”

Karlos se levantou e tampou as caixas. Depois partiu, batendo a porta.

“Se minha intuição estiver correta, esse corredor é tão longo porque leva direto para o andar mais baixo.”

Se recordou de outras salas que olhou, nelas também haviam passagens para baixo, porém acabavam rápido, eram diretas e demasiadamente planas.

“Não sou engenheiro ou algo do tipo, mas o intuito disso seria uma viagem rápida até o chão? Por que tantas rotas e uma principal? Poupar tempo?”

Ele parou, finalmente ponderando opções:

“Eu deveria voltar?” Encarava sério a próxima curva escura. “São apenas teorias, mas provavelmente seriam úteis para aquele policial.”

Estava prestes a decidir; uma chama verde deslizou por sua mão na espada e desapareceu num instante. Com sua atenção roubada pelo evento, ele levantou o item para perto.

“Tem isso…”

Na guarda do objeto estava escrito em uma bela caligrafia: “Moral”.

“Essas chamas verdes… são um mau presságio. Me sinto forte desde que recobrei a consciência, chega a ser estranho.” Se lembrou do tempo que passou em uma sala mais espaçosa, por lá havia testado sua movimentação. “Minha força talvez não seja mais humana. Nunca me movi tão rápido ou saltei tão alto.”

Após poucas considerações, a sua decisão foi a de seguir à frente.

“Não posso voltar. Se o que esse quadro na minha cabeça diz for verdade, essa mensagem emblemática e força anormal são um alerta. E se existe um alerta, existe um perigo.”

Pelo caminho fazia vistorias pelas salas que achava, mas evitava adentrar muito nas salas com conexões para outros andares.

“E se existe um perigo, eu vou eliminá-lo com esse poder que ganhei. Pelo bem de todos.”

Mesmo que pensasse em boas palavras, a expressão do rapaz era sombria. Quando não séria, era apática, parecida com uma máquina.

Mais adiante viu uma saída que brilhava bastante pelo contraste de luz entre ela e o corredor.

Curioso pelo exterior, Karlos acelerou os passos, hipnotizado e, antes que atravessasse a barreira de luz, um som perfurou seus ouvidos e o fez retornar a realidade, fazendo-o se jogar à parede em cautela.

Seu coração batia a mil, a respiração pesava uma tonelada para sair dos seus pulmões. Seus olhos se acostumaram com a iluminação e logo expuseram o grande saguão adiante. Era um lugar grande.

O espadachim colocou-se um pouco adiante e olhou o que havia depois do muro. O resultado foi de um espanto. Era ridículo, não dava para confiar nos olhos. Um gigante de três metros estava sentado, devorando um enorme pedaço de carne.

Impossível.

O monstro tinha uma forma humana, mas a pele era amarelada. Mesmo que possuísse uma barriga roliça, seus músculos dos braços e pernas eram volumosos e amedrontavam com a mesma força dos sons que saiam da carne ensanguentada que mastigava.

Seu rosto estava coberto por uma máscara de pano velho, espalhada acima da carne por estar comendo. Não possuía uma genital, por fora o corpo era apenas um amontoado de pele lisa. 

A máscara manchada de sangue, mesmo que puxada em parte para não atrapalhar o “lanche”, ainda cobria seus olhos e nuca, então era impossível definir se sua atenção estava mesmo direcionada à comida ou… ao rapaz.

Karlos retornou a cabeça, havia alcançado seu limite vendo essa criatura bizarra. Sem forças, suas costas deslizaram pela parede enquanto o seu suor pingava. 

“Um monstro…! Realmente há um monstro! Aah… Loucura.” Vassalo, pregou-se no quadro vermelho e preto em sua mente, letras que se deformaram antes de desaparecem subitamente. Ele segurou seu rosto. “Achei que tinha me preparado para ver um, mas não esperava por isso.”

A aberração estraçalhava a carne em seus dentes longos e podres, criando barulhos que atormentavam o rapaz caído, como se martelando os últimos pregos em sua convicção. Sua mão apertou o osso e, ao morder a carne, puxou um grande pedaço. Se lambuzava de sangue, o maldito grotesco.

“Se acalme… Esses sons me dizem sua localização, está muito longe para ser uma ameaça. Essa entrada também não cabe aquele corpo imenso.” O coração do rapaz relaxou mesmo que só um pouco. “Se foque no que viu.”

Colocou a mão na testa e recordou-se de ter visto dois portões altos atrás do monstro. E próximo, notou a entrada de outro caminho que ligava a esse saguão.

“Ele tá protegendo a saída?... Nesse caso, como conseguiu o pedaço de carne? Não, isso não importa. Eu verifiquei o caminho até aqui, não havia traços de outros seres vivos, então essa é a ameaça, a única ameaça.”

Karlos levantou-se e caminhava de volta às escadarias.

“Preciso contar ao grupo, depois podemos caçá-lo com alguma estratégia.” Seus passos mal foram adiantes, eram vacilantes. E desistiram. “Hã?... ‘Caçá-lo’? Com aquele pessoal de cima?... Aquelas pessoas simples? (...) Impossível. Quantas precisariam morrer até que o monstro caísse?”

As sombras derretiam sobre o corpo do rapaz, engolindo-o. Suas íris afundavam numa espiral tortuosa, insatisfeitos.

“Ah… Isso não é bom. Nada bom.” 

 

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Na sala inicial, Dante conversava com Otávio:

— Quantos são? — perguntou Dante.

— 149. Há setenta e três homens; somos a maioria. Os idosos e crianças totalizam vinte e cinco, não os inclui na contagem deles, e… 

— Contou consigo?

