Volume 1

Capítulo 63: Ducem e o Templo Marrom

Noite, 10 de setembro de 1590. Ducem, Templo Marrom.

O salão principal está iluminado por velas nos cantos. Todos os bancos estão cheios de cidadãos e alguns soldados. As janelas deixam um pouco da luz das luas entrar. No altar, dentro da fonte, há algumas armas velhas, empoeiradas e enferrujadas. Nas escadas, algumas mulheres sentadas segurando velas.

Todos estão em um horário do ritual de agradecimento ao divino, e ficam em silêncio, buscam o templo como um lugar de meditação e paz, refletindo sobre tudo que aconteceu, acontece e acontecerá, pedindo o melhor destino para si e até para os que os rodeiam. Entre eles, um homem alto e bonito está ajoelhado perto do altar.

Samuk chegou alguns dias e sempre fica no templo com outros que não têm casa. O sacerdote do templo acolhe aqueles que têm fé e não têm um lugar para ficar, recomendando e aconselhando as pessoas perdidas em vários sentidos a seguirem em frente e descobrir seus caminhos.

Na entrada da cidade, Marcel, o guerreiro oriental, entra disfarçado como viajante com um grande furoshiki para guardar suas coisas. Ele é abordado pelos vigias do Império e com lábia e dissimulação consegue a empatia dos soldados e passar sem ser revistado.

Ele anda pela cidade até chegar a um hotel para passar a noite com o resto de dinheiro que tem, aproveitando para comer bem. Alguns soldados do Império alertam Ducem de alguns barcos se aproximando da costa, acreditando serem inimigos querendo atacar o Império.

No fim do ritual, todos vão para suas casas, e Samuk conversa com o sacerdote.

— Boa noite. Admiro sua dedicação e esse amor ao próximo, posso saber qual é a sua motivação?

— Boa noite… É claro, além de ser grato ao nosso Criador, Deus, e aos Electi, que Ele fez para nos guiar e nos instruir, eu tive uma grande revelação na época da Guerra-D. Os demônios matavam tudo ao seu caminho, minha família e eu fomos salvos pelos Imortais em uma situação que até hoje diria que era impossível… Com vários lugares devastados, minha família e eu chegamos aqui. Era uma pequena vila em volta deste templo. Quando entrei pela primeira vez aqui, vi aquele símbolo no altar na pedra de Bruno…

O sacerdote para olhando o símbolo junto com Samuk, depois continua:

— Vejo como se fosse agora… O sangue que foi usado para formar esse símbolo de Arbidabliu brilhou e emanou uma aura que só eu via. Perguntei para minha mãe, que segurava minha mão nesse dia, mas ela não entendeu. Eu via, como se me chamasse, como se dissesse que aqui é o meu destino, e aqui fiquei, ajudando outros perdidos e refugiados de vidas passadas e perturbadoras.

— Lindo… Agradeço pelo que o senhor faz por todos e por mim. Suas palavras são profundas, mas ainda não me encontrei, não sei o que fazer.

— Samuk, no primeiro dia eu lhe disse que você é um homem de muita honra, não se prenda em pequenas situações de fraqueza sendo que você tem várias situações de força e determinação. O antigo mundo tem uma cultura ortodoxa e até peculiar às vezes, mas dignidade é sempre igual, só muda o nome.

— Mas eu me sentia no meu lugar, como o senhor aqui está no seu lugar, lá era o meu lugar, porém fui forçado a sair.

— Vou te dizer algo que aconteceu comigo há menos de um ano: um Electi disse para mim que meu objetivo aqui neste templo, nesta cidade, chegou ao fim e que gostaria de minha presença em outro lugar.

— Um Electi? O senhor recusou?

— Sim, falei que não podia abandonar os fiéis que tenho aqui. Da mesma forma que ele é um mensageiro da palavra do Divino, eu também sou, e sinto que esta cidade, que o Império, precisa muito disso, muitas pessoas vêm aqui para contar e se desabafar das coisas que ouvem do Império e do mundo, sinto que com o tempo muita coisa pode ser feita e muito pode ser mudado.

— Esses dias eu vi você conversando com o lorde da cidade de Ducem.

— Sim, tenho muita fé nele. Mesmo sendo um subordinado de um império “rigoroso”, ele tenta mudá-lo aos poucos.

— Rigoroso? O senhor é muito modesto nas palavras.

