Volume 1
Capítulo 51: O Clã de Pando
Alexia puxa Yama animada para ver Pando e os moradores. Ochi se apoia em Baltazar e o guia. Anirak e Onurb para um campo de treinamento. Maxmilliam volta para o quarto e descansa a fim de restaurar suas energias, e Ray segue junto com Imi até o tempo dos Imortais.
O dia passa rápido. A tarde toda Ray passa vendo o templo com Imi e alguns outros soldados. Ele admira item por item, pinturas e assessórios dos antigos heróis do Grande Continente. Recorda-se dos seus estudos e da história que sempre ouvia quando criança, mas sem precisar usar a imaginação, pois há muita imagem e material para ele ver por si só, como foi e como eles eram, pequenos contos e canções escritas nos pergaminhos e livros, alguns escritos pelos próprios Imortais.
Ray aproveita e faz muitas anotações em seu diário. Vê mais detalhes e informações de Alfor e uma estranha coincidência, um dos Imortais lembra muito o senhor da caverna de ladrões em Coniuro. Os detalhes fazem Ray imaginar alto:
— Onurb é filho de um dos Imortais?! Isso seria uma grande revelação.
Chegando a um ponto focado em seus pais, Imi e os soldados se afastam, dando um tempo para Ray ver e admirar os feitos de sua família. Ele não consegue segurar a emoção e as boas lembranças de quando era criança. Mesmo em lágrimas, continua anotando e agradecendo.
— Obrigado, Deus, por ser filho desses incríveis seres, peço que eu faça a diferença como eles fizeram, honrar o nome deles e a história de Arbidabliu… Tenho orgulho de ser filho de vocês, eu só queria poder ter tido mais tempo com vocês… Pai… mãe… eu amo vocês.
Anirak, Onurb e Baltazar são guiados por Ochi pelos campos de treinamento toda a tarde. Eles ficam impressionados com o treinamento difícil que eles têm, parecendo treinamento de guerreiros Praeteritum, com todos os aspectos de luta, armada e não armada, corpo a corpo e à distância, cultural e científica, ataque mágico e defesa mágica.
As lutas amistosas fazem Anirak, Baltazar e Onurb lembrarem-se de suas lutas no Império de Cristal, impressionando-os pelas habilidades usadas em treinamento. Depois de um tempo, em um momento a sós, Baltazar elogia.
— Mesmo sendo o que são, eles são fantásticos.
Onurb discorda:
— Éh. Você está parecendo a Alexia, eles são bons, mas não é para tanto.
— Baltazar, não liga para Onurb, ele está com inveja … Ele ficou com medo de ser cortejado aqui, mas viu que não recebeu nenhum olhar, Onurb é feio até para esse clã, isso porque eles são famosos por ver a beleza interior dos outros, além da externa.
— Você está delirando? Eu agradeço por não ser alvo deles, vocês viram aquela luta com tentáculos? Que magia insana era aquela?
— Ouvi dizer que é usado como método de tortura para pessoas como você, Onurb.
— Sim, e prazeroso para eles.
Baltazar questiona:
— Cortejado? Eles fazem isso entre eles?
— Baltazar, você não sentiu muita intimidade de Ochi com você?
— Não, ele é bem engraçado e legal… Ele me fez massagem quando estávamos sentados vendo o treinamento, minhas costas agradecem.
Onurb faz cara de medo.
— Como você pode ser tão inocente?
Anirak reclama com Onurb:
— Não seja malicioso, Ochi só foi legal com Baltazar.
— Éh? Por que não foi legal com você?
— Não começa a estressar, o dia está agradável.
— Agradável? Eles têm nomes estranhos, “Oxi” parece expressão de surpresa.
— Se pronuncia “Othi”, e não “Oxi”.
Ochi se aproxima.
— O pessoal está dando um tempo, vamos comer?
Baltazar se anima.
— Comida? Ótimo, estou morrendo de fome.
— Interessante, um homem com um grande apetite. Vou dar algo gostoso para você comer, Balta.
Onurb ri e puxa Baltazar.
— Ei, Touro velho, cuidado com o que você vai comer aqui na floresta.
Anirak tenta segurar o riso, mas não consegue, e aconselha Baltazar também.
— Amigo, Onurb é exagerado, mas ele tem um pouco de razão, este lugar é novo e é melhor não sair por aí experimentando tudo, entende?
— Certo…
Baltazar fica sem entender e segue Ochi para uma mesa grande cheia de comida ao ar livre junto com vários guerreiros do treinamento. Onurb e Anirak também vão com eles para comer. Em um momento, eles veem mulheres ao longe iniciando treinamento.
Todos comem. Onurb e Anirak riem vendo Baltazar receber elogios e ser cortejado por alguns homens, sem ele mesmo perceber as intenções dos homens. Em algum tempo, eles veem Alexia ao longe andando animada com Yama.