— Ei! Não sou idoso.

— Falo na contagem geral. Foco, Otávio.

— Ah! sim! Ha ha ha! Claro, contei comigo.

— Entendo. Já passamos tempo demais aqui, vamos nos preparar para sair.

— Seria melhor fazer uma vistoria antes?

— Mandar batedores, huh? — Dante segurou o queixo. — Agora que as coisas estão quietas, posso ir. Evitei antes por essas escadarias me passarem essa péssima sensação.

— O mesmo vale para todos, chega a ser estranho. Ninguém teve coragem de descer sozinho. — Um sorriso bem-humorado formou-se no rosto do policial. — Será que esse lugar é amaldiçoado? Ha ha ha!

— Eu não riria dessa suposição… 

Após chamar o grupo inteiro, foi decidida uma organização para a saída de todos. Os homens eram reunidos como linha de frente e, uma divisão menor, era encarregada de cuidar da retaguarda; naturalmente, o restante ficava pelo centro. Apesar de amedrontados e nas garras do desconforto, o vigor de finalmente abandonar esse lugar era revigorante.

Prontos para começar a caminhar, foi quando aconteceu um pequeno evento que conseguiu o foco do Dante: um rapaz passava apressado trombando com as pessoas, o que claro, fazia as reclamações acumularem.

— Me desculpe! — disse André após topar numa senhora.

— Qual o problema? — perguntou Dante, surpreendendo-o ao surgir em sua frente.

— O-oh! Perdão por causar uma confusão, senhor.

— Contanto que entenda… Mas o que procura com tanta pressa? Algum familiar?

— Ah! não! Tô procurando um amigo faz meia hora. Ele deve ter ido sentar para outro lado enquanto eu dor- quero dizer: enquanto eu estava desatento.

— Entendo. Por agora apenas espere atrás dos adultos, quando sairmos daqui ficará fácil para encontrá-lo.

— C-certo! Obrigado e desculpe pelos problemas.

O assunto acabou.

Dante virou-se e foi para a linha de frente enquanto André acatou as ordens. Apesar de ter resolvido o problema, algo incomodava o policial, como se seu instinto gritasse lhe avisando de que havia alguma coisa errada.

— Vamos lá! — disse Otávio, perto, motivando os homens a passarem pelos portões. — Coragem!

Para os que assistiam, esse território estava afetado por uma intensa gravidade que dificultava os passos de todos. Mesmo para Dante, era difícil superar a estranha semente de medo em sua mente. Porém, depois de se acostumar, seus passos ficavam leves.

“Se esses senhores estão tendo problemas”, pensou Dante, “imagino como vai ser trabalhoso fazer o restante passar. Vai levar tempo…”

Ele lembrou-se da conversa com o rapaz.

Tempo… Ele passou meia hora procurando pelo amigo nessa sala com quase 150 pessoas e não o achou. Não é tanta gente para justificar a demora e ninguém aqui usa capuz. Todos os rostos estão expostos, mesmo assim não o encontrou.”

— Que tal também dizer algumas palavras de motivação? — perguntou Otávio para o amigo preso no monólogo, mas foi ignorado. Percebendo a desatenção do colega, tentou chamá-lo outra vez. Novamente sem sucesso.

“Espera, ‘quase 150 pessoas’?!”

Para a surpresa dos à volta, Dante subitamente correu pelos degraus.

— Ei! — Otávio tentou protestar, mas só recebeu de resposta:

— Vou na frente conferir algo! Cuide de todos até eu retornar! 

Sem medo de cair, os pés do Dante se moviam rapidamente pelos degraus. O policial estava apressado, afinal havia uma ovelha perdida.

Ele abria as portas, olhava as salas, mas não largava as escadarias como rota principal. Sua descida descuidada levava em consideração que já eram terras exploradas, então se controlar era inútil. E se o jovem estivesse em perigo? Tinha que, acima de tudo, ser rápido.

Isso se provaria certo.

Ao alcançar o piso, seus passos ecoavam, mas estava longe de se equiparar ao peso dos estrondos que vinham do adiante. 

A luz passava pelas frestas entre as rochas que tampavam a saída, muitas. O caminho estava bloqueado.

Os barulhos continuavam.

Dante aproximou-se do bloqueio com temos, pois ouviu um rugido animalesco. Seguido do ensurdecedor barulho de terra explodindo. 

— O que está acontecendo?! — Ele paralisou por um momento.

O estrondo seguinte o despertou. Encorajado pelo dever, ele olhou por umas das frestas. Absurdo. Espantou-se de imediato.

O monstro gigante avançava furioso. Rodeado por uma nuvem de poeira — uma que ele mesmo cultivava com os golpes que ia desferindo com o osso na mão — sua fúria era imparável. A cada impacto, os pedaços do piso iam ao alto, abandonados.

A causa da sua imensa raiva? Ela se movia… continuamente, contrariando o óbvio destino.

Karlos saiu da nuvem de poeira em um recuo apressado, detalhes que refletiam nas íris do policial, que estava inteiramente embasbacado. Por mais absurdo que soasse, um humano estava lutando contra um monstro. 

Brasas verdes espalharam-se à volta do rapaz. As roupas dele estavam desgastadas ao ponto do torço seguir exposto com vários cortes na pele cortada e suja de sangue. Sua expressão estava vazia — próxima de desmaiar —, ainda sim, os olhos encaravam o desafio sem fraquezas.

Pronta para atravessar carne, na sua mão direita havia uma katana negra ao invés daquela de madeira e — ela — queimava.



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