— Tenho que ser, não posso julgar completamente sem conhecer o objetivo e as verdadeiras intenções, da mesma forma que existe soldado ruim, existe soldado bom, existem sacerdotes ruins também. Me esforço para sempre ser o “bom”.

— Penso assim também…

— Ótimo, algo mais?

— Não, obrigado pelo seu tempo.

— Foi um prazer.

Onze de setembro. Há o ataque, os barcos desembarcam e atacam as torres de vigia do Império perto da cidade. Eles passam o dia recuando o Império e formando uma base para guerra, ladrões náuticos bem equipados e preparados para uma grande guerra.

Na cidade, o Império se prepara para atacar antes que eles o façam. Samuk, ainda no templo, tem um mau pressentimento. Marcel passa o dia desorientado andando sem rumo pela cidade, até que chega ao Templo Marrom e fica para o ritual da noite.

Depois fica para dormir no templo, nos quartos dos “sem-teto”. Ele conhece Samuk, que guarda seus pertences em uma furoshiki também.

— Você também é…?

— Sim, não comente muito por esta cidade, eles são receosos com classes originárias de outros lugares, principalmente fora da zona de conforto deles.

— Certo. Há quantos dias você está aqui?

— Não o suficiente.

— Como assim?

— Se você está aqui, também deve ter perdido sua honra, ou acha que perdeu. Muitos aqui estão procurando motivação para seguir em frente.

— Sim…

— Eu diria que você está no lugar certo, mas estamos no tempo errado.

— O que quer dizer?

— Esses dias, em meditação, senti que esta cidade passará por muitas situações complicadas, uma briga de ideais e destinos, podendo causar grande fúria e destruição.

Enquanto Samuk, Marcel e outros passam a noite nos quartos do templo, o sacerdote, no salão principal, é abordado por um homem enquanto está apagando as velas para encerrar as visitas do dia.

— Brunu? Você é Brunu?

— Sim, boa noite. E o senhor é…?

— Boa noite, eu sou Kisnar, e queria muito falar com você, posso chamá-lo por “você”, ou gosta de formalidades como “senhor”?

— Pode me chamar de você.

— Bom, ainda mais com essa aparência jovem, não?

Brunu sorri, e Kisnar continua:

— Seu nome foi dado em homenagem a um dos primeiros Electi? Bruno?

Kisnar está usando roupas como um aldeão comum e está com uma bolsa de pano.

— Sim, e este templo foi feito em homenagem a ele.

— Fantástico, quantas referências… Sabendo disso, eu vim aqui para pedir algo assim, conquistar objetivos e sonhos, todos nós temos.

— Sim, é claro, e como eu posso te ajudar?

— Me diga, você conhece bem este templo, o mito de que aquele símbolo foi feito com o sangue de Bruno é verdade?

Brunu tenta ver as intenções de Kisnar com magia lendo sua aura, mas Kisnar consegue enganá-lo com algum artefato mágico, passando a ilusão de ser só um interessado na história.

— Sim, essa pedra é mais velha do que a cidade, foram feitos a fonte e o altar em volta da pedra, depois o templo em volta do altar, até chegar à cidade que é hoje…

Os dois andam em direção ao altar, sobem até a fonte, e, aproximando-se do símbolo, Brunu continua:

— Muitos vêm aqui e colocam suas armas no altar como símbolo de honra e até mudança de vida, abandonando vidas passadas.

— Interessante…

Kisnar pega em sua mochila uma pedra do tamanho de um punho, cheia de símbolo, e entrega para Brunu.

— Segure isso um momento.

Brunu pega a pedra, e nesse momento é paralisado, parecendo uma estátua de pedra. Kisnar tira o seu cetro da mochila e analisa o símbolo divino tocando, acariciando e falando sozinho.

— Finalmente… Bruno… Meios não justificam os fins… Preciso de seu poder… de seu apoio… Se o senhor está comigo, nada estará contra mim.

Kisnar tira uns pergaminhos e cola com saliva em volta do símbolo, e, apontando seu cetro, conjura uma onda de energia invisível para não praticantes de magias, que desativa o poder da torre de teleporte principal da cidade e impede que todos saiam ou entrem por ela. Os pergaminhos são consumidos nesse ritual, queimando e virando pó. Kisnar guarda seu cetro e pega no ombro de Brunu.

— Obrigado, foi muito útil.