Ela também passa a tarde toda com ele, admirando a vida do clã, os animais que eles criam, alguns relacionamentos que ela viu no caminho e os contos que Yama contou, de amores proibidos, intensos, entre outras histórias envolvendo os homens de Pando, o que a deixa mais apaixonada e admirada pelo clã.
Alexia se junta ao grupo para comer também, e Yama volta para os dormitórios.
O sol se põe e dá lugar a uma noite fria e nublada. O campo de treinamento fica vazio, dando espaço para Baltazar, Onurb, Anirak e Alexia treinarem junto com alguns guerreiros que se prontificaram a auxiliá-los.
Alexia não treina bem, pois sua concentração está em admirar e imaginar os homens do campo de treinamento dentro das histórias que ouviu antes por Yama. Maxmilliam desperta e visita o templo dos Imortais, e tem um momento nostálgico admirando e lembrando-se de alguns detalhes daquela época.
Yama o encontra no caminho e oferece uma poção que ajuda a restabelecer o seu poder para que ele se sinta melhor e despreocupado se surgir algum inconveniente no resto do caminho. Ray, depois de comer, volta até a sala de reunião e admira o mapa de Pando, vendo qual caminho seguir no outro dia. Uma mulher entra, e ele estranha.
— Uma mulher?
Ela é carismática e tem uma voz doce.
— E não pode? Não disseram que tem muitas de nós aqui também? Ou eles monopolizaram tudo?
— Não, me desculpe, disseram, sim, é que não vi nenhuma até agora.
— Mesmo só uma de nós sentando no altar das divas, ainda somos uma boa parte da população aqui.
— Imagino… Hoje eu só vi três líderes, você é essa “uma”?
— Esqueci minha educação, desculpe, eu sou Neko, sou braço direito de Yurizoku, uma das líderes, ela não está hoje aqui na sede.
Neko é uma mulher aurem, jovem, muito bonita, pele clara, cabelos curtos vermelhos, estatura baixa, usa roupas leves comuns, camisa, calça e sandálias. Ela tem um jeito meigo e inocente de falar e agir, um olhar puro e sincero. Ray a questiona:
— E o quinto lugar do altar? De quem é?
— Não conheço, ele saiu há muito tempo e não voltou mais… Parece que esse foi o fundador do clã aqui em Pando… Ele não é muito mencionado…
— Interessante. E os outros líderes, você os conhece bem?
— Sim, eles são um pouco fissurados com algumas coisas.
— Fissurados?
— Sim, minha chefe, por exemplo, é apaixonada por laranja, a fruta, sabe?
— Sim.
— Imi adora gemas, “gemas são pura emoção”, mas ele eu entendo, ele tem gemas poderosas de aventuras e batalhas que teve nas montanhas de Irene, além de ter essas propriedades mágicas que eu não entendo. Ochi adora limão, eu acho tão azedo, e ele chupa como se fosse doce, e Yama ama banana. Acredita que ele venceu um desafio usando banana como arma? Ninguém espera por uma banana.
— Legal, eles são peculiares…
— Sim, todos nós somos.
Onurb e Alexia entram na sala.
— Enfim achei você, Ray, por favor, fique com Alexia, ela está me irritando.
— O que houve?
— Não dê ouvidos a ele, Ray, eu só queria andar mais pelo clã e ver mais desses homens maravilhosos.
Onurb repara em Neko e admira sua beleza, aproximando-se dela.
— E você? Que bela mulher, tudo bem?
— Sim, você é Onurb?
— Sim, e você é…?
— Neko… Bara Kei falou de vocês.
— “Para quem”? Espere! Você é mulher, não?
— Sim, eu sou.
— Ah! Agora sim, finalmente uma bela paisagem.
— Onurb! Deixa Neko em paz, ela está me contando sobre o clã de Pando e você está atrapalhando.
— Não estou atrapalhando. A propósito, eu tenho uma pergunta… Neko, se vocês não têm relações com o sexo oposto, como se reproduzem? Como este lugar é tão cheio?
Neko ri alto e responde:
— Você acha que nós nos prendemos a esse costume de viver para popular? Muita gente já faz isso por nós, mesmo se fosse não teria como… Não nos reproduzimos, todos vieram de toda Arbidabliu, muitos excluídos por amigos e familiares, alguns nos buscam por vontade própria para estar junto com os seus sem críticas, e aqui temos tudo, proteção, treinamento, cultura e uma causa para lutar e viver.
— Já vi que você vai se dar bem com Ray…
Alexia admira as flâmulas no altar e questiona Neko:
— Por que existem símbolos diferentes entre vocês?
— Somos divididos para ocasiões diferentes. O Semeru é o esquadrão que ataca, e o Ukeru o que defende, isso ajuda a nos relacionar também.
Ray estranha.
— Relacionar?
Onurb se aproxima de Ray.
— Não se aprofunde nos seus estudos, Ray, tem coisas que é melhor ficar sem saber.
— Para de ser besta, conhecimento nunca é demais.
— Verdade, você deveria ter visto a magia dos tentáculos, você ficaria assustado.
