As Castas de Kodekalain Brasileira

Autor(a): Andre Ludwing


Volume 1

Capítulo 4: Revelações

Eroan fechou a porta atrás dela.

A demoniana parou no meio do quarto e olhava para ele de soslaio. Sua roupa estava colada ao corpo e escorria bastante, aumentando a poça ao seu redor. Estava com a postura um pouco acuada, a cabeça se escondendo entre os ombros. Não parecia estar completamente confortável, mas mesmo assim estava ali.

Isso o intrigava.

Bem, se tivesse fugido seria uma dor de cabeça a menos.

Eroan não pretendia deixá-la por tempo demasiado. Faria suas perguntas e quando a chuva abaixasse a chutaria dali. 

Ela se encolheu quando Eroan passou perto. 

Ele foi até a cozinha e pegou algumas lenhas do cesto onde as guardava então acendeu a lareira. Sua cabeça estava tão agitada que nem percebera a escuridão em que estava. Usou a pederneira para acender o fogo. Agachado, olhou por cima do ombro e notou que a demoniana o observava da porta.

— Eu aconselharia vestir algumas roupas enxutas se não pegar um resfriado. Pode pegar qualquer uma no armário.

Eroan espalhou os peixes sobre uma prancha de madeira ao lado da lareira. Do armário na parede, pegou um pote de sal e derramou sobre os peixe. Isso ajudaria a conservá-los. 

Encheu uma panela com ingredientes para uma sopa de carne de carneiro — já que ainda tinha algumas reservas.

A demoniana se aproximou devagar enquanto Eroan mexia a sopa.

Ela agora usava camisa e calças dele. Seu rosto azulado e olhos exóticos encapados por aquelas roupas feitas para o dobro de seu tamanho. 

Mesmo assim, ficou estranhamente atraente nelas, pensou Eroan. Ele pigarreou e voltou a focar na sopa. Enquanto ela esteve no quarto, ele havia limpado as poças d’água do cômodo de entrada. Percebeu que ainda usava roupas molhadas, que grudavam a pele, apesar de que o calor da lareira já as havia secado consideravelmente.

A demoniana sentou ao seu lado na lareira com as pernas cruzadas. A luz da lareira banhava sua pele em um tom azul-dourado.

— Estou intrigado com sua capacidade de confiar me mim nessas circunstâncias — Eroan comentou.

Ela levou um dedo aos lábios, pensativa. Então, disse, com uma voz assertiva:

— Se você quisesse realmente fazer algo comigo, já teria feito.

— Talvez eu faça. As vezes, a pessoa está apenas procurando a coragem.

Ela estremeceu.

— Vou trocar essas minhas roupas. Se você fugir agora, não poderei fazer nada contra você.

Ele foi se trocar, mas quando voltou, ela ainda estava em frente a lareira.

— Pelo visto, você é doida mesmo.

Ela o olhou, depois voltou a mirar o fogo crepitante.

— Você disse que ia me matar… mas saiba que, na minha circunstância, essa opção é muito melhor que a alternativa.

Ele respirou fundo e pegou uma tigela de madeira do armário e foi colocar algo para ela comer. Mas ela fez uma cara de enjoada.

— Eu não acho que eu vou conseguir comer nada.

— Você quem sabe.

**

Eroan olhou pela janela, desmotivado. Não parecia que a chuva passaria tão cedo.

Não se conseguia ver nada além das gotas estourando e escorrendo pelo vidro da janela, e  uma escuridão quase palpável. Estava sentado a mesa, que ficava diretamente abaixo da janela. A janela ficava na mesma parede que a porta de entrada.

Terminava sua sopa, enquanto a demoniana o esperava, silenciosa, sentada na cadeira a frente, suas mãos descansando sobre a mesa. Eroan achava estúpido o fato de ficar tão desajeitado ao comer com alguém olhando. Isso deixava ele um pouquinho puto. 

Finalmente deu a sua última colherada.

Se reclinou sobre a cadeira e cruzou os braços.

— Você disse que queria conversar comigo — ela disse.

Eroan assentiu. 

— Lembre-se que este é o único motivo pelo qual você está viva agora.

— Você vai me matar depois que eu der o que você quer?

Ele semicerrou os olhos na direção dela.

— Perdi a sede de sangue. Eu decidi que você irá embora, seguirá seu próprio caminho.

Ela fez uma expressão de tristeza.

— Na chuva?

Eroan hesitou antes de responder.

— Não, tudo bem. Você pode esperar a chuva passar.

Ela sorriu. 

Esse sorriso repentino o fez ficar inquieto. Tinha desaprendido a interagir com mulheres.

— Sobre o que você queria falar? — Perguntou ela.

A expressão dele de repente ficou mais sombria.

— Você chegou a ver Buttfed?

Ela colocou um dedo sobre o queixo para pensar.

— Você quer dizer, aquele velhaco com um metro e cinquenta?

— Esse mesmo.

— Ah, sim, eu vi ele. Ele queria… fazer coisas comigo.

— Hm… Mas quem levou você até ele?

— Ãh… um ruivo, eu acho… Assim, tinha vários homens, mas eu acho que era o ruivo quem estava no comando.

— Casper.

— Como?

— O nome dele.

— Ah!, certo. 

— Ele estava no comando… — Eroan ponderou, emputecia ao passo que um turbilhão de memória surgia a sua mente. Parou, respirou fundo. — Esse desgraçado.

— Ele é conhecido seu?

— Ah, é sim... Pera aí, isso não é da sua conta!

— Oh… tá bom.

Eroan a fitou nos olhos. Ela continuava silenciosa, o observando. A chuva estalando na janela. No fundo queria compartilhar algo com ela sobre isso. Porém, ele não era assim tão íntimo de ninguém para contar suas histórias. 

Propositalmente evitou perguntar o nome dela para que pudesse evitar qualquer fagulha de intimidade.

— Qual seu nome? Meu nome é Priya.

— Eroan… — Ele disse, e apertou os lábios.
 
Droga.

— Eroan… — Ela ressoou calmamente. — Eroan… Eroan… parece mesmo um nome genérico de plebeu. — Falou, rindo.

De repente, o sangue dele ferveu. 

Ela está ficando confortável rápido demais.

— Você não parece estar em uma posição tão favorável para fazer piadas estúpidas sobre o nome dos outros.

Ela negou com a cabeça.

— É tudo um mal entendido — ela disse, então se inclinou para frente antes de sussurrar —, meu pai já deve ter notado meu sumiço a essa altura. Meus sequestradores e esse Buttfed aí estão mortos, só não contaram a eles ainda. É só questão de tempo dele descobrir quem são os responsáveis. E eu tenho certeza que você será recompensado por não ter me entregado a eles.

Ele ponderou sobre o que ela havia dito. De fato, uma demoniana safira sendo escravizada? Havia alguma coisa muito estranha ou muito ousada aí.

— Priya, mesmo você sendo uma demoniana da casta safira, como você pode ter tanta certeza que cometeram um mal entendido sequestrando você?

— Bem, é simples. Porque quem é louco de sequestrar a filha de Rohan Dhelava Maltar, o rei de todos os demonianos?

Eroan ficou de pé empurrando a cadeira para trás.

Foi a vez dele estremecer.

— Você… é uma princesa?



Comentários