Kisnar se afasta, e Brunu volta a se mexer normalmente, desesperado.

— O que houve? O que você fez?

Brunu segue Kisnar, que sai do templo e se distancia. Brunu sai, desce as escadas do templo e ameaça gritar para os guardas sobre Kisnar, que vira para ele e diz:

— Pena, não gosto de ferir sacerdotes, acho que dá azar, mas se for necessário…

Brunu ouve o que Kisnar diz, mas não se submete à ameaça e grita para os guardas:

— Guar…

Kisnar coloca sua mão dentro da bolsa e pega no cetro. A pedra que Brunu ainda estava segurando explode, deixando seu corpo em pedaços. O barulho chama atenção de todos. Alguns soldados, aldeões e os sem-teto do templo saem para ver. Chegam, e Kisnar já fugiu disfarçado de aldeão. Todos lamentam a morte de Brunu, deixando Samuk mais preocupado. Ele conversa com Marcel no segundo andar do templo a sós.

— Viu? Isso é só o começo.

— O que será que fez isso?

— Acredito que descobriremos em breve.

— Devemos reunir os outros e ir embora?

— Eu vou ficar. Brunu, mesmo sendo convidado a sair, ficou para ajudar os outros. Farei o mesmo, afinal vim aqui procurando um objetivo para seguir minha vida, quem sabe seja esse meu destino.

— Morrer?

— Às vezes você deve morrer para seu ideal se manter vivo ou aqueles que você ama ou acredita que farão diferença em seu lugar. Não sei se é o certo, mas é o que eu farei agora.

— Certo… Entendi… Estou nessa também, o que virá eu enfrentarei, afinal o que eu tenho a perder?

— Bom, vamos dormir, pois depois será difícil.

Doze de setembro. O dia todo passa com os fiéis dentro e em volta do templo fazendo homenagem a Brunu, que morreu na noite anterior. Todos levam flores e colocam no altar dentro e em volta da fonte. Samuk e Marcel ficam dentro do templo meditando.

Em um momento, eles falam sobre suas vidas no antigo mundo e dividem experiências. Marcel aconselha Samuk a ser mais agressivo, e Samuk aconselha Marcel a ser mais calmo e buscar um equilíbrio emocional para ambos.

Samuk diz a ele que, até que ache um novo objetivo para a vida, aprenda uma habilidade poderosa do antigo mundo que envolve a criação de um clone temporário. Nesse dia, Kisnar reúne um grupo dos seus ladrões dentro de Ducem, enquanto uma armada do Império sai para recuperar a costa dos ladrões náuticos antes que cheguem às vilas e à própria cidade de Ducem.

Treze de setembro. Samuk ajuda Marcel em um treinamento de corpo e mente. Ele também conta histórias sobre o Electi Bruno, que deu origem à grande parte dos poderes e cultura do antigo mundo, sendo um grande símbolo e ícone deles.

Marcel tem conhecimento em sua cultura do antigo mundo, mas é baixa por ter se dedicado muito a trabalho, mulher e filhos. Ele mantém em segredo o que houve com esse passado familiar. Uma batalha se inicia na costa, tendo como vencedores os ladrões com um grupo grande de cães terríveis, cães dez vezes maiores do que os comuns, usados como assassinos e até como montaria, superando a cavalaria de Ducem em batalha.

Algumas vilas são destruídas, mas a população delas consegue fugir para as florestas, vilas, cidades distantes e para Ducem.

Quatorze de setembro. Os ladrões náuticos conseguem avançar, chegando perto de Ducem e deixando a cidade em alerta. Algumas medidas de guerra são tomadas, civis são chamados para auxiliar no combate, cidadãos mais fracos ou com idades baixas e altas são mantidos em um território dentro de Ducem para que fiquem longe de perigo, magos se reúnem para verificar o que houve com a torre de teleporte que está inativa.

Steve e Bill, a inteligência militar da cidade, conversam determinando pontos de ataque e defesa e mandam mensageiros a cavalo e mensagem em aves para as cidades do Império que possam ajudar. Samuk e Marcel continuam o treinamento e ficam em alerta com as manobras da cidade.

Quinze de setembro. Kisnar usa pedras explosivas para destruir e matar todos os cidadãos que foram colocados longe do risco. Enquanto isso, sua linha de frente de ladrões ataca a entrada de Ducem. Os ladrões usam vários artifícios e truques mágicos para auxiliar no combate, destruindo muros, casas e torres em seu caminho.