Neko sorri e, animada, comenta:
— Essa magia é ótima, na verdade nós filhas de Adéa que criamos, minha companheira é ótima nessa habilidade.
Onurb fica espantado.
— Nah. Informação demais, obrigado…
Ray fica pensativo e questiona:
— Companheira? Qual é o nome dela?
— Tachi… Eu sou o braço direito e ela é o braço esquerdo de Yurizoku.
Alexia a questiona:
— Yama, Ochi e Imi, eles são de qual parte desse Semeru e Ukeru?
— Não sei… nunca conversei com eles referente a isso.
Ray olha para as flâmulas e fica confuso.
— Como assim? Semeru? Ukeru?
Onurb puxa Ray pelo braço.
— Ray, Ray, não se aprofunde nessas informações.
— Para, Onurb… Neko tem uma cozinheira em Pronuntio que admira vocês, ela sempre comenta que se o mundo todo ficasse procriando, acabaria a comida e ela teria muito trabalho e pouco a receber.
Todos ficam pensativos, e Neko, sorrindo, comenta:
— Tem uma lenda que um Electi calculou isso, uma das formas pelas quais o mundo acabaria seria uma espécie específica se multiplicando, comendo e destruindo as outras, uma praga que acabaria tanto com os outros seres vivos, com o mundo e no fim acabaria com ela mesma, assim ele lançou uma magia de “contingência”, um poder chamado de “salve a mãe”, Mãe Natureza, e aleatoriamente alguns nasceriam estéreis ou sentindo atração pelo mesmo sexo, assim haveria amor e não teria superpopulação.
Onurb comenta:
— Hmmm... Seria bom se tivesse só estéreis, não precisaria dessa alternativa.
— É que, sendo estéreis, você os priva de algo que eles acham essencial, ter filhos, deixar o gosto diferenciado não os priva, eles só têm um amor diferente… Como eu disse, é só uma lenda. Sendo verdadeira ou não, nós filhos de Ivo e Adéa existimos e estamos aqui…
Ray a elogia:
— Você fala bem, Neko, gostei da lenda… Tem continuação? Quem foram Ivo e Adéa?
— Nada, eu decorei a lenda de Imi, ele sempre conta essa história para os novatos… Eu acho fascinante, é lindo pensar que um ser divino pensou em nós, não uma maldição como muitos pensam… Ivo e Adéa foram os primeiros, a vila deles ia matá-los se eles não procriassem, suspeitando que eles eram amaldiçoados e amaldiçoariam a vila e o mundo.
— E o que houve?
Onurb e Alexia sentam e ficam como crianças ouvindo uma boa história.
— Agora até eu quero saber o que houve.
— Eles pediram aos céus a ajuda do Electi, mas antes de eles serem ajudados por um ser divino, eles conseguiram a ajuda de um artista de uma cidade vizinha, ele era bom em magia e alquimia e uniu os gametas deles sem precisar da reprodução comum.
Onurb comenta:
— Já vi fazerem isso com uma vaca…
Todos o olham com cara brava, deixando-o sem reação, e Neko continua:
— Ele conseguiu engravidar Adéa, mas depois o Electi deu poder a eles, um poder que eles poderiam escolher serem “normais” e não sofrerem preconceito de suas famílias e da vila. Como Ivo e Adéa tinham parceiros secretos, eles não queriam perder o amor que já tinham e usaram esse poder para abençoar seu filho… Essa lenda diz também que esse filho pródigo de poder é o fundador do clã de Pando, o outro líder daqui que se senta na frente daquela flâmula. Ele plantou uma árvore e pediu para ela se expandir para fazer uma casa para ele e seus irmãos ficarem longe de perigo, e assim foi.
Onurb fica confuso.
— Hmmm... Estranho, mas se ele plantou essa enorme floresta e é um dos primeiros de “vocês”, ele deve ser um imortal! Como ele estaria vivo ainda?
Ray responde Onurb:
— Onurb, é uma lenda, não se sabe a profundidade da verdade, é um conto contado de tempos em tempos e mudado conforme as pessoas falam, não leve ao pé da letra, pense só na mensagem. Esse líder pode ser descendente ou pupilo desse fundador, e ele continua o legado levando o nome dele.
Neko fica pensativa e feliz com o comentário de Ray.
— Incrível, Ray. Verdade, faz muito sentido sua forma de ver a lenda, depois vou ver com minha chefe se ela sabe de algo a mais.
— Obrigado. E aqui na cidade só tem “vocês”?
— Não, temos outros como “vocês” também… Estranho ficarmos usando esse termo “vocês”, mas é engraçado… Alguns não descendentes de Ivo ou Adéa vieram por terem familiares por aqui, ou por achar nossa cidade avançada e boa para se viver. Confesso que fico um pouco receosa, pois muitos invadem a floresta falando que querem paz e nos conhecer, mas acabam nos atacando ou se infiltrando para nos prejudicar. Outra bênção é que conseguimos sentir pessoas iguais a nós, é mais seguro e mais fácil de achar alguém amado.