Os lobos conseguem matar vários, mas muitos são massacrados pelos arqueiros e os magos que são colocados na linha de frente para defender a entrada da cidade. Graças aos arqueiros, a entrada não é tomada, e os magos conseguem fazer os ladrões recuarem por mais um dia, ganhando a primeira batalha.

Kisnar ainda consegue se esconder entre os aldeões junto com um grupo de elite de ladrões que tomam a torre de teleporte sem que o exército de cristal perceba. Na torre, Kisnar passa a noite traçando táticas de enfraquecer a linha de frente para que o grupo de fora consiga entrar, pois um grupo já está sendo preparado para tomar Regem em alguns dias.

Mais flores são levadas ao templo por causa da morte de Brunu. Samuk e Marcel treinam, preparando-se para o combate que pode chegar até eles, e, junto com alguns historiadores, Samuk descobre atributos da arma de Marcel, Ikarus, a espada negra do oriente.

Dezesseis de setembro. Samuk reúne o grupo do templo formando um grupo de defesa das pessoas de Ducem, sem seguir uma bandeira, e sim uma causa: salvar os inocentes de uma guerra que está nos portões da cidade. Marcel não vê necessidade, mas Samuk informa que eles irão entrar na cidade e com certeza não pouparão ninguém.

Os portões da cidade de Ducem ainda conseguem se manter de pé, recuando os ladrões mais um dia com as habilidades dos arqueiros e dos magos. Kisnar consegue se aproximar por dentro, implanta pedras mágicas e ladrões em pontos estratégicos para matar soldados de patentes altas para que caia a moral do exército do Império e que fiquem desorientados.

Dezoito de setembro. Samuk, Marcel, o grupo de lutadores e antigos guerreiros de guerra saem do templo para ajudar os cidadãos a fugirem e se salvarem da guerra. Kisnar consegue colocar seu plano em ação matando vários soldados de níveis baixos e altos. Essa manobra faz os arqueiros e os magos focarem dentro da cidade.

Os ladrões de fora conseguem destruir os portões e as torres e conseguem entrar na cidade, comprometendo boa parte dela. Eles matam, destroem e saqueiam tudo que veem pela frente. Um grupo de ladrões acaba atacando o grupo de Samuk e Marcel. Os ladrões são devastados por subestimarem o grupo que usa vestes simples e rasgadas.

A queda da defesa da cidade comprometeu a moral e as intenções dos soldados do Império, colocando uns contra os outros e revelando um grupo opositor ao império de Xarles, que é o grupo em que Steve está incluído e liderando, mas ele foi traído por Bill. Tudo isso envolve em brigas diversas pela cidade de Ducem, com lutas entre dois grupos do Império de Cristal, os ladrões náuticos liderados por Kisnar e o grupo do templo liderado por Marcel.

Os únicos que são aliados é o grupo de Marcel e de Steve, que buscam a salvação da cidade e das pessoas. No final da noite, Kisnar e seu grupo invadem o quartel principal da cidade. Ele derrota com sua espada e cetro mágico os soldados e consegue derrotar sozinho guerreiros de elite do Império, dando moral para seus comparsas.

Na sala principal, ele se depara com o lorde da cidade sozinho atrás de uma mesa grande cheia de documentos e papéis.

— Aqui está! Você é Elton Mayo?

— E você é…?

— Desculpe meus modos, eu sou Kisnar, Kisnar Alois, mas isso não é importante para você.

Kisnar está com as vestes que usa naturalmente, parecendo ser da realeza, roupas caras e chamativas, mas tudo sujo e cheirando mal. Elton estranha tudo, e Kisnar se aproxima analisando-o de cima a baixo. Depois de um tempo encarando-o, ele diz:

— Estranho… Você está sozinho aqui? Onde estão os guardas?

— Você os derrotou ao entrar, estou errado?

— Sim, está.

Kisnar perfura a barriga de Elton com seu cetro e com magia o faz queimar. Os ladrões entram e jogam Elton em chamas pela janela. Ele cai os dois andares e morre. Kisnar lê alguns pergaminhos na mesa sobre os trabalhos e pesquisa de Elton.

— Interessante, algo sobre a capacidade social do trabalhador em grupo, grupo feliz trabalha feliz… Bem, meu grupo é feliz... E agora todo esse lugar será.



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